Caríssimos leitores do Arbítrio, eventuais ou não, comentaristas ou não, anônimos ou devidamente identificados, chegou a hora de encerrar as nossas atividades do ano. Chegou a hora de arrumar alguns detalhes na casa e esperar uns poucos amigos que celebrarão conosco o ano mais emocionante que já vivi, prenúncio de outro ainda nais agitado, inédito em suas emoções e, se Deus quiser, glorioso.
Não sou de ter saudade do tempo que passou. Mesmo tendo adorado 2008, não sinto falta dele. Sinto, isto sim, esperança quanto ao futuro, pelo muito que tenho a aprender e a fazer, de imediato. Desejo, assim, que o coração de cada um de vocês também acalente fortes e sinceras esperanças.
Que em 2009 nos encontremos habitualmente por aqui. Agradeço a paciência e as contribuições com que me honraram.
Em meu nome e no de minha família — minha esposa Polyana e minha filha Júlia, além dos goldens Frodo e Frida —, desejo a todos um maravilhoso réveillon e um ano simplesmente realizador em alegrias e conquistas.
Deus nos abençoe.
quarta-feira, 31 de dezembro de 2008
Última postagem séria do ano
O réveillon não será nada bom para Maria do Carmo Martins, re-eleita para a prefeitura de Santarém. O ministro Cézar Peluso, do Supremo Tribunal Federal, demorou, demorou mas por fim despachou a ação cautelar proposta pelos advogados de Maria. Apenas para não conhecer dela, por causa de tecnicalidades, como bem explica o blog Espaço Aberto, acompanhando o imbróglio em cima do lance.
Não pretendo dizer além do que a postagem do blog amigo já disse sobre os aspectos jurídicos, até porque essa não é a minha seara. Digo, apenas, que Santarém conhecerá agora a instabilidade própria do ente federativo que não sabe ao certo quem o governa. É o tipo de situação pouco comum no Brasil, até porque as cassações de mandato nunca foram o forte da Justiça Eleitoral brasileira, que em geral deixa passar muita coisa gritante. Lembro-me de algo assim ter acontecido no Município de São Paulo, quando o Judiciário tirou e pôs Celso Pitta na cadeira de prefeito umas tantas vezes, o que deixa qualquer um perplexo, mormente o cidadão comum.
Mas o pior é que Pitta sofria acusações gravíssimas de improbidade administrativa, pelas quais foi condenado posteriormente. Já Maria não sofreu nenhuma acusação formal nessa seara, tendo o mandato cassado com base nas nem sempre confiáveis regras sobre inelegibilidades. Que o diga o caso da infidelidade partidária. Agora como explicar para o eleitor santareno, que em maioria indiscutível, sufragou o nome de Maria, que ela não pode governar?
Serão dias nebulosos na pérola do Tapajós. Segue-se uma batalha jurídica de duração incerta e, quem sabe, uma nova eleição, com todos os seus ônus. Enquanto tudo isso ocorrer, será difícil administrar a cidade, porque ninguém governa bem sem uma projeção temporal. O prefeito interino que assumir terá à frente uma dura missão, para a qual não se dispôs no último pleito e para o que, provavelmente, não está preparado. Os riscos de fracassos administrativos são grandes e quem perde com isso, todos sabemos, é o povo.
Boa sorte, Santarém. 2009 começa tempestuoso, mas desejo que logo venha a bonança.
Não pretendo dizer além do que a postagem do blog amigo já disse sobre os aspectos jurídicos, até porque essa não é a minha seara. Digo, apenas, que Santarém conhecerá agora a instabilidade própria do ente federativo que não sabe ao certo quem o governa. É o tipo de situação pouco comum no Brasil, até porque as cassações de mandato nunca foram o forte da Justiça Eleitoral brasileira, que em geral deixa passar muita coisa gritante. Lembro-me de algo assim ter acontecido no Município de São Paulo, quando o Judiciário tirou e pôs Celso Pitta na cadeira de prefeito umas tantas vezes, o que deixa qualquer um perplexo, mormente o cidadão comum.
Mas o pior é que Pitta sofria acusações gravíssimas de improbidade administrativa, pelas quais foi condenado posteriormente. Já Maria não sofreu nenhuma acusação formal nessa seara, tendo o mandato cassado com base nas nem sempre confiáveis regras sobre inelegibilidades. Que o diga o caso da infidelidade partidária. Agora como explicar para o eleitor santareno, que em maioria indiscutível, sufragou o nome de Maria, que ela não pode governar?
Serão dias nebulosos na pérola do Tapajós. Segue-se uma batalha jurídica de duração incerta e, quem sabe, uma nova eleição, com todos os seus ônus. Enquanto tudo isso ocorrer, será difícil administrar a cidade, porque ninguém governa bem sem uma projeção temporal. O prefeito interino que assumir terá à frente uma dura missão, para a qual não se dispôs no último pleito e para o que, provavelmente, não está preparado. Os riscos de fracassos administrativos são grandes e quem perde com isso, todos sabemos, é o povo.
Boa sorte, Santarém. 2009 começa tempestuoso, mas desejo que logo venha a bonança.
Tráfico humano em contraponto a Anjos do sol
1. Leia a postagem seguinte antes desta.
2. Spoilers! Não leia o texto se não quiser saber detalhes sobre o final dos filmes comentados.
Tanto Tráfico humano quanto Anjos do sol tratam basicamente do mesmo tema: tráfico de pessoas para fins de escravização sexual. Algumas formas de cooptação das vítimas se assemelham. O funcionamento do esquema, graças à corrupção das autoridades, é inevitável. Todavia, os dois filmes apresentam universos completamente distintos, como se retratassem fatos ocorridos em planetas diferentes. Em que pese isso ser, quem sabe, decorrência da linguagem cinematográfica, penso que a diferença de objetivos dos diretores e o desenrolar das tramas atendem a fatores que têm a ver com as condições sociopolíticas dos países em que as histórias ocorrem. Vejamos:
1. Anjos do sol tem sua trama centrada num garimpo no Pará — sim, o Estado do Pará. Que lugar melhor para falar de trabalho escravo e exploração da prostituição infanto-juvenil? O esquema é mantido por um sujeito (Antônio Calloni) sem caráter, sem instrução e sem dinheiro, nada além de um pilantra do meio do mato. Quem o auxilia são pessoas como o senador vivido por Otávio Augusto, que compra meninas e depois as manda para o garimpo. O poder sustenta o crime, porque se locupleta dele, seja financeira, seja sexualmente. Em Tráfico humano, vemos um megaempresário, milionário e sofisticado, daqueles que vivem em colunas sociais. Um tipo insuspeito e que se considera acima do bem e do mal.
2. No filme brasileiro, a miséria é a causa, o pretexto e a condição para o fenômeno. Tudo no filme é miserável e degradante. Mesmo o personagem supostamente mais sofisticado, o senador, é um tipo bronco e desqualificado. As vítimas são meninas feias, de aparência tétrica, analfabetas e sem qualquer futuro. No filme americano, embora pobres, as vítimas moram em boas casas, estudam, são belas, têm dentes perfeitos e muitas oportunidades. São exploradas em prostíbulos, mas também em ambientes riquíssimos. Vemos pessoas em ternos elegantes e carros de luxo.
3. Na trama brasileira, as autoridades não tomam conhecimento do problema. Um agente de saúde que se depara com a situação se escandaliza, mas nada faz. As vítimas são invisíveis. Na americana, as meninas são coagidas pelo medo de que seus parentes sejam mortos Os criminosos dispõem de uma estrutura grandiosa. Mas as autoridades investigam o tempo todo e possuem recursos, financeiros e tecnológicos, de primeiro mundo.
4. As escravas sexuais brasileiras, no garimpo, atendiam a incontáveis homens imundos na mesma noite. No filme americano, eram em média 12 clientes por dia. Homens finos, limpos e até muito ricos. Não que isso mude a disposição deles para humilhar as mulheres, claro.
5. A testemunha americana ganha uma casa grande e bonita, com comida comprada e um quarto especialmente preparado para sua filha (apesar de morrer com um tiro certeiro na testa tão logo chega ao que deveria ser um esconderijo). No Brasil, quem acaba no programa de proteção a testemunhas não sabe se estaria pior fora dele.
6. No Brasil, falta tudo. Nos Estados Unidos, há pessoal de sobra, telas enormes de cristal líquido exibindo a movimentação financeira do investigado e tudo se resolve rápido.
7. Como resultado dos itens anteriores, as vítimas brasileiras estão fadadas à ruína. Serão assassinadas ou, se escaparem disso, morrerão graças às doenças que adquirirem. Se nada disso sobrevier, só terão um destino: permanecer na prostituição, como descobre a protagonista, na última cena. Seu único milímetro de sorte é passar a dispor do próprio corpo, sem ser mais explorada por um cafetão. Já nos Estados Unidos, fica claro que todas as vítimas têm esperança, como se comprova ao final, quando a grande maioria é liberta para uma nova vida, feliz e protegida. Até a jovem infectada por HIV terá melhores oportunidades.
8. A absoluta desesperança de Anjos do sol rivaliza com o final claramente feliz (no contexto, bem entendido) de Tráfico humano. Um paradoxo terrível, mormente quando não acreditamos que veríamos, no Brasil, alguma chance de justiça.
Se a vida imita a arte, creio que esses dois filmes demonstram razoavelmente a realidade de dois mundos. E, como sempre, saímos perdendo.
2. Spoilers! Não leia o texto se não quiser saber detalhes sobre o final dos filmes comentados.
Tanto Tráfico humano quanto Anjos do sol tratam basicamente do mesmo tema: tráfico de pessoas para fins de escravização sexual. Algumas formas de cooptação das vítimas se assemelham. O funcionamento do esquema, graças à corrupção das autoridades, é inevitável. Todavia, os dois filmes apresentam universos completamente distintos, como se retratassem fatos ocorridos em planetas diferentes. Em que pese isso ser, quem sabe, decorrência da linguagem cinematográfica, penso que a diferença de objetivos dos diretores e o desenrolar das tramas atendem a fatores que têm a ver com as condições sociopolíticas dos países em que as histórias ocorrem. Vejamos:
1. Anjos do sol tem sua trama centrada num garimpo no Pará — sim, o Estado do Pará. Que lugar melhor para falar de trabalho escravo e exploração da prostituição infanto-juvenil? O esquema é mantido por um sujeito (Antônio Calloni) sem caráter, sem instrução e sem dinheiro, nada além de um pilantra do meio do mato. Quem o auxilia são pessoas como o senador vivido por Otávio Augusto, que compra meninas e depois as manda para o garimpo. O poder sustenta o crime, porque se locupleta dele, seja financeira, seja sexualmente. Em Tráfico humano, vemos um megaempresário, milionário e sofisticado, daqueles que vivem em colunas sociais. Um tipo insuspeito e que se considera acima do bem e do mal.
2. No filme brasileiro, a miséria é a causa, o pretexto e a condição para o fenômeno. Tudo no filme é miserável e degradante. Mesmo o personagem supostamente mais sofisticado, o senador, é um tipo bronco e desqualificado. As vítimas são meninas feias, de aparência tétrica, analfabetas e sem qualquer futuro. No filme americano, embora pobres, as vítimas moram em boas casas, estudam, são belas, têm dentes perfeitos e muitas oportunidades. São exploradas em prostíbulos, mas também em ambientes riquíssimos. Vemos pessoas em ternos elegantes e carros de luxo.
3. Na trama brasileira, as autoridades não tomam conhecimento do problema. Um agente de saúde que se depara com a situação se escandaliza, mas nada faz. As vítimas são invisíveis. Na americana, as meninas são coagidas pelo medo de que seus parentes sejam mortos Os criminosos dispõem de uma estrutura grandiosa. Mas as autoridades investigam o tempo todo e possuem recursos, financeiros e tecnológicos, de primeiro mundo.
4. As escravas sexuais brasileiras, no garimpo, atendiam a incontáveis homens imundos na mesma noite. No filme americano, eram em média 12 clientes por dia. Homens finos, limpos e até muito ricos. Não que isso mude a disposição deles para humilhar as mulheres, claro.
5. A testemunha americana ganha uma casa grande e bonita, com comida comprada e um quarto especialmente preparado para sua filha (apesar de morrer com um tiro certeiro na testa tão logo chega ao que deveria ser um esconderijo). No Brasil, quem acaba no programa de proteção a testemunhas não sabe se estaria pior fora dele.
6. No Brasil, falta tudo. Nos Estados Unidos, há pessoal de sobra, telas enormes de cristal líquido exibindo a movimentação financeira do investigado e tudo se resolve rápido.
7. Como resultado dos itens anteriores, as vítimas brasileiras estão fadadas à ruína. Serão assassinadas ou, se escaparem disso, morrerão graças às doenças que adquirirem. Se nada disso sobrevier, só terão um destino: permanecer na prostituição, como descobre a protagonista, na última cena. Seu único milímetro de sorte é passar a dispor do próprio corpo, sem ser mais explorada por um cafetão. Já nos Estados Unidos, fica claro que todas as vítimas têm esperança, como se comprova ao final, quando a grande maioria é liberta para uma nova vida, feliz e protegida. Até a jovem infectada por HIV terá melhores oportunidades.
