No Chico Buarque, meteram o pau. Refiro-me à letra da canção Mulheres de Atenas, por sinal maravilhosa, interpretada como um libelo à absoluta submissão das mulheres a todo tipo de abuso e dominação masculina (muito embora se afirme que Buarque apenas criou apenas mais uma de suas metáforas para criticar a ditadura militar, sem tanto risco de se dar mal por isso). Com efeito, numa exegese apolítica do poema, não se vislumbra o menor sinal de que o autor fale de qualquer coisa que não seja a relação homem-mulher. Daí resulta que Buarque escutou desaforos.
Hoje, contudo, com o Brasil imerso na mais desbragada e louca campanha pela glorificação do mau-caratismo, do vício, do lixo e do nada, o que se revela, também, pela sucessão de podridões travestidas de "arte" e vistas com mais frequência no âmbito da "música", não se vê nenhum senso crítico na exploração da mulher como coisa nos "versos" destinados às massas. Muito pelo contrário, agora que os ritmos antes restritos às periferias invadiram os ambientes (pretensamente) mais sofisticados da sociedade — qualquer mauricinho ou patricinha, hoje, dança ao som de aparelhagens, brega, (pseudo)forró, pagode e suas incontáveis variações —, o que podemos questionar sobre a atitude das pessoas perante a violência contra a mulher?
Inevitável falar do funk, que parece possuir dois objetos principais de louvor: o sexo e o crime. Passamos pela supostamente ingênua mensagem de que "um tapinha não doi" (que de tão ingênua ganhou uma versão cantada por e para crianças!!!) até às explícitas manifestações de Tati Quebra Barraco ("Tirar onda para elas é viver de sacanagem/ O gatinho até gosta, mas tu sabe como é/ Mas se ele paga o motel, ela faz o que eles quer"; "Sou cachorra chapa quente/ Adoro quando me taram/ E fico louca de tesão/ Pedindo tapinha na cara").
Subindo do Centro-Sul para o Norte-Nordeste, a moda passa pelo ritmo que desmerece o legítimo forró, com sua profusão de bandas ridículas, a começar pela tétrica apresentação. E as letras são pérolas como:
"A coisa mais linda que eu vi na minha vida/ Foi uma mulher deitada na cama/ De calcinha preta regada na bunda/ Ela me chamava e eu logo ia"
"Só gosto de mulher quente/ de preferência safada/ que usa calcinha preta/ na bunda toda enfiada/ Sou a mulher, a que você procurava/ (...) vou tirar minha calcinha porque hoje estou tarada!"
"Desde criança no tempo da vovozinha/ Menina danadinha leva tapa na bundinha/ (...) Mas esse tapa vai ser bem gostozinho você pode até gostar e vai pedir mais um pouquinho"
"Cuida do seu homem senão vou roubar/ Eu sou rapariga sei o meu lugar/ Todo homem também gosta da mulher de rua/ Se ele me procura a culpa é toda sua"
E a antológica referência de mau gosto neste blog:
"Vaaaaai, dá tapinha na bundinhaaa, vaaaaai/ Que eu sou sua cachorrinha, vaaaaaaaai/ Fico muito assanhada, seu eu pedir você me dá/ Lapada na rachada/ Vaaaai, dá tapinha na bundinha, vaaaaaai/ Que eu sou sua cachorrinha, vaaaaai/ Fico muito assanhada/ Vamos dá uma lapadinha?/ Só se for na rachadinha/ Tooooooma gostosa, lapada na rachada.../ Você pede e eu te dou, lapada na rachada/ E aí, tá gostoso?"
Pondere, ainda, que tudo isso é cantado por fulanas seminuas, rebolando e gemendo o tempo todo, para demonstrar a satisfação em que se encontram. Deve ser muito bom mesmo ser uma vagaba. Com a palavra, as feministas. Preferencialmente aquelas que correm para o salão quando toca alguma dessas maravilhas.
Provavelmente, dirão que tudo isto é uma rematada besteira; que uma coisa não tem nada a ver com a outra; que o fato de uma mulher se deleitar com tal repertório não significa que, em sua vida de relação, ela se submeta a ser tratada como objeto sexual; que o fato de um homem adorar esse repertório não indica que pretenda reproduzi-lo nestes termos (hmmm... pretende, sim). Então tá. De minha parte, penso que as pessoas escutam as músicas com que possuem afinidade, principalmente a inconsciente. Realmente acredito que, nas mínimas atitudes, as pessoas revelam quem são. E quem treina, joga, não é assim? É tudo uma questão de conveniência e oportunidade.
