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domingo, 4 de maio de 2014

Todos queremos ser ouvidos

Imagino que muitos não acreditem quando digo que não é pessoal, mas aquele colunista de negócios, que volta e meia cito por aqui, aprontou de novo. Juro que não é pessoal, mesmo. Nem conheço o cara, exceto pela coluna em apreço. Mas é que não consigo admitir tamanha desfaçatez, disfarçada de interesse público. Mas é preciso ser muito tapado para não perceber o evidente chamego com o empresariado, que no entendimento do jornalista deveriam ter todos os direitos e poderes, sem ter suas ações limitadas por nada.

É por isso que as notas do aludido jornalista, permeados pela vetusta, superada e monstruosa perspectiva de desenvolvimento como mero desenvolvimento econômico, desvelam inequívoco desprezo pela proteção do meio ambiente, por cautelas administrativas (p. ex. licenciamento) e pelos interesses de quem não seja dono do capital.

No capítulo de hoje, o camarada me sai com mais esta demonstração de desrespeito a quem está fora do time que paga publicidade:

Protestos contra derrocagem do pedral
Estava demorando. No dia 1º, representantes de colônias de pescadores realizaram protestos, em Itupiranga, contra "o governo federal e empresas privadas, como a Vale e outras que serão beneficiadas pela Hidrovia Araguaia-Tocantins, a partir da abertura do canal do Pedral do Lourenço". Querem ser ouvidos.

Conclusão óbvia acerca da nota: o colunista menospreza a intenção dos pescadores de ser ouvidos acerca das obras. Não lhe interessa que os protestantes sejam pessoas que vivem na região e dependem do rio para promover o seu sustento. Não são empresários, não dispõem de recursos para investir em outro negócio caso o primeiro malogre. São gente simples, que vive do próprio trabalho. Caso as obras de destruição do pedral ou o início de navegação mais intensa no rio modifiquem o ritmo de vida dos peixes, p. ex. levando-os para outros locais, de que viverão essas pessoas? Como sustentarão suas famílias?

É mesmo possível que, em 2014, uma pessoa de boa fé ignore a necessidade de se escutar, para todo grande empreendimento, as populações diretamente atingidas? Para que revelem suas necessidades e receios, a fim de se evitar ou, ao menos, minimizar danos? Minha resposta é não. Como também é negativa para se admitir a ignorância acerca do fato de que ouvir as populações atingidas é uma exigência jurídica, não um favor. O jornalista poderia ao menos se informar um pouco.

Desde a mais tenra infância, todo ser humano deseja se exprimir e ser ouvido. Trata-se de manifestação inerente à condição humana, cuja aceitação indica respeito e cumpre o ideal de dignidade, que é um princípio constitucional. Negar isso é vergonhoso.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Fidelidade dos elefantes

Meu irmão, quase cinco anos mais velho do que eu, quando aprendia algo interessante na escola ou nos muitos livros que lia, vinha logo me contar. Foi assim que aprendi muitas coisas e acabei tomando gosto por ser, eu mesmo, um leitor ávido e um curioso da ciência. Foi assim que aprendi, ainda na infância, que elefantes são seres gregários; eles se esforçam pelo bem estar da manada e não deixam ninguém para trás. Eventualmente, se um deles morre, alguém lhe guarda. Pesquisadores da psicologia já se dedicaram a estudar o luto dos elefantes.

Não sei se o turista John Chaney e seus companheiros sabiam disso quando avistaram esta cena, fotografada pelo primeiro. Segundo a descrição do fotógrafo, esta aliá* se manteve por longo tempo junto ao corpo de um companheiro, morto há dias. Imóvel, permaneceu com a tromba enrolada na presa do cadáver, deixando mais evidente a sua intenção.


O fato de ser um comportamento previsível do reino animal não retira a capacidade de emocionar. Inevitavelmente, faz-nos pensar na natureza humana. Nós, ditos seres máximos da criação, que frequentemente nos comportamos de modo menos humano do que os bichos. Sei que isso é um grande clichê, mas também é uma grande verdade.

Um detalhe: vendo a imagem, o que mais me chamou a atenção foi a hiena, à direita, que pela postura parece estar bem quieta. Hienas são animais carnívoros, mas para não entrar em confronto com rivais mais poderosos, costumam alimentar-se de carniça, comendo os restos deixados por outros animais. Como perdem o melhor da festa, seu sistema digestivo é capaz de digerir até mesmo ossos, de modo que do repasto das hienas pode não sobrar literalmente nada.

E o que essa hiena está fazendo em nossa poética cena? Comungando da saudade? Claro que não. Está esperando a oportunidade de matar a fome. Não o faz, entretanto, porque o poderoso animal, que passa facilmente das quatro toneladas, segue no local, vigilante. Bastaria um golpe da probóscide, que é basicamente um amontoado de músculos, para fazê-la voar dali, de novo literalmente. A cena retrata, portanto, a linha tênue entre o senso de compromisso e a destruição do que  restou.

Realmente, é uma imagem riquíssima em significados e sensações, para nós, supostamente humanos.

* Você sabia que este é um dos nomes possíveis para a fêmea do elefante? A palavra "elefoa", que parece um erro grosseiro, também está certa, assim como "elefanta", que não uso para não ser molestado pela legião dos inimigos da "presidenta". Na verdade, gosto mesmo é de "aliá". É diferente, nada convencional.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Canicídios no Pará

Enquanto as redes sociais fervem com o caso de uma suposta política de saúde pública no Município marajoara de Santa Cruz do Arari, consistente em exterminar cachorros de rua, a jornalista Franssinete Florenzano informa que a medida não é inédita no Pará. Ela menciona dois precedentes, em Tucuruí e em Jacareacanga. Em todos os casos, a iniciativa teria sido do poder público.

Eu não entro nessa histeria pequeno-burguesa de pedir pena de morte para quem maltrata animais, ciente de que os mesmos críticos pouco se importam com o sofrimento e a morte de seres humanos pobres. Também sei que este comentário tem toda a cara de clichê, mas também é verdadeiro. Precisamos respeitar a vida dos seres humanos e dos animais, é óbvio, e não podemos tolerar nenhuma forma de violência. Justamente por isso, há que se reclamar mais atenção aos humanos que sofrem sob a invisibilidade a que foram relegados pelo conjunto da sociedade.

Independentemente disso, caso se confirme que os prefeitos ou seus prepostos determinaram a morte dos cães, estão sujeitos a processo pelo crime tipificado no art. 32 da Lei n. 9.605, de 1998 (Lei de Crimes Ambientais): "praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos". A pena é de 3 meses a 1 ano de detenção, aumentada de 1/6 a 1/3 em caso de morte do animal, além de multa.

