Hoje se completa um mês, apenas um mês que minha mãe deixou o hospital, após a sexta internação do ano. A mais grave de todas, que envolveu seis dias de UTI. Nunca estivemos tão perto de perdê-la. Toda a conjuntura foi tão estressante que parece ter abalado a minha capacidade de aferir o tempo. Sinto que faz muitos meses desde que ela recebeu alta. Meses e meses, como se fosse uma outra vida.
Acho que nem aconteceu tanta coisa nesse período, mas a sensação é de que aconteceu coisa demais. Tudo é estranho. De concreto e objetivo, temos uma rotina, na qual tentamos deixá-la o mais confortável possível. Nem sempre conseguimos, mas seguimos a convicção de que nada há a fazer senão lutar, insistir e cuidar.
E como já dito em postagem anterior, amar, amar e amar.
domingo, 30 de agosto de 2015
quarta-feira, 19 de agosto de 2015
Para onde caminhamos?
Semana passada, houve reunião de pais na escola de minha filha. Pelo tom da conversa, um item específico está incomodando bastante, porque se gastou a maior parte das duas horas e meia descrevendo comportamentos aversivos das crianças e, obviamente, de seus pais, nos quais se origina a anomalia. Concentro-me em um dos casos narrados.
Em uma das turmas existe um garoto que se comporta como um típico bully: dominante, arrogante, gosta de dar ordens e explorar os colegas, p. ex. exigindo que lhe comprem lanche, algo de que ele não precisa; faz apenas porque pode. A escola acionou a família e o pai compareceu. Apresentado o problema, o pai não ficou nem um pouco incomodado. Com a convicção própria dos canalhas, respondeu: "É o mundo cão, professora. Meu filho está aprendendo como as coisas são."
E assim fica tudo explicado: como a natureza não impede que sociopatas procriem, crianças chegam a famílias nas quais serão treinadas para realizar tudo que há de feio e indigno na humanidade, como se fosse algo bom e necessário.
Não sei como a educadora encerrou o atendimento, que se revelou um completo fiasco. Eu, se estivesse em seu lugar e tivesse condições (que, no caso concreto, existem) de tomar uma atitude desse tipo, recomendaria a esse ser abjeto que transferisse seu filho de escola por absoluta incompatibilidade entre os valores desta e os anseios particulares da família. São rumos de orientação inconciliáveis, então é melhor matricular a criança em uma escola mais adequada ao perfil (nem seria difícil encontrar uma, mesmo no down down down no high society).
E como eu sou eu, diria mais: Já que o senhor valoriza tanto o mundo cão, saiba que este possui outra regra importante, a do "com doido, doido e meio". Hoje, o senhor está satisfeito porque é o seu filho quem molesta terceiros. Mas dia chegará em que ele vai se chocar com alguém mais cínico e agressivo. Nesse dia, ele vai perder. Quando esse dia chegar, não me procure. Se ele for humilhado, roubado, espancado, não venha até a minha sala. Aqui, tudo que lhe direi é que esse é o mundo cão e que seu filho, que já aprendeu a agredir, agora precisa aprender a se defender.
E é isso. Estes são os valores da tradicional família brasileira em 2015. Não admira que protestos pela "democracia" e "moralidade" sejam marcados por lamentos sobre os militares não terem assassinado ainda mais pessoas durante a ditadura, que se quer de volta. O horror está vivo nas ruas porque é uma realidade dentro das casas. Honestamente, esse é um mundo em que não dá vontade de viver. Faço o meu papel e ensino a minha filha sobre a importância de ser decente e solidária. Mas não são justamente esses os primeiros a cair?
Em uma das turmas existe um garoto que se comporta como um típico bully: dominante, arrogante, gosta de dar ordens e explorar os colegas, p. ex. exigindo que lhe comprem lanche, algo de que ele não precisa; faz apenas porque pode. A escola acionou a família e o pai compareceu. Apresentado o problema, o pai não ficou nem um pouco incomodado. Com a convicção própria dos canalhas, respondeu: "É o mundo cão, professora. Meu filho está aprendendo como as coisas são."
E assim fica tudo explicado: como a natureza não impede que sociopatas procriem, crianças chegam a famílias nas quais serão treinadas para realizar tudo que há de feio e indigno na humanidade, como se fosse algo bom e necessário.
