segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

Para Eduardo

Quando teus sintomas começaram, estavas certo de que não era covid-19, mas tiveste a prudência de te recolher em casa. Foi por isso que, no dia 18 de dezembro, quando fizemos nossa última reunião de trabalho do ano, e aproveitamos para fazer uma pequena confraternização interna, restrita por causa da necessidade de distanciamento social, tu compareceste de modo virtual. E todos percebemos o quanto isso te custou, pois na hora do encerramento estavas em lágrimas. E isso nos comoveu, também, claro. Não fui o único a querer te abraçar naquele momento.

Até então, tudo parecia apenas um contratempo. Não imaginávamos que, na terça-feira seguinte, estarias internado. Mas a máscara de oxigênio era mais uma cautela, porque estavas bem, no geral. Mandaste uma foto, de máscara, sorridente. Eu me sentia só um pouco chateado por estares no hospital em pleno natal. Realmente não me recordo em que hora o apartamento virou UTI. Talvez, àquela altura, tudo fosse uma necessidade contornável. Mas aí começaram a falar em possível intubação e minha inclinação pessimista acendeu todos os alertas.

Amigos queridos me lembraram da importância do pensamento positivo e eu me esforcei ― juro, meu amigo, eu me esforcei muito, porque para mim essas coisas exigem esforço ― para não pensar em nada sombrio. Eu me concentrava na tua saúde e em toda a bondade que espalhavas pelo mundo. E as notícias que chegavam eram de alguma melhora, principalmente de estabilidade. Aprendi contigo, em alguma de nossas inumeráveis conversas sobre questões médicas, que um paciente grave, porém estável, é melhor do que um não grave, porém instável.

Daí as notícias já não eram tão auspiciosas. Eu sabia que, ao teu redor, além de muitos médicos, e outros profissionais de saúde, fazendo todo o possível, havia também a rede de orações, impulsionada pelo bem que sempre fizeste a tantos, notadamente os mais necessitados, os mais pobres, os moradores de rua. Eu lutava contra um pensamento que insistia em retornar: aquela sensação angustiante que vivi em 2015, de tensão quando da atualização dos informes médicos e de eles serem sempre frustrantes. Como anos atrás, passei a ter receio de ligações telefônicas ou de mensagens de WhatsApp. E, como anos atrás, fui informado de que seria a qualquer momento.

Em 2015, o "a qualquer momento" durou uns quatro dias. Hoje, foi rápido. Sentado na beira da cama, repeti o meu velho lamento: "As coisas são como são". Era o meu exercício diário de resignação.


Essa doença atroz leva as pessoas que amamos e sequer permite que sejam cumpridos os ritos que nossa cultura desenvolveu para as despedidas. E fechamentos são indispensáveis! Felizmente, tivemos a oportunidade de fazer nosso cortejo. Fizemos a carreata do Eduardo! Um modo de obter o nosso fechamento, mostrando respeito ao teu corpo, cientes de que tua alma já está em paragens muito mais elevadas. Ninguém duvida de que ficarás muito bem. Não há outro destino para quem expressou tanto amor ao próximo e altruísmo como tu. Tomara que por aí haja umas manifestações, para poderes gritar palavras de ordem a plenos pulmões.

Vai com Deus, irmão. Se possível, não te esqueças do que te pedi na despedida. Os que vêm depois, como eu, sempre necessitam dos ensinamentos dos melhores, como tu.

E, claro, obrigado. Por absolutamente tudo.

3 comentários:

Hudson Andrade disse...

Uma lindeza de amizade. Eduardo há de estar muito feliz com tanto reconhecimento, coisa que está longe da vaidade, mas é o sentimento que a humildade traz: felicidade! Parabéns por essa união que se prolongará. Abraços.

Direitoeesquerdo disse...

Linda homenagem, compatível com o ser humano que foi o Sizo.
Meus sinceros sentimentos aos familiares e amigos do Eduardo.

André Uliana disse...

Meus sentimentos amigo.