O art. 37 da mesma lei afasta a responsabilização nas hipóteses em que o abate do animal foi determinada por necessidade alimentar; para proteção de lavouras, pomares e rebanhos de animais predadores (neste caso, dependente de autorização do órgão ambiental competente); ou "por ser nocivo o animal, desde que assim caracterizado pelo órgão competente".

Esta última situação poderia ser, forçando muito a barra, a brecha para os suspeitos tentarem escapar à responsabilidade penal. Mas, a meu ver, não se sustenta. Sobre essa norma, leciona Silvio Maciel:
Essa excludente é alvo de críticas, porque segundo alguns não existem animais nocivos, já que todos possuam uma função e utilidade no sistema ambiental. Conforme o professor LUIZ REGIS PRADO, "a doutrina biológica ressalta que o termo 'nocivo' é relativo e subjetivo, pois todos os animais possuem uma função no equilíbrio do ambiente e concordam que essa terminologia deve ser revista porque são raras as espécies que, verdadeiramente, podem ser consideradas nocivas.Ademais, o simples fato de algumas espécies predadoras (v.g., jacarés, onças) atacarem o gado em fazendas (isso porque a destruição dos habitats pelo homem força esses animais e buscar alimentos em outros locais), não constitui argumento suficiente para incluí-los na lista de animais nocivos". (MACIEL, Silvio. "Meio Ambiente". In: GOMES, Luiz Flávio e CUNHA, Rogério Sanches (coord.). Legislação criminal especial, Coleção Ciências Criminais, vol. 6, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 769)
Conclui-se, portanto, que a norma em apreço foi concebida para animais selvagens, peçonhentos, transmissores de doenças (como os caramujos africanos que viraram praga por aqui, lembram?). Mas mesmo assim é necessária uma avaliação expressa do caso, a ser feita pelo órgão ambiental. Não se pode simplesmente sair exterminando, ainda mais em se tratando de animais domésticos, simplesmente porque estão nas ruas. Seria necessário provocar o órgão ambiental e demonstrar que os cachorros se tornaram um problema real e grave de saúde pública, ou que enlouqueceram e estão atacando as pessoas na rua mais do que os assaltantes.

Sem isso, a situação dos acusados deve piorar. Esse o meu prognóstico.

domingo, 21 de abril de 2013

Será?

Eu mesmo não sei dizer o motivo do meu interesse pelo futuro Shopping Bosque Grão-Pará, que promete ser o maior e mais sofisticado do Norte. Já escrevi sobre ele antes. Talvez seja por causa do nunca totalmente esclarecido imbróglio em torno da devastação do Parque Ambiental de Belém, para abertura de uma nova avenida (útil à cidade, sem dúvida, mas...), que acabou abrindo as portas para um novo bairro, obviamente de alto padrão, o Cidade Cristal, que está em vias de ser lançado comercialmente e que terá, no shopping, a cereja do bolo.

O fato é que a cobertura verde, cada vez mais escassa na área, será em breve substituída por edifícios, ruas, asfalto e vagas de garagem. Não é exatamente uma troca inteligente, mas uma meia dúzia ganhará dinheiro com isso. Nós não.

O Bosque Grão-Pará é um empreendimento que sofreu diversos contratempos. O primeiro foi a crise econômica, que derrubou o mal explicado boom de shoppings que seriam construídos. Ao todo, Belém e Ananindeua ficariam com nove. Aí veio a crise e tudo parou e somente agora se volta a falar do assunto. Aquela coluna de negócios noticia, hoje, que esta semana devem ser emitidas as últimas licenças ambientais para início das obras do Metrópole Ananindeua. Quanto ao Bosque Grão-Pará, foi prometida a inauguração para abril de 2014.

A coluna jura, pela fé da mucura, que haverá 268 operações, sendo 12 âncoras e 25 de alimentação, além de 2.300 vagas de estacionamento. Somem-se as seis salas de cinema, confirmando-se os rumores de que serão explorados pela UCI, hoje com apenas 17 estabelecimentos no Brasil. Ótimo, porque aumenta a concorrência.

A coluna também jura que a griffe espanhola Zara, aquela do trabalho escravo, e a famosa churrascaria Porcão já teriam confirmado. Mas ela havia dito o mesmo em relação ao Boulevard. Chegou a afirmar que o Porcão seria construído no topo do shopping, com vista para a Baía do Guajará, mas nada disso aconteceu, mesmo com a expansão. Logo, nem tudo que ali se diz pode ser dado como escrito. E é justamente por isso que faço esta postagem: daqui a um ano, veremos o que terá se revelado como verdadeiro e o que não.

Enquanto isso, o site do shopping segue praticamente sem atualização, exceto por uma notícia sobre uma feira de franquias lá realizada no último dia 18. A despeito disso, as obras começam a acelerar. Dia desses passei por lá e vi apenas as colunas de sustentação do nível térreo. Poucos dias depois, uma parte do andar superior já estava adiantada, marcando a porta de entrada do prédio. Enfim, a coisa está acontecendo. Resta saber com que velocidade e veracidade.

domingo, 31 de março de 2013

Paraíso e Maraú pedem socorro

Fortes indícios de que a orla da Ilha do Mosqueiro, na parte correspondente às praias do Paraíso e Maraú, não estão resistindo à força das marés. O desabamento de barracas e, ontem, a queda de uma árvore e o terreno cedendo no entorno acenderam, mais uma vez, o sinal de alerta. A preocupação é séria, tendo inclusive o aval do Corpo de Bombeiros. A notícia foi publicada na imprensa comum.

Praia do Paraíso, com o hotel fazenda indicado pela seta
Maraú (ou Marahu) e Paraíso são praias adoráveis, a começar pelo fato de ficarem para o outro lado, longe do furdunço que se forma nos pontos mais afamados da ilha. Não que nos últimos anos não tenha aumentado significativamente a procura, justamente por aqueles que preferem fugir da agonia, em especial dos babacas disputando quem escuta mais forte a música mais escrota. Faz tempo que não vou lá, uns dois anos, mais ou menos, por isso não posso afiançar que a paz ainda reine por aquelas bandas. Mas eu tive o privilégio de mergulhar naquelas águas com todo o sossego! Faz falta.