Não sei como a educadora encerrou o atendimento, que se revelou um completo fiasco. Eu, se estivesse em seu lugar e tivesse condições (que, no caso concreto, existem) de tomar uma atitude desse tipo, recomendaria a esse ser abjeto que transferisse seu filho de escola por absoluta incompatibilidade entre os valores desta e os anseios particulares da família. São rumos de orientação inconciliáveis, então é melhor matricular a criança em uma escola mais adequada ao perfil (nem seria difícil encontrar uma, mesmo no down down down no high society).
E como eu sou eu, diria mais: Já que o senhor valoriza tanto o mundo cão, saiba que este possui outra regra importante, a do "com doido, doido e meio". Hoje, o senhor está satisfeito porque é o seu filho quem molesta terceiros. Mas dia chegará em que ele vai se chocar com alguém mais cínico e agressivo. Nesse dia, ele vai perder. Quando esse dia chegar, não me procure. Se ele for humilhado, roubado, espancado, não venha até a minha sala. Aqui, tudo que lhe direi é que esse é o mundo cão e que seu filho, que já aprendeu a agredir, agora precisa aprender a se defender.
E é isso. Estes são os valores da tradicional família brasileira em 2015. Não admira que protestos pela "democracia" e "moralidade" sejam marcados por lamentos sobre os militares não terem assassinado ainda mais pessoas durante a ditadura, que se quer de volta. O horror está vivo nas ruas porque é uma realidade dentro das casas. Honestamente, esse é um mundo em que não dá vontade de viver. Faço o meu papel e ensino a minha filha sobre a importância de ser decente e solidária. Mas não são justamente esses os primeiros a cair?
domingo, 16 de agosto de 2015
Seria a rosa uma questão de aceitação?
Há dois meses, publiquei uma postagem na qual contei sobre estar lendo O pequeno príncipe para minha filha e, particularmente, como ela reagiu à passagem em que a raposa ensina ao principezinho o significado de cativar. Por razões variadas, ainda não terminei a leitura. Faltam poucas páginas, mas é justamente nelas que encontramos o clímax, quando o menino decide aceitar a oferta da cobra para retornar a seu planetinha e a sua rosa. Estou particularmente interessado em saber como Júlia lidará com o desfecho.
Ontem, fomos ao cinema para assistir à mais nova adaptação da obra imortal de Antoine de Saint-Exupéry. Desta vez, a saga do pequeno príncipe é contada em seus momentos cruciais, para servir de fio condutor à história pessoal de uma garotinha de 9 anos, cuja mãe é obcecada por sucesso (no caso, assegurar que a filha entre para a conceituada Werth Academy). O objetivo final dessa mulher é que a menina se torne "uma adulta maravilhosa" e, para isso, ela elabora um plano de vida, no qual estabelece o que a filha fará, literalmente, hora por hora de cada dia.
Na casa ao lado, porém, mora um homem que claramente é considerado amalucado e uma ameaça à vizinhança. Trata-se do "aviador", ou seja, a pessoa que viveu a estória narrada no livro, que caiu no deserto do Saara e passou uma semana em companhia de uma criança de cabelos dourados oriunda do Asteroide B-612, que vivia um dilema sobre como se relacionar com uma rosa que ele julgava única e que deixara para trás.
O aviador se queixa de que ninguém acredita em sua história, por isso ele conta a uma criança. Claro, os adultos são muito esquisitos e somente uma criança poderia enxergar a verdade. E essa verdade penetra na alma da menina e muda tudo. Aliás, muda não: transforma. Porque transformará também sua mãe e, consequentemente, toda a vida que ela conhece. Aqui, por sinal, vemos uma das decisões cênicas mais inteligentes da produção, ao fundir o universo do pequeno príncipe com os fantasmas interiores da menina, em uma eletrizante sequência completamente nova, em que ela e o príncipe, agora um rapaz fagocitado pelo sistema, tentam reencontrar a si mesmos.
A produção franco-americana The little prince, de 2015, é dirigida por Mark Osborne, um americano prestes a completar 45 anos que traz no breve currículo bobagens como Kung Fu Panda e Bob Esponja. O roteiro é de Irena Brignull (que escreveu o agradável e premiado Shakespeare apaixonado, vencedor de 7 Oscars) e de Bob Persichetti, que participou de diversas produções voltadas para crianças (Gato de Botas, Monstros vs. alienígenas, Planeta do tesouro, A nova onda do imperador, Fantasia 2000, Tarzan, Hércules, Mulan, O corcunda de Notre Dame e filmes da franquia Shrek).