8. A absoluta desesperança de Anjos do sol rivaliza com o final claramente feliz (no contexto, bem entendido) de Tráfico humano. Um paradoxo terrível, mormente quando não acreditamos que veríamos, no Brasil, alguma chance de justiça.
Se a vida imita a arte, creio que esses dois filmes demonstram razoavelmente a realidade de dois mundos. E, como sempre, saímos perdendo.
Tráfico humano
Sinto-me um pouco constrangido em tratar de um assunto tão pesado em meio às festividades de final de ano, mas estou engasgado o suficiente para sentir uma certa urgência em escrever.
Em 3.10.2006 publiquei uma postagem sobre o filme brasileiro Anjos do sol, acerca da exploração sexual de crianças e adolescentes, sob escravidão. Como menciono com frequência, em minhas aulas, o crime de redução à condição análoga à de escravo, previsto no art. 149 do Código Penal, algumas pessoas me sugeriram ver o filme Tráfico humano, dentre elas o também blogueiro Fred Guerreiro, habitué aqui do blog.
Tráfico humano (Human trafficking, direção de Christian Duguay, 2005) é um longametragem (longa, mesmo: são quase três horas de duração) policial americano de ótima qualidade — elogio curioso, considerando que o meu mal estar começou nos primeiros minutos de exibição. Mas a assepsia do cinema americano nos permite assistir à película até o final, sem maiores danos.
Na trama, a agente federal Kate Morozov (Mira Sorvino), agindo sob as graças de seu superior Bill Meehan (Donald Sutherland), persegue uma poderosa quadrilha de tráfico de pessoas para fins sexuais, liderada por Sergei Karpovich (Robert Carlyle). Aqui aprendemos, sobretudo graças ao discurso final da protagonista e às legendas de encerramento, que o tráfico humano é a terceira atividade econômica ilícita mais lucrativa do mundo, perdendo apenas para o tráfico de armas e de drogas. É um ramo milionário, que se desenvolveu graças ao ocaso econômico do Leste Europeu, o que explica a nacionalidade do vilão e de boa parte das vítimas. O filme mostra, ainda, como tais redes criminosas são poderosas e disseminadas pelo mundo, fazendo vítimas na Ucrânia, em Praga, nas Filipinas — senha para que se deduza que atuam no mundo inteiro.
Vemos que embora haja um certo padrão na seleção das vítimas (mulheres que tentam obter empregos, principalmente carreiras de modelo, e usuárias de serviços de namoro pela Internet), elas também podem ser compradas às próprias famílias ou sequestradas, o que expõe qualquer um a risco — inclusive nossas filhas, numa aparentemente inofensiva viagem de férias.
É um filme que recomendo, com a advertência de que é daquele tipo de lazer que não nos deixa felizes quando acaba. Não sou crítico de cinema, por isso não vou além. Quem se interessa pelo tema, melhor assistir. Atrevo-me a dizer, contudo, que os vícios do cinema americano estão lá, tais como (Atenção: spoilers! Se não quiser saber o final do filme, não prossiga a leitura):
1. A protagonista trabalha na polícia como forma de superar um trauma de infância pessoal. Ela tem sucesso quando quebra regras ao invés de seguir o protocolo. O clichê "eu segui o meu instinto" está lá.
2. Os dramas familiares e as coincidências permeiam a trama, tornando-se em certos momentos cruciais para que o desfecho seja o que é. O roteirista apela inclusive para improváveis ataques de humanidade e consciência entre aqueles que estão do lado do mal.
3. O vilão morre no fim, em vez de responder por seus atos — uma catarse que costuma ser agradável ao grande público, sequioso da morte como castigo por excelência. Ela provoca uma catarse em nossa raiva, mas não elimina o problema em seu nascedouro. Para mim, esse foi um desfecho bastante insatisfatório, ainda mais porque o vilão morre debochando (suas palavras são "mesmo assim valeu a pena") e, apesar de já ter levado vários tiros, o de misericórdia tem que ser dado pela mocinha.
4. A tradição do cinema americano de poupar as crianças é parcialmente respeitada. Mas quem se dá bem mesmo é a menina americana. As crianças que não chegam a sofrer abuso sexual estão no seu entorno imediato. E à exceção da que tem o pescoço quebrado, não sofrem tudo o que se poderia esperar, no contexto.
5. O ufanismo americano marca presença através da personagem Annie Gray, a americana de 12 sequestrada em Manila, capital das Filipinas. Enquanto as vítimas locais entregam-se ao seu destino cruel, a americaninha assume uma posição de liderança e solidariedade, a ponto de tratar da saúde dos companheiros de infortúnio. Não fosse por suas ações, o seu grupo não seria libertado.
Enfim, mesmo bons filmes incorrem nesses pecados. Coisas de americanos. Nada que comprometa a qualidade do resultado.
Acréscimo em 14.1.2012: Que me conste, depois disso o tráfico humano se tornou a atividade criminosa mais rentável do mundo. Repugnante.
Em 3.10.2006 publiquei uma postagem sobre o filme brasileiro Anjos do sol, acerca da exploração sexual de crianças e adolescentes, sob escravidão. Como menciono com frequência, em minhas aulas, o crime de redução à condição análoga à de escravo, previsto no art. 149 do Código Penal, algumas pessoas me sugeriram ver o filme Tráfico humano, dentre elas o também blogueiro Fred Guerreiro, habitué aqui do blog.
Tráfico humano (Human trafficking, direção de Christian Duguay, 2005) é um longametragem (longa, mesmo: são quase três horas de duração) policial americano de ótima qualidade — elogio curioso, considerando que o meu mal estar começou nos primeiros minutos de exibição. Mas a assepsia do cinema americano nos permite assistir à película até o final, sem maiores danos.
Na trama, a agente federal Kate Morozov (Mira Sorvino), agindo sob as graças de seu superior Bill Meehan (Donald Sutherland), persegue uma poderosa quadrilha de tráfico de pessoas para fins sexuais, liderada por Sergei Karpovich (Robert Carlyle). Aqui aprendemos, sobretudo graças ao discurso final da protagonista e às legendas de encerramento, que o tráfico humano é a terceira atividade econômica ilícita mais lucrativa do mundo, perdendo apenas para o tráfico de armas e de drogas. É um ramo milionário, que se desenvolveu graças ao ocaso econômico do Leste Europeu, o que explica a nacionalidade do vilão e de boa parte das vítimas. O filme mostra, ainda, como tais redes criminosas são poderosas e disseminadas pelo mundo, fazendo vítimas na Ucrânia, em Praga, nas Filipinas — senha para que se deduza que atuam no mundo inteiro.
Vemos que embora haja um certo padrão na seleção das vítimas (mulheres que tentam obter empregos, principalmente carreiras de modelo, e usuárias de serviços de namoro pela Internet), elas também podem ser compradas às próprias famílias ou sequestradas, o que expõe qualquer um a risco — inclusive nossas filhas, numa aparentemente inofensiva viagem de férias.
É um filme que recomendo, com a advertência de que é daquele tipo de lazer que não nos deixa felizes quando acaba. Não sou crítico de cinema, por isso não vou além. Quem se interessa pelo tema, melhor assistir. Atrevo-me a dizer, contudo, que os vícios do cinema americano estão lá, tais como (Atenção: spoilers! Se não quiser saber o final do filme, não prossiga a leitura):
1. A protagonista trabalha na polícia como forma de superar um trauma de infância pessoal. Ela tem sucesso quando quebra regras ao invés de seguir o protocolo. O clichê "eu segui o meu instinto" está lá.
2. Os dramas familiares e as coincidências permeiam a trama, tornando-se em certos momentos cruciais para que o desfecho seja o que é. O roteirista apela inclusive para improváveis ataques de humanidade e consciência entre aqueles que estão do lado do mal.
3. O vilão morre no fim, em vez de responder por seus atos — uma catarse que costuma ser agradável ao grande público, sequioso da morte como castigo por excelência. Ela provoca uma catarse em nossa raiva, mas não elimina o problema em seu nascedouro. Para mim, esse foi um desfecho bastante insatisfatório, ainda mais porque o vilão morre debochando (suas palavras são "mesmo assim valeu a pena") e, apesar de já ter levado vários tiros, o de misericórdia tem que ser dado pela mocinha.
4. A tradição do cinema americano de poupar as crianças é parcialmente respeitada. Mas quem se dá bem mesmo é a menina americana. As crianças que não chegam a sofrer abuso sexual estão no seu entorno imediato. E à exceção da que tem o pescoço quebrado, não sofrem tudo o que se poderia esperar, no contexto.
5. O ufanismo americano marca presença através da personagem Annie Gray, a americana de 12 sequestrada em Manila, capital das Filipinas. Enquanto as vítimas locais entregam-se ao seu destino cruel, a americaninha assume uma posição de liderança e solidariedade, a ponto de tratar da saúde dos companheiros de infortúnio. Não fosse por suas ações, o seu grupo não seria libertado.
Enfim, mesmo bons filmes incorrem nesses pecados. Coisas de americanos. Nada que comprometa a qualidade do resultado.
Acréscimo em 14.1.2012: Que me conste, depois disso o tráfico humano se tornou a atividade criminosa mais rentável do mundo. Repugnante.
Reforma ortográfica
Dentro de menos de 14 horas começa a vigorar a reforma ortográfica da Língua Portuguesa, tema de polêmicas há bastante tempo. Por falta de habilitação técnica, não posso debater essa polêmica. Neste caso, sou apenas um observador — e curioso, já que apaixonado pelo nosso idioma e obcecado pela ideia de empregá-lo sem falhas.
Abstraindo o fato de que o idioma também é resultante de um processo histórico e dos referenciais culturais de um povo, acredito que o comodismo ainda é o fator preponderante nas críticas que o cidadão comum tem feito às mudanças. Resistência à mudança, sobretudo. O engraçado é que a língua muda, inexoravelmente, devido aos apócopes, aos neologismos (muitos vindos do mundo da tecnologia), aos estrangeirismos, à expressão de segmentos sociais (gírias, principalmente), dentre outros fatores. E, quanto a estes aspectos, não há resistências. Desconheço se alguém protestou no dia em que vossa mercê virou você.
E não reclamou porque esse foi um processo natural. Pelo visto, as pessoas estão incomodadas com as mudanças artificiais (a opinião não é minha), decretadas por autoridades que as mesmas não reconhecem como tal.
De minha parte, achei algumas mudanças esquisitas. Gosto mais de vôo que de voo, de idéia que de ideia, por considerar os acentos úteis a identificar a entonação das palavras e, até mesmo, por darem um certo estilo. Não imagino os franceses escrevendo fraternite, em vez de fraternité. Além do mais, há um quê de globalização nessas medidas que me incomoda um tanto.
O fato é que não me convidaram a decidir, sabe-se lá quando, que farmácia seria escrito com "f" e não com "ph" ou, ainda mais remotamente, que haveria dígrafos e hiatos; que na separação silábica nenhuma letra pode ficar sozinha, mesmo que corresponda a uma sílaba inteira; que o "i" e o "j" são as únicas letras a possuir pingo e apenas quando minúsculas; que "m" é uma letra minúscula grande e não um "M" maiúsculo e incontáveis outras coisas que um dia aprendi e jamais esqueci, embora não me recorde mais das regras ou das explicações. Do mesmo modo, não me convidaram a opinar sobre as palavras que devem ou não ter hífen a partir de 2009. Diante disso, resignadamente e tendo fé que há uma boa razão para tanto, eu obedecerei. Daqui a algumas horas, porém não antes, começarei a usar a nova grafia das palavras.
Contudo, dou-me conta de que estou muito inseguro acerca das mudanças. Já li a respeito e nos últimos dias intensifiquei minhas buscas. Estou ciente de que as alterações serão mais intensas para os países de português lusitano. Mas de repente não tenho certeza se estarei grafando de modo correto certas palavras, o que me leva a pedir desculpas antecipadas por eventuais lapsos. É dificil vencer quase uma vida inteira de hábitos.
E uma dúvida me corroi. José Saramago — entusiasta do Português de Portugal, tanto que jamais permitiu a adaptação de seus textos para o Português brasileiro, como as editoras informam ostensivamente nos títulos do autor — já começou a escrever seu próximo livro. Estará ele respeitando as novas regras do idioma?
Abstraindo o fato de que o idioma também é resultante de um processo histórico e dos referenciais culturais de um povo, acredito que o comodismo ainda é o fator preponderante nas críticas que o cidadão comum tem feito às mudanças. Resistência à mudança, sobretudo. O engraçado é que a língua muda, inexoravelmente, devido aos apócopes, aos neologismos (muitos vindos do mundo da tecnologia), aos estrangeirismos, à expressão de segmentos sociais (gírias, principalmente), dentre outros fatores. E, quanto a estes aspectos, não há resistências. Desconheço se alguém protestou no dia em que vossa mercê virou você.
E não reclamou porque esse foi um processo natural. Pelo visto, as pessoas estão incomodadas com as mudanças artificiais (a opinião não é minha), decretadas por autoridades que as mesmas não reconhecem como tal.