Em suma, como era de se esperar, Mosqueiro precisa de socorro, também em relação às forças da natureza. É um espaço do qual não podemos prescindir, por isso espero que a prefeitura, que já sabemos não fazer mágicas, preocupe-se em fazer ao menos o seu trabalho, que começa a ganhar ares emergenciais. Mas isso dependerá do engajamento de todos. Porque sem pressão, da acontece por aqui.

domingo, 9 de setembro de 2012

A borracharia e a empreiteira

Aqui no brioso bairro da Marambaia, há uma borracharia cuja localização sempre me chamou a atenção. Ela parece estar sobre a calçada, mas mesmo assim sobra uma faixa larga de calçada para que os pedestres passem. Obstáculos, só se algum carro estacionar por ali, o que obviamente acontece com frequência. Ao lado da borracharia, há outra loja minúscula, que me lembre assistência técnica de alguma coisa. Os dois corpos estranhos jaziam na divisa entre duas empresas: uma transportadora e uma serraria. Serraria esta que, vez em quando, empestava o ar com um cheiro forte de madeira molhada, o qual se espalhava por larga distância. Sempre odiei abrir minha janela e receber uma lufada daquele ar fedido. Odeio cheiro de madeira molhada para beneficiamento.
A transportadora continua lá, mas a serraria não. O terreno foi vendido. Sem nenhum esforço, você pode deduzir que para uma grande construtora, que no local pretende erguer o bilionésimo empreendimento imobiliário vertical em Belém. Nossa cidade se asfixia cada dia um pouco mais com tantos espigões conspurcando a paisagem, cada vez mais árida e morta, cada vez com menos céu e nuvens, cada vez mais quente e sem circulação de vento, porém com cada vez mais circulação de automóveis.
A Marambaia é um bairro privilegiado por ser a última reserva de áreas verdes abundantes em Belém. Mesmo combalido pelo "Via Metrópole", que rasgou a Av. Dalcídio Jurandir (já expliquei que não aceito o nome vendido que puseram na avenida), ainda está lá o Parque Ambiental (que também ganhou um nome vendido) e, fechando um cinturão em volta, diversas áreas ocupadas pelas Forças Armadas, além do Parque Estadual do Utinga e do Jardim Botânico Bosque Rodrigues Alves. Deveria ser aproveitada a vocação desse bairro para ser uma zona verde, repleta de parques, jardins, áreas de convivência, esporte e lazer. Mas, claro, isso é um devaneio meu. A ocupação monstruosa está chegando. Já existe um edifício habitado, três em vias de e, agora, o malsinado empreendimento que erguerá, num só lugar, ao menos uma dezena de prédios. Várias centenas de famílias deverão empoleirar-se nos minúsculos (e mesmo assim caríssimos) apartamentos, gerando enorme pressão por recursos como transportes, energia elétrica, água e esgoto. O caos.
Assim que assumiu o imóvel, a construtora obviamente decidiu escorraçar os vizinhos indesejáveis. Em dezembro passado, agentes das secretarias municipais de Economia e de Urbanismo estiveram no local com intenções claras. Por alguma razão, não conseguiram remover os humildes empreendedores. Os dois borracheiros, pai e filho, Martins de seu sobrenome, constituíram um advogado e a demanda foi levada para o foro. Passados mais de oito meses, o poder econômico está perdendo os rounds iniciais. Como vingancinha, e para preservar o empreendimento da visão grosseira dos casebres, foi erguido um muro tapando descaradamente a janelinha que aliviava o calor da borracharia. Os Martins aceitaram sem protestos.
Há dois dias, encostei na frente da borracharia. Enquanto tirava um parafuso de um dos pneus (tenho uma inexplicável capacidade de atrair parafusos, pregos e outras porcarias para dentro dos pneus do meu carro!), o Martins mais novo me contou o seu problema. Vendo-me de terno e já sabendo que sou advogado, fez-me algumas perguntas das quais me esquivei, alegando que precisaria examinar os documentos mencionados. Afinal, ele já tem um advogado e se há uma coisa que nunca fiz foi emitir pareceres em casos onde já existe um advogado atuando.
O rapaz, que deve ter uns poucos anos mais do que eu, em sua enorme simplicidade, que nunca lhe impediu de ser sempre atencioso e educadíssimo comigo, explicou-me que seu pai comprou uma benfeitoria (os termos técnicos são meus, claro) da dona de um antigo restaurante que havia ali. Negócio de 30 anos atrás. Aí veio a serraria, que ocupou uma grande área e cujo dono aceitou a presença do borracheiro. Nas palavras do Martins filho, existe um documento no qual o dono da serraria autorizava expressamente a presença da borracharia "em terreno de sua propriedade".
Se assim foi, os prognósticos não são nada bons para os humildes borracheiros. Afinal, vendido o imóvel, o novo proprietário não está obrigado a liberalidade alguma. O Martins filho deve ter percebido alguma coisa em meu semblante, pois fez um silêncio e depois concluiu que acha muito difícil eles saírem dali "sem nenhuma indenização". Pessoas que ocupam imóveis irregulares ou a título precário sempre acreditam ter direito a indenizações. Às vezes a crença se dá por pura necessidade de sobrevivência, como imagino que seja o caso.
Sabe-se lá quanto tempo se passará até que o Judiciário resolva o imbróglio entre a borracharia e a empreiteira. O curioso é que sempre me incomodei com pessoas que ocupam o espaço público (o público, especificamente) e se acham donas do pedaço, como os camelôs em relação às calçadas e, mesmo, os donos de bares e outros estabelecimentos, de todos os níveis econômicos, que se acham no direito de espalhar cadeiras e mesas até sobre nossas cabeças. Mas a empatia é um fenômeno complexo. Já faz tantos anos que, de vez em quando, encosto ali na borracharia dos Martins para calibrar os pneus ou retirar os meus habituais pregos que olho para os dois com uma inesperada vontade de que vençam o litígio.
Se passo pelo local, o que me enche de aflição e mesmo de raiva é o stand de vendas do mais novo favelão da cidade, com sua propaganda histérica repleta de famílias felizes, desfrutando do prazer de uma "sofisticada" vida em condomínios bem equipados, cuja piscina é provavelmente do tamanho do apartamento.
Sabemos que, na vida real, Davis não vencem Golias. Exceto se entendermos que Golias é a cidade, imensamente maior e mais importante do que uma empreiteira, mas que continuará sendo vergastada pelo concreto e suas consequências infelizes. De minha janela e de minha sacada, vejo se reduzir a cada dia a quantidade de verde que nos cercava. Quando, afinal, ele acabará?

