domingo, 31 de agosto de 2008

Maldade...

O proprietário da construtora Village arregaçou: lançou um desafio aos tantos que andam falando que as torres Sun e Moon estão com a estabilidade comprometida — boato que fez sucesso na cidade recentemente. Quem apresentasse algum documento ou outro tipo de prova acerca da insegurança das torres ganharia um apartamento quitado. E ninguém topou a parada.
Mas será que alguém que tivesse tal prova iria querer, como prêmio, um apartamento da própria Village?
Maldaaaaaaaaaaade...

Modismos e oportunismos

Enquanto a candidata Valéria Pires Franco se aproveita da moda das Olimpíadas para propor a construção de oito vilas olímpicas na cidade (!) — decerto já um prenúncio dos desvarios de seu vice, louco por uma obra faraônica —, o candidato José Benito Priante aparece na TV com ar grave, tirando a sua casquinha do problema da segurança pública. E faz uma proposta que me chamou a atenção.
Segundo Priante, será criado um serviço — não consegui entender de quê —, que começará com 100 viaturas, as quais poderão ser acionadas a qualquer hora do dia ou da noite, como ele faz questão de frisar. Mas o que é esse serviço, afinal? De policiamento ostensivo? De investigação? De resgate?
O que me chama a atenção é o fato de que os Municípios praticamente não dispõem de atribuições no âmbito da segurança pública. A Constituição de 1988, em seu Título V, trata "Da defesa do Estado e das instituições democráticas". No capítulo III desse título, trata da segurança pública e dispõe:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.
..............................................................................................................
§ 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.


A única competência municipal, em matéria de segurança pública, é para preservação dos bens, serviços e instalações do Município, ou seja, para o resguardo da própria Administração. Não foram previstas competências para a defesa do cidadão, o que já motivou uma antiga celeuma acerca das guardas municipais: podem ou não ser armadas? Sem unanimidade, a tese prevalecente, hoje, é positiva, mas dentro das competências acima delineadas.
Aguardo com curiosidade algum esclarecimento sobre a proposta de Priante. Porque aqui não se trata de possuir ou não vontade política. Sem a definição de uma competência constitucional, uma espécie de "policiamento ostensivo municipal" seria ilícito, caso de abuso de poder. Ao propor uma viatura na nossa porta, ele atrai a atenção do eleitor que vive em pânico com a violência, mas que promete o que não pode cumprir. Com a vantagem de que, fosse o caso, amanhã poderia alegar que tentou cumprir a promessa, mas foi impedido pela Câmara dos Vereadores, pelo Ministério Público ou pelo Judiciário. Aí seria só fazer cara de coitadinho.
Isso não seria oportunismo?

Reconhecimento

Eu não teria chegado até aqui se escrevesse apenas para mim mesmo. Por conseguinte, se o Arbítrio agora completa dois anos no ar, sem interrupção, é porque muita gente bacana tem passado por aqui, provocando-me motivação e interesse em valer a pena. Afinal, este não é um blog de humor. Logo, para ter público, o jeito é oferecer algum conteúdo útil.
Agradeço aos comentaristas fieis, tais como o Carlos Barreto, Francisco Rocha Jr., Fred Guerreiro, Ivan Daniel e Cris Moreno (de novo, sumida). Agradeço, também, aos comentaristas que deixam seus registros com certa frequência, por algum tempo, depois somem e voltam, como o Vladimir König, a Rita Helena e o campineiro Alexandre. Agradeço aos meus alunos, a maioria muito tímida, que nos corredores da faculdade comentam comigo coisas que leram aqui, mas sem deixar sinais de sua passagem. Estes últimos são um dos principais focos que tenho, dadas as minhas responsabilidades com sua formação acadêmica.
E ao pedir desculpas pelos nomes que possa ter esquecido, além de registrar aqueles que deixaram comentários apenas uma vez — alguns de cidades distantes —, demonstro meu reconhecimento também aos meus inimigos. No ano passado, escrevi que rejeitara menos de 10 comentários, o que me parecia ótimo. Agora, perdi a conta, graças a um pequeno grupo de doentes que volta e meia aparece por aqui, confiantes no anonimato virtual.
Vocês não têm ideia das coisas que moderei negativamente. O sociopata mais brando que me persegue questiona meus conhecimentos jurídicos, notadamente na área do Direito do Trabalho. Mas há o que me manda trabalhar, vagabundo. Há o que questiona a sexualidade das pessoas — a minha e a de alguns comentaristas. Há quem proponha a infidelidade de minha esposa e me recomende um exame de DNA para atestar a paternidade de minha filha. Há um obcecado por saber quando eu e minha esposa retomaremos nossa vida sexual no pós-parto — e alega que tenho a obrigação de informar isso, porque expus minha vida na Internet. Mesmo a pequena Júlia é alvo dessas pobres criaturas, que já lhe sugeriram doenças e insinuaram que eu, seu pai, poderei cometer abuso sexual, por causa daquela foto que publiquei, beijando a barriga dela (e não o peitinho, como dito). E o que mais me divertiu: quando publiquei uma postagem me desculpando por estar sem tempo para o blog, ele escreveu dizendo que eu não faço falta.
Pois é. Não faço a menor falta, mas eles não conseguem viver sem mim. Podem até ficar uma temporada ausentes, mas sempre voltam, como decerto voltarão para comentar esta postagem. E cá estou rendendo homenagens também a vocês, inúteis rejeitos da civilização, que fazem girar o meu marcador, também me estimulam a prosseguir, mas não mudam minhas pautas, meus pensamentos e minha alegria. É o caso de perguntar: quem, afinal, precisa de quem, aqui?
Meus amigos — os de verdade —, manter um blog é uma experiência desafiadora. Recompensadora, sem dúvida. Tanto que estamos aqui, ativos. Graças a vocês, essencialmente. Porque toda voz quer ser ouvida. Abraços calorosos. Deus os abençoe.

Dia cheio de aniversários

I
Domingo, 31 de agosto de 2008. Minha prima Rafaela completa 18 anos — mais um indicativo de que estou envelhecendo, já que acompanhei de perto toda a sua vida, desde o segundo dia. E a data marca uma passagem, pois ela oficialmente ingressa na vida adulta, assume a plena capacidade civil, nos termos da lei. Naturalmente, o jurídico nem sempre acompanha o ritmo normal da vida. Ao felicitá-la, peço a Deus que lhe conceda juízo e boas aspirações. A começar por largar essa esculhambação de ser emo — felizmente, numa versão light, sem aquelas atrocidades que vemos andando nos shoppings, em bandos, aos domingos.


II
Quem também aniversaria hoje é minha cunhada Diana, agora eleita para madrinha de nossa Júlia. Embora sua idade ainda se conte na casa dos vinte, não me sinto autorizado a ser mais específico. Sabe como é: mulheres! De volta a sua cidade natal, Santarém, após se graduar em Florianópolis, esteve conosco no final de semana passado e, como fonoaudióloga, forneceu-nos informações importantes sobre cuidados que precisamos ter com nossa menina. Nossas melhores homenagens!


III
E o terceiro aniversariante do dia é um dos meus filhos, que completa dois anos. Como todo filho, dá alegrias, preocupações e até aborrecimentos. Mais alegrias, sem dúvida. Você está olhando para ele neste exato momento: trata-se deste Arbítrio do Yúdice.
Por alguma razão, todo blogueiro gosta de anunciar essas datas ou estatísticas. Então, ei-las: ao longo desses 731 dias (2008 é bissexto), foram 1.732 postagens — uma média de 2,36 por dia. Também tivemos 4.418 comentários publicados, incluídos os meus. Segundo o SiteMeter, foram mais de 66 mil acessos.
Considerando apenas os dados do primeiro ano, haviam sido 815 postagens, 1.987 comentários e mais de 20 mil acessos. Por conseguinte, no segundo ano de sua existência, o blog subiu seus números para 917 postagens, 2.431 comentários e algo em torno de 46 mil acessos. Só posso me dar por satisfeito com isso. Afinal, graças ao blog, fiz algumas ótimas amizades, que me renderam inclusive o convite para ser um dos articulistas do Flanar, de muito maior audiência.

Efeito colateral

Uma menina de 1 ano e 7 meses começou a apresentar hemorragias súbitas e intensas. Os médicos diagnosticaram uma doença cujo nome a minha fonte não soube dizer, que se caracteriza por uma perda acentuada das plaquetas. Em consequência, a criança precisa tomar sangue o tempo todo — ao mesmo tempo em que os médicos começam a dizer que é melhor não ter muitas esperanças quanto a sua recuperação.
Os bancos de sangue de todo o país lutam com o desinteresse da população em fazer doações. Aquela história do povo generoso revela aqui a sua face... Ocorre que, neste caso, o problema se acentua por um motivo incomum: umas tantas pessoas, graças ao esforço da família em pedir ajuda, ofereceram-se para doar sangue, mas não puderam. Motivo: tomaram vacina contra rubéola há menos de 30 dias.
Não creio que o governo pense nesse efeito colateral, na hora de definir uma campanha de vacinação como a recentemente realizada. Campanha necessária, claro. Contudo, gera uma consequência como essa, que pode custar vidas.
Penso que essas iniciativas deveriam ser mais frequentes, pois isso reduziria o número de pessoas se vacinando em cada edição, liberando as demais para as doações de rotina. Mas se tivermos uma campanha a cada dez anos, é óbvio que o conjunto da população se vacinará de uma só vez.
Neste momento, não disponho de maiores dados sobre a paciente, sobretudo o seu nome. Tentarei conseguir isso ainda esta manhã. Sei que ela precisa de sangue A positivo, mas o HEMOPA aceita doações de qualquer espécie, desde que feitas no nome da criança. Todavia, vale lembrar que esse procedimento é meramente administrativo e não muda o fato de que, no corpo do paciente, as trocas sanguíneas são mais restritas. Logo, é importante conseguir sangue A positivo mesmo.
Boa sorte para a pequena e sua família.