O elenco de dubladores também impõe respeito, a começar pelo veterano Jeff Bridges (o aviador, no Brasil muito bem defendido pelo excelente Marcos Caruso). Ao lado de uma modesta Rachel McAdams (de filmes da franquia Sherlock Holmes e do seriado True detective, como a mãe), os nomes impressionam: Marion Cotillard (a atriz que ressuscitou Edith Piaf, como a rosa), James Franco (uma das vozes da raposa), Benício Del Toro (a cobra), Paul Giamatti (o professor), Vincent Cassell (a outra voz da raposa) e Ricky Gervais (o vaidoso).
Mas o que importa mesmo é a narrativa e a linguagem e, nisso, a equipe acertou em cheio. O filme é belíssimo, dividindo dois tipos de animação; um, mais naturalista, para contar a "vida real" da garotinha (encantador o detalhe dos dentes desiguais, porque ainda crescendo); outra, mais parecida com gravuras de um livro, para contar a saga do principezinho. E o roteiro é magnífico, capaz de mostrar o que afirmei na postagem supracitada: O pequeno príncipe é uma obra imortal "porque toca de imediato o coração, mesmo de uma criança, e produz um significado que pode ser levado para a vida real e se tornar parte do que somos".
Escutando os rumores ao meu lado, fiquei com a sensação de que O pequeno príncipe era, de fato, uma memória querida das pessoas ali reunidas para ver o filme, que levaram suas crianças para introduzi-las nesse mundo de encantamento, mas que é também um símbolo da dura tarefa de amadurecer, essa missão à qual não podemos escapar. O aviador é um idoso solitário, consciente de que seu tempo está chegando ao fim. A garotinha é uma menina que parece ter assimilado a insanidade materna de ser uma miniadulta perfeita, mas que traz em si a dor do abandono paterno e que reage com fúria ao perceber que o seu novo amigo também está prestes a partir.
Estamos diante, portanto, de um filme que fala sobre crescimento, em especial sobre a necessidade de lidar com as perdas, que virão inevitavelmente. E por tratar daquilo que diz respeito à vida de qualquer um de nós, emociona profundamente, do princípio ao fim. A moral da história que identifico ali é que não podemos mudar as coisas, mas podemos sobreviver a elas e seguir em frente. Aquilo que se perde não deixa de existir, porque subsiste em nossos corações. Se prestarmos muita atenção, talvez até possamos escutar sua risada ou sentir o seu perfume.
Tudo isso pode parecer um monte de clichês, mas estranhamente eu sinto que também é a mais pura verdade. Recomendo enfaticamente que vejam o filme, de coração aberto.
PS - A raposinha do filme é a coisa mais linda. Se vocês souberem onde posso comprar uma, por favor me informem!
O trailer do filme: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-178545/trailer-19543616/
Postagem elaborada com informações do IMDb.
Ontem, fomos ao cinema para assistir à mais nova adaptação da obra imortal de Antoine de Saint-Exupéry. Desta vez, a saga do pequeno príncipe é contada em seus momentos cruciais, para servir de fio condutor à história pessoal de uma garotinha de 9 anos, cuja mãe é obcecada por sucesso (no caso, assegurar que a filha entre para a conceituada Werth Academy). O objetivo final dessa mulher é que a menina se torne "uma adulta maravilhosa" e, para isso, ela elabora um plano de vida, no qual estabelece o que a filha fará, literalmente, hora por hora de cada dia.
Na casa ao lado, porém, mora um homem que claramente é considerado amalucado e uma ameaça à vizinhança. Trata-se do "aviador", ou seja, a pessoa que viveu a estória narrada no livro, que caiu no deserto do Saara e passou uma semana em companhia de uma criança de cabelos dourados oriunda do Asteroide B-612, que vivia um dilema sobre como se relacionar com uma rosa que ele julgava única e que deixara para trás.
O aviador se queixa de que ninguém acredita em sua história, por isso ele conta a uma criança. Claro, os adultos são muito esquisitos e somente uma criança poderia enxergar a verdade. E essa verdade penetra na alma da menina e muda tudo. Aliás, muda não: transforma. Porque transformará também sua mãe e, consequentemente, toda a vida que ela conhece. Aqui, por sinal, vemos uma das decisões cênicas mais inteligentes da produção, ao fundir o universo do pequeno príncipe com os fantasmas interiores da menina, em uma eletrizante sequência completamente nova, em que ela e o príncipe, agora um rapaz fagocitado pelo sistema, tentam reencontrar a si mesmos.