De minha parte, achei algumas mudanças esquisitas. Gosto mais de vôo que de voo, de idéia que de ideia, por considerar os acentos úteis a identificar a entonação das palavras e, até mesmo, por darem um certo estilo. Não imagino os franceses escrevendo fraternite, em vez de fraternité. Além do mais, há um quê de globalização nessas medidas que me incomoda um tanto.
O fato é que não me convidaram a decidir, sabe-se lá quando, que farmácia seria escrito com "f" e não com "ph" ou, ainda mais remotamente, que haveria dígrafos e hiatos; que na separação silábica nenhuma letra pode ficar sozinha, mesmo que corresponda a uma sílaba inteira; que o "i" e o "j" são as únicas letras a possuir pingo e apenas quando minúsculas; que "m" é uma letra minúscula grande e não um "M" maiúsculo e incontáveis outras coisas que um dia aprendi e jamais esqueci, embora não me recorde mais das regras ou das explicações. Do mesmo modo, não me convidaram a opinar sobre as palavras que devem ou não ter hífen a partir de 2009. Diante disso, resignadamente e tendo fé que há uma boa razão para tanto, eu obedecerei. Daqui a algumas horas, porém não antes, começarei a usar a nova grafia das palavras.
Contudo, dou-me conta de que estou muito inseguro acerca das mudanças. Já li a respeito e nos últimos dias intensifiquei minhas buscas. Estou ciente de que as alterações serão mais intensas para os países de português lusitano. Mas de repente não tenho certeza se estarei grafando de modo correto certas palavras, o que me leva a pedir desculpas antecipadas por eventuais lapsos. É dificil vencer quase uma vida inteira de hábitos.
E uma dúvida me corroi. José Saramago — entusiasta do Português de Portugal, tanto que jamais permitiu a adaptação de seus textos para o Português brasileiro, como as editoras informam ostensivamente nos títulos do autor — já começou a escrever seu próximo livro. Estará ele respeitando as novas regras do idioma?
Todos os santos e mandingas
Milhões de brasileiros estarão de dedos cruzados nesta noite de 31 de dezembro. A vibração não será em torno da paz universal, não, e sim do número 1.035. Este é o número do último concurso da Mega-Sena de 2008, que pagará ao felizardo — se houver um — a bagatela de 35 milhões de reais, ou menos, se houver mais de um ganhador.
Convenhamos, acertar as seis dezenas tornaria a noite emocionante aos extremos, não? Ainda mais se fosse sozinho.
Então boa sorte aos apostadores, o que não é o meu caso (nunca fui de contar com a sorte para nada).
Em tempo:
Os números foram 1 - 11- 26 - 51 - 59 - 60. Ganhou?
Convenhamos, acertar as seis dezenas tornaria a noite emocionante aos extremos, não? Ainda mais se fosse sozinho.
Então boa sorte aos apostadores, o que não é o meu caso (nunca fui de contar com a sorte para nada).
Em tempo:
Os números foram 1 - 11- 26 - 51 - 59 - 60. Ganhou?
Lá para o Oriente
Acordo, rolo na cama e finalmente me levanto. Penso nas atividades que preciso realizar neste último dia do ano. No instante em que saio da cama, já é o primeiro dia do ano em alguns lugares do mundo, uma cortesia do formato geoide do planeta Terra e do modo como é iluminado pelo Sol.
A fotografia ao lado mostra o show pirotécnico realizado na Nova Zelândia para celebrar 2009.
Vale lembrar, contudo, que é o país mais oriental do mundo é o Kiribati, arquipélago que se estende por regiões da Polinésia e da Micronésia, no Oceano Pacífico. Seus pouco mais de 105.000 habitantes foram os primeiros a ver o sol nascer em 2009 — o que deve ter provocado fortes emoções, já que em março deste ano (ou do ano passado, para eles) a presidente Anete Tong anunciou que o aquecimento global pode fazer o mar cobrir seu país, pelo que pediu ajuda à comunidade internacional.
Os kiribatianos querem continuar vendo os anos mudando em sua própria terra. A propósito, para eles e para você, o lema do país:
Te mauri, te raoi ao te tabomoa
("Saúde, paz e prosperidade")
terça-feira, 30 de dezembro de 2008
...um amor que amasse
Sempre quis um amor
que falasse
que soubesse o que sentisse.
Sempre quis um amor que elaborasse
Que quando dormisse
ressonasse confiança
no sopro do sono
e trouxesse beijo
no clarão da amanhecice.
Sempre quis um amor
que coubesse no que me disse.
Sempre quis uma meninice
entre menino e senhor
uma cachorrice
onde tanto pudesse a sem-vergonhice
do macho
quanto a sabedoria do sabedor.
Sempre quis um amor cujo
BOM DIA!
morasse na eternidade de encadear os tempos:
passado presente futuro
coisa da mesma embocadura
sabor da mesma golada.
Sempre quis um amor de goleadas
cuja rede complexa
do pano de fundo dos seres
não assustasse.
Sempre quis um amor
que não se incomodasse
quando a poesia da cama me levasse.
Sempre quis um amor
que não se chateasse
diante das diferenças.
Agora, diante da encomenda
metade de mim rasga afoita
o embrulho
e a outra metade é o
futuro de saber o segredo
que enrola o laço,
é observar
o desenho
do invólucro e compará-lo
com a calma da alma
o seu conteúdo.
Contudo
sempre quis um amor
que me coubesse futuro
e me alternasse em menina e adulto
que ora eu fosse o fácil, o sério
e ora um doce mistério
que ora eu fosse medo-asneira
e ora eu fosse brincadeira
ultra-sonografia do furor,
sempre quis um amor
que sem tensa-corrida-de ocorresse.
Sempre quis um amor
que acontecesse
sem esforço
sem medo da inspiração
por ele acabar.
Sempre quis um amor
de abafar,
(não o caso)
mas cuja demora de ocaso
estivesse imensamente
nas nossas mãos.
Sem senãos.
Sempre quis um amor
com definição de quero
sem o lero-lero da falsa sedução.
Eu sempre disse não
à constituição dos séculos
que diz que o "garantido" amor
é a sua negação.
Sempre quis um amor
que gozasse
e que pouco antes
de chegar a esse céu
se anunciasse.
Sempre quis um amor
que vivesse a felicidade
sem reclamar dela ou disso.
Sempre quis um amor não omisso
e que suas estórias me contasse.
Ah, eu sempre quis um amor que amasse.
"Da chegada do amor", de Elisa Lucinda, para você começar a aquecer o seu coração, para amar no réveillon e em todo ano de 2009. Valendo muito a pena, se Deus quiser.
que falasse
que soubesse o que sentisse.
Sempre quis um amor que elaborasse
Que quando dormisse
ressonasse confiança
no sopro do sono
e trouxesse beijo
no clarão da amanhecice.
Sempre quis um amor
que coubesse no que me disse.
Sempre quis uma meninice
entre menino e senhor
uma cachorrice
onde tanto pudesse a sem-vergonhice
do macho
quanto a sabedoria do sabedor.
Sempre quis um amor cujo
BOM DIA!
morasse na eternidade de encadear os tempos:
passado presente futuro
coisa da mesma embocadura
sabor da mesma golada.
Sempre quis um amor de goleadas
cuja rede complexa
do pano de fundo dos seres
não assustasse.
Sempre quis um amor
que não se incomodasse
quando a poesia da cama me levasse.
Sempre quis um amor
que não se chateasse
diante das diferenças.
Agora, diante da encomenda
metade de mim rasga afoita
o embrulho
e a outra metade é o
futuro de saber o segredo
que enrola o laço,
é observar
o desenho
do invólucro e compará-lo
com a calma da alma
o seu conteúdo.
Contudo
sempre quis um amor
que me coubesse futuro
e me alternasse em menina e adulto
que ora eu fosse o fácil, o sério
e ora um doce mistério
que ora eu fosse medo-asneira
e ora eu fosse brincadeira
ultra-sonografia do furor,
sempre quis um amor
que sem tensa-corrida-de ocorresse.
Sempre quis um amor
que acontecesse
sem esforço
sem medo da inspiração
por ele acabar.
Sempre quis um amor
de abafar,
(não o caso)
mas cuja demora de ocaso
estivesse imensamente
nas nossas mãos.
Sem senãos.
Sempre quis um amor
com definição de quero
sem o lero-lero da falsa sedução.
Eu sempre disse não
à constituição dos séculos
que diz que o "garantido" amor
é a sua negação.
Sempre quis um amor
que gozasse
e que pouco antes
de chegar a esse céu
se anunciasse.
Sempre quis um amor
que vivesse a felicidade
sem reclamar dela ou disso.
Sempre quis um amor não omisso
e que suas estórias me contasse.
Ah, eu sempre quis um amor que amasse.
"Da chegada do amor", de Elisa Lucinda, para você começar a aquecer o seu coração, para amar no réveillon e em todo ano de 2009. Valendo muito a pena, se Deus quiser.
30 de dezembro
Hoje se comemora a Noite dos Prazeres, no México, seja lá o que isso signifique.
Há 110 anos, numa noite como esta nascia o potiguar Luís da Câmara Cascudo (quando criança, eu não acreditava que esse fosse seu nome verdadeiro, mas era), um dos maiores folcloristas que este país já conheceu. Faleceu em 1986, deixando uma gigantesca bibliografia. Seu nome sempre é lembrado quando o assunto é cultura brasileira. Na fotografia, em 1928, ao bacharelar-se em, claro, Direito.
Há dois anos, morria Saddam Hussein, que dispensa apresentações, aos 69 anos, no cumprimento da pena de morte por enforcamento que lhe fora imposta por um tribunal composto por iraquianos, mas a serviço de interesses estrangeiros, o que lhe valeu o repúdio de diversos organismos internacionais, inclusive a Anistia Internacional. A pena fora imposta por crimes contra a humanidade.
A penúltima noite do ano também deixou seus vestígios na História.
Monitoramento eletrônico de preso
Já tratamos deste assunto aqui no blog. Enquanto nos Estados Unidos há muito tempo se difundiu o uso de tornozeleiras eletrônicas, para monitorar pessoas submetidas ao sistema de justiça criminal, condenadas ou não, em terras brasileiras isso ainda é um tabu. Por lá, até celebridades saem às ruas enfeitadas. A última de que me recordo foi Michelle Rodriguez, a Ana-Lucía Cortez, de Lost (presa no Havaí, onde o seriado é gravado, por dirigir embriagada). Ainda que não seja uma grande celebridade, serve como referência.
O fato é que, no Brasil, medidas como esta são tidas como atentatórias à dignidade humana. Olha que sou um defensor dos direitos humanos, inclusive dos criminosos, mas frequentemente perco a paciência com esses pruridos ridículos e injustificáveis. Afinal, não se pode negar que as tornozeleiras permitem a vigilância sobre o indivíduo, de um modo mais simples e barato do que a fiscalização pessoal. Se eu estivesse encrencado com a d. Justa e me perguntassem se eu prefiro uma cela ou monitoramento eletrônico, não teria a menor dúvida quanto à resposta.
As tornozeleiras já começaram a ser testadas no Brasil, mas num projeto piloto em que os monitorados eram condenados que aceitaram, de livre e espontânea vontade, ser submetidos ao artefato. Só assim para os excessivamente suscetíveis concordarem.
Agora, existe a possibilidade de um dos criminosos mais célebres do país se tornar o primeiro condenado a utilizar a tornozeleira de modo individual. Novamente, por sua própria escolha. Trata-se de Nicolau dos Santos Neto, condenado a 26,5 anos de reclusão, por diversos delitos relacionados à apropriação de dinheiro público, destinado à construção da sede do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, do qual era presidente.
Aos 80 anos, Nicolau — que está preso há oito — cumpre prisão domiciliar, alegadamente devido a agravos a sua saúde. Mais uma prova de como o Estado brasileiro sabe ser leniente com alguns de seus filhos. Não por ter concedido a ele essa benesse, mas nunca o fazer quando o requerente é menos bacana. O fato é que todo mundo, inclusive a própria polícia, odeia o esquema montado para vigiar a mansão do camarada. Assim, será mais fácil e econômico adotar o procedimento tecnológico.
Aguardemos as cenas dos próximos capítulos.
Ana Bolena
A razão de eu ter pensado em Ana Bolena justamente hoje foi o fato de eu ter acabado de assistir ao filme A outra (título insosso para The other Boleyn girl, Justin Chadwick, 2008). Com Natalie Portman como Ana Bolena, o filme tem ainda Scarlett Johansson como Maria Bolena e Eric Bana como Henrique Tudor (Henrique VIII, 1491-1547, rei a partir de 1509).
Trata-se de mais uma das incontáveis obras ficcionais construídas sobre a trágica trajetória de Ana Bolena (?1500-1536). O filme é bom, sem dúvida, mas nada de especial. Serve para despertar a curiosidade do público acerca dos fatos históricos dos quais tratamos em nossas salas de aula do ensino médio e que interessam aos vestibulandos. Contudo, para quem não tem maiores pendores quanto à História, pode ser apenas um bom lazer. O longa é mais útil para quem tem alguma informação e pode perceber, p. ex., que Goerge Bolena foi decapitado com um machado, ao passo que Ana, com uma espada. O detalhe, aparentemente sem nenhuma importância, e que passará completamente despercebido aos desavisados, representou uma prova de que Ana tinha grande poder sobre o rei, mesmo após cair em desgraça. É que ela se recusou a ser morta com o machado, pois uma rainha da Inglaterra jamais curvaria sua cabeça a ninguém (era preciso inclinar-se, para a cabeça ficar apoiada). Diversamente, com a espada, o golpe era dado com o condenado de joelhos, mas empertigado.
