domingo, 30 de junho de 2013

Deixando meu adeus a junho

E lamentando profundamente não ter usufruído dos quitutes juninos como gostaria. Já virou rotina: as obrigações profissionais do período não me permitem. Mas, ao menos, o mês está terminando bem e julho começará melhor ainda, já que, a partir de amanhã:

  • os salários de todos os brasileiros terá aumentado em 300%, no mínimo;
  • a alíquota do imposto de renda cairá para 10% e receberemos o que pagamos a mais, retroativamente aos últimos 5 anos;
  • o índice de desenvolvimento humano do Brasil passará a níveis suecos;
  • teremos alcançado a excelência acadêmica e zerado o déficit dos ensinos fundamental e médio;
  • todo brasileiro a partir de 60 anos estará automaticamente aposentado, com proventos integrais;
  • os serviços de internet, telefonia, TV a cabo, energia elétrica e água atingirão níveis de qualidade sem comparação com qualquer outro país do mundo;
  • nossos índices de criminalidade cairão para os níveis históricos mais baixos e serão representados apenas por delitos de menor importância;
  • estradas e hospitais absolutamente perfeitos brotarão do solo, já em plena capacidade de funcionamento;
  • os políticos corruptos amanhecerão mortos e seus lugares serão ocupados por homens e mulheres de boa vontade;
  • não haverá mais preconceito de nenhuma espécie;
  • cada clareira desmatada voltará a ser uma pujante floresta;
  • e o Brasil será uma grande nação de homens cultos e livres.
Espere para ver. Basta acordar.

Histeria brasileira

Você percebe que há algo de muito grave acontecendo quando o capitalista, aquele que não joga para perder, manda fechar o seu supermercado antes das 16 horas, por causa de uma bosta de jogo que só começará às 19 horas. E tudo isso sem aviso prévio, ou ao menos eu, que sempre acesso os portais de notícias, não tive o privilégio de ser informado.

Graças a isso, não terminei minhas compras, porque já não havia quem me atendesse no açougue, na padaria e no setor de hortifrutigranjeiros, cujas mercadorias precisam ser pesadas. Sem falar na sensação desagradável de andar numa loja imensa, vazia, exceto por um funcionário que nos espreitava de longe, como se fôssemos ladrões. Ao final de nossa missão incompleta, éramos as únicas pessoas no supermercado, além dos funcionários. E as luzes iam-se apagando.

E nem havia a quem reclamar. Afinal, todos os demais são brasileiros. Exceto nós, segundo a mediocridade geral. Tudo isto, a meu ver, é motivo de fúria.

***

No trajeto de volta para casa, meu irmão mencionou ter presenciado a ira de um sujeito, reclamando do fato de o jogo acontecer à noite. Por causa disso, não haveria tempo para comemorar. Claro, claro, é preciso encher a cara por muitas horas para extravasar a felicidade da vitória do Brasil!

A canção "Perfeição", minha favorita da Legião Urbana, segue sendo absurdamente atual e precisa. Vamos cantar juntos o hino nacional!

Prioridades tucanas

Até porque, dia desses, fiz uma crítica ao modo de governar dos tucanos, que foi objeto de réplica, aqui vai o link para uma postagem de A Perereca da Vizinha, blog da jornalista Ana Célia Pinheiro, que, quando escreve, mata a cobra e mostra a cobra morta (já que o pau não é prova bastante):

http://pererecadavizinha.blogspot.com.br/2013/06/prefeitura-de-belem-nao-tem-dinheiro.html

Eu quis dizer que, quando Ana Célia escreve, sempre apresenta provas documentais, de origem oficial, para comprovar as suas alegações.

Belém não fez investimentos para a copa do mundo, mas nossa praia aqui é outra: publicidade. A velha questão da publicidade. Já são 3 milhões de reais empenhados, em apenas 6 meses da gestão de Zenaldo "Não Sou Mágico" Coutinho, em favor de uma única agência de publicidade, a Griffo, a oficial do tucanato paraense.

3 milhões de reais. Infinitamente menos do que seria necessário para evitar que estas cenas aqui tivessem ocorrido. Inventei de assistir a esse vídeo antes de me deitar e consegui uma boa hora de mal estar, na cama, pensando naquelas imagens. Sou pai, afinal de contas. Eu me ponho no lugar e me apavoro.

As notícias estão aí. Os fatos. Você os julga como achar que deve.

Holograma

Foi realizado ontem à noite, em Brasília, o show "Renato Russo Sinfônico", projeto de Giuliano Manfredini, filho do cantor, empenhado em preservar a memória e a obra do pai. Uma tarefa nada difícil, considerando que uma e outra continuam vivas e intensas no imaginário de uma legião de fãs.

Ainda não li as notícias a respeito, mas parece que houve problemas no som. Consta que o público presente perdoou isso. Afinal, todos estavam ávidos para ver o grande acontecimento da noite: o próprio Renato Russo cantando "Há tempos", graças a uma tecnologia utilizada somente uma vez até hoje, que permite a projeção de um holograma. Eu estava atrás de vídeos do espetáculo, para saber como funcionou o tal holograma, mas não encontrei por enquanto.

Nunca fui de viajar para shows, mais provavelmente por puro comodismo. Se eu morasse no Distrito Federal, sem dúvida teria ido. Morando aqui, não me empolguei. Afinal de contas, não consigo entender uma homenagem a Renato sem a presença de artistas que fizeram parte de seu mundo. Estou ciente de que os demais músicos da Legião Urbana já gritaram aos quatro ventos que agradecem as honrarias, mas que já deu. Para eles, Legião Urbana é página virada e eles não voltarão a isso. Tudo bem.

Mas como fazer esse show sem Capital Inicial, Plebe Rude, Paralamas do Sucesso? Será que esses artistas foram ao menos sondados? Ou a proposta era fazer um evento de fãs para o ídolo?

Não conheço alguns nomes que aparecem no setlist. Talvez sejam gratas surpresas, mas não dá para tolerar Ivete Sangalo! Jerry Adriani não me inspira muita confiança, ainda mais com um dos títulos mais importantes do repertório da banda. E Lobão... Deixemos de lado o passado do cara. Mais recentemente, ele saiu do obscurantismo com uma autobiografia no qual passa a defender o ideário da extrema direita! Roqueiro de direita, mermão?! Renato deve ter gritado muitos palavrões nessa hora.

Mas, enfim, espero que Giuliano Manfredini siga seu projeto. Com sorte, quem sabe um dia tenhamos um museu dedicado ao cantor. Terei prazer em visitá-lo. Enquanto isso, sigo ouvindo sua voz no carro, ele que é minha trilha sonora mais constante.

Minha pequena socialista

Conversando com Júlia, e tendo em vista que ela é, naturalmente, a grande privilegiada da família para tudo, disse-lhe hoje, em tom de brincadeira:

— Filha, você é a única pessoa rica da família.

— Mas, papai — surpreendeu-me ela , o dinheiro que tem na Cocó é para todos nós!

Vamos aos esclarecimentos. Cocó é um cofrinho em forma de galinha, que está abarrotado de moedas de 5 centavos. Algumas de 10. Moedas maiores do que essas sequer passam pela fenda. Júlia acredita piamente que é rica, por causa desse bendito cofre! Já nos falou sobre isso diversas vezes. E hoje nos comoveu (além de nos fazer rir, claro) com sua generosa espontaneidade: tudo o que ela tem também é nosso.

Dizem que toda criança traz o seu baú. Na verdade, a criança é o próprio baú. Não há riqueza maior.

Uma questão de oportunidade

Evidentemente, é necessária e salutar a medida que o Mangal das Garças tomará nos próximos dias, de fazer a manutenção no Lago da Ponta (não sabia que tinha esse nome). Para tanto, todos os animais que vivem naquele ambiente — peixes, tartarugas e aves — foram transferidos para um lago menor. O principal será esvaziado, para limpeza minuciosa. Trata-se da primeira operação do gênero naquele parque zoobotânico.

Muito legal. Mas precisavam realmente fazer isso no período de férias escolares? Se não deu para fazer mais cedo, não seria, talvez, mais interessante postergar a limpeza para agosto? É que justamente quando as crianças dispõem de mais tempo e os pais precisam achar um modo de entretê-las, o Mangal estará com suas atrações prejudicadas  e isso por um tempo estimado em 20 dias.

Some-se a isso a interminável reforma do Parque Zoobotânico Museu Emílio Goeldi, um dos mais frequentados espaços de lazer propícios a crianças, em obras há anos. Não é exagero: são anos. Júlia está prestes a completar 5 anos e, desde que ela nasceu, estivemos no Museu algumas vezes, mas sempre enfrentando o fechamento de espaços e consequente retirada de animais. Nada de cobras e peixes, p. ex. As exposições também se foram. É frustrante.

Lembrando que o adorável Parque do Utinga é basicamente um espaço de contemplação, porque lá não há o que fazer (refiro-me a programas com crianças; lá é um ótimo espaço para se exercitar), restam o Jardim Botânico Bosque Rodrigues Alves, o pequeno Horto Municipal e o pedalinho do Ver-o-Rio, além de algumas praças (mas a da República, p. ex., fica impraticável aos domingos). Ah, sim, a orla, que aos finais de semana vira um formigueiro humano (tanto que, a despeito de minhas tentativas, até hoje não consegui encostar por lá). Desse jeito, fica difícil garantir lazer com segurança para nossas crianças. Eu nem me arvoro a criticar quem vive enfiado dentro dos enervantes shopping centers. O que podem fazer essas pessoas?