Golpismo

Lei da oferta e da procura é uma droga. Há duas semanas, Belém enfrenta problemas de desabastecimento de combustível (ou pelo menos de gasolina). A princípio, falou-se em uma descontinuidade na chegada dos navios à base da Petrobras, na cidade; um simples atraso. Eu soube disso pelos jornais, porque não vi nenhuma agitação nos postos nem tive problemas para abastecer.
Esta semana, de novo o problema, mas agora com a explicação de que um navio sofrera uma pane e não viria, reduzindo efetivamente a quantidade de combustível na cidade. O medo de ficar a seco levou os motoristas a se apressar em abastecer. O resultado óbvio foi o oportunismo dos empresários. Para ficar somente no exemplo que conheço, de um dia para o outro, o posto em que abasteço majorou o preço da gasolina em 10 centavos, elevando-o para R$ 2,79. Isso, decerto, sem qualquer mudança nos custos de produção, transporte, etc. Ou seja, o produto custou o mesmo para o revendedor, mas devido à maior procura, toma-te consumidor!
Enquanto em Brasília a tchurma se agita com a futura condição do Brasil de país exportador de petróleo (já existe gente querendo gastar dinheiro por conta da vindoura produção do Pré-Sal), cá ficamos pagando quase R$ 3,00 por um único litro de gasolina.
Ô vida!

sábado, 30 de agosto de 2008

O último dia

Meu amor
O que você faria se só te restasse um dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?
Ia manter sua agenda
De almoço, hora, apatia?
Ou esperar os seus amigos
Na sua sala vazia?
Meu amor
O que você faria se só te restasse um dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?
Corria pr'um shopping center
Ou para uma academia?
Pra se esquecer que não dá tempo
Pro tempo que já se perdia?
Meu amor
O que você faria se só te restasse esse dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?
Andava pelado na chuva?
Corria no meio da rua?
Entrava de roupa no mar?
Trepava sem camisinha?
Meu amor
O que você faria?
O que você faria?
Abria a porta do hospício?
Trancava a da delegacia?
Dinamitava o meu carro?
Parava o tráfego e ria?
Meu amor
O que você faria se só te restasse esse dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?
Me diz o que você faria
Me diz o que você faria...

Encerro minhas atividades internéticas de hoje com a instigante e agradabilíssima canção composta por Paulinho Moska e Billy Brandão, gravada pelo primeiro, que nos remete a um exercício que faço sempre.
Na verdade, eu não penso no fim do mundo, mas na minha própria morte. Penso no que aconteceria com as pessoas diretamente ligadas a mim se eu morresse agora. Pode parecer mórbido e até tétrico mas, acredite, é um bom exercício. A mim, não faz nenhum mal. E me ajuda a repensar certas coisas. Além do mais, não vejo motivo para esse horror medieval que as pessoas continuam tendo da morte.
O poema escolhido para encerrar este dia sugere um fim, um fechamento. De fato, amanhã começa uma nova época, para quem, como eu, adora ciclos. Mas sobre isso falo amanhã.
Boa noite.

O mito do juiz imparcial

Vale muito a pena ler o excelente artigo abaixo, que mostra como é fácil derrubar o mito da imparcialidade do juiz. Basta ler o que ele escreve.

Juízos perigosos
Ninguém reconhece que julga conforme impressão pessoal
por Eduardo Mahon (advogado)

Nenhum juiz reconhece que julga conforme suas impressões pessoais sobre o acusado. Preferem dizer que julgam os fatos. Não é verdade. Os magistrados, ainda atentos à etiologia e teorias do risco, ainda centram suas sentenças nos supostos “índices de periculosidade” do autor, atuando mais como psicólogos do que julgadores, aplicando seus próprios valores sobre terceiros, numa fundamentação essencialmente jurídica. Uma rápida consulta ao banco de sentenças do Tribunal de Justiça de Mato Grosso é capaz de desvendar essa armadilha neo-positivista.
Convido o leitor para ler referências reais de sentenças e decisões penais do estado de Mato Grosso e refletir sobre elas. Com objetivo de facilitar a leitura, não colocarei entre aspas e sim aplicarei o itálico como método de referência à fala judicial selecionada. Para alguns, a “periculosidade” é, simplesmente responder a outro processo criminal, como se extrai: o fato dela encontrar-se respondendo a processo, pela mesma pratica delitiva, evidenciando sua periculosidade. Para outros, a afetação social são causas de “periculosidade”: assim, a presença de duas causas de aumento de pena denota maior periculosidade do agente, que agride a ordem social de modo mais exacerbado e maior risco para a vítima, impondo, por conseqüência uma majoração acima do mínimo legal.
A prevenção especial ainda é utilizada pelos magistrados, cotejando a pena pela iminência da agressão à sociedade ou da probabilidade calculada pelo próprio magistrado, conforme se pode observar: Portanto, permitir que elementos desse nível de periculosidade tenham acesso à sociedade novamente, antes de efetivamente cumprirem suas penas, é expor a vida de inocentes a perigo.
Considerações de ordem moral, ética, social, psicológica também são freqüentes na definição de “periculosidade”. Termos como destemor, sordidez, baixeza e outros termos subjetivos também se fazem maciços. Observemos alguns casos onde os conceitos pessoais do juiz foram determinantes: a) revela audácia e destemor do agente da infração, além de completa insensibilidade moral, despida de valores éticos, denotando intensa periculosidade, todo a exigir repressão mais rigorosa; b) revelando alto grau de periculosidade, haja vista tratar-se de crime hediondo, repugnante e sórdido; c) às circunstâncias ficaram estampadas face da audácia e periculosidade do agente, visto ter praticado o crime a luz do dia em local movimentado da cidade, demonstrando uma total insensibilidade; d) revela audácia e destemor do agente da infração, além de completa insensibilidade moral, despida de valores éticos, denotando intensa periculosidade, todo a exigir repressão mais rigorosa; e) revela pela sua conduta alta periculosidade social, ausência de limites e de senso crítico, além de preocupante ousadia.
E, finalmente, julgam conforme o conceito social do delito e não conforme a própria legislação, agravando-se assim duplamente a pena: devendo prevalecer o bem-estar social sobre o individual, pois a quantidade de substância entorpecente encontrada com o denunciado evidencia a sua periculosidade e a conduta do mesmo, que revela-se extremo risco à ordem pública, com a prática de um crime abominável para a sociedade.
Todavia, separei três casos extremamente significativos. O primeiro diz respeito à medicalização do Direito Penal. O magistrado repassa a responsabilidade penal a outros órgãos estatais a coadjuvar uma pena indeterminada. Observemos: determino que a perícia médica para apurar a sua periculosidade seja realizada no prazo de um ano, ficando a incumbência a cargo da Secretaria Municipal de Saúde. O segundo caso emblemático diz respeito ao julgamento conforme a opinião pública, sendo essa a justificativa para mensurar a “periculosidade”.
O juiz cita o clamor social e o interesse público como elementos jurídicos capazes de majorar a pena, conforme se vê: há que se ter em vista a necessidade de manutenção da ordem pública em crimes de tamanha gravidade, que não apenas suscitam clamor público como revelam periculosidade de seus autores, devendo o interesse da sociedade prevalecer em detrimento do direito individual do réu, independentemente das condições pessoais que este possa ostentar.
Quero sublinhar o final — é perigoso o réu pelo clamor social, independentemente das condições pessoais exibidas em juízo. E, por fim, o magistrado utiliza-se da repercussão do fato nos jornais para amparar o seu entendimento: no caso dos autos, o acusado, em concurso de agentes, desempenhou atuação extremamente audaz, com elevada periculosidade, tendo causado verdadeiro sentimento de pânico nas vítimas, o que foi amplamente reproduzido pelos veículos de comunicação local.
Ao estudar o banco de dados do TJ-MT, exceção deve ser feita a três magistrados que discutem a questão da indeterminação da “periculosidade” e seu conteúdo profundamente subjetivo e ideológico: Célia Vidotti, João Alberto Menna Barreto Duarte e Douglas Romão. Pesquisando todas as indexações contidas no repositório de jurisprudência, extraio o nítido delineamento de várias teorias que são mal absorvidas e misturadas entre si: o Direito Penal do autor, seja pelo finalismo, seja pelo funcionalismo penal. E algumas tendências: a) julgar conforme a moral e ética pessoal; b) julgar conforme o clamor público; c) julgar conforme a mídia; d) identificar o inimigo na zona de pobreza, protegendo os bens jurídicos ligados ao patrimônio; e) não há qualquer sistematização da definição de “perigoso”, sendo completamente arbitrária a fixação do conceito. Afinal, quem é mais perigoso?
Revista Consultor Jurídico, 30 de agosto de 2008

Reféns da demagogia

Mais uma vez garimpando pelos blogs amigos, encontrei em O Intimorato, do Fred Guerreiro, uma valiosa análise sobre o tema da segurança pública em nosso Estado. Ele, que não é nem um pouco amigo da governadora, a quem chama carinhosamente de "Nhá Júlia", resolve absolvê-la pelo problema da insegurança, da criminalidade excessiva. Não é que esse drama urbano esteja isento de relação com a omissão e a incompetência do poder público. Pelo contrário. Mas é que existem muitas outras causas, relacionadas ao próprio cidadão. É disso que ele trata, em uma interessantíssima abordagem, que merece ser conhecida, mesmo que você não concorde com todos os seus aspectos.
Leia aqui.

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Doação de cadáver

O Centro Universitário do Pará — CESUPA, instituição na qual leciono e que há dois anos mantém um curso de Medicina, acaba de receber uma importante doação, que só pode ser feita pelo poder público e que muito interessa à formação de seus acadêmicos: um cadáver.

Trata-se, naturalmente, de um cadáver não reclamado por nenhum parente ao Centro de Perícias Científicas "Renato Chaves", que engloba o Instituto de Medicina Legal. É o terceiro corpo doado a instituições científicas.

O procedimento é disciplinado pela Lei n. 8.501, de 30.11.1992, que só permite a doação para fins de ensino e pesquisa de caráter científico, após 30 dias sem a manifestação de qualquer interessado. Dispõe a lei:

"Art. 3° Será destinado para estudo, na forma do artigo anterior, o cadáver:
I - sem qualquer documentação;
II - identificado, sobre o qual inexistem informações relativas a endereços de parentes ou responsáveis legais.
§ 1° Na hipótese do inciso II deste artigo, a autoridade competente fará publicar, nos principais jornais da cidade, a título de utilidade pública, pelo menos dez dias, a notícia do falecimento.
§ 2° Se a morte resultar de causa não natural, o corpo será, obrigatoriamente, submetido à necropsia no órgão competente.
§ 3° É defeso encaminhar o cadáver para fins de estudo, quando houver indício de que a morte tenha resultado de ação criminosa.
§ 4° Para fins de reconhecimento, a autoridade ou instituição responsável manterá, sobre o falecido:
a) os dados relativos às características gerais;
b) a identificação;
c) as fotos do corpo;
d) a ficha datiloscópica;
e) o resultado da necropsia, se efetuada; e
f) outros dados e documentos julgados pertinentes.