A palavra continua com as feministas.
Tema sugerido pelo Adelino Neto, a quem agradeço pela sugestão. Mas saiba, meu amigo, que foi difícil escrever a postagem porque, graças a Deus, não conheço os nomes dessas bandas e muito menos de suas "canções", por isso tive que fazer uma garimpagem em sítios de letras. Quem quiser dar outras dicas de letras edificantes em honra da mulher, à vontade. Podemos fazer uma lista do melhor do pior.
21 comentários:
Fui procurar uma letra (parece piada chamar de letra) de um funk que ouvi há uns meses. Encontrei com o nome da 'danada' que canta. É Mc Nayara, e ela canta, ou geme, tanto faz, essa música (hahahahaha... música...):
(ela começa)
Vem amor, bate nao pára
Com o piru na minha cara
Essa é a minha tara
(entra uma voz de homem)
Com esse corpo, com essa bunda
Com essa cara de safada
Vai descendo e merecendo
Surra de piru na cara
(ela termina)
Bate, bate, bate, bate
Com o piru minha cara
Obrigado, amigo Yúdice. Seu texto desmascara a hipocrisia reinante na sociedade brasileira, que deveria - deveria - rejeitar todo esse lixo.
E o grande questionamento continua aguardando uma resposta coerente das mulheres, se é que existe coerência no fato de elas aprovarem esse tipo de "música": por que algumas mulheres gostam de músicas que depreciam o sexo feminino?
Acho que não teremos respostas, pois não acredito que existam mulheres desse nível entre as leitoras do seu prestigioso blog.
Mas, se houver, nada mais me surpreenderá.
Um abraço,
Adelino Neto
"Piru na cara", Ivan? Essa merecia mesmo ser destacada. Obrigado.
Caro Adelino, sugeriste uma boa pauta. Não sei se este blog é tão prestigioso como dizes, mas concordo com a provocação de que será difícil justificar esses gostos. Continuemos aguardando algum manifesto contrário a nossa opinião.
Égua! Piru na cara!!!!!!
hahahahahahahahahahahahahahahaha
Ótimo post.
Acredito que é possível alguém dizer que gosta deste tipo de... música... porque as pessoas hoje não refletem sobre a informação que recebem. Absorvem muita informação e não sabem da metade daquilo que está sendo mmostrado. Não pensam no significado, na mensagem, na influência, na educação. Em nada. É como um monte de zumbis que se sacode com um ritmo que consideram legal pra dançar, então, qualquer coisa que vier num ritmo desse, tá valendo.
Ou então a realidade ao voltar pra casa é bem pior do que a cantada nas músicas.
Lembra da peça do Fangundes, dos 7 minutos? É isso. Se é que alguém que gosta desse lixo parou pra refletir ou pelo menos ficou surpreso/chocado/indignado/levemente incomodado com as palavras que ouviu, sete minutos depois já esqueceu. Ou acha que não vale a pena ficar pensando nisso. E continua ouvindo.
Ah sim, fora a necessidade de pertencer ao grupo. Se tá todo mundo dançando e curtindo, é possível que a reflexão nem chegue aos 7 minutos, e a pessoa já decidiu deixar de lado qualquer raciocínio lógico sobre aquela letra. Afinal, curtir com a galera deve ser mais importante.
Boa tarde, Polyana.
Sobre o seu comentário, não vejo isso como falta de reflexão. De maneira alguma. Penso que a afinidade com esse tipo de música, mesmo de forma inconsciente, revela por completo a personalidade da pessoa, seja homem ou mulher.
Eu, por exemplo, não suporto a mediocridade das letras de forró, a falta de criatividade das melodias e o total despreparo artístico dos "cantores" e "cantoras". Forró, enfim, é lixo!
Mas, ao mesmo tempo, o problema não é o forró em si. É a pobreza. Estou falando da falta de dinheiro. Difícil de entender? Nem tanto. Vou explicar.