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

12 camarões e o princípio da insignificância

O princípio da insignificância tem sido admitido de maneira errática na jurisprudência brasileira e sua abordagem não é exatamente conceitual, técnica, pois depende do tipo de crime imputado. Estou constatando que reina particular dissenso em matéria de crimes ambientais.
Para alguns, conduta que afeta o ecossistema não pode ser insignificante, afirmação genérica que me parece tola. Para outros, entretanto, o princípio é perfeitamente possível, como neste caso, em que um indivíduo acusado de crime ambiental por pescar em período de defeso, condenado em primeira instância, acabou absolvido, com base na insignificância. O motivo? Pescou apenas 12 camarões.
Sem olvidar a previsão constante da própria Lei de Crimes Ambientais, no sentido de que se afasta o crime quando a conduta seja cometida com vistas à subsistência pessoal e familiar, 12 delícias como essas aí ao lado não são suficientes sequer para tapar o buraco do dente, que dirá para desequilibrar o meio ambiente.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Faltou o dolo

Repercute na Internet e na imprensa, em âmbito local, o caso dos cães que morreram asfixiados no interior de um veículo usado para transporte de animais, pertencente a um pet shop da cidade. Li, inclusive, matéria na qual a reportagem entrara em contato com o promotor de justiça de Defesa do Meio Ambiente, Benedito Wilson Sá, o qual teria enfatizado a responsabilidade criminal do proprietário do pet shop, face à configuração do crime de maus-tratos contra animal, previsto no art. 32 da Lei n. 9.605, de 1998 (Lei de Crimes Ambientais).
O tipo penal em apreço tem a seguinte redação:
Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos: Pena detenção, de 3 meses a 1 ano, e multa.
(...) § 2º A pena é aumentada de 1/6 a 1/3, se ocorre morte do animal.
Com todo o respeito e estima que me merece o meu ex-colega de primeiro mestrado, Benedito Wilson, e não podendo ter certeza se ele afirmou peremptoriamente a informação que lhe é atribuída, na condição de estudioso do Direito Penal, acredito ser importante fazer uma ponderação da maior relevância.
Os fatos narrados pela família proprietária dos cães foi confirmada integralmente pela empresa e, assim sendo, podemos admitir que os animais foram pegos em casa, para fins de banho e tosa, no veículo do próprio pet shop, como já fora feito diversas vezes antes. Contudo, em vez de serem levados desde logo para local adequado, foram "esquecidos" dentro do carro que, fechado, aqueceu-se insuportavelmente, matando os caninos por asfixia.
Não tomei conhecimento do motivo que levou o funcionário a deixar os cães no carro. Contudo, se houve esquecimento, pressa, preocupação com outro assunto, distração, etc., todas essas situações nos levariam a uma mesma conclusão: houve negligência. E negligência é fundamento de culpa, não de dolo. A menos que haja alguma informação adicional que desconheço, não há nenhum fator razoável que justifique conceber-se a figura do dolo eventual. Para tanto, seria preciso que o funcionário deixasse os cães naquela situação de caso pensado, sem se importar com o mal que lhes pudesse suceder. Mas a hipótese é no mínimo inverossímil, por ser óbvio que a consequência seria, como foi, a perda do emprego.
O delito acima descrito é necessariamente doloso; não há modalidade culposa prevista para ele. Logo, se os fatos se deram do modo como está sendo propalado, não existe crime no contexto, por atipicidade absoluta ou, em linguagem mais modesta, por ausência de previsão legal.
Embora chovendo no molhado, invoco a doutrina: O tipo subjetivo dessa figura "é o dolo, consistente na vontade de abusar, maltratar, ferir ou mutilar o animal. Não há a forma culposa do delito" (MACIEL, Silvio. "Meio ambiente: Lei 9.605, 12.02.1998". In: GOMES, Luiz Flávio e CUNHA, Rogério Sanches (coord.). Legislação criminal especial. Coleção Ciências Criminais, vol. 6. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 755). O aspecto é tão comezinho que mesmo a doutrina o resolve em duas frases, passando a tratar de outras questões mais específicas, como a mutilação de animais para fins estéticos (esta, sim, nitidamente dolosa, mas supostamente assimilada pela sociedade).
No mais, ainda que crime houvesse, qualquer neófito em Direito Penal sabe que a responsabilidade penal é personalíssima. Costumamos falar sobre o princípio da intranscendência da pena (art. 5º, XLV, da Constituição de 1988) no máximo na segunda semana de aulas. Por conseguinte, o autor do delito seria o funcionário que deixou os cães em sofrimento, jamais o proprietário do pet shop, a menos que tivessem agido em comunhão de desígnios. Vale lembrar, por oportuno, que nem todos os penalistas concordam com a coautoria em crimes culposos.
Em suma, a responsabilidade da empresa é civil (reparação dos danos materiais e morais).

***

Considerando que a histeria tomou conta da Internet, concluo esta postagem lembrando que gosto de animais, amo cachorros tenho dois e sou avesso a qualquer forma de maus-tratos. Outrossim, não conheço qualquer pessoa relacionada ao pet shop em questão, dono ou funcionário, jamais tendo posto os pés no estabelecimento. Também não conheço ninguém da família prejudicada. As considerações acima constituem, exclusivamente, uma reflexão restrita à dogmática penal.

terça-feira, 22 de maio de 2012

Maurício politizado

Nunca soube que Maurício de Souza fosse dado a se envolver com a política do país, mas o famoso desenhista decidiu ser coerente com o discurso desenvolvido em suas publicações e escolheu o mais carismático de todos os seus personagens para mandar um recado direto:




As duas charges foram publicadas ontem no Twitter. Enquanto isso, a novela triste que se tornou este novo Código Florestal não termina, mas como existe um prazo, especula-se que amanhã será anunciada a decisão da presidência da República.

Aparentemente, o mais provável é que o projeto seja parcialmente vetado, o que decerto deixará ambos os lados insatisfeitos. A habitual política dos panos quentes, que não ajuda em nada o país, nem ajudará neste caso específico.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Orcas no tribunal

Quem se preocupa com os direitos dos animais e considera que os humanos invadem demais os direitos que aqueles possuem de viver com dignidade talvez apreciem saber que a Corte Distrital de San Diego (Califórnia) admitiu uma ação tendo como autoras, declaradamente, as orcas do famosíssimo parque aquático Sea World.

A ação foi proposta pela organização não-governamental PETA (People for the Ethical Treatment of Animals), três especialistas em mamíferos marinhos e dois ex-treinadores.

O objetivo é demonstrar que os animais são tratados como escravos, porque vivem em cativeiro e são obrigados a trabalhar, no caso, fazendo os seus mundialmente conhecidos shows acrobáticos. O fundamento jurídico é a 13ª Emenda à Constituição americana, que proíbe a escravidão  embora de humanos.