A produção franco-americana The little prince, de 2015, é dirigida por Mark Osborne, um americano prestes a completar 45 anos que traz no breve currículo bobagens como Kung Fu Panda e Bob Esponja. O roteiro é de Irena Brignull (que escreveu o agradável e premiado Shakespeare apaixonado, vencedor de 7 Oscars) e de Bob Persichetti, que participou de diversas produções voltadas para crianças (Gato de Botas, Monstros vs. alienígenas, Planeta do tesouro, A nova onda do imperador, Fantasia 2000, Tarzan, Hércules, Mulan, O corcunda de Notre Dame e filmes da franquia Shrek).
O elenco de dubladores também impõe respeito, a começar pelo veterano Jeff Bridges (o aviador, no Brasil muito bem defendido pelo excelente Marcos Caruso). Ao lado de uma modesta Rachel McAdams (de filmes da franquia Sherlock Holmes e do seriado True detective, como a mãe), os nomes impressionam: Marion Cotillard (a atriz que ressuscitou Edith Piaf, como a rosa), James Franco (uma das vozes da raposa), Benício Del Toro (a cobra), Paul Giamatti (o professor), Vincent Cassell (a outra voz da raposa) e Ricky Gervais (o vaidoso).
Mas o que importa mesmo é a narrativa e a linguagem e, nisso, a equipe acertou em cheio. O filme é belíssimo, dividindo dois tipos de animação; um, mais naturalista, para contar a "vida real" da garotinha (encantador o detalhe dos dentes desiguais, porque ainda crescendo); outra, mais parecida com gravuras de um livro, para contar a saga do principezinho. E o roteiro é magnífico, capaz de mostrar o que afirmei na postagem supracitada: O pequeno príncipe é uma obra imortal "porque toca de imediato o coração, mesmo de uma criança, e produz um significado que pode ser levado para a vida real e se tornar parte do que somos".
Escutando os rumores ao meu lado, fiquei com a sensação de que O pequeno príncipe era, de fato, uma memória querida das pessoas ali reunidas para ver o filme, que levaram suas crianças para introduzi-las nesse mundo de encantamento, mas que é também um símbolo da dura tarefa de amadurecer, essa missão à qual não podemos escapar. O aviador é um idoso solitário, consciente de que seu tempo está chegando ao fim. A garotinha é uma menina que parece ter assimilado a insanidade materna de ser uma miniadulta perfeita, mas que traz em si a dor do abandono paterno e que reage com fúria ao perceber que o seu novo amigo também está prestes a partir.
É hora de partir. |
Estamos diante, portanto, de um filme que fala sobre crescimento, em especial sobre a necessidade de lidar com as perdas, que virão inevitavelmente. E por tratar daquilo que diz respeito à vida de qualquer um de nós, emociona profundamente, do princípio ao fim. A moral da história que identifico ali é que não podemos mudar as coisas, mas podemos sobreviver a elas e seguir em frente. Aquilo que se perde não deixa de existir, porque subsiste em nossos corações. Se prestarmos muita atenção, talvez até possamos escutar sua risada ou sentir o seu perfume.
Tudo isso pode parecer um monte de clichês, mas estranhamente eu sinto que também é a mais pura verdade. Recomendo enfaticamente que vejam o filme, de coração aberto.
PS - A raposinha do filme é a coisa mais linda. Se vocês souberem onde posso comprar uma, por favor me informem!
O trailer do filme: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-178545/trailer-19543616/
Postagem elaborada com informações do IMDb.
quinta-feira, 13 de agosto de 2015
terça-feira, 11 de agosto de 2015
De volta às origens
Por uma interessante coincidência, retorno na tarde de hoje ― dia da instituição dos cursos jurídicos no Brasil e dia do advogado ― a uma tarefa que marca o início de minha carreira docente.
Em 1999, participei de um processo seletivo para professor substituto do curso de Direito da Universidade Federal do Pará. Passei em segundo lugar, mas com muito orgulho de ter sido o único candidato a receber a nota máxima na prova didática, o que eu, aos 24 anos de pura inexperiência, interpretei como prova de minha vocação.
Aquela seleção fora para professor orientador do Núcleo de Prática Jurídica (NPJ), mas como esse serviço era vinculado ao Departamento de Direito Penal e Processual e faltavam professores para todos os lados, ganhei duas turmas de Penal I. Quase explodi de alegria com isso.Estava realizando o meu sonho.
