Em 1º de novembro do ano passado, a mulher passou por uma cirurgia de retirada do tumor e começou o tratamento com radioterapia e quimioterapia, em função da alta probabilidade de retorno da doença.
A desembargadora Avelirdes Almeida Pinheiro Lemos, relatora do processo, se manifestou pela concessão de um habeas corpus preventivo, com base no artigo 128, inciso I, do Código Penal, que prevê o aborto quando "não há outro meio de salvar a vida da gestante". Os outros desembargadores seguiram seu voto.
Riscos
Quando o caso foi julgado em primeira instância, o juiz negou o pedido, alegando que o tratamento e a gravidez simultânea não colocavam em risco a vida da gestante.
A diferença entre as decisões de primeira e segunda instância mostra que a batalha em torno do aborto terapêutico não se encerrou com a decisão do Supremo Tribunal Federal, em abril do ano passado, na qual por maioria dos votos liberou a interrupção da gravidez de anencéfalos.
Segundo a oncologista Solange Moraes Sanches, o tratamento químio e radioterápico nos primeiros três meses de gestação é contraindicado pela possibilidade de provocar aborto ou má formação no feto. O risco para a mãe não está na gravidez, mas em atrasar o início do tratamento. Esperar até o quarto mês de gestação, de acordo com Solange, não é uma opção no caso, pois a suspensão do tratamento pode inviabilizar as chances de cura.
Revista Consultor Jurídico, 11 de março de 2013
Fonte: http://www.conjur.com.br/2013-mar-11/gravida-tipo-agressivo-cancer-aborto-autorizado-justica
O último parágrafo do texto esclarece suficientemente a questão, em termos de necessidade médica, mas mesmo assim as interpretações tradicionais, irrefletidas, continuam a prevalecer. Custa-me crer que um juiz, com o nível de cultura geral que dele se espera (e se pode exigir), não tenha compreendido desde logo onde pairavam os riscos para a gestante.
Por oportuno, ele deveria ter perguntado à gestante o que ela preferiria, fosse apenas uma questão de escolha. Provavelmente, ela preferiria ser mãe, ter esse bebê, e se chegou ao ponto de uma decisão extrema, foi porque não vislumbrou alternativa. Nem seus médicos, frise-se. E com toda a urgência, em vez de agir clandestinamente, teve o cuidado de apresentar suas pretensões ao judiciário, antes de qualquer ação. Isso é boa fé, não?
Mais uma vez, percebe-se como faltam humanidade e senso de realidade a muitas autoridades. Felizmente, o tribunal de Goiás repôs a situação nos eixos. Nada a comemorar, obviamente. Uma vida se perde. Mas aposto que ninguém está feliz com isso. Foi uma decisão para dar a esperança de que uma outra vida subsista e, quem sabe no futuro, se multiplique.
2 comentários:
Se fosse comigo, eu abortaria primeiro e perguntaria depois.
Muito bom o seu texto, Yúdice, a sua postura, o seu racionalismo.
Abortando primeiro, melhor deixar quieto. Mas caso a bomba estourasse, haveria um argumento relevante para alegar inexistência de crime, pois seria um verdadeiro caso de estado de necessidade.
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