A pobreza das pessoas é, na verdade, o grande elemento criador do público de forró - e também dos públicos apreciadores de pagode, do funk de favela, do brega, do calypso e de outras porcarias. Se as pessoas tivessem melhores e mais amplas oportunidades de acesso ao ensino de qualidade, à cultura e a manifestações artísticas mais dignas; se não morassem amontoadas umas sobre as outras em favelas insalubres; se tivessem dinheiro para comprar livros e revistas de qualidade, com essas condições, o forró por si só não encontraria espaço para proliferar e conquistar novos adeptos.
O dinheiro faz diferença. Imaginem, numa daquelas favelas barra-pesada, os moradores (a grande maioria) ouvindo Mozart, U2 e The Beatles. Nem combina, né? O estilo de vida pobre é quem cria plenas condições para que o forró se manifeste. E haja "você não vale nada, mas eu gosto de você" nas caixas de som.
Há exceções? Há, mas elas apenas confirmam a regra. Eu acredito que o fim da pobreza também representará o fim da cultura trash em nosso país. Numa sociedade mais instruída, mais crítica, com capacidade para diferenciar o belo do feio, certamente o forró será naturalmente rejeitado por todos.
Outra coisa: não bastasse a baixaria e a pornografia explícita, os "cantores" de forró interpretam as canções (todas com melodias plagiadas) de um jeito muito nojento, à toa, com uma atitude de pretensos conquistadores baratos. É algo meio inexplicável e totalmente repugnante.
Não sou puritano, pois considero isso uma hipocrisia. Ninguém é santinho. Acontece que há limites que devem ser respeitados para garantir a manutenção dos valores morais na sociedade. E o forró extrapolou esses limites.
Nosso país vive uma crise moral gravíssima. E essas "canções" ajudam a disseminar a mentalidade que prega a banalização da família. Traição, sexo sem compromisso, gravidez precoce, prostituição e relacionar-se com vários parceiros ao mesmo tempo; tudo isso passa, gradualmente, a ser visto como coisa normal, como comportamentos plenamente aceitáveis no cotidiano.
Imagine uma criança com 5 anos de idade hoje, que sempre ouve forró em casa, nas festas de família. Essa pessoa está no momento de formação da personalidade. É na infância que se estabelecem parâmetros e referências, que vão definir o que a pessoa será para o resto da vida. Vejam bem: é para o resto da vida.
O tempo vai passar, essa pessoa vai crescer e, num belo dia, ela estará agindo exatamente como essas canções imundas sempre pregaram. Estará traindo, transando irresponsavelmente e fazendo coisas até piores. Porque, querendo ou não, a educação não se dá somente na escola ou através dos exemplos da família, mas também do conteúdo (a)cultural que o cidadão recebe ao longo da vida.
O problema não é o ritmo do forró, mas seu conteúdo. Aliás, o ritmo também é um problema grave, haja vista que algumas melodias são descaradamente plagiadas dos maiores nomes do rock internacional, mas isso aí já é outra história. E não deixa de ser prova inequívoca da total incapacidade criativa dessa bandinhas fuleiras que posam de artistas. Não têm talento para criar letras nem arranjos. Não merecem o prestígio que têm. E só desfrutam dele por conta da desqualificação moral do povo.
Ufa! Acho que é isso. Espero não ter ofendido ninguém.
Um abraço,
Adelino Neto
Ainda que considerando justas as novas ponderações, só gostaria de fazer um apelo, no sentido de que separássemos o joio do trigo. Afinal, existe o forró de verdade, música nordestina de raiz, maravilhosa de se ouvir e de dançar (quem sabe), e existem os modismos destes tempos, que é justamente do que estamos falando.
Não podemos nem em sonho colocar Luiz Gonzaga no mesmo saco do Calcinha Preta. O primeiro é arte popular. O segundo, baixaria para vender aos adeptos.
Oportunamente, publicarei alguns exemplos de forró do bom, que não merece estas críticas.