Art. 4° Cumpridas as exigências estabelecidas nos artigos anteriores, o cadáver poderá ser liberado para fins de estudo.
Art. 5° A qualquer tempo, os familiares ou representantes legais terão acesso aos elementos de que trata o § 4° do art. 3° desta Lei."

O fim está próximo!

Penitenziagite!! O mundo vai acabar no dia 10 de setembro próximo!
Nosso amigo Oliver, um dos articulistas do Flanar, anuncia a data para deixarmos de existir. Calma, ele não é profeta. Apenas lê os jornais. Clique aqui para saber do que estamos falando.

Vá trabalhar assim... no Japão!

Extraído da revista Galileu, n. 204 (julho de 2008), p. 21:

Eu quero sossego!
Empresas nipônicas rasgam a legislação trabalhista do país e dão uma trégua a seus extenuados profissionais.

Jornadas excessivas, pressão e estresse são as associações quando se fala em trabalho no Japão. No país famoso pela rigidez de suas leis trabalhistas - folgas somente uma vez por semana, dias de férias que variam com o tempo de serviço etc. - existe até um termo para se referir aos casos de mortes por excesso de trabalho, os "karoshi". Mas os nipônicos dão as primeiras demonstrações de que estão de saco cheio. Por conta disso, começam a aparecer algumas mordomias de fazer inveja até mesmo aos funcionários públicos do mundo ocidental. (FERNANDA COLAVITTI)


Licença dor-de-cotovelo
Os funcionários da Hime & Co., de Tóquio, podem ficar em casa curtindo a dor-de-cotovelo em caso de divórcio - não importando de qual dos dois partiu a decisão. O benefício é de um dia para os funcionários de 20 anos, de dois dias para os que já chegaram aos 25 e de três dias a partir dos 30 (os mais jovens se recuperam mais rápido, segundo a empresa).


Pausa para um cochilo
No Japão, dormir no trabalho não só é permitido: é um sinal de que a pessoa tem se esforçado. Mas a prática, batizada de "inemuri" ("estar presente enquanto dorme"), segue algumas regras. Não é permitido deitar na mesa e o benefício só é permitido aos funcionários dos cargos mais altos e mais baixos. Os intermediários têm de se manter acordados.


Auxílio-bebedeira
A empresa Japan General Estate Co. irá oferecer um benefício mensal de cerca de 5 mil reais para os empregados que supervisionam 20 ou mais pessoas. Com esse dinheiro, eles podem levar seus subordinados para beber depois do trabalho. As happy-hours são encorajadas no país, como uma maneira de aliviar a tensão das longas jornadas.


Vigilantes do peso
Pode soar ditatorial à primeira vista, mas a iniciativa do governo japonês de obrigar as empresas a medir a circunferência abdominal dos funcionários de 40 anos pode ser uma estratégia para conter a obesidade. Homens com medidas acima de 85 centímetros e mulheres com mais de 90 centímetros de cintura serão incluídos em um grupo de alto risco.


Nem vou perguntar qual das medidas acima mais lhes agradou, porque já sei a resposta. Pergunto, então, que outros benefícios vocês acham que poderiam ser ofertados aos trabalhadores brasileiros, a fim de melhorar a sua qualidade de vida. Licença jogo-da-copa não precisa propor, porque já existe.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Recomendo uma religião

A interminável peleja em torno das concessões que o Estado de Direito faz às religiões — e a uma muito em especial —, mesmo sendo oficialmente laico, acaba de detonar mais uma polêmica. A bola da vez é o juiz Éder Jorge, da 4ª Vara Criminal de Goiânia, que concedeu livramento condicional para a famosa Vilma Martins Costa, condenada a 15 anos e 9 meses de reclusão por dois crimes de sequestro, tendo como vítimas Pedro Rosalino Braule Pinto e Aparecida Fernanda Ribeiro da Silva, criados como seus filhos.
Como a liberdade é condicional, faz-se mister que a sentença concessiva estipule as condições mediante as quais o apenado deverá ficar em liberdade, sob pena de retornar à instituição penitenciária. E o juiz fixou as seguintes condições:

I – residir no endereço a ser declarado, relacionando-se bem com seus familiares e coabitantes;
II – recolher-se a sua residência até às 21:00 horas;
III – não mudar de endereço residencial e nem ausentar-se desta cidade sem previa comunicação a este juízo;
IV- comparecer bimestralmente perante o SIP para comprovar suas atividades;
V – exercer trabalho honesto e ter comportamento exemplar na sociedade;
VI – atender com rapidez e boa vontade as intimações das autoridades judiciárias e policiais, e fornecer todas as informações requisitadas pelos órgãos de fiscalização destas condições;
VII – conduzir documentos pessoais e cópia das condições supra, para exibi-los quando solicitados;
VIII – não portar armas, nem freqüentar locais de má fama ou fazer-se acompanhar de pessoas de maus costumes.
IX – Recomenda-se freqüência a entidades religiosas de formação cristã
X – Deverá o reeducando estar munido de documento de Identificação pessoal (cédula de identidade, CNH ou identidade funcional) como condição para ser colocado em liberdade, devido a cópia respectiva ser juntada aos autos.

As condições acima são rotineiras, inclusive quanto aos conceitos indeterminados que utiliza ("relacionando-se bem com seus familiares"; "comportamento exemplar"; "locais de má fama"; "pessoas de maus costumes"). O problema é o item IX, no qual o magistrado alude a acompanhamento religioso. Questionado, ele já se defendeu, alegando que fez apenas uma recomendação, sem caráter impositivo, porque a religião é importante na formação do caráter do indivíduo. A sentença, como se vê, usa de fato o verbo "recomenda-se". Mas uma decisão judicial não é uma recomendação, muito menos quando é nítido que o juiz está fixando regras para a liberdade da apenada. Além disso, porque uma religião cristã? A cidadã não pode decidir-se por cultos afrobrasileiros ou talvez pelo budismo? Não poderia ela adotar o agnosticismo ou o ateísmo, o que estaria em plena consonância com a condição laica do Brasil?
A confusão está posta. E Vilma, o que decidirá?

Horror na intimidade do lar

Uma estatística para estarrecer aqueles que têm sangue nas veias: de cada quatro idosos internados em hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS), um sofreu agressão. 25%. Esses crimes horrorosos têm como autores membros da própria família ou pessoas contratadas para tomar conta das vítimas. Em qualquer situação, trata-se de uma covardia inominável, que hoje pode ser penalmente punida através da caracterização de tortura, com pena cominada de 2 a 8 anos de reclusão.
O fato revela o que já disse por aqui em outras ocasiões: vivemos em uma sociedade de psicopatas, à caça apenas de uma oportunidade para dar vazão a sua crueldade. Isso se percebe pela natureza das vítimas: quando crianças ou idosas, são indefesas perante seus agressores, às vezes incapazes até de pedir socorro, mais tarde, quando um parente chega. E se é verdade que a esmagadora maioria dos delitos é cometida por homens, sobretudo em se tratando de práticas violentas, nos casos de agressão deste tipo, descortina-se a perversidade feminina, guardada em mulheres franzinas e aparentemente inofensivas. É de meter medo em qualquer um.
Qual será a sensação de agredir uma pessoa, especificamente devido a sua indefensividade? Isso é maldade, no sentido mais puro da palavra. E merece uma resposta à altura, não apenas das autoridades, mas das famílias, principalmente se a covardia nasceu dentro dela.

Anjo da guarda sênior

Mais um anjo da guarda entra na lista dos candidatos a promoção. Trata-se do protetor de um menino de apenas 1 ano e 6 meses, que caiu do terceiro andar de um edifício no Recife. A criança sofreu pequenas fraturas e passa bem. Motivo da sorte, segundo testemunhas: a fralda descartável prendeu numa ponte de ferro, em cima do muro. Isso mesmo, prendeu num ofendículo, destinado a dificultar a passagem de invasores. Se a criança tivesse caído exatamente em cima das pontas de ferro, teríamos uma cena de filme trash. Mas ela passou raspando e justamente isso a salvou.
Merecimento é tudo.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Suprema audiência pública

Pela primeira vez em sua história, o Supremo Tribunal Federal, reconhecendo os elevados impactos que seus provimentos acarretam sobre a vida das pessoas, realiza audiências públicas para subsidiar uma decisão. Ponto para ele. Meus parabéns. Só lamento que a medida seja tomada quando o assunto interessa à Igreja — a grande manifestante neste caso —, mas não quando o que está em jogo são questões tributárias, a arrecadação do governo e o nosso bolso. Neste caso, até repristinação vale.
As audiências públicas — utilizadas pela primeira vez durante a análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 3510 (contra a Lei de Biossegurança, acerca das células-tronco)* — foram novamente convocadas no bojo da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n. 54, que decidirá se é ou não constitucional abortar fetos portadores de anencefalia e moléstias análogas. O primeiro dia de debates é hoje. Eles prosseguem no dia 28 e, finalmente, 4 de setembro.
Transcrevo os dados abaixo diretamente do sítio do STF:

Instituições e especialistas inscritos na audiência pública:26 de agosto de 2008 (terça-feira)
1. Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB

Representante: Padre Luiz Antônio Bento
Currículo: Doutor em Bioética pela Universidade Lateranense e Academia Alfonsiana de Roma, Assessor Nacional da Comissão Episcopal para a Vida e a Família da CNBB, e autor do livro Bioética. Desafios éticos no debate contemporâneo. São Paulo, Paulinas, 2008.

Representante: Dr. Paulo Silveira Martins Leão Junior
Currículo: Procurador do Estado do Rio de Janeiro e Presidente da União dos Juristas Católicos da Arquidiocese do Rio de Janeiro. Vem trabalhando há anos em temas de bioética e biodireito.

2. Igreja Universal
Representante: Bispo Carlos Macedo de Oliveira
Currículo:

3. Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família
Representante: Dr. Rodolfo Acatauassú Nunes
Currículo: Professor Adjunto do Departamento de Cirurgia Geral da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Mestre e Doutor em Medicina pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Livre-Docente pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.

4. Católicas pelo Direito de Decidir
Representante: Maria José Fontelas Rosado Nunes
Currículo: Socióloga, doutora pela École des Hautes em Sciences Sociales, Paris (1991); Mestra em Ciências Sociais pela PUC/São Paulo (1984) e pela Université Catholique, Louvain – la – Neuve, Bélgica (1986). É Professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, pesquisadora CNPq e membro dos Conselhos do NEMGE/USP e da Revista de Estudos Feministas, entre vários outros. É autora de artigos e capítulos de livros em obras nacionais e internacionais, algumas das quais receberam prêmios, como o da UNESCO (1995), Jabuti e Casa Grande & Senzala (1998). Seu campo de interesse é o cruzamento das questões de gênero e religião. Fundou e dirige a ONG Católicas pelo Direito de Decidir. Em 2005, foi indicada pela Associação Mil Mulheres pela Paz, juntamente com outras 51 brasileiras, para receber coletivamente o prêmio Nobel da Paz.