Num mundo regido por fru-frus simbólicos, esse fato é de grande relevância.
Uma boa reconstituição de época, o figurino habitualmente competente, boas interpretações. No mais, muito agradável para quem adora tramas cheias de intrigas e ambição, jogos de poder, lampejos de moralidade e gente se dando muito mal no fim.
Confira, se lhe interessar.
Últimas palavras de Ana Bolena
Figura que entrou para a História por estar na raiz do surgimento da Igreja Anglicana — o rei Henrique VIII se divorciou de Catarina de Aragão para se casar com ela, rompendo com a Igreja de Roma e sendo excomungado por isso — Ana Bolena (?1500-1536) foi rainha consorte da Inglaterra por cerca de mil dias.
Suas últimas palavras antes de morrer foram:
"É pequeno, muito pequeno, não é verdade?"
Antes que os engraçadinhos de plantão façam piadinhas acerca dos dotes do rei da Inglaterra, saiba que Bolena, ao falar em pequeno, referia-se ao próprio pescoço, que apresentava ao carrasco na hora de sua execução, quando morreu demonstrando grande presença de espírito, ao abençoar o marido que mandara decapitá-la e confiando a própria alma a Jesus Cristo.
Acabei de encontrar um sítio na Internet que apresenta as últimas palavras de algumas figuras bastante famosas. Quem quiser conhecê-las, clique aqui. Vai abrir em Ana Bolena, mas de lá você navega para outras personalidades.
Ritmo de final de ano
Tão logo entrei de férias, uma pregui tomou conta de mim. Tanto que não tive forças para escrever preguiça, completa. Esta gracinha aprendi com Ana Kelly Jansen de Amorim, na época em que trabalhamos juntos na Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos.
O ritmo das postagens caiu, assim como o de acessos. E demorei mais de uma semana para responder a alguns comentários, pelo que me desculpo. De modo algum foi desapreço aos gentis comentaristas. Já foram respondidos, especialmente o de Lafayette sobre relacionamentos entre cães, o que muito me interessa.
Tirando um tempinho para dar uma nova cara ao blog, acabo de aderir à ferramenta "seguidor", que considero muito simpática e é um atrativo a mais para convidar os nossos leitores a visitar outros endereços, que nos parecem recomendáveis.
Esclarecimentos feitos, desejo-lhes uma ótima terça-feira. Qualquer hora retorno, para postar de verdade. Abraços.
O ritmo das postagens caiu, assim como o de acessos. E demorei mais de uma semana para responder a alguns comentários, pelo que me desculpo. De modo algum foi desapreço aos gentis comentaristas. Já foram respondidos, especialmente o de Lafayette sobre relacionamentos entre cães, o que muito me interessa.
Tirando um tempinho para dar uma nova cara ao blog, acabo de aderir à ferramenta "seguidor", que considero muito simpática e é um atrativo a mais para convidar os nossos leitores a visitar outros endereços, que nos parecem recomendáveis.
Esclarecimentos feitos, desejo-lhes uma ótima terça-feira. Qualquer hora retorno, para postar de verdade. Abraços.
segunda-feira, 29 de dezembro de 2008
O que passamos a ver
Um organismo microscópico visto em aparelho de última geração?
Uma imagem de detalhes de uma célula, ao microscópio de altíssima resolução?
Nada. Apenas a nossa boa e velha Marte. Imagens de sua superfície feitas pela Mars Reconnaissance Orbiter, 18ª sonda enviada pela NASA ao planeta vermelho. E assim pouco a pouco vamos sabendo mais sobre o universo ao nosso redor.
No mínimo, curioso
Volta e meia, os jornais locais publicam alguma nota sobre furtos de plantas de logradouros públicos, que costumam acontecer na Doca de Souza Franco e na Duque de Caxias. Todas essas notas têm um ponto em comum: destacar que o crime não é perpetrado por criminosos do padrão a que o senso comum se acostumou. São sempre pessoas de boa aparência, bem vestidas e, em pelo menos um caso, que chegou e fugiu numa picape estilosa.
Como pessoas de boas condições financeiras não cometem crimes — no máximo, agem movidas por cleptomania ou sob o efeito de medicamentos contra depressão, não é, Ronaldo Ésper? — fico matutando sobre essa peculiaridade do mercado belenense de plantas afanadas.
Ah, sim, outro ponto em comum entre as reportagens: de acordo com o que se deduz delas, os larápios sempre são vistos, mas ninguém faz absolutamente nada.
Então tá.
Como pessoas de boas condições financeiras não cometem crimes — no máximo, agem movidas por cleptomania ou sob o efeito de medicamentos contra depressão, não é, Ronaldo Ésper? — fico matutando sobre essa peculiaridade do mercado belenense de plantas afanadas.
Ah, sim, outro ponto em comum entre as reportagens: de acordo com o que se deduz delas, os larápios sempre são vistos, mas ninguém faz absolutamente nada.
Então tá.
O bem amado na telona
Eu era muito criança nos gloriosos anos 1980 para aproveitar o humor inteligente e a crítica social afiadíssima de Dias Gomes em sua novela O bem amado, um dos maiores triunfos da TV brasileira. Se o produto em si já era excelente, tornou-se antológico também graças a atuações impecáveis e inesquecíveis, onde despontava o protagonista, o Odorico Paraguaçu do maravilhoso Paulo Gracindo.
É com enorme alegria que acabo de saber que O bem amado será levado às telas dos cinemas, pelas competentes mãos de Guel Arraes — que eu presumo seja, hoje, a pessoa mais adequada para a empreitada. As informações dão conta de que a equipe começará os trabalhos no próximo dia 20 de janeiro, em Olinda.
A primeira pergunta que nos fazemos é, justamente, quem poderia reviver o prefeito brasileiríssimo imortalizado por Gracindo. Garimpando na Internet, lendo uma notinha aqui e outra ali (porque não encontrei nada mais conclusivo nos sítios sobre cinema), parece que Arraes está de olho em Marco Nanini, uma escolha bastante natural — não apenas por se tratar do ator mais completo de nosso tempo, ao menos do que se refere a tempo de comédia e versatilidade, como também pelo fato de já haver encarnado o personagem no teatro, em peça cujo cartaz você vê à direita. Mas é estranho não haver confirmação do Titelrolle se as filmagens devem começar em menos de um mês.
Todavia, parece que as irmãs Cajazeiras serão interpretadas por ninguém menos que Andréa Beltrão, Drica Moraes e Zezé Polessa. Com esse trio, o filme já se pagou.
Já estou na maior expectativa pela estreia do filme. Afinal, o universo de Sucupira e seus tipos incomuns precisa ser revisitado sempre — seja para que o cemitério municipal ganhe enfim um habitante, seja para que possamos escutar, de novo, aquelas pérolas do tipo: "Não me venha com problemáticas. Eu quero é solucionáticas!"
E comparar os personagens com figuras dos noticiários reais será um prazer à parte.
Acréscimo em 14.1.2012: Não sei por qual razão não vi o filme no cinema. Vi muito tempo depois, em casa, pela TV a cabo. E detestei. Apesar do elenco de peso, o roteiro era tão ruim, mas tão ruim, que sequer terminei de assistir. Lastimável.
Acréscimo em 14.1.2012: Não sei por qual razão não vi o filme no cinema. Vi muito tempo depois, em casa, pela TV a cabo. E detestei. Apesar do elenco de peso, o roteiro era tão ruim, mas tão ruim, que sequer terminei de assistir. Lastimável.
domingo, 28 de dezembro de 2008
Mais do mesmo
A campanha eleitoral já acabou, o fulano já foi diplomado, dentro de pouco mais de quatro dias estará empossado de novo e, mesmo assim, o comportamento do poder público municipal continua a ser de palanque. Pelo menos a julgar pela matéria que o Diário do Pará publica hoje sobre o binário das avenidas Senador Lemos e Pedro Álvares Cabral. Tudo bem que não temos jornais sérios e confiáveis, mas a explicação apresentada na reportagem tem toda a cara de prefeitura de Belém.
Segundo a matéria, a Secretaria Municipal de Saneamento — SESAN teria informado que as obras do binário "em momento algum sofreram paralisação". Houve apenas uma "desaceleração dos trabalhos em função da secretaria aguardar os repasses de mais recursos financeiros à obra".
Como diria o meu irmão, depois que inventaram a desculpa, o mundo se tornou um lugar perfeito para viver. "Paralisação" ou "desaceleração", tudo é uma questão de retórica, instrumento largamente utilizado por pessoas que estão de má fé. Aliás, péssima retórica, pois quem passa pela Pedro Álvares Cabral, como eu, sabe que as obras estão, sim, completamente paralisadas há meses. Por sinal, desde antes da eleição.
A única tarefa concluída foi a supressão do canteiro, deixando uma pista desnivelada, perigosa para os carros e principalmente para os pedestres. O que temos agora é muito pior do que o que havia antes. A única verdade na explicação da SESAN é que não há dinheiro para continuar o serviço. Nisso eu acredito piamente.
Esta é a marca de qualidade com a qual conviveremos por mais quatro anos. Parabéns a você, que depositou o seu voto num sujeito que herdou de seus nefastos padrinhos — a coligação política que deu asas a sua carreira — a inesgotável capacidade de vender a ideia de que vivemos num mundo quase perfeito, mas sem ter sequer a mesma capacidade de fazer as maquiagens necessárias para tanto.
Em homenagem à posse do re-prefeito, um micropoema:
Mande-me o seu poeminha, também. Adorarei publicá-lo.
Segundo a matéria, a Secretaria Municipal de Saneamento — SESAN teria informado que as obras do binário "em momento algum sofreram paralisação". Houve apenas uma "desaceleração dos trabalhos em função da secretaria aguardar os repasses de mais recursos financeiros à obra".
Como diria o meu irmão, depois que inventaram a desculpa, o mundo se tornou um lugar perfeito para viver. "Paralisação" ou "desaceleração", tudo é uma questão de retórica, instrumento largamente utilizado por pessoas que estão de má fé. Aliás, péssima retórica, pois quem passa pela Pedro Álvares Cabral, como eu, sabe que as obras estão, sim, completamente paralisadas há meses. Por sinal, desde antes da eleição.
A única tarefa concluída foi a supressão do canteiro, deixando uma pista desnivelada, perigosa para os carros e principalmente para os pedestres. O que temos agora é muito pior do que o que havia antes. A única verdade na explicação da SESAN é que não há dinheiro para continuar o serviço. Nisso eu acredito piamente.
Esta é a marca de qualidade com a qual conviveremos por mais quatro anos. Parabéns a você, que depositou o seu voto num sujeito que herdou de seus nefastos padrinhos — a coligação política que deu asas a sua carreira — a inesgotável capacidade de vender a ideia de que vivemos num mundo quase perfeito, mas sem ter sequer a mesma capacidade de fazer as maquiagens necessárias para tanto.
Em homenagem à posse do re-prefeito, um micropoema:
Prefeito — empossado.
Cidade — empoçada.
Mande-me o seu poeminha, também. Adorarei publicá-lo.
Quase de duplo sentido
A julgar pelas denúncias de superfaturamento da obra, o prefeito do Rio de Janeiro, César Maia, poderia levar outro tombo, bem mais sério, devido à Cidade da Música, além do que levou ontem, fisicamente, por ocasião de um concerto inaugural.
Até o momento, já foram gastos 518,4 milhões de reais — dinheiro do Município — na obra, muito além do originalmente previsto e sequer se chegou ao final. Acredita-se que para a conclusão dos trabalhos sejam necessários outros 40 milhões.
Nada contra o projeto em si (*). Nada contra o seu tamanho e a sua pompa — a ponto de o espaço ter sido projetado por Christian de Portzamparc, responsável por projeto análogo em Paris e com outras obras de vulto no currículo. Criticamos inúmeras vezes o descaso dos governos com a cultura. Portanto, não é esse o problema. O problema é gastar-se tanto quando a cidade ainda enfrenta mazelas típicas do terceiro-mundo-caindo-para-o-quarto. Cria-se, assim, um monumento ao luxo, em cujas calçadas dormirão os mendigos e as crianças abandonadas.
Por fim, também é um grande problema que a obra esteja imersa em denúncias de ladroagem, o que neste país não é nenhuma novidade. Afinal, é nas obras que a tchurma se locupleta. Principalmente naquelas que começam custando x e terminam custando muitas vezes essa letra.
Que bom que isso não acontece no Pará...