Trenzinho da Sacanagem
Garota Safada
Composição: Indisponível
Quer ir mais eu, vamos eu tô saindo agora
E no trenzinho da sacanagem que eu já vou embora (4 vezes)
Eu sou cabra raparigueiro, nasci pra raparigar
Raparigar é minha vida eu nasci pra raparigar
A cachaça fica boa quando chega a rapariga e no forró da rapariga todo mundo vai dançar
Quer ir mais eu, vamos eu tô saindo agora
E no trenzinho da sacanagem que eu já vou embora (2 vezes)
E quando a festa fica boa os homens vivem bebendo
Tem rapariga doidona, tem rapariga bebendo
Tem rapariga doidona, tem rapariga querendo
Tem rapariga doidinha pra se agarrar
Tem rapariga chorando, tem rapariga assanhada
E no forró da rapariga todo mundo vai dançar
Quer ir mais eu, vamos eu tô saindo agora
E no trenzinho da sacanagem que eu já vou embora (4 vezes)
Eu sou cabra raparigueiro, nasci pra raparigar
Raparigar é minha vida eu nasci pra raparigar
A cachaça fica boa quando chega a rapariga e no forró da rapariga todo mundo vai dançar
Quer ir mais eu, vamos eu tô saindo agora
E no trenzinho da sacanagem que eu já vou embora (4 vezes)
E quando a festa fica boa os homens vivem bebendo
Tem rapariga doidona, tem rapariga bebendo
Tem rapariga doidona, tem rapariga querendo
Tem rapariga doidinha pra se agarrar
Tem rapariga chorando, tem rapariga assanhada
E no forró da rapariga todo mundo vai dançar
Quer ir mais eu, vamos eu tô saindo agora
E no trenzinho da sacanagem que eu já vou embora (4 vezes)
Chupa Que É De Uva
Aviões do Forró
Composição: Alexandre Avião / Richardson Maia / Marujo
Vem meu cajuzinho
Te dou muito carinho
Me dá seu coração
Me dá seu coração
Vem meu moranguinho
Te pego de jeitinho
Te encho de tesão
Te encho de tesão...
Me deixa maluca
Tira o mel da fruta
Me mata de amor
Me mata de amor
Me pega no colo
Me olha nos olhos
Me beija que é bom
Me beija que é bom...
A sua boca eu viro fruta
Chupa que é de uva
Chupa, chupa
Chupa que é de uva
A sua boca eu viro fruta
Chupa que é de uva
Chupa, chupa
Chupa que é de uva
Chupa, chupa
Chupa que é de uva...
Vem meu cajuzinho
Te dou muito carinho
Me dá seu coração
Me dá seu coração
Vem meu moranguinho
Te pego de jeitinho
Te encho de tesão...
Me deixa maluca
Tira o mel da fruta
Me mata de amor
Me mata de amor
Me pega no colo
Me olha nos olhos
Me beija que é bom
Me beija que é bom...
Da sua boca eu viro fruta
Chupa que é de uva
Chupa, chupa
Chupa que é de uva
A sua boca eu viro fruta
Chupa que é de uva
Chupa, chupa
Chupa que é de uva
Chupa, chupa
Chupa que é de uva...
Me deixa maluca
Tira o mel da fruta
Me mata de amor
Me mata de amor
Me pega no colo
Me olha nos olhos
Me beija que é bom
Me beija que é bom...
Da sua boca eu viro fruta
Chupa que é de uva
Chupa, chupa
Chupa que é de uva
A sua boca eu viro fruta
Chupa que é de uva
Chupa, chupa
Chupa que é de uva
Chupa, chupa
Chupa que é de uva...
Mulher Não Vale Nem Um Real
Aviões do Forró
Composição: Indisponível
É hoje que eu vou encher a cara
Pra me esquecer da fuleragem da mulher
Eu hoje vou sair fazer zueira
Quero acodar de bobeira dormindo num cabaré(2x)
Essa mulher nao vale nem um real
Eu gosto dela e nao é da conta de ninguém
Por isso agora eu digo Tô decidido!
Se ela não ficar comigo não fica com mais ninguém(2x)
Mas aí o coro come, a cobra fuma, o bicho pega
Eu tô com essa danada e quem manda nessa bodega
Piriri, Piriri, Pocotó, Pocotó...
Yúdice,
assim caminha a humanidade! Hehehehe
As músicas comentadas fizeram-me lembrar de duas outras, que provavelmente foram as precursoras dos gemidos e cantadas grosseiras.
Veja só que evolução (?). Nos anos 1960 (eu acho) a música "Je t'aime moi non plus" foi um escândalo mundial, com seus gemidos sôfregos e a imagem poética mais engraçada e menos romântica para o sexo ("ficar entre os rins" é dose! heheheheh)
Acho que foi essa música que inspirou um sucesso brasileiro do Ira! ("Entre teus rins") com a "cantada" menos eficiente e, pelo menos para mim, mais engraçada da história" ("Agora estou a fim de ficar entre os seus rins").