Com informações do Portal ORM.

sábado, 29 de junho de 2013

Eu não

Pode ser estatisticamente irrelevante, mas eu gostaria de deixar consignado, para ciência de toda a imprensa que insiste em repetir que, amanhã, todo o Brasil estará torcendo pela seleção de Felipão, que este brasileiro aqui, que nunca foi brasileiro de campeonato ou de conveniência, não torcerá amanhã pela tal seleção.

Amanhã será um dia como outro qualquer. Os indicadores sociais provarão o que digo.

Refletindo a partir de Burke

"Até a liberdade deve ser limitada, a fim de ser possuída."

Li esta frase muitos anos atrás e, como era meu hábito, anotei-a em um caderno cheio de citações. O caderno, com os anos, se perdeu. Felizmente, contudo, as palavras de Edmund Burke permaneceram em minha memória.

Burke foi um filósofo e político (hoje em dia, atividades incompatíveis entre si) irlandês, que viveu entre 1729 e 1797. Faz muito tempo, portanto, que proferiu estas palavras, que seguem sendo tão atuais. Vale destacar que ele foi entusiasta da soberania do povo e percebeu que a democracia podia levar a maioria a oprimir as minorias (uma discussão hoje muito em voga na filosofia do direito, podendo-se citar Ronald Dworkin entre os que se interessam pelo tema). Pensamentos sensatos. A Burke também se atribui outra citação que prezo muito: "Aqueles que não conhecem a história estão fadados a repeti-la".

Quando li a frase que inaugura esta postagem, nos dias de minha juventude, considerei-a instantaneamente correta. Pareceu-me um truísmo, ainda que, naquela época, eu não soubesse o que era um truísmo. Mas também me pareceu que, sendo eu um garoto muito pouco propenso a desafiar regras, a empatia com esse aforismo não era de surpreender. Eu me preocupava, naquele tempo, com comportamentos transgressores. Hoje, em uma fase da existência em que vejo na transgressão uma forma legítima de lutar por bens necessários à vida, à felicidade, à realização de nossas aspirações mais profundas, minha preocupação é outra.

Preocupo-me com o fato de que se lutou tanto por liberdade, tantos morreram por ela, mas uma vez alcançada, tal qual o cachorro que corre atrás do automóvel e um dia finalmente o alcança, as pessoas simplesmente não sabem o que fazer com ela. Aí vieram as tecnologias de comunicação e todos nós ganhamos a capacidade de produzir ideias nos cantos mais obscuros do mundo e disseminá-las por todo o planeta. Isso serviu para quê?

Para que nos tornássemos uma geração de covardes, que se escondem atrás de uma tela para não precisar olhar mais ninguém nos olhos. Uma geração de tolos, que abreviam palavras e com elas ideias, mal disfarçando a nossa dificuldade de pensar. Uma geração de consumidores, que no ter uma infinidade de coisas, desaprende o valor de cada uma. Uma geração de membros de redes sociais, grupos virtuais e congêneres, que assim se desobrigam de interagir de verdade com seres humanos. Uma geração de críticos inclementes e sempre furiosos (e o mais das vezes, totalmente desinformados). Uma geração que não perde a oportunidade de atacar, ferir, humilhar, seja lá pelo motivo que for. É uma espécie de inclinação natural, como se a internet houvesse desvelado que somos um bando de psicopatas surtados.

Ao mesmo tempo, somos uma geração débil. Débeis de conhecimento, de tanto que sorvemos informações desconectadas e inúteis, porque só a inteligência seria capaz de lhes dar serventia. Débeis de generosidade, porque precisamos de incentivos para fazer o que é certo, já que nosso primeiro impulso é causar dor. Débeis de futuro, porque nada construímos; aquilo que não pode ser comprado não será possuído, porque não temos mais criatividade para produzir. Somos a massa, que consome as mesmas comédias ruins, a mesma música ruim, os mesmos programas ruins, os mesmos alimentos industrializados e somos orientados, por terceiros, sobre aquilo de que devemos gostar. Esportes, p. ex. Esportes rendem muito dinheiro, embora não para nós. Fomos  programados para gostar de futebol e, mais recentemente, de lutas. Aguarde o próximo surto criativo da indústria do entretenimento. Você também vai gostar da coisa, seja lá o que for.

Somos, por fim, a geração do trauma, aquela que com tudo se ofende; que não tolera nem a mais leve crítica; que acredita piamente possuir um direito à felicidade; que não valoriza a história, a experiência e a boa vontade dos que vieram antes de nós. A geração que acredita não poder ser restringida em suas ambições, independentemente do motivo. Principalmente se esse motivo disser respeito àquilo que não nos interessa: um tal de outro.

Somos uma geração de carros desgovernados, ladeira abaixo, que nada pode deter. Se tentar, que seja atropelado. Porque temos direito à liberdade absoluta. O desfecho de uma tal perspectiva, todos deveríamos conhecer: não vai dar certo.

***

Ninguém se preocupe: não estou jogando a toalha. Estes foram apenas lampejos de ideias incompletas, reunidos a partir de alguns acontecimentos recentes pouco animadores. Mas a vida segue. E pode ser melhor do que tudo quanto dito acima. Sempre pode. Porque somos livres para isso.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Réplica e tréplica sobre a incoerência

Acerca da postagem anterior, que ironizava a eleição de Fernando Henrique Cardoso à Academia Brasileira de Letras, um comentarista me escreveu este reproche:
Essa frase foi invenção. Ele já negou que tenha falado isso. Dá uma pesquisada. Muito provavelmente foi criada pelo PT pra embaraçar ele, simplesmente porque não se ganha eleição elogiando o adversário.
E sejamos justos: o Lula passou o tempo todo falando mal do FHC e, quando assumiu ao governo, manteve a mesma política econômica que ele estabeleceu, o que, na verdade, demonstra que as críticas eram só bravata eleitoral. Se o Lula, do jeito malandro dele, reconheceu o acerto do Plano Real, não tem o menor sentido o próprio FHC renegá-lo.
Calma aí, Yudice. A tua repulsa pelo PSDB acaba nublando o teu julgamento e acaba afetando a tua credibilidade.
Minha resposta:
Das 23h45, grato pelas ponderações, mas:
1. Nunca achei que FFHH tenha dito essa frase. Ele é um homem muito culto e jamais diria uma sandice dessas. No entanto, ele não disse, mas fez. Conheci sociólogos que se referiam a ele como "a vergonha da classe". Pode ser que esse mito tenha sido criado por sociólogos ou acadêmicos, não necessariamente pelo PT. Nesse caso, a prevenção é da sua parte.
2. Verdade que Lula manteve a política econômica do antecessor e essa foi uma das razões de eu me decepcionar com ele e logo me tornar um crítico de seu governo. Procure, no blog, postagens chamadas "Breve histórico de uma exaustão", em duas partes. Foram escritas logo no começo do governo Lula e mostram a minha frustração.
3. Se é para sermos justos, vale destacar que o Plano Real não é uma criação de FFHH, como os desinformados insistem em dizer, para louvá-lo. O cara era o ministro da Fazenda na época e acabou levando o crédito. Mas havia um time de economistas por trás da concepção do plano, à frente Pérsio Arida. Eles, sim, é que deveriam levar o mérito, mas seus nomes não são sequer conhecidos por quem não é do ramo. Além disso, do ponto de vista hierárquico, se alguém devesse ser elogiado por tal plano, deveria ser o presidente da República, não o ministro.
4. No mais, o plano Real teve seus méritos, mas não era tão inquestionável assim. Veja como a política neoliberal de FFHH, mantida por Lula, condenou o país a um crescimento econômico pequeno e, ainda por cima, sem desenvolvimento real. Lembre, também, que FFHH não conseguiu evitar o retorno da inflação. Nos dois últimos anos de seu mandato, a economia estava piorando lenta, porém inequivocamente. A estabilidade só veio depois, já com Lula. Contudo, para sermos justos, aprendi no mestrado que Lula é um cara de sorte: a estabilidade veio não por méritos de sua gestão, mas porque a conjuntura interna e internacional foram favoráveis, até a crise de 2008.
5. Tenho repulsa pelo PSDB, sim, porque não governa para seres humanos. São elitistas e arrogantes, pessoas diferenciadas que não toleram dividir lugar no avião com a empregada doméstica. Governam sob projetos grandiosos, para encher os olhos, mas não se ocupam de atender as necessidades basilares da população. Foi por se preocupar com este aspecto que o governo Lula, com seus muitos e horrorosos defeitos, aniquilou as chances de retorno dos tucanos ao poder. E ainda que "aniquilar" seja um termo forte, ele também se aplica para as eleições de 2014. Espere para ver.
6. Lembremos, também, do Consenso de Washington, o odioso protocolo econômico neoliberal, criado na década de 1980 e subscrito por FFHH em 2000. Assinado de caso pensado. Para sermos justos, também devemos lembrá-lo por isso.
7. Meu julgamento é menos obnubilado do que parece, meu caro. Tanto que reconheço os erros e os vícios das esquerdas. Não faço a linha maniqueísta direita má vs. esquerda boa. Tenho consciência de que a esquerda pode ser, e frequentemente é, péssima. O problema é que a direita sempre é péssima. Ainda não tive o prazer de ver um exemplo em sentido contrário. Se houver algum, por favor me conte.
Agora cabe a você, leitor, julgar.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Quanta incoerência!