(*) Clique aqui para conhecer informações sobre o projeto, segundo a prefeitura do Rio de Janeiro.
sexta-feira, 26 de dezembro de 2008
Uma Belém inédita
Para quem se acostumou (ou quase) a uma realidade bem diversa e muito pior, este Natal proporcionou àqueles que vivem nesta cidade e se importam com ela um cenário quase inacreditável: Belém estava calma, com pouco tráfego, silenciosa e — pasme! — limpa na manhã de Natal. É duro dizer, mas parecia que me haviam abduzido para um outro lugar, não fosse reconhecer as paisagens por onde passei.
Fazia tempo que eu não via a cidade tão bonita e aconchegante. Infelizmente, não é o tipo de coisa que dure. Não li os jornais nos últimos três dias e por isso não sei se essa minha impressão de paz corresponde à realidade. E como o réveillon não é uma festa familiar, como o Natal, e sim um pretexto para o povo perder as estribeiras — como provam as estatísticas criminais, de acidentes de trânsito e de atendimento nos hospitais —, melhor por as barbas de molho. Mas pelo menos levo comigo esta feliz lembrança. Recente.
Fazia tempo que eu não via a cidade tão bonita e aconchegante. Infelizmente, não é o tipo de coisa que dure. Não li os jornais nos últimos três dias e por isso não sei se essa minha impressão de paz corresponde à realidade. E como o réveillon não é uma festa familiar, como o Natal, e sim um pretexto para o povo perder as estribeiras — como provam as estatísticas criminais, de acidentes de trânsito e de atendimento nos hospitais —, melhor por as barbas de molho. Mas pelo menos levo comigo esta feliz lembrança. Recente.
quarta-feira, 24 de dezembro de 2008
Feliz Natal!
Vocês que me aturaram ao longo deste ano de 2008 demonstraram ter muita paciência. Por isso, é com grande reconhecimento que lhes desejo um Natal abençoado, repleto das alegrias que buscamos e merecemos. E digo isso com o espírito cheio de um amor renovado e enorme, como todos vocês podem imaginar que tenho comigo.
Saúde, paz e muita felicidade. Ah, claro, comida boa e um dinheirinho não fazem mal a ninguém...
Saúde, paz e muita felicidade. Ah, claro, comida boa e um dinheirinho não fazem mal a ninguém...
terça-feira, 23 de dezembro de 2008
5 meses
A esta hora, exatos cinco meses atrás, eu estava sentado em um sofazinho meio cafajeste, dentro de um quarto na penumbra, olhando um bercinho transparente e pensando em toda a nova vida que se abria à minha frente. Enrolada em panos e mais panos, ressonava minha filha, sem compreender como, de repente, o mundo parecia menos apertado, menos quentinho e menos escuro.
Hoje, quando comemoramos os seus cinco meses de nascida, temos o prazer indizível de ver esse sorriso — que a fotografia mostra, num momento em que Júlia brincava com a sua decopeia (uma centopeia de dez pés) —, a todo momento se abrindo numa boca sem dentes. Se bem que os dentinhos devem estar chegando, a julgar pela intensificação do hábito de morder objetos, pela baba e, hoje, uma certa mudança de temperamento. Disseram-me que a gengiva estava vermelha, mas juro que não notei nenhuma diferença.
Nossa garotinha agora é ágil para girar sobre o próprio eixo e ficar de bruços, o que lhe dá grande alegria. Se apoiada, consegue sentar-se, mas logo pende como um joão bobo e acaba caindo. Há uma semana, começou a experimentar frutas raspadas. Dos cinco sabores que conhece — leite materno, pera, maçã, mamão e banana —, este último é o que ela mais aprecia. Já tenta agarrar a colher para por na boca, com sofreguidão. E todo mundo se diverte.
Há pouco mais de um ano, escrevi aqui no blog que a maior de todas as aventuras estava começando. De uma coisa estejam certos: realmente, é uma aventura indescritível. E maravilhosa. Não há como tentar explicar. Se você não passa por isso, não tem com entender. Escutei isso muitas vezes frases desse tipo e achava exagerado. Não era.
Hoje, considero da maior importância e urgência que as pessoas possam criar e manter sua famílias. Livres e felizes, como todos precisamos e merecemos ser.
Medicina vs. comércio
"A Medicina não pode, em qualquer circunstância, ou de qualquer forma, ser exercida como comércio."
A bela declaração de intenções acima precisa ser relembrada por um famosíssimo médico de nossa cidade, que também exerce funções empresariais em seu estabelecimento, que não para de crescer. Não direi seu nome por razões óbvias, mas acredito que seja muito fácil deduzir de quem não se trata. Por isso mesmo, vou logo avisando que não publicarei comentários identificando o nobre senhor.
O motivo desta postagem é o ressentimento que guardo pela forma como fui tratado por ele. Não diretamente. No trato pessoal, ele é um gentleman, educado e gentil até demais. Mas considero inadmissível que meu tempo e minhas necessidades sejam sumariamente desprezados. É certo que isso acontece hoje em 99% dos consultórios médicos, mas alguns abusam. E o senhor em apreço abusa.
Na recente gestação de minha esposa, tivemos dois contatos com ele. Poderiam ter sido três, mas no que seria o primeiro preferimos recorrer a outro médico, pois a "reunião de diretoria" do nosso medalhão não tinha hora para acabar. Depois, pagamos os nossos pecados na sala de espera. Idem no mês seguinte, quando demos entrada na clínica às 8 da manhã, mas o bonito só começou a atender às 10h30, após terminar as suas reuniões. Ia dar meio dia quando finalmente nos atendeu, numa consulta que dura pouco mais de dez minutos. Nesse dia, avisei minha esposa que não poria mais os meus pés ali. Promessa cumprida, as duas últimas consultas foram realizadas com outro profissional, sem nenhuma crítica à qualidade e com um diferencial que para mim é crucial: saí de sua clínica antes das 9 da manhã (entrando um pouco depois das 7), com tudo resolvido. E só demoramos mais porque optamos por esperar o laudo do exame.
Hoje, fiquei sabendo que uma amiga gestante fez a mesma troca, em definitivo. Motivo: você telefona para a clínica e marca consulta com o medalhão. A secretária confirma. Contudo, no dia marcado, um imprevisto sempre aparece e as funcionárias começam a induzir o público a ser atendido pelos demais médicos, o que será mais rápido. Você já saiu de sua casa, quer e precisa do exame, não aceita perder mais tempo. Fará o quê? Irá ao outro médico. O nosso amigo, assim, fica numa condição curiosa: seu nome atrai os pacientes, mas estes não conseguem o que desejam.
Para mim, as coisas são muito simples: se você decidiu ser empresário e não médico, assuma isso e toque sua vida para a frente. Só não iluda ninguém.
Art. 9º do Código de Ética Médica
A bela declaração de intenções acima precisa ser relembrada por um famosíssimo médico de nossa cidade, que também exerce funções empresariais em seu estabelecimento, que não para de crescer. Não direi seu nome por razões óbvias, mas acredito que seja muito fácil deduzir de quem não se trata. Por isso mesmo, vou logo avisando que não publicarei comentários identificando o nobre senhor.
O motivo desta postagem é o ressentimento que guardo pela forma como fui tratado por ele. Não diretamente. No trato pessoal, ele é um gentleman, educado e gentil até demais. Mas considero inadmissível que meu tempo e minhas necessidades sejam sumariamente desprezados. É certo que isso acontece hoje em 99% dos consultórios médicos, mas alguns abusam. E o senhor em apreço abusa.
Na recente gestação de minha esposa, tivemos dois contatos com ele. Poderiam ter sido três, mas no que seria o primeiro preferimos recorrer a outro médico, pois a "reunião de diretoria" do nosso medalhão não tinha hora para acabar. Depois, pagamos os nossos pecados na sala de espera. Idem no mês seguinte, quando demos entrada na clínica às 8 da manhã, mas o bonito só começou a atender às 10h30, após terminar as suas reuniões. Ia dar meio dia quando finalmente nos atendeu, numa consulta que dura pouco mais de dez minutos. Nesse dia, avisei minha esposa que não poria mais os meus pés ali. Promessa cumprida, as duas últimas consultas foram realizadas com outro profissional, sem nenhuma crítica à qualidade e com um diferencial que para mim é crucial: saí de sua clínica antes das 9 da manhã (entrando um pouco depois das 7), com tudo resolvido. E só demoramos mais porque optamos por esperar o laudo do exame.
Hoje, fiquei sabendo que uma amiga gestante fez a mesma troca, em definitivo. Motivo: você telefona para a clínica e marca consulta com o medalhão. A secretária confirma. Contudo, no dia marcado, um imprevisto sempre aparece e as funcionárias começam a induzir o público a ser atendido pelos demais médicos, o que será mais rápido. Você já saiu de sua casa, quer e precisa do exame, não aceita perder mais tempo. Fará o quê? Irá ao outro médico. O nosso amigo, assim, fica numa condição curiosa: seu nome atrai os pacientes, mas estes não conseguem o que desejam.
Para mim, as coisas são muito simples: se você decidiu ser empresário e não médico, assuma isso e toque sua vida para a frente. Só não iluda ninguém.
Infernal
Sair de casa esta noite foi a coisa mais estúpida que eu poderia fazer. Três engarrafamentos depois — que somados ultrapassam uma hora —, inclusive com direito a sair de um para cair exatamente em outro, chegar em casa foi um alívio, sobretudo tendo a bordo uma criança tão pequena, necessitada de descanso em seu próprio berço. Some-se a isso a maior quantidade de ambulâncias em situação de emergência que já vi na vida. Se a coisa não estava boa para o meu lado, imagine para o dos doentes. Do jeito que a coisa anda (aliás, "andar" não é exatamente a melhor palavra) nesta cidade, muita gente vai morrer sem socorro médico, com o detalhe de estar dentro da ambulância. Anote aí. Sem condições de escoar o tráfego, não há como atender o necessitado. E o que dizer dos que estavam nos ônibus cheios? Eles pagaram R$ 1,70 para estar naquela situação...
Aceite um conselho de amigo: se não for realmente necessário sair de casa, fique nela. Ou aguente.
PS — Nenhum, não vi absolutamente nenhum agente de trânsito fazendo qualquer coisa útil nesse meio tempo. Na ida, após mais de 20 minutos preso na Pedro Álvares Cabral, vi um na esquina dessa rua com a Júlio César. Ele não ajudou a fazer o tráfego fluir, mas estava preenchendo o talonário de multa quando passei por ele. Na volta, nenhum agente mesmo. Nem naqueles ridículos picolés da CTBel, seja em São Brás, seja na Almirante Barroso com Júlio César. Claro, àquela altura já deviam estar em casa, descansando. Coisa que milhares de belenenses também gostariam de estar fazendo, mas não podiam.
Aceite um conselho de amigo: se não for realmente necessário sair de casa, fique nela. Ou aguente.
PS — Nenhum, não vi absolutamente nenhum agente de trânsito fazendo qualquer coisa útil nesse meio tempo. Na ida, após mais de 20 minutos preso na Pedro Álvares Cabral, vi um na esquina dessa rua com a Júlio César. Ele não ajudou a fazer o tráfego fluir, mas estava preenchendo o talonário de multa quando passei por ele. Na volta, nenhum agente mesmo. Nem naqueles ridículos picolés da CTBel, seja em São Brás, seja na Almirante Barroso com Júlio César. Claro, àquela altura já deviam estar em casa, descansando. Coisa que milhares de belenenses também gostariam de estar fazendo, mas não podiam.
44 imagens
No novo banner que caracteriza o blog, são vistos 44 fragmentos de imagens já publicadas em minhas postagens, a maioria relativamente recente.
Evidentemente, fica fácil perceber que a minha própria careta abre e fecha a montagem. Contudo, são exibidos outros rostos, alguns bastante nítidos, outros nem tanto. Há duas pinturas antigas, quatro filmes, dois fenômenos meteorológicos, um grande avanço científico, duas referências esportivas, etc.
Você seria capaz de identificar os personagens exibidos, de esclarecer o contexto da imagem ou de dizer a que postagem ela está relacionada?
Uma dica: o bebê que aparece olhando para o alto no canto inferior esquerdo não é a minha Júlia. Note as letrinhas em uma ponta da imagem. Trata-se da capa da revista americana BabyTalk, que provocou estardalhaço ao exibir uma mulher amamentando esse bebezinho.
Faltam apenas 41 quadros. Alguns são bem fáceis.
Lula e as 10 mais
A revista Época selecionou as 10 maiores pérolas do presidente Lula neste ano de 2008. Deve ter sido uma tarefa espinhosa. Descontando o apoio dado à conscientização dos homens quanto ao exame preventivo do câncer de próstata, a seleção é de doer. A menos pior é a que sugere que o Brasil passará incólume pela crise econômica mundial. Mas a do futebol... Se você fechar os olhos, escutará a voz do Homer Simpson em sua cabeça!
E olha que eu simpatizo com o cara...
PS — Fiquei em dúvida sobre qual marcador deveria utilizar para classificar esta postagem. Brasil, política... Não era isso. Então escolhi humor. Creio que era a minha melhor opção, mesmo não sendo exatamente engraçado.
E olha que eu simpatizo com o cara...
PS — Fiquei em dúvida sobre qual marcador deveria utilizar para classificar esta postagem. Brasil, política... Não era isso. Então escolhi humor. Creio que era a minha melhor opção, mesmo não sendo exatamente engraçado.