Abraços,
Vlad.
Je t'aime moi non plus(Serge Gainsbourg)
Je t'aime /Eu te amo
Je t'aime /Eu te amo
Oh oui je t'aime /Oh sim eu te amo
Moi non plus /Eu mais ainda
Oh mon amour... /Oh meu amor...
Comme la vague irrésolue /Como a onda irresoluta
Je t'aime /Eu te amo
Je t'aime /Eu te amo
Oh oui je t'aime /Oh sim eu te amo
Moi non plus /Eu mais ainda
Oh mon amour... /Oh meu amor...
Tu es la vague, moi l'île nue /Tu és a onda, eu a ilha nua
Tu vas /Tu vais
Tu vas et tu viens /Tu vais e tu vens
Entre mes reins /Entre meus rins
Tu vas et tu viens /Tu vais e tu vens
Entre mes reins /Entre meus rins
Et je te rejoins /E eu junto a ti
Je t'aime /Eu te amo
Je t'aime /Eu te amo
Oh oui je t'aime /Oh sim eu te amo
Moi non plus /Eu mais ainda
Oh mon amour... /Oh meu amor...
Comme la vague irrésolue /Como a onda irresoluta
Je vais /Eu vou
Je vais et je viens /Eu vou e eu venho
Entre tes reins /Entre teus rins
Je vais et je viens /Eu vou e eu venho
Entre tes reins /Entre teus rins
Et je me retiens /E eu me retenho
I love you /Eu te amo
Moi non plus /Eu mais ainda
I love you /Eu te amo
Moi non plus /Eu mais ainda
Retiens moi /E me retens
Tu vas /Tu vais
Tu vas et tu viens /Tu vais e tu vens
Entre mes reins /Entre meus rins
Je vais et je viens /Eu vou e eu venho
Je me retiens /E eu me retenho
- Non ! maintenant /- Não! Agora
Viens... /Venha...
Te amo!
Isso eu posso te dizer
Como eu gosto de você
Como eu gosto de você...
Te quero!
Isso é tudo que eu sei
Que eu gosto de você
Ah! Como eu gosto de você...
O que eu sinto
Não é difícil explicar
É o amor
Como uma fonte a jorrar
Pura emoção...
E o meu sonho
Nem consigo me lembrar
Mas o certo
É que você estava lá
Sonho real!
Sonho real!...
Seu beijo!
Minhas mãos em seu quadril
Madrugada tão febril
Ah! Como eu gosto de você...
Meu exílio!
É em seu corpo inteiro
És meu país estrangeiro
Ah! Como eu gosto de você...
Me deu o dedo
Eu quis o braço e muito mais
Agora estou a fim
De ficar entre os seus rins
De ficar entre os seus rins...(2x)
De ficar entre os seus rins
De ficar entre os seus rins...
Seus rins!...
E o acervo da baixaria continua crescendo! Agradeço ao(s) anônimo(s) pelas contribuições. Aliás, o próprio nome da banda - "Garota Safada" - já esgota o espírito da coisa.
Vlad, conheci essa pérola da música francesa ainda criança e a detestei desde o primeiro momento. Nada de especial, apenas a achava ridícula. Conheci um sujeito que disse sonhar em gravar um disco e especificamente essa coisa. Não devia ser muito bom da cabeça.
O fato é que, por mais horrorosa que seja a canção, o escândalo veio por conta do puritanismo da época. O autor ainda tentou suavizar a coisa, como se percebe pela ridícula referência a estar entre os rins. Fosse ele um forrozeiro brasileiro de hoje, permaneceriam os sussurros e gemidos, desapareceria o "eu te amo" (porque nessas canções só se alude a sexo selvagem, mas não a sentimentos) e a letra ganharia tons mais explícitos, do tipo "abre a perna e senta", "vou comer a tua...", "enfiar na tua bunda" e outras gentilezas do gênero.