Fernando Henrique Cardoso foi eleito, hoje, para a Academia Brasileira de Letras, aquele honorável sodalício que eu não sei bem para que serve e que adora eleger cariocas (acabou de eleger mais um).

Mas não foi justamente FFHH, o príncipe dos sociólogos, quem disse, ao assumir a presidência da República, "esqueçam tudo o que eu escrevi"? Pelo menos, consta que ele disse tal frase, a mais conhecida de toda a sua vida.

Se assim é, como ele pode tornar-se imortal?

Ver, também: http://yudicerandol.blogspot.com.br/2007/09/os-imortais-paraenses.html

Dia Nacional da Matemática

Entrou em vigor hoje, quando de sua publicação, a Lei n. 12.835, de 26.6.2013, que institui a data de 6 de maio como Dia Nacional da Matemática. Legal, não? Mas talvez você se pergunte: a novidade serve para quê, mesmo? Respondo: para que o Poder Executivo incentive "a promoção de atividades educativas e culturais alusivas à referida data". E só. Esse é todo o conteúdo da lei.

Aliás, leis instituindo dias disso e daquilo são abundantes em todos os níveis federativos e têm em comum o fato de que não servem para nada.

Vale ao menos destacar que o dia 6 de maio foi escolhido por marcar o aniversário de nascimento de Malba Tahan. Os poucos brasileiros que já escutaram esse nome certamente o relacionam ao famoso livro O homem que calculava. Esses poucos brasileiros talvez acreditem que Malba Tahan era algum pensador indiano ou coisa que o valha.

Na verdade, Malba Tahan é o pseudônimo do matemático, professor e escritor Júlio César de Mello e Souza, nascido no Rio de Janeiro em 1895 e falecido no Recife, em 18.6.1974. Este grande e pouco conhecido (pelo público em geral) compatriota ganhou renome internacional por difundir o conhecimento da Matemática de modo leve e lúdico, através de mais de uma centena de livros.

Suas tramas reuniam aventura e recreação matemática, consideradas muito instigantes para fins educacionais.Você pode saber mais sobre ele no site específico, que por sinal disponibiliza desafios matemáticos. Um doce entretenimento para quem gosta e tem cacife.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Ato do rato: uma resposta

Um leitor que se identifica como "Morador e usuário do posto" comentou a postagem anterior, em termos que me pareceram úteis para ampliar nossa compreensão sobre o caso. Meu agradecimento a ele.

Meu respeito e admiração pela comunidade da Terra Firme. Só pra lembrar, o posto de saúde em questão foi reformado depois que a comunidade organizou abaixo-assinado e o destinou ao MP que obrigou o secretário de saúde da época, Sérgio Pimentel, a realizar as obras, que foram feitas a toque de caixa para que o secretário e o prefeito não fossem presos ou processados. Apesar de ouvir de pessoas desinformadas e/ou preconceituosas que a TF é um bairro "violento e perigoso", digo que tenho orgulho do bairro em que moro há 13 anos e nunca fui incomodado. Parabéns a esta comunidade criativa e lutadora!

Ato do rato

Enquanto os políticos gastam fortunas do meu, do seu, do nosso dinheirim pagando marqueteiros caríssimos e nem sempre eficientes, a tal voz rouca das ruas revela mentes criativas e inteligentes, capazes de transmitir mensagens de modo lúdico e efetivo.

Foto de Bruno Carachesti
Veja-se o caso dos moradores da Terra Firme, indignados com a interdição de um posto de saúde, motivado pelo encontro de um rato morto no prédio. Assustador, não? Pois a comunidade diretamente afetada pelo problema realizou, ontem, uma caminhada pacífica e bem humorada, com direito a enterro simbólico do murídeo falecido.

O evento foi batizado de "ato do rato". Aprendam, marqueteiros caríssimos: preciso, objetivo, marcante e, acima de tudo, exprime exatamente o que a manifestação era. A repetição fonética ajuda a fixar a ideia na cabeça. Você escuta "ato do rato" e não se esquece mais.

Agora veja o cartaz que o manifestante carrega na imagem. Dá um slogan simplesmente perfeito: "Se o rato morreu, imagina eu"! Em uma única frase, foi sintetizada a preocupação com a saúde pública. Todo mundo entendeu. E ninguém pagou rios de dinheiro por isso.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Ecobag

Quando Lady Di morreu naquele controverso acidente de trânsito, o comovido povo inglês ficou indignado com a rainha, que se transferiu para a residência de campo e guardou silêncio monacal sobre o episódio. Pressionada por todos os lados, a rainha voltou à capital e, devidamente assessorada, comungou do sentimento público de luto. E todos os britânicos se regozijaram.

Quando a onda de protestos tomou conta do Brasil, em meados de 2013, o indignado povo brasileiro cobrou da presidente da República que se pronunciasse a respeito. Pressionada por todos os lados, d. Dilma concedeu entrevista coletiva, devidamente assessorada, num tom bastante Dilma, que foi interpretado por alguns até como ameaçador. E já que precisamos de medidas concretas, a alternativa foi sacar de uma velha gaveta um pacote de medidas contra a corrupção. Tudo comida requentada.

Vocês já podem imaginar esse pacote sendo trazido pelo Coelhinho da Páscoa em pessoa, pilotando o trenó do Papai Noel e pousando estrepitosamente, entre fogos de artifício, música e luzes, no meio do gramado do novo Maracanã, para dar uma forcinha da legitimação dos investimentos da copa. E depois que o pacotão for anunciado, tudo entrará nos eixos. Não será preciso, sequer, começar a implementá-lo.

Já vimos esse filme. Cadastro de empresas corruptoras? Também existe um cadastro nacional de exploradores de trabalho escravo, a famosa "lista suja", mas quem não gosta de ser incluído nele impetra mandado de segurança e, às vezes, até consegue alguma coisa. Mudança na lei de licitações? Balela. Nunca dá certo? Punições pecuniárias? O povo continuará apostando na impunidade. E haverá a corrupção para fugir da penalização por corrupção. Nenhum problema se resolve com medidas emergenciais. Além do mais, a história de nosso país tem mostrado que pacotes são prenúncios de malogros. Mas arrefecem os ânimos na hora e isso, agora, é mais do que suficiente para a turma do primeiro escalão.

Então não há solução nem esperança? Há sim, claro. Mas ela não cai de paraquedas. Aliás, ela não pode cair, mais fluir de cada brasileiro. Não vejo outro jeito.

Entendendo as razões

Para quem achou que a onda de manifestações pelo Brasil afora são mera agitação da juventude, sem consequências práticas, que lhes parece a presidente da República receber os líderes do Movimento Passe Livre, convocar governadores e alguns prefeitos e anunciar medidas que tocam em feridas bem severas da realidade brasileira? Alguém acha que isso não é nada? Mais dramático do que isso, só a Globo deixando de exibir duas novelas para acompanhar, em tempo real, as agitações em diferentes cidades!

Criticada pelo silêncio acerca do principal acontecimento no país, ontem Dilma Rousseff falou. Se fosse tucana, viria com algum discursinho de união pelo Brasil, elencaria suas muitas realizações e coisa e tal. Mas Rousseff não é assim. Em vez disso, chegou chutando o balde, fazendo umas propostas com cara de inócuas, com cara de cortinha de fumaça, mas uma delas muito séria: a reforma política.

Reforma política é assunto velho na pauta das grandes discussões republicanas e apareceu como item das reivindicações dos atuais manifestantes das ruas. Ela nunca ocorre por razões óbvias: os congressistas, investidos do poder de reformar a constituição, não têm o menor interesse em promover mudanças que dificultem os desmandos, o oportunismo, o fisiologismo, a corrupção, o tráfico de influência e tudo mais que serve de recurso habitual para locupletamento.

A proposta de reforma política, contudo, chegou incendiando o mundo jurídico. Afinal, os grandes constitucionalistas imediatamente se pronunciaram alertando que não existente constituinte parcial, pela metade, temática, etc. Só existe Assembleia Nacional Constituinte, com poderes para elaborar uma nova constituição, do zero, tratando sobre tudo, absolutamente tudo. Esta interpretação foi sustentada inclusive por ministros do Supremo Tribunal Federal, na ativa, aposentado e ainda por tomar posse. Recado dado.

E aí a oposição e os críticos começam a dizer que Rousseff é burra e despreparada. Será? Sem dúvida, a proposta está incorreta e causa estupefação, eis que o caminho correto seria uma emenda constitucional. Mas não é motivada por burrice. A presidente, com esse gesto, deixa clara sua visão de que os atuais senadores e deputados federais não têm estatura moral para bulir com a constituição. A constituinte seria a única forma de convocar outros brasileiros para tão relevante missão, deixando os atuais titulares de mandatos eletivos cuidando apenas das tarefas de sempre.

Infelizmente, a boa finalidade não se reveste de uma forma jurídica adequada. Não vai dar para fazer assim e Rousseff terá que lidar com o desgaste decorrente de suas intenções. E, imagino, não será um desgaste pequeno.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Medidas de exceção?

