Anjos do sol

E já que estamos nas dicas culturais, recomendo o premiado filme de Rudi Lagemann, Anjos do sol, que vi ontem à noite. Trata-se de um relato ficcional, porém verossímil e respeitável, da exploração sexual no Brasil, tanto que a origem do roteiro são reportagens publicadas sobre o tema. Você assiste e sente que as coisas acontecem mesmo daquele jeito.
A trama se desenvolve, em síntese, assim: uma família miserável vende uma filha, na expectativa de que ao menos ela tenha uma vida melhor. O filme dá a entender que as famílias sabem o que vai acontecer, mas eu, pessoalmente, quero crer que elas fantasiam uma possibilidade de suas meninas serem mesmo mais felizes, eis que ter o que comer é o máximo de felicidade que concebem. Penso que eles vendem suas filhas para serem, talvez, teúdas e manteúdas de homens ricos, tendo assim a oportunidade de ao menos viver. Não aquilatam a escravização sexual que sofrerão, abusadas inicialmente por fazendeiros, que querem desvirginá-las e, após enjoar da novidade, vendem-nas para garimpos, onde o sentido de escravidão chega ao seu ápice.
Anjos do sol é um ótimo filme e eu diria mais: todos deveriam vê-lo. Mas não há como sair feliz do cinema. Não há como sair sem se estar perturbado ou, como minha esposa, até culpada por ser tão feliz. Quem não gosta de ir ao cinema para ver as misérias humanas, passe longe. Mas quem não vê no cinema apenas uma desculpa para desligar o cérebro — coisa que ninguém deveria fazer jamais —, deve ir sem falta.

Acréscimo em 4.9.2011
Melhorando a ideia: mesmo que sabendo que as filhas seriam prostituídas, talvez pensassem que isso seria melhor do que passar fome, porque não eram capazes de aquilatar o tamanho da violência que sofreriam. Além disso, pessoas carentes de tudo se lançam com mais conformismo ao sofrimento, como se dele fosse impossível escapar. Muitas vezes é.