quarta-feira, 6 de outubro de 2021

Os maiores ladrões de banco do Brasil

Há dois dias, o portal Uol publicou uma reportagem na qual três jornalistas se dispõem a apresentar, ao público leitor, "os maiores ladrões de banco do país", como está designado na manchete. Leia aqui. Naturalmente, sem nenhuma surpresa, eles escrevem sobre bandidos tradicionais, digamos assim. Sobre sujeitos marginais que escolheram uma vida de crimes e se tornaram bandidos perigosos, até porque esse ramo da criminalidade não é para qualquer um, eis que envolve necessidade elevada de planejamento, investimento e recursos.

Em minha humilde opinião, que ninguém pediu, os maiores ladrões de banco do país são aqueles que drenam os recursos das instituições financeiras ao ponto de colocá-las na iminência da bancarrota ou que as quebram, efetivamente. Com isso, em vez de usurpar o patrimônio de uma grande empresa, que tem seguro, usurpam dos correntistas e investidores, que muitas vezes perdem tudo que amealharam ao longo de suas vidas. Alegadamente para impedir prejuízos a essas vítimas inocentes, pode ocorrer de o governo federal aportar recursos, ou seja, usar o dinheiro do contribuinte para salvar o banco.

Eu gostaria que os grandes portais de notícias fizessem reportagens assim: colocando o bandidão fortemente armado exatamente no mesmo patamar do executivo de sobrenome estrangeiro, educação estrangeira e hábitos estrangeiros, que desfila nas colunas sociais, nos eventos mais badalados, nas reportagens que celebram seus grandes feitos como empresários; que é amigo de políticos influentes e abre sua mansão para os burocratas que deveriam fiscalizá-los ou processá-los. Gostaria que essas reportagens também contabilizassem os prejuízos, pois isso certamente demonstraria que os roubos milionários das catervas são menores do que aqueles que ocorrem nas salas das diretorias. Também gostaria que nos informassem quem foi parar na lista de mais procurados e quem não; quem foi preso e quem não; e o que ocorreu com eles passados alguns anos.

A história recente do Brasil ofereceria vários nomes para compor essa desejada e ilusória matéria. Nem daria trabalho procurar. Agora mãos à obra. Que tal dar nome aos bois?

segunda-feira, 4 de outubro de 2021

Onde estarão as pessoas decentes?

Eu sei, é claro, que existem pessoas capazes de legitimar a violência de muitas formas e que, por isso, transferem esse tipo de atitude para as gerações seguintes. Fazem-no pelo exemplo, usando agressões como forma de comunicação em âmbito familiar ou fora dele, ou como expressão didática, p. ex. ensinando os filhos a resolver suas desavenças no soco.

Mas eu acredito, suponho, tenho esperança de que também existem pessoas regidas pelo código da bondade. Não essa bondade condicionada a supostas valorações sobre "justiça", cujo efeito prático é criar distinções entre quem merece respeito e quem não; que merece viver, inclusive. Uma bondade em sentido mais originário, a tal regra de ouro já conhecida na filosofia grega antiga e amplamente difundida pelo cristianismo: não faças aos outros aquilo que não queres que seja feito contigo. Aliás, milhões de pessoas passaram longas horas dentro de igrejas, escutando seus sacerdotes falar sobre uma mensagem de amor, de perdão e até de dar a outra face, deixada por Jesus Cristo.

Assim matutando, não consigo parar de pensar nos familiares desses agentes de segurança pública que, com frequência crescente, têm sido mostrados nas redes sociais, às vezes na imprensa comum, agredindo, humilhando, torturando e até assassinando seres humanos, ainda que culpados de algum ilícito, porém francamente indefesos frente a seus algozes. Penso nesses pais, mães, cônjuges, filhos (sobretudo os mais crescidos) que se defrontam com a realidade de que alguém muito próximo deles, alguém amado por eles, seja capaz dessas atrocidades repugnantes. Eu não conseguiria conviver com alguém assim. Não poderia olhar seu rosto sem horror nem ficaria no mesmo espaço sem um desejo extremo de ir embora.

Violência e abuso de autoridade são práticas rotineiras na experiência brasileira, naturalizadas, banalizadas e aplaudidas. O sistema sempre protegeu seus malfeitores e está mais aparelhado do que nunca para fazê-lo, reagindo aos questionamentos que agora sofrem com mais frequência, com argumentos jurídicos, quando não com os sempre bem sucedidos discursos de nós contra eles. Mas não é no sistema que estou pensando: é nas pessoas. É, p. ex., na esposa que vê imagens de seu marido surrando com cassetete uma mulher caída no chão e consegue se deitar ao seu lado todas as noites. Ou na mãe amorosa que ensinou seu garotinho a tratar bem os outros. Ou no filho ou filha, que tem naquele homem uma figura de autoridade.

Raramente tomamos conhecimento das consequências legais dessa brutalidade. Vemos as agressões, mas dificilmente sabemos o destino dado aos agressores, levando à conclusão razoável de que foram perdoados ou sofreram penalidades para constar. Mas nunca ouvimos seus familiares e amigos falando. Pelo visto, ninguém até hoje se interessou em fazer uma reportagem sobre esse assunto. E eu realmente gostaria muito de assistir a algo assim. Se alguém conhecer matéria nesse nicho, por favor me indique.

Daqui, sigo fazendo minha parte. Não levanto a mão para ninguém e ensino minhas crianças que isso não se faz. Mas, naturalmente, temo todos os dias que nossos caminhos se cruzem com o time do outro lado.