5. Associação Médico-Espírita do Brasil – AME
Representante: Marlene Rossi Severino Nobre
Currículo: Médica ginecologista aposentada, especializada em prevenção do câncer; participou de inúmeros seminários e estágios na área médica, inclusive estágios nos Hospitais Broca e Boucicault, em Paris, e curso de formação em Psicoterapia no Instituto de Psiquiatria e Psicoterapia da Infância e Adolescência (PPIA), Dra. Amélia Thereza de Moura Vasconcellos, em São Paulo. Foi Diretora do Posto de Assistência Médica (PAM) do INAMPS, da Várzea do Carmo, em S. Paulo, bem como Chefe do Serviço de Clínicas e Chefe do Serviço de Patologia Clínica desse mesmo PAM. Preside atualmente a Associação Médico-Espírita Internacional (AME-Int), e a Associação Médico-Espírita do Brasil. Tem participado de inúmeros congressos nacionais e internacionais.

28 de agosto de 2008 (quinta-feira)
1. Conselho Federal de Medicina
Representante: Dr. Roberto Luiz D’Ávila
Currículo: Médico Cardiologista; Coordenador da Câmara sobre Terminalidade da Vida e Cuidados Paliativos; Conselheiro do Conselho Regional de Medicina do Estado de Santa Catarina e do Conselho Federalç de Medicina; Ex-Presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de Santa Catarina; 1º Vice-Presidente do Conselho Federal de Medicina; Membro do Grupo de Trabalho do Ministério da Saúde sobre Morte Súbita; Mestre em Neurociências e Comportamento; Professor Adjunto da UFSC; Coordenador da Câmara Técnica de Informática em Saúde; doutorando em Medicina/Bioética pela Universidade do Porto/Portugal.

2. Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia
Representante: Prof. Dr. Jorge Andalaft Neto
Currículo: Prof. Titular de Obstetrícia e Ginecologia da Universidade de Santo Amaro. Mestre e Doutor em Obstetrícia pela Unifesp - Escola Paulista de Medicina. Membro da Comissão Nacional de Aborto Previsto em Lei da Febrasgo.

3. Sociedade Brasileira de Medicina Fetal
Representante:
Currículo:

4. Sociedade Brasileira de Genética Clínica
Representante:
Currículo:

5. Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência
Representante: Doutor Thomaz Rafael Gollop
Currículo:

6. Deputado Federal José Aristodemo Pinotti.
Currículo:

7. Deputado Federal Luiz Bassuma
Currículo: Presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Vida – Contra o Aborto

8. Professora Lenise Aparecida Martins Garcia
Currículo: Professora titular do Departamento de Biologia Molecular da Universidade de Brasília. Presidente do Movimento Nacional da Cidadania em Defesa da Vida – Brasil Sem Aborto.

4 de setembro de 2008 (terça-feira)
1. Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero – ANIS
Representante: Débora Diniz
Currículo: É antropóloga, doutora em Antropologia e pós-doutora em Bioética. Atualmente é professora da Universidade de Brasília e pesquisadora da organização não-governamental Anis – Instituto de Bioética Direitos Humanos e Gênero e compõe a diretoria da Associação Internacional de Bioética.

2. Associação de Desenvolvimento da Família – ADEF
Representante:
Currículo:

3. Escola de Gente
Representante: Claudia Werneck
Currículo:

4. Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos.
Representante: Dra Lia Zanotta Machado
Currículo: Lia Zanotta Machado possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (1967), mestrado em Sociologia pela Universidade de São Paulo (1979), doutorado em Ciências Humanas (Sociologia) pela Universidade de São Paulo (1980) e pós-doutorado na École des Hautes Études en Sciences Sociales (1993/1994). Atualmente é professora titular de Antropologia da Universidade de Brasília. Lia Zanotta integra o Conselho Diretor da Rede Feminista de Saúde Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, tendo integrado a Comissão que elaborou o anteprojeto de lei sobre a Revisão da Legislação Punitiva e Restritiva ao Aborto no Brasil.


* Correção feita graças à intervenção da querida Rita Helena, aí na caixinha de comentários.

Descobrindo a pólvora

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul acabou de julgar um recurso e, nele, concluir que é abusiva e portanto ilegal a cláusula contratual, imposta pelas operadoras de telefonia celular, a respeito de tempo mínimo de fidelidade, sob pena de multa. Embora louvável a decisão — que chega com ares de novidade, a merecer uma notícia a respeito —, de se lamentar que chegue com tanto atraso, pois a abusividade da aludida cláusula é algo que salta aos olhos de qualquer jejuno.
A corte gaúcha entendeu que a disposição cria uma reserva de mercado para a operadora, estabelecendo uma relação de grande proveito para ela, em detrimento do consumidor. Ora, pois! E quem não sabe? Ainda mais se o cidadão estiver insatisfeito com os serviços que lhe são oferecidos.
Para minimizar os efeitos de suas malinagens, as empresas hoje condicionam as suas promoções a uma fidelização de pelo menos um ano. Pode-se até admitir que esta medida seja legalmente admissível, embora não seja essa a minha opinião. Afinal, ninguém é obrigado a vender aparelhos a preços simbólicos, muito menos ofertá-los gratuitamente. Se o cliente aceita a oferta em troca de uma fidelização, exercitou sua liberdade de escolha, mormente se for cliente novo e, portanto, livre de quaisquer embaraços que a empresa pudesse causar. É minha opinião, contudo, que as estratégias mercadológicas usadas por todas as empresas são construídas na maldade, para explorar brechas, atrair o consumidor e, somente ao final, abrir o jogo. Mesmo que a cláusula em si não fosse ilegal, a forma de captação do cliente foi imoral, o que já autoriza, a meu ver, a punição do fornecedor.
Vale lembrar que, há alguns anos, você só podia comprar um aparelho se habilitasse uma linha nova — o mais escandaloso caso de venda casada de que já fui vítima pessoalmente. Meu aparelho quebrou numa queda e, para adquirir outro, fui submetido a essa extorsão manifesta. Ministério Público fez alguma coisa? Nada. A prática acabou (ou foi mitigada) graças às leis do próprio mercado: o aumento da concorrência, pela chegada de novas operadoras.
Enfim, com atraso ou sem originalidade que seja, o precedente gaúcho é importante, ao menos para nos ajudar a redigir petições, quando for nossa vez de correr atrás de nossos direitos. Infelizmente, contudo, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (justamente do qual os paraenses são jurisdicionados) entende o contrário e autoriza a cláusula em questão. Que lástima!
O argumento de que a fidelização serve para garantir o preço subsidiado do aparelho é simplesmente ridículo. Afinal, o custo do aparelho, para a operadora, é apenas uma módica fração do preço cobrado do cidadão comum, em qualquer loja. Aquela coisa de lucrar 300% em cima de um só item. Coisas de Brasil.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

O político e o caju

Há tempos que me ressinto de não colocar, aqui no blog, nada de poético. Afinal, poesia sempre foi das artes uma das minhas favoritas. Volta e meia, alguma bela obra aparecia por aqui. Decidi, então, clicar no marcador "Poesia" e conferir o que já fora publicado. Deletei-me com dois belos poemas, postados em junho e setembro de 2007, portanto há muito tempo, de modo que leitores mais recentes deles não tomaram conhecimento.
Vale a pena relembrar: nestes tempos de campanha eleitoral, mostremos como este país não muda, em se tratando de políticos.
Depois, podemos rir com o maravilhoso Vinícius de Morais e algo que você nunca pensou sobre o caju.
Aproveite.

Virtuais, mas localizáveis

Os doentes que se escondem atrás do anonimato da Internet que se cuidem. O cerco aperta.