Naquele mesmo ano, em setembro, fui contratado pelo CESUPA para lecionar Noções de Direito, Legislação e Ética para o curso de Tecnologia em Processamento de Dados. Quatro meses depois, recebi o convite para ser o primeiro professor de direito penal daquele curso então nascente. Naquele momento, éramos pouco professores e tínhamos a função de fazer um curso inteiro funcionar pela primeira vez, pois tudo era novidade, literalmente. Assim, eu também fui um dos fundadores do NPJ do CESUPA.
Em 2003, recebi o convite para trabalhar no Tribunal de Justiça do Estado do Pará, o que me incompatibilizou com a advocacia e, por consequência, com a orientação no NPJ, já que eu não podia assinar peças nem fazer audiências.
Hoje, enfim, já tendo encerrado meu compromisso no TJE há 5 meses e retornado ao exercício da advocacia, voltarei também ao NPJ do CESUPA para um novo ciclo de orientação. Terei a oportunidade de conhecer turmas para as quais não dei aula, conviver um pouco mais com ex-alunos, ajudar de formas diferentes e, claro, aprender coisas que eu mesmo preciso saber, pela vivência dos casos que nos chegam e troca de experiências com os colegas e com os nossos alunos.
Estou feliz pela oportunidade de participar de mais um aspecto da formação acadêmica das novas gerações e, claro, pela lembrança do meu nome, o que representa mais uma carinhosa validação da instituição que me acolhe há quase 16 anos. Espero estar à altura da missão.
Em 1999, participei de um processo seletivo para professor substituto do curso de Direito da Universidade Federal do Pará. Passei em segundo lugar, mas com muito orgulho de ter sido o único candidato a receber a nota máxima na prova didática, o que eu, aos 24 anos de pura inexperiência, interpretei como prova de minha vocação.
Aquela seleção fora para professor orientador do Núcleo de Prática Jurídica (NPJ), mas como esse serviço era vinculado ao Departamento de Direito Penal e Processual e faltavam professores para todos os lados, ganhei duas turmas de Penal I. Quase explodi de alegria com isso.Estava realizando o meu sonho.
Naquele mesmo ano, em setembro, fui contratado pelo CESUPA para lecionar Noções de Direito, Legislação e Ética para o curso de Tecnologia em Processamento de Dados. Quatro meses depois, recebi o convite para ser o primeiro professor de direito penal daquele curso então nascente. Naquele momento, éramos pouco professores e tínhamos a função de fazer um curso inteiro funcionar pela primeira vez, pois tudo era novidade, literalmente. Assim, eu também fui um dos fundadores do NPJ do CESUPA.
Em 2003, recebi o convite para trabalhar no Tribunal de Justiça do Estado do Pará, o que me incompatibilizou com a advocacia e, por consequência, com a orientação no NPJ, já que eu não podia assinar peças nem fazer audiências.
Hoje, enfim, já tendo encerrado meu compromisso no TJE há 5 meses e retornado ao exercício da advocacia, voltarei também ao NPJ do CESUPA para um novo ciclo de orientação. Terei a oportunidade de conhecer turmas para as quais não dei aula, conviver um pouco mais com ex-alunos, ajudar de formas diferentes e, claro, aprender coisas que eu mesmo preciso saber, pela vivência dos casos que nos chegam e troca de experiências com os colegas e com os nossos alunos.
Estou feliz pela oportunidade de participar de mais um aspecto da formação acadêmica das novas gerações e, claro, pela lembrança do meu nome, o que representa mais uma carinhosa validação da instituição que me acolhe há quase 16 anos. Espero estar à altura da missão.
domingo, 9 de agosto de 2015
Sintomático, não?
Chama a atenção que as últimas cinco postagens deste blog (seis, se contarmos esta), separadas por um período de quase dois meses, estejam todas sob a rubrica "pessoal". Só estou falando de mim e do meu entorno imediato. Parece que estou mesmo muito necessitado de retomar a terapia.
O primeiro dia dos pais
O título desta postagem provavelmente causaria estranheza a alguém ciente de que sou um homem de 40 anos, cujo pai vive e que tem uma filha de 7. Portanto, a matemática não bate. Como assim, primeiro dia dos pais?