Adelino, acho que só confirmaste o que eu disse, estamos reforçando o discurso um do outro. O fato de ser um povo com pouca educação e condições decentes de vida faz com que eles não passam para a próxima escala da realização pessoal, que envolve a reflexão e o pensamento no outro. Como têm milhões de outras preocupações mais básicas (como comida) para lhes ocupar a mente, não conseguem aprender a refletir sobre outras coisas mais além. Infelizmente. Todos nos repreendem quando dizemos que não queremos que a Júlia se envolva neste tipo de cultura e alegam que não poderemos fugir disso, que ela vai aprender de qualquer jeito e etc. Mas, enquanto for possível, faremos o que estiver ao nosso alcance para mantê-la no nível da reflexão.
Abraços.
Obviamente concordo com Adelino e Polyana: a pobreza explica porque as pessoas oriundas de classes sociais mais baixas não são admiradoras de músicas de melhor qualidade. Dificilmente alguém que não teve acesso à educação formal entenderia a profundidade de alguns versos de Chico Buarque, por exemplo.
Mas como explicar que tais letras nada edificantes façam tanto sucesso entre os jovens (e nem tão jovens assim) abastados de nosso país? Basta um giro rápido pela cidade em uma madrugada de sábado que se verá as boates, bares e casas de show mais caras de Belém infestadas por músicas de gosto duvidoso, as mesmas escutadas na periferia, diga-se de passagem.
Garotos passeando em seus carros, com o vidro abaixado, ouvindo verdadeiras atrocidades em um sistema de som que custou pra lá de R$2.000,00, normalmente com o volume muito acima do razoável, são vistos o tempo todo!
Além disso, basta olharmos para sociedades com níveis educacionais muito mais avançados com o nosso para perceber que o fenômeno é mundial. "Artistas" como Black Eyed Pea, 50 Cent, Snoop Dog, Beyoncé e Britney Spears são algumas das celebridades mais bem pagas do mundo. Basta procurar a letra de "Candy Shop" ou "My Humps" pra ver que não se diferem muito das citadas acima.
Então, não acho que a pobreza seja o único fator que explique. Na verdade ela justifica os pobres, mas e quanto aos outros? Creio que o que explique seja a cultura do sexo, dos corpos perfeitos, da promiscuidade e principalmente, da mediocridade, tão valorizados nos dias atuais. É disso que Yúdice e Polyana têm que afastar a Júlia, de qualquer jeito!
Abraços,
Luiza Montenegro Duarte
Esta postagem já é a mais comentada dos últimos tempos e vai ficando mais charmosa com novos comentaristas, inclusive assinando, o que sempre é muito simpático. Obrigado, Luiza, por sua participação e pela irrepreensível análise.
Com efeito, meu texto faz alusão à penetração dessas tragédias pseudo-musicais nos setores mais abastados da sociedade, o que constato em cada festa de formatura a que compareço (e eu vou todo semestre!). Portanto, embora o nível de renda e os conseqüentes efeitos educacionais sejam uma variável das mais importantes, eles realmente explicam apenas uma parte da história. Há algo muito mais grave que, como você sugeriu, tem a ver com uma tendência a escolher muito mal o que será idolatrado - o que freqüentemente chamo de inversão de valores.
Um dos nossos maiores anseios, Luiza, meu e da Polyana, é conseguir o que você disse que precisamos fazer. Preocupamo-nos com isso. E esperamos ter o apoio de pessoas sensatas como você, para não adotar a política do que-que-tem ou do são-os-outros-que-vêem-maldade-porque-a-criança-é-inocente.
Yúdice e Polyana,
Infelizmente não tive a oportunidade de conhecê-los, mas de longe, faço o melhor juízo de ambos. Primeiramente, pelas palavras deste blog, onde é facilmente perceptível a sensibilidade, a honestidade, a dignidade, a cultura e a visão de mundo privilegiadas de Yúdice.
Além disso, comentando estas percepções com uma amiga querida em comum, a Tônia Chalu, obtive testemunho que as confirmaram e se estenderam à Polyana. E se tem uma opinião que eu respeito e confio e a da Tônia!
Assim, tenho certeza que vocês conseguirão transmitir tantas características maravilhosas à Júlia. Sem dúvida ela será uma criança muito amada e educada e isso já é um bom começo para a formação de uma pessoa de bem e que viva longe de mediocridades e futilidades.
Abraços,
Luiza Montenegro Duarte
Olá Luiza, muito obrigada pelos elogios, fico lisonjeada em merecê-los. Prometemos que vamos tentar fazer o melhor para nossa Julinha.