Prato frio
Autora de ofensa no Orkut é localizada três anos depois
por Daniel Roncaglia
Uma briga entre garotas de colégio foi parar na Justiça graças ao alcance que as ofensas pessoais ganharam com a internet. O caso só foi resolvido três anos depois quando a adolescente ofendida, que tinha 17 anos na época, já tinha saído da escola e mudado para os Estados Unidos. Os motivos do ataque — feito por meio de comunidades no Orkut — só foram compreendidos depois que a máquina de onde foram criadas as páginas foi finalmente identificada pela Polícia.
Em 2005, a adolescente foi “homenageada” por uma colega da escola com duas comunidades no Orkut dedicadas a ofendê-la em razão da origem de sua família, que é da região norte do país. As comunidades colocavam em dúvida, com termos indelicados, a conduta sexual da moça. A mãe da jovem reclamou à escola. A diretoria tomou providências e alguns colegas saíram das comunidades, mas passaram a ameaçar a jovem até ela sair da escola.
Também foram feitas reclamações à Google, dona do Orkut, nos Estados Unidos. Nenhuma providência foi tomada. Na época, além de dizer que a subsidiária brasileira não era responsável pelo site, a empresa matinha a posição de não abrir os dados de seus usuários.
A Google chegou a dar a seguinte sugestão: “se você optar por processar essa pessoa legalmente e a ação resultar em uma determinação de que o material é ilegal ou deve ser removido, tomaremos as providências necessárias para retirá-lo do Orkut”.
A mãe da menina encaminhou então representação para que o caso também fosse investigado pelo Ministério Público. Os promotores determinaram que a 4ª Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática de São Paulo abrisse um inquérito para investigar os autores das ofensas. Um processo também foi ajuizado na Vara de Infância e Juventude de São Paulo.
Em junho de 2006, cerca de um ano depois da criação das comunidades, o Orkut enviou um oficio à advogada Giovanna Gazola, que defende a adolescente ofendida, afirmando que as páginas já não estavam no ar. Apesar disso, a autora das comunidades continuou desconhecida.
A Polícia só descobriu o IP da máquina (sigla em inglês de Protocolo de Internet, que é á identificação digital de cada máquina que se conecta à rede mundial de computadores) no meio deste ano. O computador era de uma ex-colega de classe da adolescente. Com isso, o processo pôde ser finalmente julgado em julho deste ano. Descobriu-se que o motivo do ataque era ciúme. Explica-se: a autora da comunidade mantinha um relacionamento homossexual com uma amiga da garota ofendida. Como a agressora também era menor de idade quando fez a comunidade, ela não pôde responder criminalmente pelo ataque.
Nova atitude
Casos como este fez a Google mudar de posição sobre o sigilo de informações no Orkut. Em julho deste ano, a empresa assinou acordo com o Ministério Público Federal em São Paulo para unir esforços para combater a pedofilia na internet. A Google Brasil se comprometeu a permitir o acesso a 3,2 mil álbuns do site de relacionamentos Orkut com conteúdo de pornografia infantil.
Além disso, o setor de atendimento ao consumidor da Google ficou obrigado a responder, no prazo de até 15 dias úteis, todas as reclamações formuladas por e-mail dos usuários do Orkut afetados pela criação de perfis e comunidades falsas ou ofensivas.
A mudança também foi influenciada pela série de decisões judiciais contra o Orkut na Justiça brasileira. Inicialmente, a Google Brasil argumentava que não conseguia obter as informações porque era apenas uma subsidiária da matriz americana. A dona do site era a empresa que fica nos Estados Unidos, argumentava. A Justiça, no entanto, rejeitou o argumento.
Em abril deste ano, por exemplo, a 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais determinou que a Google Brasil fornecesse o número do IP de um usuário do Orkut. O usuário desconhecido criou um falso perfil para difamar uma mulher.
Em novembro de 2007, o juiz Gustavo Quintanilha Telles de Menezes, da 26ª Vara Cível do Rio de Janeiro, determinou que a Google Brasil fornecesse ao Ministério Público e à Polícia Civil do Rio de Janeiro dados cadastrais de usuários do Orkut que praticaram crimes.
No mesmo sentido foi a decisão da 13ª Câmara Cível do TJ de Minas, que condenou a empresa a tirar do ar uma comunidade chamada “Lugar de ladrão é na cadeia” e identificar o criador. A 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio também atendeu pedido do Ministério Público para fornecer à Justiça do estado dados cadastrais dos criadores e integrantes das comunidades "Eu sei dirigir bêbado" e "Sou menor, mas adoro dirigir".
Em setembro de 2007, a Google Brasil anunciou que tinha passado a responder como procuradora de sua matriz. “Os dados continuarão sendo armazenados nos EUA, mas essa mudança vai agilizar o processo de identificação dos responsáveis pela publicação dessas informações”, afirmou o diretor-geral da Google Brasil, Alexandre Hohagen.
A Polícia também encontra agora os IPs dos usuários de internet com mais facilidade. No começo do mês, o advogado Guilherme Stinighen Gottardi, 26 anos, foi preso sob a acusação de ter falsificado perfil de duas pessoas no Orkut. Ele criou perfis de uma colega de trabalho, onde ela aparece nua em uma fotomontagem, e do noivo dela, apresentado como homossexual. Ele foi pego em flagrante em uma lan house, quando atualizava os perfis.
Revista Consultor Jurídico, 24 de agosto de 2008

Estratégias falhando

O sistema de justiça criminal é excludente, bem o sabemos. Não foi feito para alcançar quem está por cima da pirâmide social. Eventualmente, contudo, quando membros do andar superior cometem atos por demais escandalosos, acabam caindo nas malhas da Justiça. Nessas ocasiões, invariavelmente, recebem tratamento mais brando do que os acusados em geral, ou seja, recebem o tratamento que a lei prevê. Contudo, os tempos estão mudando e, mesmo nesses casos, a dificuldade tem aumentado.
Refiro-me às recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça, denegando habeas corpus em casos de repercussão nacional. Em um deles, a empresária goiana Silvia Calabresi Lima, que manteve em cárcere privado e torturou uma adolescente, bateu nas portas daquela corte atrás de uma ordem para ser submetida a exame de insanidade mental, o que já fora negado pelo juízo da causa e pelo Tribunal de Justiça de Goiás. Como estamos cansados de saber, insanidade temporária é a tese preferida dos privilegiados, quando não podem negar a autoria do delito nem alegar legítima defesa.
O outro HC negado pelo STJ foi impetrado em favor de uma duplinha daquelas: Nicolau Archilla Galan e Renato Grembecki Archilla, pai e filho, acusados de um delito tão famoso que tem até apelido: "o crime do Papai Noel". Os dois nacionais são acusados de contratar o assassinato de Renata Guimarães Archilla, neta e filha deles, respectivamente. Um crime que me deixou pessoalmente horrorizado, quando tomei conhecimento dele. A intenção, neste caso, era responder ao processo em liberdade. Graças ao tribunal superior, contudo, os dois permanecerão na cela.
Quer saber? Bem feito para os três. Para tudo tem um limite.

Data marcada

Enfim, temos o dia: 12 de setembro. Nessa data, estreará no Brasil Ensaio sobre a cegueira, o novo filme de Fernando Meirelles, em sua carreira internacional. Se você prestar atenção nos links à direita desta página, verá que há um para o diário de produção do filme.
Este não é um blog sobre cinema e os motivos do meu especial interesse no filme em questão dizem respeito a sua origem (ser uma adaptação da obra de meu escritor favorito, José Saramago, que até então rejeitava terminantemente a ideia de esse seu romance ser adaptado para as telas), ao diretor (considero uma honra que o Brasil tenha em Fernando Meirelles um representante entre os grandes cineastas mundiais, o que pode ajudar a divulgar as produções nacionais), à atriz principal (adoro Julianne Moore) e, sobretudo, ao tema: o romance e, consequentemente, o filme exploram uma natureza humana cruel e desoladora, que aflora em um momento de grande perplexidade e medo.
Ensaio sobre a cegueira é, evidentemente, uma metáfora sobre a alma humana, capaz de pensar e fazer tantas coisas más e sem sentido, como todos nós sabemos muito bem.
Finalmente, a cegueira vem chegando.

Brasilianidades

I


A Constituição de 1988 veda o nepotismo no serviço público, mas é preciso que inúmeras forças atuem para que se "descubra" isso. A última novidade foi decisão do Supremo Tribunal Federal regulamentando o assunto — regulamentação essa que, na prática, significa fazer hoje o mesmo óbvio que deveria ter sido feito quase vinte anos atrás.


II


Face à decisão do STF, o senador Morazildo Cavalcanti (PTB-RR) — anote aí o nome do nacional — já está propondo mudanças na Constituição, para que a regra seja "flexibilizada" — neste país, a palavra flexibilização sempre dá medo —, permitindo o empreguismo da parentada, quando realmente "qualificada". Tão Brasil...

III

Não seria muito melhor dizer, de uma vez por todas, com todas as letras: eu quero mais é que a sacanagem continue e ninguém me encha o saco?!

Não seria digno, claro. Mas seria verdadeiro. Por essas e outras, referencial de político é mesmo Justo Veríssimo, o famoso personagem de Chico Anysio, cujo bordão era "Eu tenho horror a pobre!"
Um crápula, na pior acepção do termo. Mas falava a verdade. Só por isso, já era melhor do que a maioria dos colegas da vida real.

sábado, 23 de agosto de 2008

E ela floresce!

Hoje, dia 23 de agosto, nossa pequena Júlia completou o seu primeiro mês de nascida. Pela manhã, uma consulta pediátrica revelou que ela já está com quase 3,7 Kg. Seu desenvolvimento está plenamente normal. Aos poucos, as coxas engrossam e assumem uma aparência musculosa — pré-atleta olímpica, a julgar por um de seus esportes favoritos: atravessar o berço se empurrando com as pernocas.

Não houve exatamente uma comemoração nem cantos de parabéns. Não fizemos um "messário" ou "mesversário", como se fala hoje em dia. Mas alguns amigos que gentilmente nos visitaram nesta data tiveram a oportunidade de desfrutar, conosco, de um maravilhoso bolo de bacuri que, seguramente, é um dos melhores bolos que já comi na vida — e olha que doce é comigo mesmo. Neste momento nem me recordo de algum melhor. Trata-se de uma massa leve e o bacuri entra no recheio, na geleia e em pedaços de polpa que enfeitam a cobertura. O glacê é levemente aromatizado com a fruta, produzindo um resultado divino e nada enjoativo. Só experimentando.


Na imagem, vocês veem um pai empolgado tentando despertar mãe e filha sonolentas. E o mencionado bolo, claro.

Como todos os dias, agradecemos a Deus por nos ter enviado uma criança boazinha, tranquila e, acima de tudo, saudável. Sem nenhum favor, a filha com que sonhamos.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Derretendo

Se tem uma notícia capaz de destruir o meu humor é previsão do tempo indicando aumento do calor — e é exatamente isso que a imprensa publica hoje, segundo dados do 2º Distrito de Meterologia. Calor de 35º, com sensação térmica de 38º. E o que é melhor: durante todo o segundo semestre, já que o alívio só virá com as chuvas de dezembro.
Portanto, meus amigos, o negócio é abusar das roupas leves (se você não for obrigado a usar terno, como eu), tomar muito líquido e cantar aquela famosa canção da Marisa Monte:

Ó chuva, vem me dizer
Se posso ir lá em cima pra derramar você

Boa sorte, sumanos. Porque vamos precisar.

PS — Minha solidariedade ao povo do sul do Estado, onde a situação é declaradamente pior. Não quero nem pensar no que é pior do que isso.

Foragidos

O direito de saída temporária da prisão é, hoje, um dos temas fustigados pelos moralistas de plantão, sempre lembrados aqui no blog, defensores das ideias da linha lei e ordem. Por conta disso, a imprensa — que cumpre exatamente esse papel de fazer recircular a desinformação e a repulsa ao que não se compreende — tem dado atenção especial à liberação dos apenados. A única vantagem é que todos podemos conhecer os números reais e a informação é essencial para que possamos formar nossa opinião sobre o benefício.
De acordo com os últimos dados da Superintendência do Sistema Penal, 657 condenados obtiveram o direito de passar o dia dos pais em casa. Desses, 89 não retornaram à prisão e agora são foragidos, sujeitos à recaptura e à regressão ao regime fechado. Se voltarem a cumprir pena, para pleitearem novos benefícios de execução penal precisarão passar doze meses sem cometer faltas disciplinares, retornando assim à classificação de bom comportamento carcerário.
89 foragidos importam em 13,54% dos beneficiados — um número sem dúvida alto, mormente considerando que a taxa estava abaixo dos 10%, nas vezes anteriores. Entretanto, mesmo diante disso, é o caso de perguntar: e os 86,46% restantes, não servem para apontar o cabimento do benefício? Pesando prós e contras, o indicativo não continua sendo favorável aos condenados que, mais responsáveis, realmente estão fazendo por onde retornar à liberdade pela porta da frente?

Volta por cima

Já dizia Carlos Drummond de Andrade que a hora mais bela surge da mais triste.