Os autores (verdadeiros) da ação a consideram um marco histórico, porque a causa poderia nem ter sido admitida pelo Judiciário, mas o juiz Jeffrey Miller decidiu apreciar a pretensão. Independentemente disso, analistas se mostram reticentes quanto ao desfecho do processo.

No mais, recordo-me vagamente de uma ação judicial, salvo engano aqui no Brasil, para conseguir a liberdade de um gorila (ou chimpanzé, sei lá), que estaria sob cárcere privado em um zoológico. Mas minhas lembranças são muito vagas e nada achei numa consulta rápida à rede mundial.

PS  Pelo amor de Deus, orcas não são baleias!!! Como pertencem à família Delphinidae, na verdade esses cetáceos são parentes mais próximos dos golfinhos do que das baleias. A confusão, acreditam alguns, foi disseminada porque algum retardado, aqui no Brasil, batizou o filme de Michael Anderson (1977) de Orca, a baleia assassina. Seja como for, a Wikipedia afirma que as orcas também são conhecidas como baleias-assassinas, numa provável popularização do equívoco que, de tão exaustivo, foi cometido, inclusive, na reportagem que me fez conhecer este caso, cujo link está abaixo. Alguém dê zero ao jornalista da BBC que escreveu essa besteira.

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/bbc/1045070-cinco-orcas-processam-parque-aquatico-por-escravidao.shtml
Leia no site da PETA: http://www.peta.org/b/thepetafiles/archive/2012/02/06/historic-day-for-seaworld-orcas-in-court.aspx

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Macho

Segundo a imprensa, hoje, o governo do Estado vai endurecer com o Consórcio Norte Energia, que implanta canteiro de obras para a construção daquela josta superlativa que atende pelo nome de Hidrelétrica de Belo Monte. Desde que começou a atuar, o consórcio tem comprado veículos e maquinários pesados no Sudeste do país, quando poderia adquirir os mesmos produtos aqui, no Pará. Como se trata de compras vultosas, nosso Estado perde uma significativa arrecadação de ICMS, porque todo mundo (governo federal, políticos, empresários) sempre acharam que paraense é otário e tem mesmo que perder tudo. Aqui a coisa sempre funciona na base da predação: leva-se o que é bom sem deixar nada em troca.

Quando o consórcio fez suas comprinhas fora, o governo exigiu que as aquisições fossem feitas aqui. Mas, é claro, nem tchuns. A comprinha desta vez envolveu 118 caminhões, ao custo de 48 milhões de reais. Vamos ver o que é que o governador Simão Jatene fará.

Vale lembrar que o seu antecessor tucano, que o fez governador quando ele era apenas um técnico pouco conhecido como político, subiu nas tamancas em 2001, por causa do "apagão" durante o segundo governo FHC. Almir Gabriel disse ser inaceitável que um Estado que produzia energia para outras regiões do país fosse penalizado como os Estados não produtores. Afetado, foi a Brasília tomar satisfações. FHC, mesmo sendo do mesmo partido, sequer o recebeu. Mandou um preposto do ministério, que nem era o ministro, para se ver o tamanho do prestígio.

No final, Almir voltou mais calmo, falando que o paraense é generoso e entenderia a necessidade de ajudar os irmãos brasileiros a superar aquela fase ruim. Aham, senta lá, Cláudia. E foi assim que terminou a história. Quem se lembra daqueles tempos, sabe que o Pará enfrentou o apagão exatamente como todo o resto do país. Exceto pelo fato de que os ônus socioambientais das hidrelétricas ficam aqui.

Vamos ver a macheza do Simão, até porque o representante do Poder Legislativo (uma tal de Comissão Parlamentar Externa) já foi sumariamente menosprezado ontem. Sintomático.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Bamburrando

Comemorando o seu aniversário, o caderno de negócios do jornal Diário do Pará aproveitou a tiragem do Círio para se apresentar em nada menos do que 90 páginas, sendo que 8 delas da Prefeitura de Belém, ou seja, matéria paga com dinheiro público para fins de nítida glorificação do prefeito-desastre.
Sabemos que "publicidade institucional" neste país é balela. Mas a lambança com tanta publicidade de página inteira deveria ser investigada porque, afinal de contas, não é por aí que se justificaria, num mundo sério, o uso de recursos públicos com fins de divulgação.
Mas já sabemos por onde isso vai.

***

Na mesma coluna, noticia-se que o Hospital da Beneficente Portuguesa vai construir um novo prédio, que se ligará ao antigo através de uma passarela sobre a Rua Boaventura da Silva.
Gostaria de lembrar que a passarela ligando o edifício-estacionamento da Assembleia Paraense a sua sede só agradou aos beneficiários. Obviamente, o clube não teve nenhuma dificuldade em conseguir as autorizações necessárias para levantar o mondrongo, que felizmente enfeia uma rua secundária. Na inauguração, o prefeito-desastre estava lá, para bajular o clube de elite. No entanto, quando a mesma coluna de negócios anunciou que o Hospital Porto Dias também queria construir uma passarela sobre a Av. Mauriti, também para interligar suas unidades, houve reação.
Profissionais da área de Urbanismo criticaram a iniciativa, encarada como uma agressão à cidade. Temia-se, inclusive, que o privilégio da AP virasse moda. Coincidência ou não, o hospital desistiu e não se ouviu mais falar da tal passarela. Agora é a Beneficente Portuguesa que puxa da manga a mesma alopração.
Retomo, então, a discussão: vamos permitir que todo empreendimento privado construa passarelas sobre as ruas da cidade, para sua própria conveniência? É essa a cidade que queremos?

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Notícias do Pará

Há meses convivemos com o escândalo da Assembleia Legislativa, que implicou no locupletamento mais safado por parte de muitas pessoas, ao longo de vários anos.
Depois veio o imbróglio da OAB, que tem dominado a mídia e causado constrangimentos para todos os lados envolvidos.
Nos últimos dias, uma nova ação do Ministério Público Federal contra a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte e uma nova onda de protestos trouxeram à tona as mazelas sociais da região, a persistência de um modelo de grandes projetos que até a mais tosca ameba sabe ter sido lesiva para a Amazônia, além do apoio indecente ao governo federal ao projeto que, segundo consta, nem vai gerar toda a energia que se espera.
Nesse meio tempo, assassinaram dois extrativistas, aumentando a inglória lista de mortos no campo, que se torna ainda mais vergonhosa porque a maioria desses crimes acaba sem punição (notadamente dos mandantes) e porque são mortes anunciadas, desvelando a omissão do poder público em proteger pessoas ostensivamente ameaçadas.
Agora morrem duas crianças prematuras na porta da Santa Casa de Misericórdia, o que remete à morte de mais de duas centenas de bebês em 2008 e se soma a outros episódios trágicos naquele mesmo hospital e no Pronto Socorro, evidenciando o descalabro em nossa saúde pública.
Como se tudo isso não bastasse, as propostas de divisão do Estado demonstram a falta de identidade do povo, o atraso histórico de muitas regiões e o descaso governamental crônico. Quando a campanha esquentar de verdade, não duvide que haverá pancadaria nas ruas.
Esses são os temas por meio dos quais o Brasil tem tomado conhecimento do Pará. Está bom ou quer mais?