Ouvi, nos últimos dias, pessoas falando sobre o risco de os militares começarem a se assanhar por causa da onda de manifestações espalhada pelo país. Considerei a perspectiva exagerada, mas agora me deparo com preocupação semelhante, exarada pela Profa. Janaína Paschoal, que leciona direito penal na Universidade de São Paulo e, em sua fala, procura reforçar a liderança da USP em relação a tudo que acontece no país. Mas o alarmismo de Paschoal não está sendo compartilhado pelos próprios colegas.

Não sou cientista político nem tenho conhecimento sobre a dinâmica das instituições brasileiras que me permita uma análise razoável da conjuntura. Por ingenuidade ou ignorância, não estou preocupado com os militares. Até prova em contrário, não creio que seja o caso de pensar num levante, num golpe, em ameaça armada contra a democracia.

O mundo mudou bastante da década de 1960 para cá. Não podemos esquecer que o golpe de 1964 (golpe, não existe outro nome para o que aconteceu) somente foi vitorioso porque uma conjugação de fatores, nacionais e internacionais, garantiu o sucesso da empreitada. Naquela época, o mundo se debatia com a Guerra Fria, de modo que o alinhamento com os Estados Unidos contra a tal ameaça comunista era um discurso que fazia sentido. Hoje, o comunismo acabou e os americanos substituíram os comunistas pelos terroristas nas prioridades de combate. Já tendo eliminado Saddam Hussein e Osama Bin Laden, desarticulando a Al Qaeda, neste momento estão mais preocupados em se reerguer do desastre econômico iniciado em 2008.

Além disso, os líderes mundiais que mais se opunham aos Estados Unidos também estão partindo. Chávez morreu; o Irã acabou de eleger um novo presidente, de perfil mais conciliatório, e a Coreia do Norte é governada por um moleque que brinca de tentar assustar o mundo com supostas ameaças nucleares. Salvo Cuba, que não tem força para nada, o país declaradamente comunista (na verdade, capitalista de Estado) restante é a China, que interage numa boa com o Ocidente, se lhe for vantajoso.

Além disso, na década de 1960 boa parte da América Latina foi palco de ditaduras militares. Esses países todos se transformaram em democracias, ainda que tímidas, como é o caso do próprio Brasil, em que o sistema democrático funciona muito bem na forma, porém não em substância.

Outro suporte imprescindível que os golpistas brasileiros tiveram foi da classe média, mas hoje seria diferente. O que essa faixa da população quer é segurança, pessoal e patrimonial, mas duvido que esteja disposta a tolerar restrições pessoais. Não consigo ver um Brasil de Congresso Nacional fechado, de Supremo Tribunal Federal aparelhado, de habeas corpus suspenso, de censura oficialmente restabelecida.

Não acho, também, que desta vez a Igreja estenderia sua mão amiga às Forças Armadas, nem ela teria toda essa força, já que hoje divide o rebanho com diversos segmentos evangélicos e vê o aumento do número de ateus e agnósticos. Além disso, melhoraram os níveis de educação e de articulação entre os indivíduos. Controle da internet? No país em que as redes sociais crescem mais rapidamente? Fala sério.

Em suma, reafirmo a minha baixa capacidade de fazer este tipo de análise, porém manterei o meu ceticismo quanto ao risco de Forças Armadas, sucateadas e sem legitimidade social, tentarem assumir o comando. A instabilidade vai passar. O povo brasileiro está vivendo um momento de catarse, está extravasando, vivendo o sonho de se manifestar nas ruas. Mas uma hora vai perceber que a mudança tão perseguida é mais fácil de obter do que parece: basta votar melhor no próximo ano. Mas isso, claro, depende de haver opções disponíveis para o eleitorado.

Outra percepção a que precisam chegar é que, sem envolvimento com partidos políticos, gerando seus próprios representantes, os manifestantes não chegarão a lugar algum. Mas a coisa começa alucinadamente. O bom senso vem depois. ele virá.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Um pouco de sensatez

Enquanto os brasileiros insistem no erro, os ingleses mostram mais clareza e convicção. Reportagem do jornal "Guardian" elogia os brasileiros por estarem protestando contra os gastos excessivos com eventos esportivos, que classifica como "extravagância", enquanto naquele país o povo se manteve inerte.

O texto do jornalista Simon Jenkins tem um trecho contundente, que merece destaque, para responder a babacas notórios como Pelé e Ronaldo "Fenômeno": "Todo mundo sabe que o 'dilúvio de promessas' que as nações sede recebem sobre legado é uma bobagem". E exemplifica com o caso de Toronto, que teve gastos bilionários, "não fez nada pelos pobres e devastou a economia local por um ano".

É nisso que os deslumbrados brasileiros precisam pensar. Ficam falando nas maravilhas das mil e uma noites que a copa e as olimpíadas proporcionarão, mas será que proporcionarão, mesmo? Além de obras de infraestrutura, o que mais fica de um evento que dura só alguns dias?

Eventos esportivos são como a atividade de mineração: são extremamente lucrativas e alguém vai ganhar muito dinheiro. Mas não será você. Alguém de fora vai lucrar absurdamente, a partir de investimentos feitos com recursos públicos (BNDES, p. ex.), mas a população diretamente atingida vai ficar só com os buracos e demais danos ambientais e sociais.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Onda de retratações

Havia uma coisa em comum entre Geraldo Alckmin, governador do Estado de São Paulo, e Fernando Haddad, prefeito da capital paulista, e não eram as gravatas da cor de seus respectivos partidos. Eram os semblantes desgastados e constrangidos que exibiram ao anunciar, juntos, a redução do preço das passagens de ônibus naquela cidade, estopim da ebulição que agita o país há duas semanas.

Eles bateram o pé, soltaram seus argumentos, mas ao final e ao cabo recuaram, chamuscados perante seus eleitores e seus partidos. Se mais não houver de resultado prático de tudo quanto está acontecendo, ao menos este deleite merecemos: todos os que se locupletam de nosso país, de nosso povo, de nossas riquezas, ano após ano, estão baixando as cristas habitualmente arrogantes.

A Globo se retratou. Discretamente, mas mudou o tom. O surtado do Datena. O retardado do Ronaldo "Fenômeno" (do quê?). O detestável do Pelé. E outros, além dos políticos. Um após o outro, foram experimentando a insólita sensação de dever satisfações a terceiros, a estranhos, àqueles que costumam usar como massa de manobra. Deve ser um choque, para todos. E uma grata surpresa, para o cidadão comum, descobrir uma obviedade sempre lembrada, mas não praticada: a de que ele tem, sim, algum poder, alguma voz.

A redução das tarifas de transporte têm um custo? Lógico que tem. Afeta os próprios recursos públicos? Provavelmente. Porque capitalistas apresentarão suas faturas ao governo, claro. Essa gente nunca perde. Em São Paulo, estão calculando o montante dos subsídios, que custarão cortes em investimentos. Essa é a chantagem. Os tais subsídios são necessários? Talvez. Mas também se pode cortar do lucro dos empresários, dos impostos extorsivos, das verbas de propaganda, das torneiras jorrantes da corrupção, etc. Talvez nem fosse realmente necessário cortar investimentos. A questão passa a ser: quem, no final das contas, vai perder?

Mas dinheiro não é tudo. A sensação de que nada será como antes não tem preço. Oxalá não seja mera impressão. Oxalá ela crie raízes entre nós. Era hora de um pouco de civilização chegar por estas bandas.

Twitterítica XXX

Senhor, obrigado por me testar e permitir que eu desenvolva um pouco da arte da paciência. Amém.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Uma esmolinha útil

Está tramitando no Senado, sendo aprovado nas comissões técnicas, projeto de lei destinado a isentar o 13º salário do imposto de renda (PLS 266/2012). No estado em que se encontra, o projeto segue para a Comissão de Assuntos Econômicos, onde será apreciado de forma terminativa, ou seja, uma vez aprovado lá, não será necessária a submissão ao plenário, podendo seguir de imediato à Câmara dos Deputados.

Se virar lei, a medida não vai enriquecer ninguém, mas ao menos trará um bafejo de justiça tributária num país que extorque seus filhos sem pena, todo santo dia.

Idosos do Brasil

Dia desses, mencionei o aniversário de minha mãe e uma pessoa (de 68 anos) me perguntou quantos anos ela completaria. Quando informei 71, sua reação foi enfática: "Ah, mas ela é nova!" Achei curioso na hora porque, convenhamos, 71 não é pouco. Contudo, mais de uma pessoa manifestou a mesma opinião quanto à juventude de minha mãe (que não se considera nova). Os tempos são outros, a expectativa de vida aumentou, a maturidade produtiva e saudável dispõe de recursos para durar mais tempo e, além disso, há todo um esforço de respeito e valorização da turma da melhor idade. Ratifico tudo isso, mas daí a dizer que a pessoa é nova, parece haver uma longa distância.

Mas veja que interessante: o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) está propondo que o Estatuto do Idoso seja modificado, a fim de que o conceito legal de idoso passe a abranger pessoas a partir de 65 anos, por considerar os atuais 60 incondizentes com a realidade atual.

Acho a ideia boa, se a mudança da lei não implicar em restrições a direitos, e acho até que os adultos dessa faixa etária podem se sentir valorizados. Afinal, há questões emocionais intensas relacionadas ao tema do envelhecimento.

Este tema me faz recordar um dos maiores exemplos de cinismo deste país. Refiro-me à proposta de emenda constitucional destinada a subir, de 70 para 75 anos, a idade para aposentadoria compulsória no serviço público, ofensivamente apelidada de "PEC da bengala" (PEC 457/2005). Estagnada na Câmara dos Deputados há mais de três anos, é apoiada, p. ex., pelos ministros do Supremo Tribunal Federal. Por sinal, nos últimos meses, as aposentadorias dos ministros Cézar Peluso e Carlos Ayres Britto reacenderam a discussão, por se tratar de juristas com plena capacidade física e mental para o exercício de suas funções.

Enquanto no setor privado a aposentadoria vai-se tornando um sonho cada vez mais distante e improvável, no público há um discurso canalha, que apela à necessidade de "oxigenar" os tribunais. Falo tribunais porque, na verdade, ninguém está preocupado com o serviço público em si. Aqueles que lutam pela manutenção do status quo não estão nem aí se a tia que serve o cafezinho deve ou não ir para casa descansar. Cuida-se de uma medida focada em classes privilegiadas, cujas bem remuneradas carreiras se organizam em regras de promoção e, claro, todos os membros da classe querem chegar ao topo.

Quando escuto esses caras defendendo argumentos supostamente honoráveis para se justificar, tenho vontade de vomitar. Queria perguntar se eles realmente acham que enganam alguém. Eles é que precisam ser oxigenados. Defender reserva de mercado não é resguardar o interesse público.

Para ficar no âmbito dos tribunais, deixo apenas esta provocação: você acha que o STF está melhor com a juventude do Dias Toffoli do que estaria com a experiência do Ayres Britto?

Pense nisso.

terça-feira, 18 de junho de 2013

Deu no New York Times


Rá! A despeito do pouco caso habitual da imprensa nacional com a nossa cidade, fomos nominalmente citados pelo New York Times em matéria intitulada "Milhares se reúnem para protestar nas maiores cidades brasileiras".

Sim, eu me recordo que não gosto desses ufanismos bobos, mas acho que vale a pena sentir orgulho de sermos a capital onde não houve confusão durante a manifestação. O criminalista Salo de Carvalho, autor do Antiblog de Criminologia (dentre outros feitos), noticiou em seu perfil no Facebook, ontem, que a Polícia Militar disparou balas de borracha contra a população que caminhava ordeiramente. Isso foi lá. Aqui, os organizadores da passeata conclamaram o cumprimento do acordo com as autoridades e repeliram com veemência as tentativas de partidarização.

Honestamente, emociona-me ver algo assim acontecendo e, particularmente, os próprios manifestantes dando parabéns à Polícia Militar pela forma como se conduziu. O povo e a polícia, antagonistas tradicionais neste país, dando mostras de civilidade e cooperação. E as pessoas em casa, nos prédios, aplaudindo a passagem do povaréu. Isso dá esperança, sabe?

Foto de Antônio Cícero / Estadão Conteúdo (obtida na web)

Para quem ainda se pergunta, alguns com boa dose de desdém, sobre o que era o protesto, afinal de contas (muita gente está considerando tolice protestar contra o BRT justamente agora que as obras foram retomadas, em habitual falta de conhecimento do mundo ao redor), o protesto era sobre... a pauta que você quisesse. Oficialmente, criticava-se a situação do BRT e se pedia passe livre nos transportes públicos. Mas de um modo geral, por todo o país, o tema transversal mais visível é a indignação contra os desmandos. O povo está protestando contra os péssimos serviços públicos, contra a carência de infraestrutura, contra a corrupção, contra a copa do mundo, contra Belo Monte, contra o oportunismo político (daí a rejeição expressa a manifestações partidárias), etc.

Sua escola está sem aula? Vá para a rua. Sua rua está esburacada? Vá para a rua. Os impostos são elevados demais? Vá para a rua. O vizinho bateu na esposa e a polícia não ajudou? Vá para a rua. E por aí vai. A meu ver, é justamente isso que torna essa onda nacional tão fascinante: ela ser tão difusa quanto aos objetivos e tão convicta quanto à motivação. Ela é, portanto, acima de tudo, uma demonstração radical às autoridades: estamos cansados.

Foto: Gil Sóter / G1 PA (obtida na web)

É provável que ainda demore um pouco para o povo descobrir o que fazer com a irresignação. Aprender cidadania e espírito democrático não é simples. Leva tempo e exige esforços, mas a maior parte de nossa história nos levou para o lado exposto. Por isso, estamos sendo alfabetizados. À medida que o nível educacional do povo cresce, a paciência diminui. Esse é o caminho.

Há um futuro, portanto.

sábado, 15 de junho de 2013

Perfil do mal

Juro que nunca me passou pela cabeça que um desgracento como esse aí ao lado pudesse ter um perfil no Facebook. Afinal, com seu telhado de vidro, um perfil numa rede social é uma porta aberta para ataques, embora ele seja faixa preta e Ph.D em fazer cara de paisagem e ignorar solenemente qualquer crítica ou problema. Nem Freud, Jung e Lacan juntos conseguiriam descrever tamanho transtorno de conduta.

A iniciativa de engolir um pouco do meu asco e colocar essa careta em meu próprio blog foi para destacar a descrição que o indigitado se deu, e que persiste na página até hoje.

Ele é "Prefeito de Belém na empresa Prefeitura Municipal". O Facebook inventa tanta coisa, mas não expande as suas opções. Imagine chamar de "empresa" para um órgão público e, ainda por cima, para o Poder Executivo de uma unidade federativa. Mas a característica seguinte é culpa do próprio fulano: "Estudou na instituição de ensino Senado Federal"! O Senado não é uma instituição de ensino, obviamente. Se bem que lá se aprende muita coisa, embora provavelmente nada que merecesse ser dito abertamente. E o rapaz aí não é do tipo que aprende, mas que ensina!

E veja que o sujeito tem 1.334 seguidores! Fiquei até assustado de saber que ele tem 6 amigos em comum comigo. Temendo por essas pessoas, percebi que duas delas são jornalistas e blogueiras, que pelo teor de suas postagens não são partidárias do cara. Menos mal.

O Facebook acha que eu quero ver o que esse aí compartilha com os amigos e me sugeriu que eu lhe enviasse um pedido de amizade. Não, obrigado. Sequer tenho essa curiosidade. A única curiosidade que possuo é saber por qual lugar do mundo anda essa pessoa. Assim que souber, informarei o oficial de justiça da 4ª Vara Federal de Belém.

Anote aí

De acordo com a Prefeitura de Belém e com a empresa Andrade Gutierrez, o prazo final para a entrega da primeira fase do BRT, totalmente pronta, é dezembro de 2013. Como não foi informado dia, pensemos em 31.12.2013.

31.12.2013. Está anotado. Dia 1º de janeiro voltaremos a falar sobre isso. Ou antes?

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Mais ou menos do mesmo jeito

Em meados de 2008, o tempo fechou para a então governadora do Pará, Ana Júlia Carepa. Motivo: 32 bebês haviam morrido na UTI neonatal Santa Casa de Misericórdia, num espaço de dias. Houve quem responsabilizasse a governadora quase como se ela houvesse asfixiado os bebês com as próprias mãos, mesmo com todas as explicações dadas na época.

Se você quiser saber que explicações eram essas, basta ler esta reportagem aqui. Ela não é de 2008 nem tem relação com Ana Júlia. Ela é de hoje e se refere ao falecimento de 25 bebês, na mesmíssima UTI, num período de apenas 13 dias. Em plena era tucana reloaded, no terceiro ano da gestão Jatene, que a esta altura não pode recorrer ao argumento conveniente da herança maldita, como todos fazem.

Deixo claro, contudo, que não sou leviano a ponto de responsabilizar o hospital por essas mortes. Pelo contrário, quando se deu o escândalo anterior, defendi o hospital e seus profissionais, que se dedicam aguerridamente por aquelas crianças, frequentemente lutando contra carências infraestruturais. Até externei minha gratidão pessoal pelo apoio que as dedicadas profissionais do banco de leite deram a minha esposa, acometida por uma forte mastite nos primeiros meses de nossa filha Júlia.

Considero plausível e nada cínica a explicação sobre o conjunto de fatores apresentados pelo hospital, embora causa perplexidade o número de mortes em tão breve intervalo. Isso precisa ser esclarecido com muito cuidado a toda a população, sendo do maior interesse não apenas da clientela da Santa Casa, mas de qualquer maternidade, já que eventuais explicações poderiam indicar cenários passíveis de repetição em outros locais.

Resta saber se, em tempos tucanos, a exploração midiática do caso e sua repercussão no imaginário geral serão equivalentes aos de cinco anos atrás. Precisamos agir com responsabilidade, todos e sempre.

Quente praca

Dia dos namorados em meio a um mundo de trabalhos por cumprir e ao cansaço decorrente. Mas achei justo que nos permitíssemos uma hora de folga, a bem da própria sanidade mental. Saímos do trabalho para um jantarzinho rápido. Obviamente, fugi dos restaurantes mais badalados e centrais, porque seria impossível conseguir uma vaga. Com efeito, passamos na frente de alguns e o negócio estava feio. Honestamente, não consigo entender como alguém passe horas à espera de uma mesa e ache que isso pode ser uma noite feliz.

Indo a um restaurante bacana, porém fora de circuito e do centro da cidade, encontramos lugar sem nenhuma dificuldade. A despeito de terem esquecido de comandar o nosso pedido, até que não demorou. Enquanto esperávamos, notei que alguns garçons estavam com a camisa para fora das calças, totalmente desarrumados. Mas esse é o tipo de coisa que noto, porém não me importo. Também não me importei quando o rapaz que nos atendia deixou os talheres caírem à minha frente.