O fato é que meu pai saiu de casa quando eu mal completara 3 anos de idade. E escolheu fazê-lo justamente no dia dos pais daquele ano de 1978. Cruel? Pois saiba que ele tomou uma decisão pior ainda: decidiu se separar não apenas da mulher, mas dos filhos também. Por incrível que pareça, muitos homens fazem isso, como pude constatar quando me tornei advogado. Durante meses, sequer soubemos do seu paradeiro e só conseguíamos algum contato indiretamente, através de minha avó paterna. Durante anos, ele se esforçou por não manter relações conosco, para estar livre em sua nova vida.
Em 1986, meu avô paterno teve um ataque cardíaco e morreu. Recordo-me de minha mãe tentando fazer meu pai ficar perto de mim (ou de nós; não me lembro da presença de meu irmão) durante o velório, mas ele me (nos) repelia. O fato é que o tempo passou e, suponho, a paternidade começou a ser ressignificada em seu coração. Aí ele ensaiou uma reaproximação, que não deu muito certo. Eu e meu irmão não estávamos disponíveis. Uma trajetória de vida como essa não acontece sem deixar muitos e graves danos.
O tempo seguiu seu curso e meu pai participou ocasionalmente de alguns momentos de nossas vidas, p. ex. de parte dos eventos de nossas formaturas. Não era uma pessoa presente, como se imagina que seria alguém da família. Sintomático que, por ocasião do meu casamento, ele estava junto a mim durante a cerimônia civil, quando a juíza - uma amiga muito querida - se referiu "aos pais" de Polyana e "à mãe" do Yúdice. Ela não sabia que eu tinha pai vivo e que ele estava lá! Anos antes, um colega de faculdade me perguntara se eu tinha pai, pois eu falava da família, mas nunca do meu pai.
Quando soubemos que Polyana estava grávida, eu telefonei para ele e contei que seria avô. Não fui a sua casa, todavia. Permiti que fosse avô de Júlia e foi uma escolha pessoal dele ser um avô distante, que aparece muito de vez em quando, geralmente em ocasiões festivas. Decidi que não o privaria de seus direitos.
E após vários anos telefonando em seu aniversário, mas nunca no dia dos pais, hoje ele veio almoçar conosco, em minha casa. A iniciativa foi de meu irmão, um sujeito bem mais espiritualizado do que eu. Alguém que se esforça mais por ser uma pessoa melhor. Nosso pai hesitou e precisou de um tempo para aceitar o convite. Mas aceitou, veio e disse que hoje foi "o dia mais feliz de sua vida", por estar conosco. Meu irmão, em resposta, deixou bastante clara a relevância do acontecimento. E eu estava ali, achando tudo muito estranho. Eu ainda preciso de um tempo. Cada pessoa tem o seu. Não consigo esquecer que tudo poderia ter sido mais fácil e não custava nada tentar.
Hoje, sem dúvida, foi um dia de aproximação, mas toldado pelo contexto da doença de nossa mãe, que nos ameaça com sua ausência. Não fazemos escolhas tranquilas, suponho; estamos vivendo no limite e as emoções extremas estão nos conduzindo. E com família não se brinca. Há quem diga e até tente acreditar que não se importa, mas a força das relações familiares é única. O que acontece e o que não acontece deixam marcas profundas. As nossas estão aqui, à flor da pele.
O que acontecerá amanhã não sabemos. Mas que hoje foi um dia importante, sem dúvida foi. Um dia inédito: o primeiro dia dos pais que me lembro de ter passado com o meu, celebrando a ocasião. Espero que isso nos ajude a sermos pessoas melhores e mais felizes no futuro que vem chegando.
O fato é que meu pai saiu de casa quando eu mal completara 3 anos de idade. E escolheu fazê-lo justamente no dia dos pais daquele ano de 1978. Cruel? Pois saiba que ele tomou uma decisão pior ainda: decidiu se separar não apenas da mulher, mas dos filhos também. Por incrível que pareça, muitos homens fazem isso, como pude constatar quando me tornei advogado. Durante meses, sequer soubemos do seu paradeiro e só conseguíamos algum contato indiretamente, através de minha avó paterna. Durante anos, ele se esforçou por não manter relações conosco, para estar livre em sua nova vida.
Em 1986, meu avô paterno teve um ataque cardíaco e morreu. Recordo-me de minha mãe tentando fazer meu pai ficar perto de mim (ou de nós; não me lembro da presença de meu irmão) durante o velório, mas ele me (nos) repelia. O fato é que o tempo passou e, suponho, a paternidade começou a ser ressignificada em seu coração. Aí ele ensaiou uma reaproximação, que não deu muito certo. Eu e meu irmão não estávamos disponíveis. Uma trajetória de vida como essa não acontece sem deixar muitos e graves danos.