Em tempo: O Jornal Nacional no Ar já pousou em Belém para fazer uma reportagem sobre o assunto.

Jornalistas gravam reportagens e dificultam o trânsito
em frente à Santa Casa de Misericórdia.

domingo, 7 de agosto de 2011

Carros (ou indústrias) verdes

A edição deste mês da revista 4 Rodas (n. 620, p. 45) publicou uma matéria intitulada "Rastro verde: Setor automotivo  é o segundo mais sustentável", assinada por Isadora Carvalho. A ideia pode parecer inverossímil à primeira vista, mas considere o teor:

Fabricantes de automóveis foram considerados um dos setores da indústria mais alinhados com a sustentabilidade. Esse foi o resultado de uma pesquisa realizada pela Fundação Nacional de Qualidade (FNQ) com 63 representantes de empresas. O segmento foi eleito o segundo mais preocupado com o meio ambiente - o primeiro é a área de energia. "Contribuiu para esse resultado o investimento da indústria em motores flex e elétricos", diz Jairo Martins, superintendente geral da FNQ. Segundo ele, as montadoras aplicam recursos em iniciativas limpas não só por estratégia de marketing e consciência ambiental. Há fatores econômicos envolvidos. É o caso da Mercedes-Benz, que economiza 60 reais a cada tonelada de resíduo da fábrica que não é encaminhado ao aterro sanitário. "Os restos vão para a reciclagem e parte deles é usada como combustível em fornos de cimento", diz Guilherme Heinz, gerente de qualidade corporativa da marca.

CONFIRA O PROGRAMA DE OUTRAS FÁBRICAS
Peugeot. A marca mantém uma fazenda de 10 000 hectares pouco maior que Paris no norte do Mato Grosso, região sul da Amazônia. Resultado: Em dez anos, a Peugeot reflorestou 1,8 hectare de pastos com plantas amazônicas. A ideia é que a área funcione como um poço de carbono, capaz de retirar CO2 do ar por meio de fotossíntese da floresta. Até agora, 110 000 toneladas de CO2 foram capturadas.
Honda. Transporta motocicletas e peças entre Belém (PA) e Manaus (AM) por meio da Balsa Swimming Warehouse, que substitui 75 carretas nas estradas. Resultado: Com a balsa, deixa-se de emitir poluentes. O projeto economizou 2,8 milhões de litros de diesel entre 2007 e 2010, ou 1,7 litro por motocicleta transportada.
Volkswagen. Tem software que mede os impactos da produção no meio ambiente, o que permite contabilizar o consumo de recursos naturais e emissões de resíduos. Resultado: De 2008 a 2010, a empresa reduziu em mais de 16% o consumo de água, energia e gás natural por veículo produzido.
Mercedes-Benz. Um programa conscientiza funcionários a reduzir o consumo de água, de energia e de solventes e a evitar resíduos. Rotas alternativas dentro da fábrica garantem menor consumo de combustível. Resultado: O consumo de energia caiu 20% e o de água, 60% a cada veículo produzido nos últimos dez anos.

Imagino que as empresas, de um modo geral, regem-se pela busca de lucros como prioridade zero. A falta de consciência ambiental tanto se pode explicar pela falta de conhecimentos científico-tecnológicos que permitam uma produção mais limpa, quanto pelo desejo de internalizar lucros, externalizando problemas. No entanto, o fato de a indústria mudar certas posturas por exigências do mercado ou do público, e em última análise para otimizar suas vendas, não diminui o valor dessas iniciativas, algumas delas absolutamente essenciais, como a economia de água.
É reconfortante ver a indústria automobilística se esforçando por gastar menos na produção e por oferecer produtos que gerem menos despesas individuais, sociais e ambientais. Com o tempo, essas práticas se arraigarão de um tal modo na consciência das pessoas que as novas gerações nem cogitarão de comprar produtos produzidos de forma irresponsável. Tomara.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Grafite

LEI Nº 12.408, DE 25 DE MAIO DE 2011


Altera o art. 65 da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, para descriminalizar o ato de grafitar, e dispõe sobre a proibição de comercialização de tintas em embalagens do tipo aerossol a menores de 18 (dezoito) anos.


A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:


Art. 1º Esta Lei altera o art. 65 da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, dispondo sobre a proibição de comercialização de tintas em embalagens do tipo aerossol a menores de 18 (dezoito) anos, e dá outras providências.

Art. 2º Fica proibida a comercialização de tintas em embalagens do tipo aerossol em todo o território nacional a menores de 18 (dezoito) anos.

Art. 3º O material citado no art. 2º desta Lei só poderá ser vendido a maiores de 18 (dezoito) anos, mediante apresentação de documento de identidade.

Parágrafo único. Toda nota fiscal lançada sobre a venda desse produto deve possuir identificação do comprador.

Art. 4º As embalagens dos produtos citados no art. 2o desta Lei deverão conter, de forma legível e destacada, as expressões “PICHAÇÃO É CRIME (ART. 65 DA LEI Nº 9.605/98). PROIBIDA A VENDA A MENORES DE 18 ANOS.”

Art. 5º Independentemente de outras cominações legais, o descumprimento do disposto nesta Lei sujeita o infrator às sanções previstas no art. 72 da Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998.


Art. 6º O art. 65 da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 65. Pichar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.


§ 1º Se o ato for realizado em monumento ou coisa tombada em virtude do seu valor artístico, arqueológico ou histórico, a pena é de 6 (seis) meses a 1 (um) ano de detenção e multa.

§ 2º Não constitui crime a prática de grafite realizada com o objetivo de valorizar o patrimônio público ou privado mediante manifestação artística, desde que consentida pelo proprietário e, quando couber, pelo locatário ou arrendatário do bem privado e, no caso de bem público, com a autorização do órgão competente e a observância das posturas municipais e das normas editadas pelos órgãos governamentais responsáveis pela preservação e conservação do patrimônio histórico e artístico nacional.” (NR)


Art. 7º Os fabricantes, importadores ou distribuidores dos produtos terão um prazo de 180 (cento e oitenta) dias, após a regulamentação desta Lei, para fazer as alterações nas embalagens mencionadas no art. 2º desta Lei.