O que eu não esperava era que, ao nos servir, ele soltasse uma exclamação mais para si mesmo, porém perfeitamente audível: "Está quente pra caralho!"

Eu e Polyana nos entreolhamos e tivemos que rir. De fato, o prato chegou quente praca, fumegante. Mas eu também não me importei com o deslize do atrapalhado, porém simpático e atencioso garçom. O que importa é que o paladar estava ótimo. Mas creio que outros clientes talvez não fossem assim tão desencanados.

Educação no Pará

Enquanto a afiliada da Rede Globo destas bandas não se cansa de elogiar os governos tucanos, a matriz sempre teve uma opinião diferente. E desvelou a dita cuja, mais uma vez, no jornalístico Bom Dia Brasil de ontem. A reportagem escrita contém um link para o vídeo respectivo. Os problemas são muitos e não me darei ao trabalho de listá-los, porque você provavelmente os conhece. Afinal, são os mesmos do ano passado, do retrasado, do anterior e assim por diante. Ou melhor, retrospectivamente.

Em anos pretéritos, a propaganda tucana — única atividade em que são ótimos — usava o slogan "É Pará, isso!". Pois bem, é Pará isso de estar sempre na última ou, com sorte, penúltima posição no ranking da educação nacional. Uma vergonha descarada, ainda mais por se tratar do único setor que pode transformar de verdade uma nação.

Mas como aprendi ainda na adolescência, povo transformado é tudo o que os maus políticos não querem.

Inesperada figura

No congestionamento que se forma todas as manhãs na confluência das avenidas Almirante Barroso e Júlio César, um personagem inesperado tem sido notado, e elogiado, por quem passa pelo local.

Trata-se de um agente de trânsito. Isto mesmo, um agente de trânsito. Em vez de ficar fiscalizando o tempo, como diz um amigo, ou aguardando a oportunidade de multar alguém, ele vai para o asfalto e realmente orienta o tráfego. Organiza as filas de veículos que vêm pela Júlio César e cria condições para que convertam à Almirante Barroso em segurança, mesmo com o sinal fechado. Com isso, o tráfego flui mais rapidamente.

Nosso agradecimentos a esse prestimoso servidor público, que decidiu fazer algo inesperado: trabalhar corretamente, no interesse de todos.

Será?

Com um atraso de pelo menos um mês em relação ao anunciado, supostamente as obras do BRT devem ser retomadas ainda hoje. Isto porque, nesta manhã, o prefeito de Belém, aquele que não é mágico, finalmente assinou a ordem de serviço. E o fez, claro, no canteiro de obras do Entroncamento, na presença da blague, de operários e da imprensa. Sobretudo da imprensa.

Segundo consta, a primeira meta é concluir os elevados do Entroncamento. Mesmo que as pistas exclusivas do BRT não sejam abertas ao tráfego, a liberação dos elevados daria um grande alento para quem precisa passar por aquela área da cidade que, justamente por causa dessas obras, promoveu uma série de interdições, na medida em que a rotatória foi obstruída.

Deus ajude. Mas só acredito vendo.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Hands free ou não

A tecnologia de comunicação via Bluetooth permitiu o surgimento de dispositivo que, acoplado junto ao ouvido humano, permitia o uso do celular sem o uso constante das mãos. Começava a era hands free, extremamente importante para a indústria automobilística, já que hoje as pessoas são física e mentalmente dependentes do celular, mas é proibido o seu uso durante a condução de veículos.

Abstraindo-se a breguice daquele aparelho enfiado na orelha (que muita gente ostentava com orgulho, conversando ostensivamente pela rua), foi um avanço em termos de segurança no trânsito. Depois a tecnologia melhorou e, hoje, populariza-se o uso do viva-voz pelo sistema de áudio do automóvel. Uma comodidade que eu, particularmente, acho ótima, porque teclas no próprio volante me permitem atender e desligar, sem desviar a atenção da direção (embora permaneça o problema de originar a chamada).

Pensávamos que era seguro voltar para a água, mas eis que um estudo realizado pela Universidade de Utah, por encomenda da American Automobile Association, veio jogar muita água fria sobre nossas cabeças. Segundo a pesquisa, a tecnologia hands free não apenas não resolve o problema como o agrava!

Embora eu seja muito permeável a argumentações científicas, recebo a notícia com reserva. Até segunda ordem, penso que a distração provocada pelo aparato de comunicação se tornará perigosa na medida em que as pessoas sejam tolas, alheias às necessidades de segurança — o que, reconheço, infelizmente é o mais comum. Ainda acredito que um mínimo de bom senso pode tornar essa tecnologia nossa aliada. Não dá para ficar namorando telas de sistemas multimídias com o pé no acelerador. Mas um bom usuário pode dirigir com muito segurança e eficiência, ancorado nesse valioso suporte.

Num 12 de junho qualquer

Não me queira mal, caríssimo leitor solteiro, por repercutir a maldade do Kibeloco aqui neste blog. É que sou chegado num amor negro, apenas isso. Em meu favor, informo que já estive nessa condição por tempo bastante para odiar o dia dos namorados. Portanto, eu realmente entendo a situação.

Já é muito ruim você não ter aquela pessoal especial para tornar sua vida mais doce. Ter que aturar a massiva exploração midiática em torno desta data estritamente comercial é sacanagem; em alguns casos, chega a ser desumano.

Mas vivemos numa sociedade consumista e pouco dada à reflexão, então as pessoas, de um modo geral, submergem nessa lógica de homenagens, jantares, presentes, motel, etc. Fala-se tanto disso, e com tamanha convicção (ai de quem tente fugir ao padrão!), que os solteiros em redor acabam oprimidos, sufocados, sem condições de suportar a onda de badalação dos apaixonados.

Estando casado há 8 anos, previsível que esta data não me amargure. Contudo, isto não implica que eu vá usufruir dela. A comemoração chega no período de finalização do semestre letivo, ou seja, quando estamos mais ocupados e exaustos. Já passei várias noites assim aplicando prova. Hoje estarei em aula. Acima de tudo, estou tão cansado que minhas olheiras, característica física inalienável minha, estão gritando de dar pena. Consegui dormir mais cedo do que o habitual (ou seja, antes de uma da manhã...), mas acordei como se tivesse tirado apenas um cochilo. Nem tudo é festa...

Resta-me, portanto, desejar um dia feliz àqueles que terão a oportunidade de se entregar às delícias da paixão, inocente como a das crianças ou tórrida como a dos adultos. Atendendo a pedidos, vou até antecipar minha aula desta noite, a fim de liberar os alunos mais cedo, permitindo que corram para o amor. E como prova de minha boa vontade, concluo esta postagem com o adorável doodle que o Google preparou para hoje.

Seja feliz.

A sempre lembrada Noruega

Noruega como modelo de reabilitação de criminososPor Luiz Flávio Gomes

O Brasil é responsável por uma das mais altas taxas de reincidência criminal em todo o mundo. No país a taxa média de reincidência (amplamente admitida mas nunca comprovada empiricamente) é de mais ou menos 70%, ou seja, sete em cada dez criminosos voltam a cometer algum tipo de crime após saírem da cadeia.
Alguns perguntariam “Por quê?”. E eu pergunto: “Por que não”? O que esperar de um sistema que propõe reabilitar e reinserir aqueles que cometerem algum tipo de crime, mas nada oferece para que essa situação realmente aconteça. Presídios em estado de depredação total (veja teoria das janelas partidas), pouquíssimos programas educacionais e laborais para os detentos, praticamente nenhum incentivo cultural, e, ainda, uma sinistra cultura (mas que divertem muitas pessoas) de que bandido bom é bandido morto (a vingança é uma festa, dizia Nietzsche).
Situação contrária é encontrada na Noruega.  Considerada pela ONU, em 2012, o melhor país para se viver (1º no ranking do IDH) e de acordo com levantamento feito pelo Instituto Avante Brasil, o 8º país com a menor taxa de homicídios no mundo, lá o sistema carcerário chega a reabilitar 80% dos criminosos, ou seja, apenas dois em cada dez presos voltam a cometer crimes; é uma das menores taxas de reincidência do mundo. Em uma prisão em Bastoy, chamada de ilha paradisíaca, essa reincidência é de cerca de 16% entre os homicidas, estupradores e traficantes que por ali passaram. Os EUA chegam a registrar 60% de reincidência e o Reino Unido, 50%. A média europeia é 50%.
A Noruega associa as baixas taxas de reincidência ao fato de ter seu sistema penal pautado na reabilitação e não na punição por vingança ou retaliação do criminoso. A reabilitação, nesse caso, não é uma opção, ela é obrigatória. Dessa forma, qualquer criminoso poderá ser condenado à pena máxima prevista pela legislação do país (21 anos), e, se o indivíduo não comprovar estar totalmente reabilitado para o convívio social, a pena será prorrogada, em mais cinco anos, até que sua reintegração seja comprovada.
No presídio, um prédio, em meio a uma floresta, decorado com grafites e quadros nos corredores, e na qual as celas não possuem grades, mas sim uma boa cama, banheiro com vaso sanitário, chuveiro, toalhas brancas e porta, televisão de tela plana, mesa, cadeira e armário, quadro para afixar papéis e fotos, além de geladeiras. Encontra-se lá uma ampla biblioteca, ginásio de esportes, campo de futebol, chalés para os presos receberem os familiares, estúdio de gravação de música e oficinas de trabalho. Nessas oficinas são oferecidos cursos de formação profissional, cursos educacionais e o trabalhador recebe uma pequena remuneração. Para controlar o ócio, oferecer muitas atividades educacionais, de trabalho e lazer são as estratégias.
A prisão é construída em blocos de oito celas cada (alguns deles, como estupradores e pedófilos ficam em blocos separados). Cada bloco contém uma cozinha, comida fornecida pela prisão e preparada pelos próprios presos. Cada bloco tem sua cozinha. A comida é fornecida pela prisão, mas é preparada pelos próprios detentos, que podem comprar alimentos no mercado interno para abastecer seus refrigeradores.
Todos os responsáveis pelo cuidado dos detentos devem passar por no mínimo dois anos de preparação para o cargo, em um curso superior, tendo como obrigação fundamental mostrar respeito a todos que ali estão. Partem do pressuposto que ao mostrarem respeito, os outros também aprenderão a respeitar.
A diferença entre o sistema de execução penal norueguês em relação ao sistema da maioria dos países, como o brasileiro, americano, inglês, é que ele é fundamentado na ideia que a prisão é a privação da liberdade, e pautado na reabilitação e não no tratamento cruel e na vingança.
O detento, nesse modelo, é obrigado a mostrar progressos educacionais, laborais e comportamentais, e, dessa forma, provar que pode ter o direito de exercer sua liberdade novamente junto a sociedade.
A diferença entre os dois países (Noruega e Brasil) é a seguinte: enquanto lá os presos saem e praticamente não cometem crimes, respeitando a população, aqui os presos saem roubando e matando pessoas. Mas essas são consequências aparentemente colaterais, porque a população manifesta muito mais prazer no massacre contra o preso produzido dentro dos presídios (a vingança é uma festa, dizia Nietzsche).

* Colaborou Flávia Mestriner Botelho, socióloga e pesquisadora do Instituto Avante Brasil.

terça-feira, 11 de junho de 2013

Alienação parental é punível, mas não é crime

Desde que surgiu a Lei n. 12.318, de 2010, muitas pessoas passaram a acreditar que a odiosa prática da alienação parental foi criminalizada. Até o próprio Senado acredita nisso, como se vê em matéria intitulada "Doutrinar filhos contra o outro genitor é crime". Na exígua matéria, apontam-se modalidades de alienação parental, mas não se fala em penas. Nem podia.

Para acabar de vez com a dúvida, eis aqui o texto integral da lei:

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a alienação parental. 
Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
Parágrafo único. São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:
I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;
II - dificultar o exercício da autoridade parental;
III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;
VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós. 
Art. 3º  A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda. 
Art. 4º Declarado indício de ato de alienação parental, a requerimento ou de ofício, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente, o processo terá tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso.
Parágrafo único. Assegurar-se-á à criança ou adolescente e ao genitor garantia mínima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompanhamento das visitas. 
Art. 5º  Havendo indício da prática de ato de alienação parental, em ação autônoma ou incidental, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica ou biopsicossocial.
§ 1º O laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor.
§ 2º A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.
§ 3º O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo, prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada. 
Art. 6º Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso:
I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;
II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;
III - estipular multa ao alienador;
IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;
V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;
VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;
VII - declarar a suspensão da autoridade parental.
Parágrafo único.  Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar. 
Art. 7º A atribuição ou alteração da guarda dar-se-á por preferência ao genitor que viabiliza a efetiva convivência da criança ou adolescente com o outro genitor nas hipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada. 
Art. 8º A alteração de domicílio da criança ou adolescente é irrelevante para a determinação da competência relacionada às ações fundadas em direito de convivência familiar, salvo se decorrente de consenso entre os genitores ou de decisão judicial. 
Art. 9º  (VETADO) 
Art. 10.  (VETADO) 
Art. 11.  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

O trecho marcado em verde é a única referência a crime em toda a lei, mas perceba que ele não criminaliza conduta alguma. O que faz é, tão somente, dispor sobre uma ação autônoma destinada a comprovar se houve alienação parental, ação essa que tramitará independentemente de outras ações cíveis (p. ex., decretação de divórcio pelo reconhecimento de culpa do cônjuge alienador) ou mesmo penais (se algum crime for praticado, p. ex. violência doméstica).

De tanto que já repetiram esse erro, comecei a duvidar de mim. Mas aí está a lei, que não me deixa mentir. Não existe um delito de alienação parental. As punições se dão em outro nível.

Twitterítica XXIX ou Mensagem do dia

Há frustração e tristeza quando a zona de conforto passa a ser hostil. Aprender a fazer do limão uma limonada é uma arte.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Baratas na cabeça

Um setor intelectual e moralmente prejudicado do povo brasileiro gosta de expressar o seu saudosismo em relação aos tempos da ditadura militar. Segundo eles, tudo era melhor naqueles tempos, especialmente, é claro, o modo como se combatia o "crime".

Aqui no Pará, além desse defeito de caráter tradicional, existe uma variante: "Bom era nos tempos do Barata!"

O débil refere-se a Joaquim de Magalhães Cardoso Barata (1888-1959), que foi interventor federal, senador e governador de nosso Estado. Existe uma lenda, já desmentida por historiadores, segundo a qual Barata determinou que ladrões (sei lá se outros criminosos também) fossem postos num navio e levados para alto-mar, onde por fim seria lançados às águas para virar comida de tubarão!

O previsível resultado disso é que a escumalha sanguinolenta e dona da verdade adora dizer que sente saudades do Barata, por causa de algo que ele nunca fez. De minha parte, quando vejo alguém manifestando esse sentimento, só consigo pensar que fazer o mesmo com o sujeito seria uma ideia legal, exceto pelo fato de que seria crime ambiental e os pobres tubarões merecem comer coisa melhor.

Explosão demográfica no sistema penitenciário paraense

De junho de 2006 ao mesmo mês de 2012 a população carcerária no Pará aumentou cerca de 85%, segundo informações do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias (InfoPen) do Departamento Penitenciário Nacional ligado ao Ministério da Justiça. Enquanto ao número de presos quase que dobrou em seis anos, o número de vagas cresceu apenas cerca de 23%, conforme mostram os dados. Os próprios dados divulgados, porém, mostram que o perfil de quem é preso não sofreu alteração, da mesma forma que a corrupção de agentes penitenciários ainda continua com a mesma lógica. Por questão de segurança, todos os nomes de detentos revelados nessa matéria são fictícios.
“Aqui a gente é muito humilhado. Não tem remédio, a comida é podre, e tem dia que a gente não consegue dormir porque não tem lugar no chão pra todo mundo e o calor é infernal”, revelou Antônio Silva, de 30 anos, (nome fictício) condenado a 9 anos de prisão por pelo menos três crimes que ele não quis comentar quais foram. O DIÁRIO conversou com ele através de um telefone celular que ele mantém na cadeia, com o qual consegue ser informado de tudo que acontece aqui do lado de fora.
Ele conseguiu acesso ao aparelho após pagar propina a um agente prisional, que fez acordo com ele durante algum dos contatos diários que tem com os detentos no pátio, combinaram o valor de R$ 150,00, que foi cobrado fora da casa penal à esposa do Antônio, que entregou o dinheiro e o aparelho. O valor em espécie o agente guardou e o telefone entregou ao detento, que assim pode monitorar os passos da esposa e de tudo mais que o interessar no mundo externo.
O DIÁRIO conversou com três detentos por celular. Ambos reclamaram abertamente sobre a falta de espaço na hora de dormir, falta de cuidados médicos adequados, falta de remédios, da comida, mas ficaram muito apreensivos ao falar sobre a corrupção com a qual se beneficiam. O fato é que, só na Operação Sentinela do Norte III, realizada no dia 06/12/12 em todas as casas penais, 330 celulares foram apreendidos (redução de 50% em relação à Sentinela II).
Se cada aparelho é colocado para dentro por no mínimo R$ 150,00 e pelo menos 90% deles entram com a “Mão amiga” dos agentes, os presos de nosso estado geraram R$ 44.550,00 de lucro apenas pelos celulares que foram realmente encontrados, isso sem contar carregadores e entorpecentes, que também são em grande parte “colocados para dentro”.
Ou seja, de um lado estão os detentos, pessoas que são investigadas ou foram condenadas por terem contrariado a lei, do outro o próprio Estado, que por incompetência, falta de planejamento, conivência, falta de recurso ou o que for, também descumpre a lei, seja através de agentes corruptos, pela superlotação que fere a dignidade humana dos detentos, pela falta de assistência por conta do inchaço populacional nas penitenciárias paraenses.
Perfil dos presos não sofre alteração
Em junho 2006, 60% dos presos não tinham o Ensino Médio Completo e 44 % não haviam concluído nem mesmo o Ensino Fundamental e eram 55,5% jovens de 18 a 29 anos. No mesmo período de 2012, 79% dos detentos não haviam concluído o Ensino Médio e 64,7% não haviam estudado sequer todo o Ensino Fundamental e eram 54,5% jovens de 18 a 29 anos. Ou seja, o perfil dos presos no Pará, como não é diferente em todo Brasil, são jovens com baixa escolaridade e oriundos da periferia ou de lugares com ausência ou falta de políticas públicas.
“O número de presos no Pará aumentou significativamente, o que não foi acompanhado adequadamente na estrutura de acolhimento e aprisionamento com dignidade desses presos, que estão amontoados em celas superpovoadas que reproduzem o sistema de enfurnar pessoas em verdadeiros contêineres”, analisou o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Pará (AL), deputado Carlos Bordalo. Segundo ele, no Pará praticamente inexiste centros para recuperação dos presos, a não ser a colônia penal agrícola Heleno Fragoso, em Santa Izabel, que só possui o perfil atual graças à pressão feita pela CPI do Tráfico de Pessoas e aos Conselhos Tutelares.
A comissão da AL criou coordenadoria de acompanhamento e monitoramento do sistema penitenciário para desenvolver mecanismo para monitorar cada casa penal do Estado. Já para Gleidson Pontes, de 28 anos, membro do Fórum da Juventude Negra do Pará (Fojunepa), a ausência de uma rede de Políticas Públicas para a juventude negra, maciçamente presente nas periferias e nos locais mais excluídos historicamente é um dos fatores condicionantes da realidade penal paraense.
“Se você olhar o perfil dos presos na década de 70, 80 e 90, não será muito diferente do que vivemos hoje. A maioria já era negra, filhos da periferia”, apontou Gleidson. Ele explicou que os negros vieram da África à força e, quando não obedeciam, iam ao tronco. Quando libertados, foram obrigados a habitar lugares inóspitos sem a presença efetiva do Estado, que hoje chamamos de periferia, e a ideia de punição ainda permanece semelhante, razão que também explicaria o fato de que parte da imprensa e da sociedade aplaudem a condição degradante na qual os encarcerados vivem.
Para o militante, o Estado gastará muito mais com a construção de cadeias novas, obras essas que certamente gerarão lucro aos empresário, enquanto que políticas sociais continuarão sendo realizadas de maneira ineficiente “porque essa é a lógica do modelo de desenvolvimento do Estado”.
Corrupção de agentes prisionais existe, diz a susipe
Segundo o titular da Superintendência do Sistema Penitenciário do Estado do Pará (Susipe), o tenente coronel André Cunha, de dezembro de 2006 a dezembro de 2012 o aumento da população carcerária foi de cerca de 50%, e o acréscimo foi de 21% nos números de vagas. Nos dados apresentados pelo Ministério da Justiça, havia um déficit de 5.812 vagas no Sistema Penal paraense em junho de 2012, mas a Susipe aponta que em março de 2013 o déficit era de 4.525 vagas. Há em andamento a construção de 1644 vagas em Santa Izabel, Marabá, Santarém São Félix do Xingu e Breves. “Para enfrentar esse problema a Susipe atua em três frentes: Construção de novas vagas; Redução do fluxo de entrada e reduzir a reincidência; aumento do fluxo de saída. Essas ações resultaram, por exemplo, que em dezembro de 2012 saíram mais presos do que entraram das casas penais do Pará”, pontuou o superintendente. Na última sexta (07), por exemplo, enquanto André Cunha dava entrevista, mais um mutirão era realizado no complexo de Americano, para que presos condenados tivessem sua situação regularizada, e no caso de detentos que já tenham cumprido a lei, que possam ganhar a liberdade e liberar vaga no presídio.
Parte da superlotação se dá também pelo número de presos que ainda não foram julgados, conforme ele explicou. “Em 2001 o número de preso provisórios correspondia a 65% da população carcerária. Em março de 2013 é 46%, isso significa um enorme avanço do judiciário paraense, que tem feito enorme esforço para deixar em condições aceitáveis a quantidade de presos que ainda não foram julgados”, explicou.
A Susipe realiza palestras em escolas da periferia em parceria com a Secretaria de Estado de Educação (Seduc) e com o Pro-Paz, para informar crianças em condição de vulnerabilidade a como medida de prevenção. Como exemplo de projetos de ressocialização há o projeto “Reconquistando a Liberdade”, realizado com detentos do regime semiaberto de Heleno Fragoso. “Até o final do mês de junho, um novo grupo de internos, entre eles 20 mulheres vão trabalhar na limpeza de praças e logradouros em um convênio fechado com a Secretaria Municipal de Urbanismo de Belém”, informou a assessoria de comunicação da Susipe.
Em relação à corrupção de agentes prisionais, o superintendente confirmou que objetos e substâncias proibidas entram nas casas penai ou por conivência ou por omissão de servidores, na maioria temporários, razão apontada por críticos como um dos elementos fundamentais para tanta corrupção. “Não é o fato do servidor ser temporário ou concursado que isso vai mudar o caráter da pessoa”, alegou o titular da Susipe, que alertou sobre possível demissão para trabalhadores pegos em conduta indevida e até mesmo indiciamento na justiça comum caso o delito seja criminoso.

Nova universidade

Já está em vigor desde quinta-feira passada (6.6.2013) a Lei n. 12.284, de 5.6.2013, que criou a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará.

A UNIFESSPA assumirá o campus de Marabá, outrora pertencente à UFPA. E ampliará a sua estrutura física por meio da criação de campi em Rondon do Pará, Santana do Araguaia, São Félix do Xingu e Xinguara. Com isso, o ensino superior público chegará mais perto de regiões que jamais contaram com tal possibilidade. Uma expansão já iniciada por meio da criação da Universidade Federal do Oeste do Pará, com sede em Santarém. Uma política de governo das mais louváveis, que foi iniciada há poucos anos. Se é que você me entende.

Em breve serão anunciados os nomes do reitor e vice-reitor pro tempore. Depois da posse destes, começa a contagem do prazo de 180 dias para aprovação do estatuto. Como se trata de desmembramento de uma universidade já existente, a nova instituição está bem perto de funcionar com as próprias pernas. Bom para todos.

Reduzindo gente a nada

O número de processos judiciais no Brasil envolvendo o crime de tráfico de pessoas e o de
redução à condição análoga à de escravo chegou a 1.163 de 2005 a 2012. Desses, seguem
em tramitação 428. O levantamento foi feito a pedido do Conselho Nacional de Justiça junto
aos Tribunais Regionais Federais e contribuiu para subsidiar o primeiro relatório sobre o
Tráfico de Pessoas no Brasil elaborado pela Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da
Justiça em parceria com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc), que
revelou a existência de 475 vítimas do tráfico no Brasil entre 2005 e 2011.
Segundo os dados apresentados pelos
tribunais, a maior incidência foi relativa ao
crime de redução a condição análoga à
de escravo. Nos últimos oito anos, foram
distribuídos 317 casos de exploração
servil nos cinco tribunais federais. No
mesmo período, os números de processos
iniciados sob suspeita de tráfico interno e
internacional de pessoa contabilizaram 73.
Os processos contabilizados dizem
respeito especificamente aos crimes
de tráfico internacional de pessoas para fim de exploração sexual (Código Penal, artigo
231); tráfico internacional de pessoas (CP, 231); tráfico interno de pessoa para fim de
exploração sexual (CP, artigo 231 A); tráfico interno de pessoas (CP, artigo 231 A); redução
a condição análoga à de escravo (CP, artigo 149); crimes previstos no Estatuto da Criança e
Adolescente (ECA, artigo 239); e crimes de Lei de Remoção de Órgãos e Tecidos (Lei
9.434). Os dados foram coletados dos TRFs, uma vez que tais crimes são de competência
da Justiça Federal.
Dados por tribunal
No Tribunal Regional Federal 1ª Região, que engloba 14 estados sob sua jurisdição, estão em
tramitação 155 processos, sendo 111 tipificados no crime de condição análoga à escravidão e
44 em tráfico de pessoas. O Sul brasileiro, representado pelo TRF-4, apresenta 104
processos, todos referentes ao crime de condição análoga à escravidão.
O TRF da 2ª Região, que abrange os estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo, possui
atualmente 78 processos em curso, sendo apenas dois deles referentes a tráfico de pessoas
(um interno e um internacional); 41 processos tipificados como condição análoga à de escravo
e 35 por crimes previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente. O TRF da 3ª Região
informou 60 processos, sendo 39 sobre redução à condição análoga à escravidão e 12 sobre
tráfico internacional de pessoas.

Já o TRF da 5ª Região informou haver 31 processos em tramitação, sendo 22 relativos ao
crime de redução à condição análoga à escravidão.
Com informações da Assessoria de Imprensa do CNJ.
Revista Consultor Jurídico, 8 de junho de 2013
Fonte: http://www.conjur.com.br/2013-jun-08/brasil-428-processos-trafico-pessoas-trabalho-escravo

Redução à condição análoga à de escravo e tráfico de pessoas para fins de exploração sexual. Duas contundentes manifestações do que há de pior na alma humana. Mas, no Brasil, nem são crimes tão graves assim.

Já que existem crimes hediondos, estes dois deveriam sê-lo. Mas não são. As penas máximas cominadas chegam a 8 anos, menos do que roubo. Puxar uma faca para alguém e levar-lhe 10 reais é mais grave do que submeter uma pessoa à escravidão. Apenas sob algumas circunstâncias, restritas, tais penas podem ser aumentadas de metade, chegando a 16 anos.

Não bastasse isso, tais práticas largamente disseminadas pouco se convertem em ações penais reais. A impunidade reina. Mas a imprensa não se mobiliza por essa causa, muito menos a sociedade, salvo setores muito específicos. Sintomático, não?