Com relação à classe média-alta, acho que disseste tudo: enquanto os mais pobres têm outras preocupações que os impedem de refletir, os jovens e bem abastados de hoje em dia não têm nada (sério) para se preocupar, a não ser o que a propaganda fortemente induz - roupas, modismos, consumismo, e a regra do pareça-feliz-a-todo-custo. Infelizmente, para eles, a onda é aproveitar o máximo a juventude, e isso nos valores de hoje significa muitas vezes viver de balada em balada, sem nem lembrar do nome das pessoas com quem conversou, ficou, pegou... Só isto daria um posto novo, pois é uma situação degradante da sociedade como um todo hoje em dia.
Bem, falar mais é repetição. Abraços a todos.
Yúdice e Polyana,
Não dêem ouvidos às opiniões da multidão, pois toda unanimidade é tola e burra. Ao contrário, continuem sendo firmes e façam tudo o que estiver ao alcance de vocês para proteger a Júlia dessa podridão social e comportamental.
Luiza,
Você é boa observadora. De fato, muitos jovens "nascidos em berço de ouro" são ardorosos defensores do baixo nível que permeia a cultura brasileira. Acho - digo "acho" porque o fenômeno possui inúmeras explicações possíveis - que a mídia induz a sociedade a enxergar a pobreza como algo "cult" e até divertido. Um dos principais disseminadores desse pensamento medíocre foi o programa "Central da Periferia", apresentado pela patética Regina Casé na Rede Globo (e que esteve em Belém, lotando a área do Ver-o-Peso no dia da gravação).
Existe ainda a glamourização das transgressões, em filmes da linha “Velozes e Furiosos” e muitos outros, que seduzem especialmente os adolescentes mais abastados. Quem não entra na onda é visto como chato, nerd e anti-social.
São explicações possíveis, mas não definitivas. O hábito da leitura também está desvalorizado, contribuindo para a formação de uma sociedade vazia, sem idéias e sem nenhum senso crítico para filtrar a informação que recebe. Ver televisão (e todo o lixo que ela oferece) é mais cômodo, afinal.
Hoje em dia tudo é banal, as mulheres (não todas, é claro) se preocupam mais com a estética do que com a inteligência. Parecem reféns desse padrão inatingível de beleza que os meios de comunicação impõem como obrigatório.
No meio de tanto horror, só nos resta deixar as crianças afastadas disso tudo. E o único canal de televisão com programação infantil 100% confiável chama-se Discovery Kids.
É isso. Um abraço!
Adelino Neto
Com tudo isso, a cultura brasileira se desqualifica. Intérpretes de gosto duvidoso usam outros artifícios para conquistar o público, enquanto dissimulam sua falta de talento musical. E as pessoas acabam sendo corrompidas pelo sentimentalismo, confundindo “boas pessoas” com “bons artistas” e levando gato por lebre, achando que um brega virou “gênio da MPB” apenas porque usa paletó nas apresentações ao vivo.
O grande prejuízo disso é a imbecilização do público, o enriquecimento dos empresários que estão por trás desses ídolos, e a desqualificação musical que faz da música brasileira um fenômeno decadente, não porque inexistem talentos autênticos, mas porque estes não são acessíveis à maioria da população. A péssima qualidade da imprensa e das emissoras de rádio e TV também contribui para essa calamitosa educação cultural, que chega ao ponto de deslumbrar setores “modernosos” da intelectualidade, que imaginam que uma Kelly Key da vida é “música popular autêntica”. Enquanto isso, que gente do povo vai consumir maravilhas como Lúcio Alves, Baden Powell, Cartola e Pixinguinha? Só se for as canções mais manjadas, e na voz do Alexandre Pires?
Esse processo viciado de consumo e apreciação do popularesco acaba promovendo o ridículo, o piegas e o vulgar como pretensas formas de afirmação das classes populares. Estas, portanto, acabam sendo desmoralizadas com essa verdadeira manipulação ideológica que associa o popular ao grotesco. E, com cultura de qualidade duvidosa, o povo acaba deixando de ter uma auto-estima cultural, uma consciência de vida, empobrecendo seu gosto, sua formação sócio-cultural, e traindo sua emotividade por coisas à toa. E isso faz do Brasil um país cada vez menos desenvolvido, mais pobre, e não há escola que dê jeito nessa idiotização que o popularesco promove todos os dias e horas para a grande maioria dos brasileiros.
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