O tempo seguiu seu curso e meu pai participou ocasionalmente de alguns momentos de nossas vidas, p. ex. de parte dos eventos de nossas formaturas. Não era uma pessoa presente, como se imagina que seria alguém da família. Sintomático que, por ocasião do meu casamento, ele estava junto a mim durante a cerimônia civil, quando a juíza - uma amiga muito querida - se referiu "aos pais" de Polyana e "à mãe" do Yúdice. Ela não sabia que eu tinha pai vivo e que ele estava lá! Anos antes, um colega de faculdade me perguntara se eu tinha pai, pois eu falava da família, mas nunca do meu pai.
Quando soubemos que Polyana estava grávida, eu telefonei para ele e contei que seria avô. Não fui a sua casa, todavia. Permiti que fosse avô de Júlia e foi uma escolha pessoal dele ser um avô distante, que aparece muito de vez em quando, geralmente em ocasiões festivas. Decidi que não o privaria de seus direitos.
E após vários anos telefonando em seu aniversário, mas nunca no dia dos pais, hoje ele veio almoçar conosco, em minha casa. A iniciativa foi de meu irmão, um sujeito bem mais espiritualizado do que eu. Alguém que se esforça mais por ser uma pessoa melhor. Nosso pai hesitou e precisou de um tempo para aceitar o convite. Mas aceitou, veio e disse que hoje foi "o dia mais feliz de sua vida", por estar conosco. Meu irmão, em resposta, deixou bastante clara a relevância do acontecimento. E eu estava ali, achando tudo muito estranho. Eu ainda preciso de um tempo. Cada pessoa tem o seu. Não consigo esquecer que tudo poderia ter sido mais fácil e não custava nada tentar.
Hoje, sem dúvida, foi um dia de aproximação, mas toldado pelo contexto da doença de nossa mãe, que nos ameaça com sua ausência. Não fazemos escolhas tranquilas, suponho; estamos vivendo no limite e as emoções extremas estão nos conduzindo. E com família não se brinca. Há quem diga e até tente acreditar que não se importa, mas a força das relações familiares é única. O que acontece e o que não acontece deixam marcas profundas. As nossas estão aqui, à flor da pele.
O que acontecerá amanhã não sabemos. Mas que hoje foi um dia importante, sem dúvida foi. Um dia inédito: o primeiro dia dos pais que me lembro de ter passado com o meu, celebrando a ocasião. Espero que isso nos ajude a sermos pessoas melhores e mais felizes no futuro que vem chegando.
sábado, 8 de agosto de 2015
Palavras trancadas
Não sou uma pessoa impulsiva e realmente não gosto de gente impulsiva. Acho importante pensar bem antes de agir e, ainda que com algumas traições, até mesmo antes de falar. Mas, parafraseando a cantora e compositora Ana Carolina, na canção "Vou deixar a rua me levar", as palavras têm um tempo exato para falar, isto é, para ser faladas. E quando esse tempo é perdido, palavras, ideias e sentimentos associados acabam se perdendo, ficam pelo caminho e ninguém toma conhecimento deles.
Há uma sensação de perda nisso. Você gostaria de ter falado. Gostaria, talvez, de ter dito o que estava sentindo, mas os dias se sucedem e o que hoje parece importante e urgente amanhã, possivelmente, não será mais nada. Sob certos aspectos, é possível que tenha sido melhor não dizer nada. Mas nunca saberemos.
Esse mal-estar pode advir justamente daí: da impossibilidade de saber como teria sido a realidade alternativa. E assim mais uma incompletude se inscreve em nossas almas.
Há uma sensação de perda nisso. Você gostaria de ter falado. Gostaria, talvez, de ter dito o que estava sentindo, mas os dias se sucedem e o que hoje parece importante e urgente amanhã, possivelmente, não será mais nada. Sob certos aspectos, é possível que tenha sido melhor não dizer nada. Mas nunca saberemos.
Esse mal-estar pode advir justamente daí: da impossibilidade de saber como teria sido a realidade alternativa. E assim mais uma incompletude se inscreve em nossas almas.