Parabéns, Maurren Maggi, primeira mulher brasileira a ganhar ouro em um esporte individual.

Sobre o tribunal do júri

"Com algumas alterações, impostas pela lição da experiência e pelo sistema de aplicação da pena adotado pelo novo Código Penal, foi incluído no corpo do projeto o Decreto-lei 167, de 5 de janeiro de 1938. Como atestam os aplausos recebidos, de vários pontos do país, pelo Governo da República, e é notório, têm sido excelentes os resultados desse Decreto-lei que veio afeiçoar o tribunal popular à finalidade precípua da defesa social. A aplicação da justiça penal pelo júri deixou de ser uma abdicação, para ser uma delegação do Estado, controlada e orientada no sentido do superior interesse da sociedade. Privado de sua antiga soberania, que redundava, na prática, numa sistemática indulgência para com os criminosos, o júri está, agora, integrado na consciência de suas graves responsabilidades e reabilitado na confiança geral."
Ministro Francisco Campos, na exposição de motivos do projeto de lei que se converteu no Decreto-lei n. 3.689, de 1941 — Código de Processo Penal, ainda em vigor.

Estou certo de que Francisco Campos — grande jurista de seu tempo, a quem se atribui a redação da Constituição de 1937 e do famigerado Ato Institucional que deflagrou o golpe militar de 1964 —, se pudesse manifestar-se hoje, não estaria tão seguro de que o tribunal do júri consegue cumprir sua "finalidade precípua da defesa social", ou que as pessoas — cidadãos comuns — que dele fazem parte estão mesmo conscientes de suas graves responsabilidades. E, com certeza, não afirmaria que a instituição está reabilitada na confiança geral.
Duvido que haja uma instituição de processo penal mais polêmica do que o tribunal do júri. Sua origem pode ser considerada uma conquista da civilização. Afinal, foi criado para democratizar o Poder Judiciário, permitindo ao cidadão comum, nos casos pré-estabelecidos, atuar como juiz de fato, ou seja, tomar parte ativa na distribuição da justiça. Esperava-se, com isso, que as decisões a serem tomadas em relação aos delitos mais graves não fossem apenas burocráticas e tecnicistas, mas que possuíssem, também, uma certa identidade com o grupo social afetado pelo delito, particularmente sua visão de mundo e seus modos de viver. Assim, se um homem matasse outro numa grande metrópole, após ter sido ofendido moralmente por ele, poderia ser condenado, até quem sabe por homicídio qualificado, se admitido o motivo fútil. O mesmo fato, ocorrido num interior desses bem profundos do país, poderia ter um desfecho completamente diferente, seja pelo reconhecimento do privilégio (crime cometido sob o domínio de violenta emoção, logo após injusta provocação do ofendido), seja, até mesmo, pelo reconhecimento da legítima defesa da honra e consequente absolvição do réu.
A lei é a mesma em todo o país. A interpretação que se lhe dá é que varia, de acordo com inúmeros fatores.
A idéia do júri, portanto, é muito boa. O problema está na sua efetivação. O motivo principal, sempre lembrado, é o fato de que o tribunal do júri é composto por sete pessoas do povo (além do juiz togado que o preside), escolhidas dentre maiores de idade de boa reputação, entendida como ausência de antecedentes criminais. Nenhum requisito técnico é exigido do indivíduo que pretenda compor o conselho de sentença, até porque, se isso ocorresse, estaria comprometido o ideal de democratização: o júri seria uma reunião de doutos, numa sociedade semi-alfabetizada. Obviamente, produziria uma justiça elitizada, justamente o oposto do pretendido.
Como decorrência do seu caráter leigo, os jurados são os únicos juízes que decidem sem a obrigação de fundamentar suas decisões. Fazem o que lhes parecer melhor, mais plausível ou mais humanamente admissível. Decidem votando quesitos apresentados pelo juiz-presidente, aos quais respondem com um simples "sim" ou "não", sem qualquer esclarecimento. E ao júri a Constituição confere a soberania dos vereditos, para que as deliberações populares não possam ser reformadas em grau de recurso, mas apenas anuladas, em situações restritas e especiais. O problema é que o Direito é um conhecimento complexo demais para ser manuseado por quem não o compreende, sobretudo se considerarmos as suas consequências, notadamente as penais.
Daí decorre que muitos propõem a extinção do tribunal do júri, acusando-o de decidir sem critérios objetivos, razoáveis ou defensáveis. Decidir apenas com a emoção — o que, para o bem ou para o mal do réu, não se pode tolerar. Eis aí uma briga antiquíssima, que está longe de uma solução.
Hoje, existe quem proponha uma solução "eclética": o júri seria mantido, mas o réu somente seria submetido a ele se concordasse. Caso preferisse um julgamento estritamente técnico, seria julgado por um juiz de Direito. Justifica-se a proposta sob a alegação de que uma norma criada para beneficiar (ser julgado pelos próprios pares, que teoricamente comungam dos mesmos valores, seria mais justo ao réu), não poderia prejudicar (sofrer um julgamento passional e contrário às próprias normas penais e processuais). Difícil coadunar esta proposta com o princípio do juiz natural. Além do mais, causaria perplexidade que o acusado de um delito tivesse tanto poder decisório sobre o próprio futuro, quando na verdade deveria estar entregue à sociedade, para a realização da almejada justiça.
Pessoalmente, tenho grande simpatia pela instituição do tribunal do júri. Entendo que ela deve continuar a existir. Aliás, vou além e proponho que sua competência seja ampliada. Não apenas os delitos dolosos contra a vida, consumados ou tentados, lhe deveriam ser submetidos, como outros, que também afetam a vida mas se enquadram em outros setores da legislação (tais como o latrocínio e a extorsão mediante sequestro com resultado morte, que são delitos patrimoniais, e o estupro ou atentado violento ao pudor, com resultado morte, ridiculamente classificados até hoje como delitos contra os costumes). O mesmo deveria valer para a redução à condição análoga à de escravo, para a qual defendo todo tipo de endurecimento da lei penal. E, ainda que admitindo uma certa dose de mordacidade, alguns dos crimes contra a Administração Pública, tais como peculato e corrupção. Já pensou? Aquelas figurinhas ilustres da República sentadas no banco dos réus, sob os olhares do contribuinte lesado?
Seja qual for a competência jurisdicional do tribunal popular, contudo, é certo que todo pessoa admitida a fazer parte da lista geral de jurados deveria passar por um treinamento, ao fim do qual tivesse uma noção decente dos fins do Direito Penal, das graves consequências que provoca, não apenas para o réu, mas para sua família, para as vítimas e familiares destas, além de receber um mínimo de instrução sobre questões técnicas, necessárias para a qualidade do veredito e para reduzir os riscos de posterior declaração de nulidade do julgamento.
Uma mudança assim, contudo, exige que a sociedade levante da cadeira, dando um tempo no futebol e na novela, para se ocupar, um pouquinho, do próprio futuro.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Isso é que é marketing!

Belém do Pará. Ao lado da cabeceira da pista do Aeroporto Júlio César, eis a placa, que foi posta para ser claramente vista da avenida ao lado, de mesmo nome:

Agora me diga: é ou não uma grande sacada do cara? "Pouso de emergência" tem tudo a ver com aviação, atividade do empreendimento ao qual o sujeito quer se acoplar, para ganhar visibilidade. Ao mesmo tempo, a palavra "pouso" também significa "abrigo", "acolhida", ser recebido em algum lugar, o que remete à atividade do estabelecimento em questão.
Por fim, "emergência" tem tudo a ver com a finalidade última do indivíduo que procura esse estabelecimento que, com certeza, é baratim, bem no jeito de quem precisa dele numa dessas horas de necessidade.
Eis a sabedoria das ruas! MBA para quê?

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Julgamento

Começamos a ver os efeitos práticos da Lei n. 11.689, de 2008, que alterou o rito do tribunal do júri. Ontem, foi realizado, aqui em Belém, mais um julgamento já sob a nova disciplina. O réu era Mário Tasso Serra Júnior (42) e o caso, bastante rumoroso, teve como vítima Nirvana Evangelista Cruz (22). Mais uma edição da mania que muitos homens têm de se considerar proprietários de suas namoradas, esposas, companheiras e afins. Longe de ser uma simples sociopatia pontual, é uma verdadeira tendência, já que casos como esse sempre foram e continuam sendo frequentes, não importando a idade, o nível social e de instrução dos agentes. Pelo visto, há muitos componentes sociais que reforçam essa insanidade.
O julgamento de ontem terminou como esperado, com uma condenação exemplar para o réu: 22 anos de reclusão, obviamente em regime fechado inicial. Em que pese o meu apreço pelo colega criminalista Jânio Siqueira, sou forçado a dizer que a tese de legítima defesa não era apenas inverossímil: era ridícula. Três tiros à queima roupa, todos em locais nobres, infirmam desde logo a tese, mesmo que eu não tivesse nenhum laudo pericial para examinar em detalhes. Outrossim, o que explicaria a vítima, de uma hora para outra, tornar-se uma assassina em potencial e apontar uma arma para o ex, se não possuía um histórico de violência ou agressividade? Por último, a alegação de não lembrar o que se passou no momento exato dos disparos, como se a consciência tivesse saído do sujeito, tende a ser mal recebida por qualquer ouvinte.
A atuação do defensor sempre é limitada pelos fatos. Quando estes são muito escabrosos, restam as teses estapafúrdias que, em geral, não colam.
O julgamento de ontem poderia ter demorado muito mais. Contudo, a recente alteração legislativa melhorou muito o funcionamento do júri, tirando as suas gorduras inúteis. Com menos espaço para manobras sem vergonha, os trabalhos duram menos tempo, reduzindo o esforço de todos os envolvidos e, em especial, o sofrimento das famílias que aguardam o desfecho.
A passos de cágado embriagado, o processo brasileiro vai melhorando.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Vento caído

Desde que me entendo por gente, minha mãe — que é de Óbidos — proíbe terminantemente que se façam algumas coisas com bebês, tais como soprar em seu rosto ou erguê-los acima da altura de nossas cabeças. O motivo? Dá vento caído. Nunca teve a gentileza de me esclarecer o que isso significava e, com o tempo, o instigante assunto caiu no esquecimento. Todavia, com o nascimento de sua neta, a ameaça voltou à tona. Aqui e ali, alguma coisa que faço é repreendida por conta do tal vento caído.

Desta vez, contudo, cobrei maiores explicações. Ela, todavia, por alguma razão, não soube fornecê-la. Sabe apenas que o tal vento caído existe e isso é tudo. E olha que minha sogra, igualmente natural de Óbidos, parecia desconhecer a tal moléstia.