Art. 8º Os produtos envasados dentro do prazo constante no art. 7º desta Lei poderão permanecer com seus rótulos sem as modificações aqui estabelecidas, podendo ser comercializados até o final do prazo de sua validade.

Art. 9º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. [DOU de 26.5.2011]

Brasília, 25 de maio de 2011; 190o da Independência e 123o da República.

A única diferença na redação do art. 65 da Lei de Crimes Ambientais, antes desta mudança, era a presença do verbo "grafitar" no preceito primário. Os artistas de rua agradecem.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Defesa da orla de Belém

Agindo conjuntamente, a União, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado do Pará protocolaram, ontem, ação civil pública, com pedido de antecipação de tutela, contra o Município de Belém e as construtoras Quadra Engenharia LTDA., Cyrela Brazil Realty e Premium Participações. A ACP, que tomou o número 16934-22.2011.4.01.3900, destina-se a proteger a orla de Belém de empreendimentos imobiliários potencialmente lesivos ao meio ambiente, mas que mesmo assim tiveram seus projetos licenciados pelo Executivo municipal.
A partir de procedimento administrativo que tramitou perante a Procuradoria da República no Pará, aqueles entes públicos concluíram pela inconveniência dos empreendimentos "Edifício Premium" (Premium/Quadra) e "Mirage Bay" (Cyrela), de 23 e 31 andares respectivamente. Argumentam os autores que, naquela área da cidade (Complexo "Ver-o-Rio" e Av. Pedro Álvares Cabral) a legislação urbanística da cidade só permitia a construção de edifícios com no máximo três andares, mas ultimamente vêm sendo autorizados empreendimentos de até 30 andares. No caso, nenhum estudo de impacto de vizinhança foi realizado.
Dizem os autores:

"Nota-se assim, que a tendência, com a alteração do Plano Diretor, é de que haja rápida ocupação da referida área, por estar localizada em bairro privilegiado e de frente para Baía do Guajará, prejudicando, com isso, a ventilação, o trânsito, o clima, o acesso ao rio e a paisagem da cidade."

"A mudança drástica na legislação de Belém, deixa claro que a grande especulação imobiliária na cidade foi posta à frente do equilíbrio ambiental, prejudicando espaços de lazer existentes na orla e impossibilitando o acesso da população em geral, com sério risco de agravar inúmeros problemas socioambientais já gerados em decorrência deste processo desordenado de ocupação e uso do solo urbano."

Após estudos técnicos baseados nos trabalhos de professores da Universidade Federal do Pará — do Prof. Dr. Juliano Pamplona Ximenes Pontes, atual diretor da Faculdade de Engenharia e Arquitetura (ocupação da orla); do Prof. Dr. Antônio Carlos Lôla da Costa, do Laboratório de Meteorologia Ambiental (ventos); do Prof. Ms.C Luiz de Jesus Dias da Silva, do curso de Arquitetura (esgotamento sanitário); do Prof. Dr. Irving Montanar Franco e Prof. Diego Augusto Coelho Ulhôa (relação verticalização x ventilação) — e da Universidade da amazônia (Prof. Dra. Elcione Lobato de Moraes, arquiteta, doutora em Acústica Arquitetônica e pós-doutora em Acústica Ambiental), os autores invocam a Constituição de 1988 e a legislação federal para concluir pela impossibilidade de prosseguir os empreendimentos sem estudo prévio de impacto ambiental. Apontam violação, também, da legislação municipal, notadamento o Plano Diretor (Lei n. 8.655, de 2008), que identifica como Zona Especial de Interesse Ambiental a "área da orla continental do Rio Guamá e da Baía do Guajará". Segundo o PDU, essas áreas devem destinar-se, preferencialmente, "ao lazer da população, de forma a contribuir com o equilíbrio ambiental".
Considerando que o PDU também condiciona o licenciamento de obras ao estudo prévio de impacto de vizinhança e seu resultado pode impor a anulação de licenciamentos já concedidos.
Ao final, os autores pedem que a tutela seja antecipada para suspender as obras dos prédios até que estudo competente mostre a viabilidade dos mesmos. No mérito, pedem que às construtoras seja imposta obrigação de não fazer (não construir no local objeto da demanda até a conclusão do estudo de impacto de vizinhança), bem como ao Município de Belém (não licenciar obras na orla da cidade), que deve também promover os estudos de impacto ambiental.
A peça, de 43 laudas, é assinada pelos procuradores da República Alan Rogério Mansur Silva e Bruno Araújo Soares Valente; pelos promotores de justiça Benedito Wilson Corrêa de Sá e José Godofredo Pires dos Santos; e pelos advogados da União Denis Gleyce Pinto Moreira e José Mauro de Lima Ó de Almeida.
A briga é das boas.

terça-feira, 29 de março de 2011

É um lixo!

Que Belém está um lixo só, não é novidade para ninguém. O monturo começa desde a sede da prefeitura, onde eventualmente pode ser encontrado aquele que nos relegou a esta situação de quase indigência. Desta vez, contudo, a lixeira teve consequências: o IBAMA aplicou multas diárias, de 40 mil reais, ao Município, e de 4 mil reais ao tal de Duciomar Costa, por irregularidades no tristemente famoso "Lixão do Aurá", esse aprazível condomínio horizontal da foto aí ao lado.
O lixão a céu aberto, nem preciso dizer, é uma fonte inesgotável de danos ambientais e riscos à saúde da população. Não é de hoje que se tenta resolver em definitivo a situação do mesmo, mas é óbvio que, sem governo, não há como esperar que alguma coisa aconteça.
Triste é que, no final, a fatura sempre cai no costado do contribuinte. Mas como eu sempre repito: não foi por falta de aviso!