Inúteis, porém bem pagos
O Liberal adorou que lhe tenha sido dada munição e publicou matéria sobre o absenteísmo do deputado federal Jader Barbalho na Câmara. Ele é um gazeteiro de mão cheia e no único parecer que emitiu, como membro de uma comissão temática, o assunto era concessão para uma empresa de comunicação, tema no qual ele tem interesse absolutamente particular.
Hoje, o Diário do Pará, não tendo ninguém da família inimiga para atingir, vai de Wladimir Costa mesmo. E olha que o sujeito é do PMDB, partido do jornal em questão. Pelo visto, a intenção é dissipar um pouco a má impressão em torno do patrão, pela divulgação de outros cometas profissionais.
A conduta omissiva e abusiva desses parlamentares, contudo, não deveria surpreender ninguém. Quem se elege com vistas, única e exclusivamente, a angariar benefícios pessoais, usando a representação política como instrumento eficiente para se dar bem, não tem o menor compromisso com a frequência, com os debates, com as votações, com o exercício da democracia. Ele está fazendo apenas aquilo que poderíamos esperar dele.
Se eu entrasse em uma turma, no primeiro dia de aula, e anunciasse que estou ali pelo dinheiro e que não ligo para quem quer aprender, melhor seria que os alunos se movimentassem para me alijar imediatamente. Não teria sentido me deixar ficar para, depois, reclamar que falto muito ou que minhas aulas são ruins. Ou seja, querer remediar o problema já instalado.
Pode esquecer esse papo furado de perda de mandato ou de desconto nos polpudos rendimentos. Isso nunca acontecerá. Solução para gazeteiro é uma só: na escola, ser reprovado; na política, não ser re-eleito.
Hoje, o Diário do Pará, não tendo ninguém da família inimiga para atingir, vai de Wladimir Costa mesmo. E olha que o sujeito é do PMDB, partido do jornal em questão. Pelo visto, a intenção é dissipar um pouco a má impressão em torno do patrão, pela divulgação de outros cometas profissionais.
A conduta omissiva e abusiva desses parlamentares, contudo, não deveria surpreender ninguém. Quem se elege com vistas, única e exclusivamente, a angariar benefícios pessoais, usando a representação política como instrumento eficiente para se dar bem, não tem o menor compromisso com a frequência, com os debates, com as votações, com o exercício da democracia. Ele está fazendo apenas aquilo que poderíamos esperar dele.
Se eu entrasse em uma turma, no primeiro dia de aula, e anunciasse que estou ali pelo dinheiro e que não ligo para quem quer aprender, melhor seria que os alunos se movimentassem para me alijar imediatamente. Não teria sentido me deixar ficar para, depois, reclamar que falto muito ou que minhas aulas são ruins. Ou seja, querer remediar o problema já instalado.
Pode esquecer esse papo furado de perda de mandato ou de desconto nos polpudos rendimentos. Isso nunca acontecerá. Solução para gazeteiro é uma só: na escola, ser reprovado; na política, não ser re-eleito.
Incapacidade, inidoneidade
Ontem, o 5ª Emenda publicou uma postagem sobre a passeata pela paz, organizada por familiares e amigos do médico assassinado Salvador Nahmias. Em apenas três linhas, Juvêncio de Arruda se limitou a dizer que estavam presentes segmentos que não estão acostumados a manifestações desse tipo, numa clara relação dessa prática com as esquerdas. Quando li a postagem, já havia 22 comentários publicados e uma celeuma instalada.
Já falei várias vezes sobre a raiva que me dá a incapacidade de uns tantos de fixar o real foco do debate. Seja por má fé ou por limitação intelectual, desvirtua-se o conteúdo e se envereda por discussões, muitas vezes toscas e sem qualquer utilidade. No caso a que me refiro, o que se estabeleceu foi um ingrediente perigosíssimo da sociedade de nossos tempos: o ódio entre classes. De repente, começaram a chover críticas contra a elite e os ricos. Arruda fez uma intervenção oportuna, basicamente para reconhecer o direito dos manifestantes de se manifestar, mas pelo visto não deu muito resultado.
Há algum tempo, fez-se um estardalhaço no país por causa do roubo de um Rolex avaliado em 50 mil reais, do pulso de Luciano Huck, que escreveu na Internet um desabafo sobre a insegurança. O cantor Zeca Baleiro subiu nas tamancas e esculhambou Huck, culpando-o por carregar no pulso algo cujo valor alimentaria muitas famílias. Mesmo não vendo nada demais em Huck e sendo fã de Baleiro, dei razão ao primeiro. Afinal, não se trata do que eu tenho, mas de eu possuir o direito de usufruir do que tenho. Huck não era menos vítima por ser rico. Ele também conheceu a violência que é estar sob a mira de uma arma. Ele também poderia ter sido ferido ou morto. E, claro, tem todo o direito de se indignar com isso. Demais disso, não é culpa dele se as pessoas — pobres ou ricas — estão em perigo nas ruas.
Dito isto, considero indecente negar à classe média ou alta de Belém do Pará o direito de protestar, de se insurgir, de criticar o Estado pela insegurança que acomete a todos nós, e a eles, com muito mais patrimônio ameaçado. Boa parte dessas críticas inclusive falta com o dever de solidariedade humana, na medida em que havia muita gente ali amargando a dor de pessoas amadas mortas. Seus motivos e seus objetivos são justos e merecem toda a consideração.
Finalmente, uma movimentação como essa, ainda que pontual, surte algum efeito. Ou ninguém reparou na insistente propaganda do governo do Estado, falando sobre os novos 2.000 policiais que em breve estarão nas ruas? Considero ingênuo supor que a morte de Nahmias e a repercussão que trouxe não provocou nenhum efeito concreto no governo. É claro que sim, ainda mais se tratando a vítima de uma pessoa com trânsito nos mesmos meios de quem tem o poder decisório — a governadora e os parlamentares.
Respeitemos a dor alheia. E suas boas iniciativas. Não é uma menina bonita com um cachorro no colo, em plena passeata, que porá a perder a ideia. Pelo menos, é o que pensa este cidadão que adora ver a sociedade sair de sua inércia habitual.
Já falei várias vezes sobre a raiva que me dá a incapacidade de uns tantos de fixar o real foco do debate. Seja por má fé ou por limitação intelectual, desvirtua-se o conteúdo e se envereda por discussões, muitas vezes toscas e sem qualquer utilidade. No caso a que me refiro, o que se estabeleceu foi um ingrediente perigosíssimo da sociedade de nossos tempos: o ódio entre classes. De repente, começaram a chover críticas contra a elite e os ricos. Arruda fez uma intervenção oportuna, basicamente para reconhecer o direito dos manifestantes de se manifestar, mas pelo visto não deu muito resultado.
Há algum tempo, fez-se um estardalhaço no país por causa do roubo de um Rolex avaliado em 50 mil reais, do pulso de Luciano Huck, que escreveu na Internet um desabafo sobre a insegurança. O cantor Zeca Baleiro subiu nas tamancas e esculhambou Huck, culpando-o por carregar no pulso algo cujo valor alimentaria muitas famílias. Mesmo não vendo nada demais em Huck e sendo fã de Baleiro, dei razão ao primeiro. Afinal, não se trata do que eu tenho, mas de eu possuir o direito de usufruir do que tenho. Huck não era menos vítima por ser rico. Ele também conheceu a violência que é estar sob a mira de uma arma. Ele também poderia ter sido ferido ou morto. E, claro, tem todo o direito de se indignar com isso. Demais disso, não é culpa dele se as pessoas — pobres ou ricas — estão em perigo nas ruas.
Dito isto, considero indecente negar à classe média ou alta de Belém do Pará o direito de protestar, de se insurgir, de criticar o Estado pela insegurança que acomete a todos nós, e a eles, com muito mais patrimônio ameaçado. Boa parte dessas críticas inclusive falta com o dever de solidariedade humana, na medida em que havia muita gente ali amargando a dor de pessoas amadas mortas. Seus motivos e seus objetivos são justos e merecem toda a consideração.
Finalmente, uma movimentação como essa, ainda que pontual, surte algum efeito. Ou ninguém reparou na insistente propaganda do governo do Estado, falando sobre os novos 2.000 policiais que em breve estarão nas ruas? Considero ingênuo supor que a morte de Nahmias e a repercussão que trouxe não provocou nenhum efeito concreto no governo. É claro que sim, ainda mais se tratando a vítima de uma pessoa com trânsito nos mesmos meios de quem tem o poder decisório — a governadora e os parlamentares.
Respeitemos a dor alheia. E suas boas iniciativas. Não é uma menina bonita com um cachorro no colo, em plena passeata, que porá a perder a ideia. Pelo menos, é o que pensa este cidadão que adora ver a sociedade sair de sua inércia habitual.
domingo, 21 de dezembro de 2008
O gosto pelo trabalho
Texto atualizado em 22.12.2008:
Num país que despreza a leitura, o jornalista Laurentino Gomes pode se considerar um vencedor. Ele é autor de 1808: Como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a História de Portugal e do Brasil, que se tornou um dos maiores sucessos editoriais recentes no Brasil (para felicidade da Editora Planeta), embalado pelas comemorações dos 200 anos da chegada da família real por estas paragens.
Desde o seu lançamento, estava ávido por ler a obra — aficcionado por História que sou. Mas somente agora surgiu a oportunidade. A preocupação enorme e declarada de Gomes em produzir um texto "acessível" surtiu efeito. As páginas se sucedem em grande velocidade, numa leitura que em momento algum deixa de ser instigante. Vencidas 166 páginas em pouco mais de três horas, constato que o autor merece os muitos elogios que lhe têm sido feitos.
Das muitas coisas interessantes que encontrei no livro, destaco uma. Abdicando-se da ridícula história oficial — que já foi objeto de críticas aqui no blog —, conhecendo-se a história revisitada e real, aprendemos que a colonização portuguesa está na raiz de algumas características bastante odiosas que os brasileiros apresentam ainda hoje e das quais não parecem dispostos a desistir. Uma delas é descrita nestes termos:
Sérgio Buarque de Holanda, autor do clássico Raízes do Brasil, mostrou que no Brasil colônia se tinha aversão ao trabalho. Segundo ele, o objetivo da aventura extrativista era explorar rapidamente toda a riqueza disponível com o menor esforço e sem nenhum compromisso com o futuro: "O que o português vinha buscar era, sem dúvida, a riqueza, mas riqueza que custa ousadia, não riqueza que custa trabalho" (Gomes, ob. cit., p. 61).
Em capítulo posterior, Gomes explica que muitos escravos recebiam autorização de seus donos para alugar sua força de trabalho. Eram os chamados "pretos de ganho", que podiam até auferir bons lucros, mas estes beneficiavam seus donos e os agenciadores dessa mão de obra (se bem que muitos podiam guardar parte do lucro e comprar a própria liberdade). Segundo James Tuckey, viajante que esteve no país naquela época, citado por Gomes, "Todos os que conseguem adquirir meia dúzia de escravos passam a viver na mais completa ociosidade — explorando os rendimentos do trabalho dos seus negros — e a caminhar pela rua solenemente, com grande empáfia".
A aversão ao trabalho ainda é uma característica forte do brasileiro. Basta ver que, nas manjadérrimas reportagens sobre prêmios acumulados da loteria, a resposta "eu não trabalharia nunca mais" é uma das mais fornecidas. Este pensamento lamentável não se limita aos assalariados ultra-explorados por maus empregadores ou aos que labutam no mercado informal. É uma opinião reinante entre pessoas de condições sociais privilegiadas, inclusive de formação superior, que poderiam usar esse dinheiro para empreendimentos audaciosos e confortáveis, como constatei pessoalmente em várias ocasiões. O negócio é viver na gandaia, mesmo.
Nossas origens apontam, também, para a mentalidade dilapidadora: lucro fácil e exorbitante, ao custo de qualquer destruição ambiental, social ou humana. Assim se conduzem as Vales da vida, mas também qualquer madeireiro, por menor que seja.
Por fim, uma outra característica detestável: é só ganhar alguns tostões ou um arremedo de poder e o sujeito se sente melhor que os outros, fazendo questão de externar isso.
Longe de mim validar teses lombrosianas. Mas que a genética do brasileiro não é das melhores, infelizmente não é.
Livros à disposição
Finalmente, o semestre letivo se encerrou. Paralelamente, um recesso na outra atividade profissional me permitirá alguns dias de descanso. Eles são sempre muito bem vindos, considerando a pauleira que o encerramento de todo semestre letivo costuma ser. E olha que este foi até algo mais leve do que os anteriores. Mas é melhor não elogiar.
Agora que posso tirar o relógio do pulso e não me preocupar com rotinas, meus olhos brilham em torno do precioso tesouro que tenho dentro de caixas desde que me mudei, há seis meses: meus livros. Muitos deles ainda estão lacrados. Outros tiveram uma ou outra página lida. Alguns são apenas para consulta, mesmo. Outros são aquisições tão recentes que ainda estão na sacola da livraria. Minha meta é organizá-los com a dignidade que merecem e me danar a ler — seja pensando nas aulas a partir de fevereiro (alguns títulos são técnicos), seja para o meu mais profundo deleite — romances, poesia, ensaios.