O pulso ainda quer pulsar
Este blog nasceu com a intenção de ser bastante ativo. Durante um tempo, ele foi. Basta que se veja o número sempre crescente de postagens em seus três primeiros anos de existência. Mas quem tem dois empregos, família e a expectativa de alguma vida social não pode viver com a cara na tela do computador, então nos anos seguintes houve atividade significativa, maior ou menor, de acordo com os ventos de cada ano, mas não equivalente ao triênio inaugural.
Graças a este blog, entrei para um time seleto - não que eu estivesse à altura deles, de gente como Juvêncio de Arruda, do 5ª Emenda, ou o projeto coletivo do Flanar, do qual me tornei depois um dos editores -, mas eu gostava de pensar que fazia parte do grupo, dadas as nossas boas relações, ainda que muitas vezes exclusivamente virtuais. Era o virtual positivo: a vida na grande rede não substituía a real, apenas era vivida com qualidade e honestidade. Eu realmente fiz amigos por aqui.
A partir de 2012, o ritmo começou a despencar. O mestrado me deixou sem tempo e, depois, a doença de minha mãe roubou minha alma. O último ano foi extremamente difícil e 2015 está sendo uma pedreira que só não classifico como intransponível porque ainda estamos aqui. Resulta daí que o blog chegou a um estado de estagnação, o que lastimo. Afinal, acredito que fiz alguns textos bem bacanas ao longo desses quase 9 anos, coisas que podem ser úteis ou até divertidas. Por conta disso, acho importante prosseguir.
Dia desses, preparando-me para assumir turmas novas de Direito Penal I, organizava o meu material e cheguei ao documento que encaminho aos alunos, citando este blog como um local para procurar textos de interesse de nosso curso. Daí pensei que existe muita coisa aqui que pode ajudá-los. Isto me confere razão mais do que suficiente para persistir um pouco mais. Então vamos em frente. Assim como na vida real, na blogosfera também eu hei de lutar um pouco mais para, quem sabe, trazer algo de benefício ou de satisfação para uma ou duas pessoas. Creio que isto já será justificativa suficiente.
Naturalmente, no território líquido da Internet (à moda de Bauman), se houver um público, ele responderá de acordo com a produtividade do blog. Neste momento, portanto, é provável que eu escreva para ninguém. Mas se tem alguém na linha, se tem alguém no ar, é possível que alguém volte a ler as minhas tentativas de ser cronista ou crítico de tudo. Afinal, dizem, sempre há um sapato velho para calçar um pé cansado.
Abraço quem estiver por aí.
Graças a este blog, entrei para um time seleto - não que eu estivesse à altura deles, de gente como Juvêncio de Arruda, do 5ª Emenda, ou o projeto coletivo do Flanar, do qual me tornei depois um dos editores -, mas eu gostava de pensar que fazia parte do grupo, dadas as nossas boas relações, ainda que muitas vezes exclusivamente virtuais. Era o virtual positivo: a vida na grande rede não substituía a real, apenas era vivida com qualidade e honestidade. Eu realmente fiz amigos por aqui.
A partir de 2012, o ritmo começou a despencar. O mestrado me deixou sem tempo e, depois, a doença de minha mãe roubou minha alma. O último ano foi extremamente difícil e 2015 está sendo uma pedreira que só não classifico como intransponível porque ainda estamos aqui. Resulta daí que o blog chegou a um estado de estagnação, o que lastimo. Afinal, acredito que fiz alguns textos bem bacanas ao longo desses quase 9 anos, coisas que podem ser úteis ou até divertidas. Por conta disso, acho importante prosseguir.
Dia desses, preparando-me para assumir turmas novas de Direito Penal I, organizava o meu material e cheguei ao documento que encaminho aos alunos, citando este blog como um local para procurar textos de interesse de nosso curso. Daí pensei que existe muita coisa aqui que pode ajudá-los. Isto me confere razão mais do que suficiente para persistir um pouco mais. Então vamos em frente. Assim como na vida real, na blogosfera também eu hei de lutar um pouco mais para, quem sabe, trazer algo de benefício ou de satisfação para uma ou duas pessoas. Creio que isto já será justificativa suficiente.
Naturalmente, no território líquido da Internet (à moda de Bauman), se houver um público, ele responderá de acordo com a produtividade do blog. Neste momento, portanto, é provável que eu escreva para ninguém. Mas se tem alguém na linha, se tem alguém no ar, é possível que alguém volte a ler as minhas tentativas de ser cronista ou crítico de tudo. Afinal, dizem, sempre há um sapato velho para calçar um pé cansado.
Abraço quem estiver por aí.
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