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Um bosque para o consumo

Os dois primeiros shopping centers da cidade — o então Iguatemi, hoje Pátio Belém, e o Castanheira — foram inaugurados em 1993. Àquela altura, a Internet ainda era incipiente nos lares belenenses e não existiam ferramentas de comunicação hoje popularíssimas. Se alguém dissesse "blog!", ouviria de volta um "saúde!". Por isso, todas as pautas a respeito dos dois empreendimentos foram selecionadas pela imprensa comum. Já em 2008, quando começou a construção do Boulevard Shopping, a conjuntura era totalmente diferente. A obra — de um ritmo nunca antes visto por estas bandas — foi acompanhada e descrita por diversos blogueiros curiosos, alguns dos quais chegaram a publicar fotos logo após a inauguração do empreendimento.
O processo está prestes a começar novamente e é possível que ganhe alguns contornos especiais. É que, desta vez, não se trata apenas de um shopping, mas de um empreendimento imobiliário mais arrojado, uma espécie de microbairro planejado, cravado numa área de conservação ambiental. Consoante apresentação feita na última quarta-feira pelos empreendedores, Belém deve ganhar um conjunto de mais de 30 edifícios de altura mediana (devido à proximidade do Aeroporto Internacional Júlio Cezar Ribeiro), divididos entre residenciais e comerciais. Como foi dito na ocasião, pela primeira vez a infraestrutura chegará antes da ocupação. Lá isso é verdade: nunca aconteceu antes, por aqui.
O ícone do empreendimento é o anunciado maior shopping da Região Norte: o Bosque Belém, nome que considerei muito bonito. Aliás, a logo, que você vê ao lado, também é bela.
Como entende o mercado de hoje, qualidade de vida pressupõe que você tenha um centro de consumo grandioso e variado, bem pertinho. As obras de construção do shopping devem começar no primeiro semestre de 2011 e a inauguração deve ocorrer até o final de 2012. [Anotação em 18.5.2012: Pode esquecer: nem o serviço de terraplanagem foi concluído e parece estar havendo problemas de comercialização. Este empreendimento não sairá tão cedo.]
Vale lembrar que, há uns poucos anos, houve um surto de propostas para construção de shoppings em Belém, que a recente crise economia mundial bloqueou. Agora que o vendaval amainou (ou ao menos se crê nisso), os projetos voltam a ser desengavetados. Ao menos o do Grupo Jereissati Nordeste está aí. Algumas imagens divulgadas pela imprensa:



Sem dúvida, um belo projeto, mas o que me chamou a atenção foi a promessa de que ele está afinado às novas exigências ambientais: fará captação de energia solar e da água das chuvas. Tomara. Afinal, é sempre necessário receber com os dois pés atrás as boas intenções do mercado imobiliário, que sabe ser altamente predatório. Além do mais, a proximidade com os dois aeroportos, com uma área de conservação ambiental e com bairros pobres da cidade trazem questões palpitantes: segurança do tráfego áereo, meio ambiente e a angustiante dicotomia entre pobreza e concentração de renda.
Acompanharei o andamento do "Cidade Cristal" com interesse, por conta dessas temáticas. E São Tomé que sou, neste momento ainda me pergunto se o negócio vai mesmo sair do papel. Ainda não me saiu da memória o tal Shopping Center Belém, anunciado com estardalhaço no começo da década de 1990 e que prometia ser nada menos que o maior shopping do Brasil. Palavras ao vento. No local em que deveria ser erigido, de frente para a Universidade Federal do Pará, surgiu a favela Riacho Doce e um universo de mazelas nunca resolvidas.
Alguém me avise quando começarem a construir as fundações.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Adubo monetário

A edição de hoje do jornal Público, distribuído gratuitamente na cidade, estampa como principal manchete "DINHEIRO VIRA ADUBO NO PARÁ".
Escaldado com tantos escândalos de corrupção e ciente de que estamos em ano eleitoral, pensei logo que se tratava de alguma safadeza. Mas, na verdade, a matéria é sobre um projeto de reciclagem, que transforma cédulas em adubo orgânico mais barato para os pequenos produtores. Trata-se de um convênio de cooperação técnica e financeira entre o Banco Central, o governo do Pará e a Universidade Federal Rural da Amazônia.
A matéria, não assinada, explica o seguinte:

A idéia é usar as 11 toneladas de papel moeda retiradas de circulação, na região Norte, que são triturados todos os meses em Belém, para a produção de 10 toneladas de adubo orgânico que serão distribuídas para 20 pequenos produtores da Região Metropolitana. O Banco Central, que tritura 1 milhão e meio de quilos de papel moeda por ano, pretende usar o projeto piloto que será implantado em Belém como modelo para todas as suas regionais no país.
O projeto foi desenvolvido e será coordenado pelo professor Carlos Augusto Cordeiro Costa, da Ufra, que comprovou a eficácia do uso do papel moeda na produção do adubo. Segundo ele, o uso do composto orgânico, que tem 20% de papel moeda triturado em sua composição, é mais saudável para a população do que os adubos químicos que provocam intoxicações. Além do reaproveitamento das cédulas, que eram descartadas, como fonte de matéria orgânica, que pode se transformar num recurso simples e barato, diminuindo os gastos com adubos e insumos para o pequeno produtor.

Uma ótima notícia, sem dúvida. O custo de produção do dinheiro é muito elevado e, pelos péssimos hábitos do brasileiro, as cédulas se estragam rapidamente. Um desperdício absurdo, de que a grande maioria das pessoas simplesmente não toma conhecimento. Com este projeto, pelo menos se reduzem os danos e se cria uma nova oportunidade de crescimento para o pequeno produtor.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Exuberante

Cientistas do Museu Goeldi, em parceria com a CI-Brasil (Conservação Internacional), encontraram (sic) um grande número de espécies de plantas, peixes, mamíferos, aves, répteis e anfíbios na Estação Ecológica Grão Pará. É a maior unidade de proteção integral em florestas tropicais do mundo, com 4,2 milhões de hectares. O tesouto descoberto demonstra a diversificada história natural da Calha Norte do rio Amazonas, que é a porção mais preservada do Pará. As espécies são de grande interesse para a indústria, a pesquisa científica e a conservação ambiental. São mais de 140 espécies diferentes de peixes. Também foram registradas 62 espécies de anfíbios e 68 de répteis, com possíveis novas espécies. Dentre as descobertas, estão os sapos coloridos da família Dendrobatidae, geralmente utilizados como animais de terrários na Europa, nos EUA e no Japão.

A nota acima, publicada na coluna do jornalista Mauro Bonna hoje, pode ser confirmada na página do Museu Paraense Emílio Goeldi, com maiores detalhamentos.
É mais uma prova da exuberância da Amazônia. Pena que a nota coloque o grande interesse da indústria à frente da pesquisa científica e, por último, o da conservação ambiental. A ordem deveria ser invertida, sob pena de aquela região deixar de ser "a porção mais preservada do Pará".
Sei que é difícil, mas tomara que as prioridades corretas sejam seguidas nesse caso. E mais uma vez nossos parabéns ao Emílio Goeldi, que tanto orgulho nos proporciona.