Engraçado. Noite dessas, enquanto meus alunos faziam prova, eu usava o notebook para alguns lançamentos acadêmicos. Quando terminei, acessei a Wikipedia em busca de alguns conceitos. Incomoda-me não ter a menor ideia do que sejam algumas expressões que escuto com certa frequência. Fui atrás delas. Nesse momento, um aluno se aproximou e olhou a tela. Pegou-me lendo sobre música. Riu e me perguntou se eu não parava de estudar. Eu não estava estudando, apenas reduzindo um pouco o arcabouço da minha enguinorança. Fica, contudo, a impressão de que só podemos acessar a Internet para o Orkut, se não estamos trabalhando.
Trarei aqui para o blog algumas informações muito interessantes que encontrei nesses livros, mesmo em rápidas olhadas. É por isso que os livros são tão bons. Até sem querer, fazem nossas vidas mais interessantes.
Boa leitura.
Agora que posso tirar o relógio do pulso e não me preocupar com rotinas, meus olhos brilham em torno do precioso tesouro que tenho dentro de caixas desde que me mudei, há seis meses: meus livros. Muitos deles ainda estão lacrados. Outros tiveram uma ou outra página lida. Alguns são apenas para consulta, mesmo. Outros são aquisições tão recentes que ainda estão na sacola da livraria. Minha meta é organizá-los com a dignidade que merecem e me danar a ler — seja pensando nas aulas a partir de fevereiro (alguns títulos são técnicos), seja para o meu mais profundo deleite — romances, poesia, ensaios.
Engraçado. Noite dessas, enquanto meus alunos faziam prova, eu usava o notebook para alguns lançamentos acadêmicos. Quando terminei, acessei a Wikipedia em busca de alguns conceitos. Incomoda-me não ter a menor ideia do que sejam algumas expressões que escuto com certa frequência. Fui atrás delas. Nesse momento, um aluno se aproximou e olhou a tela. Pegou-me lendo sobre música. Riu e me perguntou se eu não parava de estudar. Eu não estava estudando, apenas reduzindo um pouco o arcabouço da minha enguinorança. Fica, contudo, a impressão de que só podemos acessar a Internet para o Orkut, se não estamos trabalhando.
Trarei aqui para o blog algumas informações muito interessantes que encontrei nesses livros, mesmo em rápidas olhadas. É por isso que os livros são tão bons. Até sem querer, fazem nossas vidas mais interessantes.
Boa leitura.
sexta-feira, 19 de dezembro de 2008
Se não presta, copiam
A coluna Repórter 70 de hoje noticia que a bandidagem que grassa no Estado tem sido glorificada nas festas de aparelhagem, uma das marcas registradas da cidade (fazer o quê?...). Segundo a coluna, é crescente a relação entre tais eventos e a apologia de crime, citando uma gangue chamada "Galera do Aurá", que já teria "música" em sua homenagem.
Nada além de uma cópia dos batidões do funk carioca, que homenageia o crime organizado, notadamente o narcotráfico. Mais uma vez, o culto ao que não presta é copiado nestas paragens. Não me surpreende. Se aqui os mano anda de gorro de lã enfiado na cabeça para ficar parecido com os marginais cariocas, nada mais natural que as principais festas no nível popularesco também ganhassem essa nova e deplorável feição. A cópia, contudo, é pior do que o original. A uma, pelo simples fato de ser uma cópia desmotivada, o que ressalta a mediocridade. A duas e mais importante, porque os funkeiros cariocas estão homenageando as pessoas que concretamente lhes dão algum tipo de assistência ou proteção na favela (digo, na comunidade), ao passo que, aqui, a honraria é gratuita, baseada única e exclusivamente no desejo de escandalizar.
Valeu para a banda Planet Hemp, valeu para os batidões do funk (foram proibidos, inclusive mediante censura nas rádios), então vale em Belém do Pará também: apologia de crime ou criminoso é crime, segundo o art. 287 do Código Penal, com pena cominada em 3 a 6 meses de detenção, ou multa. A polícia pode e deve reprimir. Simples assim.
O mais chato disso é que se cria uma imagem de que as pessoas pobres, que buscam nesse tipo de festa uma diversão acessível ao seu bolso, aprovam e têm interesse no crime, criando uma injusta e terrível relação entre ser pobre e ser bandido. Alimenta-se, assim, o ódio entre as classes sociais. Pior é pensar que o setor prejudicado nessa avaliação, à míngua de outros meios de se destacar socialmente, ainda fomentará e adorará a imagem. Parece um redemoinho na água: um caos onde você só é puxado para baixo.
Os promotores das festas de aparelhagem e os donos das mesmas poderiam colaborar e iniciar espontaneamente uma campanha pelo fim desse tipo de apologia. Antes de mais nada, seria bom para eles.
Nada além de uma cópia dos batidões do funk carioca, que homenageia o crime organizado, notadamente o narcotráfico. Mais uma vez, o culto ao que não presta é copiado nestas paragens. Não me surpreende. Se aqui os mano anda de gorro de lã enfiado na cabeça para ficar parecido com os marginais cariocas, nada mais natural que as principais festas no nível popularesco também ganhassem essa nova e deplorável feição. A cópia, contudo, é pior do que o original. A uma, pelo simples fato de ser uma cópia desmotivada, o que ressalta a mediocridade. A duas e mais importante, porque os funkeiros cariocas estão homenageando as pessoas que concretamente lhes dão algum tipo de assistência ou proteção na favela (digo, na comunidade), ao passo que, aqui, a honraria é gratuita, baseada única e exclusivamente no desejo de escandalizar.
Valeu para a banda Planet Hemp, valeu para os batidões do funk (foram proibidos, inclusive mediante censura nas rádios), então vale em Belém do Pará também: apologia de crime ou criminoso é crime, segundo o art. 287 do Código Penal, com pena cominada em 3 a 6 meses de detenção, ou multa. A polícia pode e deve reprimir. Simples assim.
O mais chato disso é que se cria uma imagem de que as pessoas pobres, que buscam nesse tipo de festa uma diversão acessível ao seu bolso, aprovam e têm interesse no crime, criando uma injusta e terrível relação entre ser pobre e ser bandido. Alimenta-se, assim, o ódio entre as classes sociais. Pior é pensar que o setor prejudicado nessa avaliação, à míngua de outros meios de se destacar socialmente, ainda fomentará e adorará a imagem. Parece um redemoinho na água: um caos onde você só é puxado para baixo.
Os promotores das festas de aparelhagem e os donos das mesmas poderiam colaborar e iniciar espontaneamente uma campanha pelo fim desse tipo de apologia. Antes de mais nada, seria bom para eles.
Disparidades
Olha, eu sei que o conteúdo desta postagem é excessivamente batido e tem lá uma dose de despeito de classes, mas não posso simplesmente não achar nada do fato de que um acionamento acidental do alarme da casa de Hebe Camargo, esta madrugada, rendeu uma varredura policial, com apoio até de um helicóptero!
Enquanto isso, falta policiamento de rotina para o cidadão comum. Se você ligar para o 190, não será sequer atendido.
E assim vamos fazendo justiça social no Brasil!
Enquanto isso, falta policiamento de rotina para o cidadão comum. Se você ligar para o 190, não será sequer atendido.
E assim vamos fazendo justiça social no Brasil!
Flanando nos blogs referenciados
Dando razão a Rosana Hermann, escrever um blog é produzir prova contra nós mesmos.
Alexandre Inagaki louva a iniciativa de Glória Perez — tudo bem, suas novelas enchem a paciência, mas não podemos negar que ela é uma inovadora em temas — de convidar vários blogueiros (dentre os quais o próprio Inagaki) para um bate-papo com ela no PROJAC. O motivo: debater ideias para colocar em sua próxima novela, Caminha dos Índias, onde um personagem manterá um blog. A blogosfera será assunto abordado no folhetim.
Val-André Mutran inaugura a nova aparência de seu blog, mais enxuta e mais rápida de carregar, sempre tratando dos palpitantes assuntos da República das Bananas, sem esquecer a música.
A teóloga Maria Clara Lucchetti Bingemer reverencia o centenário de nascimento de Josué de Castro, a quem define como "o maior pensador sobre a manifestação maior da injustiça sócio-econômica em nosso país: a fome". Vale a pena conferir, no Jornal Recomeço, de Glória Reis.
O grande Gerivaldo Alves Neiva, juiz de Conceição do Coité (BA), apresenta uma adorável crônica sobre as pequenas gentilezas do cotidiano, que podem tornar melhor o dia de alguém. Ou a vida.
O juiz federal George Marmelstein ensina um novo conceito para o Direito brasileiro: o de Katchanga. Nenhum W será X ou Y sem Z. E dá-lhe lógica!
Leonardo Nóvoa esculhamba o país da esculhambação. E eu concordo com ele.
Alexandre Inagaki louva a iniciativa de Glória Perez — tudo bem, suas novelas enchem a paciência, mas não podemos negar que ela é uma inovadora em temas — de convidar vários blogueiros (dentre os quais o próprio Inagaki) para um bate-papo com ela no PROJAC. O motivo: debater ideias para colocar em sua próxima novela, Caminha dos Índias, onde um personagem manterá um blog. A blogosfera será assunto abordado no folhetim.
Val-André Mutran inaugura a nova aparência de seu blog, mais enxuta e mais rápida de carregar, sempre tratando dos palpitantes assuntos da República das Bananas, sem esquecer a música.
A teóloga Maria Clara Lucchetti Bingemer reverencia o centenário de nascimento de Josué de Castro, a quem define como "o maior pensador sobre a manifestação maior da injustiça sócio-econômica em nosso país: a fome". Vale a pena conferir, no Jornal Recomeço, de Glória Reis.
O grande Gerivaldo Alves Neiva, juiz de Conceição do Coité (BA), apresenta uma adorável crônica sobre as pequenas gentilezas do cotidiano, que podem tornar melhor o dia de alguém. Ou a vida.
O juiz federal George Marmelstein ensina um novo conceito para o Direito brasileiro: o de Katchanga. Nenhum W será X ou Y sem Z. E dá-lhe lógica!
Leonardo Nóvoa esculhamba o país da esculhambação. E eu concordo com ele.
Que fazer com a liberdade?
Caroline Pivetta da Mota está livre. Refiro-me à pichadora mais famosa do país (na foto de Luísa Brito/G1, deixando a Penitenciária Feminina de Sant'Ana há cerca de uma hora — maravilha a Internet, não?).
Sim, ela merece o título porque, devido à ampla exploração de seu caso pela mídia, neste momento nenhum jovem transgressor por livre escolha é tão badalado quanto ela. Por mais que eu reprove isso, antes ela que um Leonardo Pareja da vida. Se não sabe quem foi Pareja, procure no Google (hoje não estou muito a fim de ter trabalho com consultas e links).
Na saída da carceragem, uma comemoração debochada e a glorificação de sua gangue. Podemos apostar que a festa acontecerá nos muros da cidade. Afinal, segundo a própria jovem, o que ela gosta é pichar coisas feias para agredir.
Já afirmei anteriormente que o tratamento persecutório dado a Pivetta (continuo achando o nome apropriado) foi realmente duro, sob a ótica estritamente penal. Contudo, tenho a nítida impressão que a moçoila pertence àquela categoria incorrigível, ainda mais quando se sente tão apoiada por todos os lados.
Esta é a crônica de uma pichação anunciada. Vem mais sujeira pela frente. Afinal, agora a proposta pode ser explorar a fama para agredir, desafiar e, quem sabe, levar a melhor de novo. Preparem-se para os próximos 15 minutos de celebridade. Inclusive o advogado.
quinta-feira, 18 de dezembro de 2008
Transplante de rosto inteiro
Sempre defendendo que a ciência existe para melhorar a vida das pessoas, comemoro cada avanço. O mais recente foi o primeiro transplante de rosto inteiro do mundo.
Felicitações à equipe médica de Cleveland. Considerando que um progresso puxa outros, o mundo todo deveria agradecer.
Felicitações à equipe médica de Cleveland. Considerando que um progresso puxa outros, o mundo todo deveria agradecer.
quarta-feira, 17 de dezembro de 2008
Direito ao adultério
Ok So-ri é uma atriz sul-coreana, famosíssima em seu país, que hoje, a seis dias de completar 40 anos, foi condenada a oito meses de prisão pela Justiça de Goyang, cidade próxima a Seul. Seu crime: adultério. So-ri confessou ter mantido um caso extraconjugal com um cantor pop.
Ao se defender, a atriz suscitou um argumento a meu ver absolutamente correto: uma lei que criminaliza o adultério viola os direitos humanos. Não entrarei na discussão, já apresentada aqui no blog, de que a monogamia seria contrária à natureza. Limito-me a um argumento bem mais rotineiro: o Direito não deve ser utilizado como instrumento para impor moral.
A criminalização do adultério somente se explica por uma inconveniente positivação de padrões morais, cuja imposição viola o livre-arbítrio e, por conseguinte, a própria humanidade. O Direito pode nos obrigar a não causar danos a terceiros, mas não a possuir certas virtudes, como a fidelidade.