Irresignado, rendi-me ao caminho fácil desta nossa era: a Internet, mais especificamente o Google. E eis que, enfim, descubro que mais alguém já ouviu falar do mistério. O curioso é que só encontrei a expressão de busca em páginas que mencionavam o trabalho de rezadeiras. Páginas sérias, diga-se de passagem, onde a atividade das rezadeiras é tratada com respeito, como objeto de análise antropológica.

Em pleno sítio do Estado do Acre, encontrei esta referência:

Mau olhado, quebranto, vento caído. Para as rezadeiras, todo mal de reza surge dentro ou fora do âmbito familiar. Elas acreditam que o quebranto, por exemplo, origina-se do "excesso de amor" ou "amor caduco" na família. Já o mau olhado se explica pela ação de um agente externo, e o vento caído é o resultado de sustos ou medos fortes sofridos pela criança.
(Negritei. Para ler na íntegra, clique aqui.)

Realmente, minha mãe me repreendeu por ter brincado de assustar a pequena Júlia, alegando o aludido vento caído. Encontrei, enfim, uma relação e um começo de explicação. No entanto, até o presente momento, não localizei uma explicação para o que o vento caído de fato é. Você sabe me dizer?

Em novas andanças pela Internet, descobri ao menos uma coisa: as fezes esverdeadas, uma das características do problema, seriam consequência da ingestão de lactose, o que pode acontecer, inclusive, com bebês alimentados exclusivamente de leite materno. Uma explicação científica, enfim. Faz-me pensar que o tal vento caído é, na verdade, um problema de fundo alimentar, já que o organismo dos bebês ainda está se adaptando às intensas mudanças provocadas pela vida extrauterina. Isso pode provocar dor, que leva à irritação. [Parágrafo acrescentado em 4.3.2016].

Enquanto não mato a curiosidade sobre as sabedorias populares, pelo menos aprendi rezas que curam o mal:

Dor abrando a tua ira e quebro as tuas forças. Assim como Judas vendeu Cristo que é Nosso Senhor Jesus, por esse mundo andou, olhado e vento caído Jesus curou.
(Leia a matéria.)

Jesus... me curai essa criança de vento caído... vento virado... mal olhado com os poderes de Deus e da Virgem Maria assim como tu andavas no mundo... Jesus... tu curavas os cegos... os aleijados. Então cura essa criança.
(Fonte.)

Outros links:
http://www.religiosidadepopular.uaivip.com.br/espinhela.htm (sobre espinhela caída, menciona o vento); http://www.correiodesergipe.com/lernoticia.php?noticia=13634; http://revistaraiz.uol.com.br/portal/index.php?option=com_content&task=view&id=58&Itemid=72; http://institutohypnos.wordpress.com/2006/09/03/materia-do-jornal-da-paraiba-enviada-a-nos-por-uma/; e http://64.233.169.104/search?q=cache:iRtCDOVoN80J:reposcom.portcom.intercom.org.br/bitstream/1904/19882/1/Vanda%2BCunha%2BAlbieri%2BNery.pdf+%22vento+ca%C3%ADdo%22&hl=pt-BR&ct=clnk&cd=18&gl=br (mencionam, mas não explicam)

Patrulha da imprensa

Alguém informe ao redator da coluna Repórter Diário, de hoje, a respeito da nota "Lei do cangaço", que o Antônio desconhece a palavra "torriquete". Antônio Houaiss, bem entendido, aquele do dicionário (aliás, apontado como o melhor dicionário de Língua Portuguesa). A palavra em questão não existe ou, para ser simpático, não chegou a ser dicionarizada. Fico com a primeira alternativa e uma especulação: alguém redigiu a nota à mão e a letra "n" foi confundida com um "r". No contexto, "torniquete" ("instrumento destinado a apertar, etc.") faria sentido.
Seja como for, é problema de conhecimento da língua, para uns, e de falta de revisão, para outros. Ambos bastante inconvenientes num jornal, obviamente.

Bom dia, Campinas!

Um bom dia para todos os leitores do blog. Acordo animado, porque estou de férias (de um dos batentes) desde ontem e, somando com o feriadão, estes têm sido dias ótimos. Feliz daquele que encontra satisfação em, simplesmente, ficar em casa! Animado, também, porque minha Júlia continua dando um show de colaboração e dorme horas e horas. Se bem que, desde ontem, dorme mais do que o habitual. Minha esposa suspeita que tem algo a ver com a nova pomada para as mamas, cuja finalidade é "restaurar a barreira cutânea" na área afetada pela amamentação. O produto contém óleo de passiflora e, segundo instruções, o bebê pode mamar por sobre a camada do medicamento. Coincidência ou não...

Levamos um susto esta madrugada. Júlia fez um ruído estranho, uma vez só. Acordamos, mas ficamos deitados porque nossa menina permaneceu quieta. Contudo, uma aflição levou Polyana a ir conferir o berço, onde constatou que Júlia golfara e estava engasgada. Todos sabemos que uma aspiração de vômito pode ter consequências que ninguém quer pensar.

De volta à cama, ficamos ambos em alerta, sem dormir, aguardando. Uma tosse úmida fez com que eu me levantasse. Júlia golfava de novo, com força. Coloquei-a mais ereta e ela, muito sonolenta, pareceu relaxar. Fizemos a limpeza e a colocamos deitada bem de lado, como recomendado. Mas é difícil sossegar com essa expectativa. Felizmente, ela dormiu bem até quase nove horas da manhã.

O problema é que Júlia resolveu dormir de peito para cima. Nós a colocamos de lado, mas ela vira na primeira oportunidade. E começou a explorar todos os quadrantes do berço. Ambas as coisas não são exatamente seguras. Se alguma mamãe ou algum papai mais experiente souber o que podemos fazer para conter a nossa atleta das madrugadas, a fim de que ela não se torne um risco para si mesma, agradecemos penhoradamente.

E o que Campinas tem a ver com tudo isso? Nada. É apenas uma alusão ao retorno do amigo Alexandre, lá daquelas bandas, que deixa, vez em quando, seus comentários, mas andava sumido. Ele é tio de uma Júlia, nascida poucos meses antes da minha, a quem chamo Júlia Campineira. Manda notícias, meu amigo. Quem sabe um dia as duas não se conhecem?

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

A velha injustiça

A imprensa tem sido dura com os atletas olímpicos brasileiros, por causa dos sucessivos insucessos nos jogos de Beijing. Nos sítios de humor, já cansaram as piadinhas sobre como estamos à frente do Quirguistão, Tadjiquistão, Djibuti e atrás da Etiópia, Cazaquistão e Zimbábue. É isso mesmo: o desempenho brasileiro está pífio, inclusive em modalidades nas quais ouros eram esperados, como na ginástica olímpica. Mas, por causa disso, vamos zoar os nossos atletas?
Já falei mais de uma vez aqui no blog: o Brasil é o país do futebol, infelizmente. Atenções e investimentos são destinados a essa joça. Contratos milionários e salários inacreditáveis fazem parte do universo desses batedores de bola. Mas onde está a verdadeira política de incentivo ao esporte? Algumas empresas, que batem no peito dizendo que incentivam o esporte brasileiro, na verdade patrocinam este ou aquele atleta, já consagrado.
Hoje, o vôlei tem visibilidade. Mas foi preciso que a geração de prata vencesse primeiro, para depois ver a cor da grana. É sempre assim: primeiro dê o seu jeito, faça o seu milagre de vencer e, se for o caso, eu libero uma verbinha. Mas investimentos sistemáticos em esporte, isso não existe. Como, então, podemos colocar o Brasil no nível, para dar apenas um exemplo, dos Estados Unidos, onde a prática esportiva é tão inerente à rotina escolar como as aulas de inglês?
Continuo aplaudindo todos os nossos atletas. Os que ficaram de fora, durante as seletivas. Os que morreram na beira. Os que caíram, literalmente. Tenho o maior respeito por todos.
Beijing, se Deus quiser, abrirá os olhos dos brasileiros. Não somos uma superpotência esportiva. Nossos sucessos recentes podem ter passado essa falsa idéia, mas não somos. Ou investimos de verdade, ou estaremos sempre atrás da Bielorrússia e da Mongólia. Quem sabe agora alguém descubra isso.

Degradação nossa de todo dia

O Blog do Espaço Aberto publica hoje uma postagem valiosa, acerca de uma pesquisa que comprova como o bom e generoso povo brasileiro sabe ser vil. O mote da pesquisa é a condição da mulher negra e pobre, explorada como empregada doméstica. Vale a pena ler.

sábado, 16 de agosto de 2008

Perdendo os cabelos

A campanha política para as eleições de outubro, em Belém, ainda está chocha e desalentadora como chochos e desalentadores são os candidatos. Mas, mesmo assim, segundo o IBOPE, a segunda colocada nas pesquisas já está tecnicamente empatada com o primeiro, que vem a ser o sedizente prefeito e verdadeiro desastre. Seria de 3 pontos a diferença, com margem de erro de 4% para mais ou para menos. Isso sem propaganda gratuita no rádio e TV, sem comícios e debates.
Mais adiante, quando o sujeito tiver que conceder alguma entrevista, ficará entre a cruz e a caldeirinha: se não comparecer, confirmará o estigma do recandidato em suposto primeiro lugar (fujão), além de relembrar o absenteísmo que caracterizou a maior parte de seu mandato, já que não parava em Belém; se comparecer, mostrará a sua desenvoltura (ahahahahahahahah!!!!!) para falar às pessoas e mostrar as suas (ahahahahah!!) ideias (ahahahahahah!!!).
Como o resultado das eleições, qualquer que seja, não me trará nenhuma alegria, meu único alento é pensar que ele está vivendo dias bem infelizes. Afinal, re-eleger-se não é apenas uma questão de mandato. Também é uma questão de foro privilegiado.
Enquanto isso, aproveitemos este período pré-eleitoral, único em que obras pululam por toda a cidade, mesmo que de má qualidade.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Imagine na Jamaica

Adivinhe onde o pau está comendo — e no mau sentido?
No Supremo Tribunal Federal.
E depois me acusam de ser muito ríspido...

Atualização em 1º.9.2008:
E o imbróglio continua rendendo.