A criminalização do adultério somente se explica por uma inconveniente positivação de padrões morais, cuja imposição viola o livre-arbítrio e, por conseguinte, a própria humanidade. O Direito pode nos obrigar a não causar danos a terceiros, mas não a possuir certas virtudes, como a fidelidade.
Infelizmente para So-ri, seu caso não foi julgado por mim, mas por seus conterrâneos. A decisão provavelmente provocará reações mundo afora, mas o primeiro aspecto a considerar é o princípio da autodeterminação dos povos. A comunidade internacional pode ter opinião, mas não intervir sobre um assunto interno da Coreia do Sul (sua soberania para estabelecer suas leis). O debate, assim, será mais produtivo se grassar no próprio país, levando a uma conclusão, pelos próprios sul-coreanos, sobre se o adultério deve ou não constituir crime.
Adultério foi crime no Brasil até 2005, quando a Lei n. 11.106 revogou o art. 240 do Código Penal. Isto aconteceu pelo reconhecimento de que, há décadas, ninguém reagia a uma traição através do crime em apreço. Portanto, a lei foi adequada a uma prática social já instalada.
Ambiguidades da notícia
Mas se o jacaré estava em casa, por que não deixaram o bicho em paz? Será que o pobre réptil não pode ter respeitado o direito constitucional à inviolabilidade do domicílio?
Felizmente, a notícia principal apresentava uma manchete um pouco mais clara.
Eu me divirto com essas derrapadas, mas elas depõem contra a equipe responsável pelas notícias, tanto contra quem escreve quanto contra o revisor. Se houver um.
Boa sorte para ele e para nós
Este senhor simpático aí ao lado (foto de Thiago Araújo) se chama Evaldo Rosa e é um dos poucos vereadores eleitos que representam uma novidade na composição da Câmara Municipal de Belém, que continua abrigando uns tantos dos mesmos péssimos nomes de sempre. Mas não procure esse nome na lista. Procure "Cobrador Pregador" — e não "Cobrador Pegador", como insisto em chamá-lo, por equívoco recorrente; afinal, o rapaz é evangélico.
Rosa ficou algo famoso ao se eleger fora dos esquemas suspeitíssimos impostos atualmente para se conseguir um mandato eletivo. Usando uma caixa de som doada pelo cantor Pinduca, que instalou em sua bicicleta, Rosa fez campanha boca a boca, pelas ruas do Guamá. E deu certo. Por isso o admiro. Elegeu-se sem assumir compromissos espúrios com ninguém. Espero que isso adiante quando a coisa começar para valer. E já que ele pretende seguir as orientações do partido, espero que o PPS ajude, em vez de atrapalhar.
Espero, sobretudo, que Rosa permaneça fiel aos seus valores morais, porque estará em um ambiente propício a perdê-los. Mas com a Câmara que temos e com a prefeitura que continuaremos a ter...
Boa sorte, cobrador.
Boa sorte, cobrador.
Interrogatório por videoconferência
O senador Aloísio Mercadante apresentou projeto de lei instituindo o interrogatório do réu e outros atos processuais através de videoconferência. O PLS 679/2007 foi aprovado e encaminhado à Câmara dos Deputados, agora como PL 4361/2008. Apreciado pelas comissões técnicas em caráter conclusivo, ou seja, sem a necessidade de votação em plenário, foi aprovado e remetido à sanção da presidência da República no último dia 9. Isto significa que, nos próximos dias, o Brasil finalmente poderá ter a inovação tecnológica instituída.
Recentemente, foi declarada a inconstitucionalidade de uma lei do Estado de São Paulo com a mesma finalidade. O motivo foi de ordem formal: apenas a União pode legislar sobre Direito Penal e processo.
Eis a nova redação do art. 185 do Código de Processo Penal, segundo o projeto sob comento:
"Art. 185. (...)
§ 1º O interrogatório do réu preso será realizado, em sala própria, no estabelecimento em que estiver recolhido, desde que estejam garantidas a segurança do juiz, do membro do Ministério Público e dos auxiliares, bem como a presença do defensor e a publicidade do ato.
§ 2º Excepcionalmente, o juiz, por decisão fundamentada, de ofício ou a requerimento das partes, poderá realizar o interrogatório do réu preso por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, desde que a medida seja necessária para atender a uma das seguintes finalidades:
I – prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento;
II – viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal;
III – impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do art. 217 deste Código;
IV – responder a gravíssima questão de ordem pública.
§ 3º Da decisão que determinar a realização de interrogatório por videoconferência, as partes serão intimadas com 10 (dez) dias de antecedência.
§ 4º Antes do interrogatório por videoconferência, o preso poderá acompanhar, pelo mesmo sistema tecnológico, a realização de todos os atos da audiência única de instrução e julgamento de que tratam os arts. 400, 411 e 531, deste Código.
§ 5º Em qualquer modalidade de interrogatório, o juiz garantirá ao réu o direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor; se realizado por videoconferência, fica também garantido o acesso a canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio e advogado presente na sala de audiência do Fórum, e entre este e o preso.
§ 6º A sala reservada no estabelecimento prisional para a realização de atos processuais por sistema de videoconferência será fiscalizada pelos corregedores e pelo juiz de cada causa, como também pelo Ministério Público e pela Ordem dos Advogados do Brasil.
§ 7º Será requisitada a apresentação do réu preso em juízo, nas hipóteses em que o interrogatório não se realizar na forma prevista nos §§ 1º e 2º deste artigo.
§ 8º Aplica-se o disposto nos §§ 2º, 3º, 4º e 5º deste artigo, no que couber, à realização de outros atos processuais que dependam da participação de pessoa que esteja presa, como acareação, reconhecimento de pessoas e coisas, e inquirição de testemunha ou tomada de declarações do ofendido.
§ 9º Na hipótese do § 8º deste artigo, fica garantido o acompanhamento do ato processual pelo acusado e seu defensor." (NR)
A nossa briosa Ordem dos Advogados do Brasil é contra a videoconferência. Alegando que o interrogatório é a oportunidade que o réu possui de fazer a sua defesa pessoal, o que procede, sustenta que a videoconferência dificulta essa possibilidade porque retira o "olho no olho". Este argumento considero uma completa asneira. Naturalmente, as críticas da OAB não se resumem a isso, envolvendo também comprometimentos à atuação do advogado.
Mesmo não sendo um entusiasta da tecnologia, entendo que nos adaptarmos a ela é um caminho sem volta. Os benefícios da videoconferência são inegáveis. Só a economia — refiro-me a dinheiro, sim — com o transporte dos presos já seria um bom argumento. Mas a questão da segurança é o fator mais importante. Aqui no Pará não temos histórico significativo de resgate de presos durante transporte terrestre, mas em outros Estados o poder do narcotráfico e do crime organizado não podem ser desprezados. Se até caminhões são atirados contra a parede da delegacia, para arrombá-la, imagine o que mais não estão dispostos a fazer. E por qual razão Fernandinho Beira-Mar só passeia de helicóptero se não a desgraça que seria se tentassem removê-lo pelo chão? Riscos intensos não apenas para o preso, cuja incolumidade está a cargo do Estado, mas para os agentes penitenciários e policiais, além da população civil, que pode ser surpreendida em qualquer esquina com um tiroteio durante resgate.
Outrossim, já perdi a conta dos processos que foram retardados por anos a fio, devido a falhas ou impossibilidades no transporte de presos, obrigando a redesignação das audiências.
Enfim, temos que pensar em como o mundo é hoje: seus perigos e as ferramentas capazes de desviar deles. Se a videoconferência não é o melhor sistema, não se pode negar que o modelo atual tampouco o é. Principalmente quando o juiz finge que interroga, o defensor finge que defende e o promotor de justiça finge que está presente ao ato.
Recentemente, foi declarada a inconstitucionalidade de uma lei do Estado de São Paulo com a mesma finalidade. O motivo foi de ordem formal: apenas a União pode legislar sobre Direito Penal e processo.
Eis a nova redação do art. 185 do Código de Processo Penal, segundo o projeto sob comento:
"Art. 185. (...)
§ 1º O interrogatório do réu preso será realizado, em sala própria, no estabelecimento em que estiver recolhido, desde que estejam garantidas a segurança do juiz, do membro do Ministério Público e dos auxiliares, bem como a presença do defensor e a publicidade do ato.
§ 2º Excepcionalmente, o juiz, por decisão fundamentada, de ofício ou a requerimento das partes, poderá realizar o interrogatório do réu preso por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, desde que a medida seja necessária para atender a uma das seguintes finalidades:
I – prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento;
II – viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal;
III – impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do art. 217 deste Código;
IV – responder a gravíssima questão de ordem pública.
§ 3º Da decisão que determinar a realização de interrogatório por videoconferência, as partes serão intimadas com 10 (dez) dias de antecedência.
§ 4º Antes do interrogatório por videoconferência, o preso poderá acompanhar, pelo mesmo sistema tecnológico, a realização de todos os atos da audiência única de instrução e julgamento de que tratam os arts. 400, 411 e 531, deste Código.
§ 5º Em qualquer modalidade de interrogatório, o juiz garantirá ao réu o direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor; se realizado por videoconferência, fica também garantido o acesso a canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio e advogado presente na sala de audiência do Fórum, e entre este e o preso.
§ 6º A sala reservada no estabelecimento prisional para a realização de atos processuais por sistema de videoconferência será fiscalizada pelos corregedores e pelo juiz de cada causa, como também pelo Ministério Público e pela Ordem dos Advogados do Brasil.
§ 7º Será requisitada a apresentação do réu preso em juízo, nas hipóteses em que o interrogatório não se realizar na forma prevista nos §§ 1º e 2º deste artigo.
§ 8º Aplica-se o disposto nos §§ 2º, 3º, 4º e 5º deste artigo, no que couber, à realização de outros atos processuais que dependam da participação de pessoa que esteja presa, como acareação, reconhecimento de pessoas e coisas, e inquirição de testemunha ou tomada de declarações do ofendido.
§ 9º Na hipótese do § 8º deste artigo, fica garantido o acompanhamento do ato processual pelo acusado e seu defensor." (NR)
A nossa briosa Ordem dos Advogados do Brasil é contra a videoconferência. Alegando que o interrogatório é a oportunidade que o réu possui de fazer a sua defesa pessoal, o que procede, sustenta que a videoconferência dificulta essa possibilidade porque retira o "olho no olho". Este argumento considero uma completa asneira. Naturalmente, as críticas da OAB não se resumem a isso, envolvendo também comprometimentos à atuação do advogado.
Mesmo não sendo um entusiasta da tecnologia, entendo que nos adaptarmos a ela é um caminho sem volta. Os benefícios da videoconferência são inegáveis. Só a economia — refiro-me a dinheiro, sim — com o transporte dos presos já seria um bom argumento. Mas a questão da segurança é o fator mais importante. Aqui no Pará não temos histórico significativo de resgate de presos durante transporte terrestre, mas em outros Estados o poder do narcotráfico e do crime organizado não podem ser desprezados. Se até caminhões são atirados contra a parede da delegacia, para arrombá-la, imagine o que mais não estão dispostos a fazer. E por qual razão Fernandinho Beira-Mar só passeia de helicóptero se não a desgraça que seria se tentassem removê-lo pelo chão? Riscos intensos não apenas para o preso, cuja incolumidade está a cargo do Estado, mas para os agentes penitenciários e policiais, além da população civil, que pode ser surpreendida em qualquer esquina com um tiroteio durante resgate.
Outrossim, já perdi a conta dos processos que foram retardados por anos a fio, devido a falhas ou impossibilidades no transporte de presos, obrigando a redesignação das audiências.
Enfim, temos que pensar em como o mundo é hoje: seus perigos e as ferramentas capazes de desviar deles. Se a videoconferência não é o melhor sistema, não se pode negar que o modelo atual tampouco o é. Principalmente quando o juiz finge que interroga, o defensor finge que defende e o promotor de justiça finge que está presente ao ato.
terça-feira, 16 de dezembro de 2008
Os bem intencionados Campbell
A família Campbell, de Easton (Pensilvânia, EUA), é composta pelo marido Heath, pela esposa Deborah e por três filhos: Adolf Hitler, Honszlynn Hinler Jeannie e JoyceLynn Aryan Nation.
Adolf Hitler você sabe quem foi. Para o caso de estar desinformado, Hinler é uma grafia incorreta que remete a Heinrich Luitpold Himmler (1900-1945), líder das SS e da Gestapo, um dos maiores expoentes do primeiro escalão do Führer. E "Aryan Nation" é somente "nação ariana" em inglês. Ao eleger esses nomes para seus pimpolhos, os simpáticos Campbell revelam certas preferências. Nem precisa dizer que a decoração de sua residência envolve um monte de suásticas.
Embora o pai diga que "são apenas nomes" e que não há motivo para alarde, as crianças já começam a sofrer as consequências da sandice dos pais. Pesquisando no Google, encontram-se muitas páginas na Internet falando sobre as três crianças e seus nomes, com óbvias reações de repulsa aos neonazistas. A julgar por isso, o futuro desses garotos não será tão simples quanto o papai pensa.
Pior mesmo é pensar nos valores que eles estão absorvendo.
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