Eles voltaram

Quem achou que Amair Feijoli da Cunha, o "Tato", e Clodoaldo Batista, o "Eduardo", assassinos condenados da irmã Dorothy Stang, não voltariam à prisão após ganharem direito de saída temporária, devido ao dia dos pais, quebrou a cara. Inclusive eu. E chegaram com 10 e 15 minutos de antecedência, respectivamente.
Menos mal. Essa vai para as minhas aulas de Direito Penal II.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Belenenses famosos

Aguardando a hora de entrar em sala de aula, acessei a internet e fiquei navegando à toa. Como de praxe, fui à Wikipedia digitar verbetes aleatoriamente. Pensei em ver o que consta sobre Belém e, por fim, encontrei uma lista de belenenses famosos. É isso aí.
Demorei dois dias para ter tempo de navegar à procura de informações sobre os citados. Pela própria natureza da Wikipedia, desconheço quem elaborou a tal lista, mas eu preciso meter a minha colher. Os famosos são:

Almirzinho Gabriel — Cantor e compositor. — O irmão é mais famoso e não foi citado.
Banda Calypso — Composta pelo casal Joelma e Chimbinha. — Essa b...anda pode ser famosa mas, convenhamos, uma banda não é uma pessoa.
Benedicto Monteiro — Escritor e compositor. — Muito bacana. Só tem um detalhe: nasceu em Alenquer.
Benedito Nunes — Filósofo. — Ok.
Beto Barbosa — Cantor. — Se não me falha a memória, ao fazer sucesso por causa da lambada, começou a dizer que nascera no Rio de Janeiro. Se for verdade, que saia da lista.
Bruno de Menezes — Escritor. — Ok.
Billy Blanco — Músico e compositor. — Ok.
Bob Freitas — Músico. — E também um dos fundadores do Grupo de Teatro "Experiência", segundo a Wikipedia.
Cacá Carvalho — Ator. Ok.
Celice Pinto Marques da Silva — Miss Brasil 1982 e semifinalista no Miss Universo. — Bom informar, porque a esta altura ninguém mais lembra.
Dalcídio Jurandir — Escritor. — Ok.
David Miguel — Compositor e sambista. — Ok.
Denner Pamplona de Abreu — Estilista. — Por não ver utilidade em assuntos de moda e companhia, desconhecia a pessoa, mas a Wikipedia o apresenta como um dos pioneiros da moda no Brasil. Chegou a ser muito famoso, mas devo ressaltar que se mudou aos 11 anos para o Rio de Janeiro e lá fez toda a sua carreira.
Dira Paes — Atriz. — Ela pode adorar Belém, mas nasceu em Abaetetuba.
Eneida de Moraes — Escritora e jornalista. — Ok.
Fabrício Coleny — Publicitário e apresentador. — Hmmm... quem?
Fafá de Belém — Cantora. — Essa até no nome.
Gaspar Viana — Médico, pesquisador da leishmaniose. — Ok.
Guilherme Coutinho — Músico e compositor. — Ignorância minha desconhecer.
Inglês de Souza — Escritor. — Já escrevi sobre ele em postagem sobre a Academia Brasileira de Letras. Nasceu em Óbidos.
Jane Duboc — Cantora. Ok.
Leila Pinheiro — Cantora. — Ok.
Lenny Bellard — Cantora finalista da versão brasileira de American Idol. — Estou sabendo agora.
Lucinha Bastos — Cantora. — Ok.
Lúcio Mauro — Ator. — Ok.
Marco André — Cantor e compositor. — Ok.
Mahrco Monteiro — Cantor e compositor. — Ok.
Mestre Verequete, o Rei do Carimbó — Cantor e compositor. — Um ícone da nossa cultura. Mas nasceu em Bragança.
Nego Nelson — Músico. — Ok.
Nilson Chaves — Cantor e compositor. — Ok.
Norton Nascimento — Ator. — Ok.
Raymundo Mário Sobral — Escritor. — Ok.
Rosa Maria Murtinho — Atriz. — Ok.
Ruy Barata — Poeta e compositor. — O grande Paranatinga, que tive a honra de conhecer pessoalmente. Pois é: nasceu em Santarém.
Sebastião Tapajós — Músico. — Nascido em Santarém. Daí o "Tapajós", Pedro Bó!
Sérgio Cardoso — Ator. — Eu desconhecia, mas percebo que teve uma carreira valorosa, no teatro e na TV. E ele pensava em ser diplomata...
Vicente Franz Cecim — Escritor. — Assumo minha ignorância por desconhecer.Vital Lima — Cantor e compositor. — Ok.
Walcyr Monteiro — Escritor. — Ok.
Waldir Cardoso — Médico, sindicalista e político. — Minha amiga Wirna vai adorar esta!
Waldemar Henrique — Poeta, maestro, compositor. — Ok.
Walter Bandeira — Cantor. — Ok.
Yara Cecim — Escritora. — Também desconhecia e, consoante descobri, agora, também nasceu em Santarém.

De novo eu me pergunto: quem elaborou esta lista? Que critérios usou para escolher estas pessoas? E por que diabos não procurou saber se eram mesmo daqui?
Então eu pergunto: na sua opinião, quem é um belenense famoso?

Tem o meu apoio

O longo capítulo XV do Código de Trânsito Brasileiro ("Das infrações") estabelece as condutas que colocam o motorista à mercê de penalidades. O art. 252 considera infração média, punível com multa, dirigir o veículo:
I — com o braço do lado de fora;
II — transportando pessoas, animais ou volume à sua esquerda ou entre os braços e pernas;
III — com incapacidade física ou mental temporária que comprometa a segurança do trânsito;
IV — usando calçado que não se firme nos pés ou que comprometa a utilização dos pedais;
V — com apenas uma das mãos, exceto quando deva fazer sinais regulamentares de braço, mudar a marcha do veículo, ou acionar equipamentos e acessórios do veículo;
VI — utilizando-se de fones nos ouvidos conectados a aparelhagem sonora ou de telefone celular.

O projeto de lei n. 3691/2008, do Deputado Dr. Talmir (PV/SP), pretende acrescentar um item neste rol, qual seja: "fumando". Segundo o proponente, fumar enquanto se dirige implica em dirigir com uma só das mãos, o que já autorizaria a punição com base no inciso V. Contudo, ele considera "extremamente difícil, senão impossível, ao agente de trânsito aplicar a penalidade ao fumante, tendo em vista a alternância dos movimentos de levar o cigarro à boca, mantê-lo na mão ou manuseá-lo para tirar a cinza". Por outro lado, fumar é uma ação que demanda algum tempo e, por isso, "pode tornar-se uma ação competitiva à prática segura da direção".
Qualquer pessoa sabe que pequenas coisas, como apertar um botão no rádio, p. ex., distrai a atenção do motorista. Qualquer pessoa deveria saber que basta um segundo de desatenção para surgir uma situação de perigo concreto, ou mesmo um acidente. Por isso, tem razão o deputado e é meritória a sua proposta.
Mesmo que não tivesse razão, a proposta continuaria sendo meritória. Insisto pela enésima vez: todo castigo para fumante é pouco. Devemos envidar todos os esforços para forçá-los a se recolher cada vez mais até a extinção total. Desculpaí, Barrettão, mas creio que já nos entendemos quanto a esse aspecto da nossa política de convivência.
Tomara que aprovem o projeto o quanto antes. Não sei se ajudará. Mas, com certeza, atrapalhará os fumantes. Já serve.

Seis meses para uma vida — penúltimo estágio

Já aprovada no Senado, a proposta que amplia a licença-maternidade para seis meses foi aprovada ontem na Câmara dos Deputados. Com isso, segue para apreciação do Poder Executivo. É a etapa final para entrar em vigor.
Vale lembrar que os dois meses adicionais da licença não são obrigatórios, dependendo de a empresa aderir, se quiser, a um programa de incentivos fiscais. Por meio destes, deve receber compensação financeira pelo benefício, mas há necessidade, ainda, de uma mudança de mentalidade e é exatamente nesse ponto que o bicho pega. Pretenderá o empregador ficar mais tempo sem a funcionária, mesmo que isso não implique em perda econômica? Duvido muito.
O importante é a lei entrar em vigor. Sua eficácia dependerá das forças sociais que lutarem por ela.

Algemas

Uma polêmica intensa e antiga teve um desfecho ontem, 13 de agosto, no Plenário do Supremo Tribunal Federal. Foi quando nasceu a Súmula Vinculante n. 11, que consolida a excepcionalidade do uso das algemas, para as situações em que isso se revele estritamente necessário. E por necessário entendam-se os casos de resistência à prisão, risco de fuga e ameaças à integridade física de terceiros ou do próprio preso. Eis o texto da súmula, que deu muita discussão até chegar à redação final:

“Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.”

O STF encampou os argumentos de setores do Direito Penal alinhados à ideia de que os direitos individuais devem ser assegurados, que encontravam a mais forte oposição nas polícias. Para estas, as algemas eram praticamente inerentes à tarefa de efetuar uma detenção. Na verdade, a súmula nada traz de inovador, pois apenas consagra interpretações conhecidíssimas. O que eu quero ver é delegado se explicando por escrito. Eles adorarão.
Sabem o que eu acho da nova súmula? Não acho nada. Honestamente. Não acho nada porque a sua eficácia será muitíssimo restrita. Ela somente será aplicada nas operações da Polícia Federal. Gente como Paulo Maluf, Jader Barbalho e Daniel Dantas estará resguardada. Mas se estes senhores — citados aqui exemplificativamente, porque é notório que foram presos pela PF — um dia chegaram a ser algemados, o fato é que sempre estiveram resguardados. Sempre tiveram acesso às garantias constitucionais, daí que sequer esquentaram os catres de suas celas.
A súmula será empregada quando a PF prender a raia miúda das grandes safadezas nacionais. Estes serão os verdadeiros beneficiários. A súmula não será empregada, entretanto, nos outros 99% dos casos em que formalmente seria exigível. Sabe por quê? Porque esses 99% restantes correspondem às prisões realizadas pelas polícias civil e militar, pelo país afora. São os ladrões e criminosos violentos de sempre.
Alguém acha que a PM, pegando um puxadorzinho de cordão, na rua, deixará de algemá-lo? Ou se justificará por escrito? É tão fácil dizer que o sujeito resistiu à prisão, como sempre foi fácil plantar uma arma ou entorpecente no bolso do cara.
Espancar, torturar, humilhar já é proibido há décadas. E mesmo assim acontece todos os dias. Lei e jurisprudência nunca fizeram diferença, tanto que autoridades respondendo por abuso de autoridade são raras e, quando acontece, é pelo mesmo motivo dos criminosos: não têm acesso pessoal aos mecanismos de proteção. Não respondem sequer administrativamente. E assim continuará a ser. Com ou sem súmula.

Acréscimo em 15.8.2008:
Pelo que vejo, comunga do mesmo ponto de vista meu o grande cartunista J. Bosco: