Conquista recente e valorosa do blog, Luiza Duarte tem-nos brindado com belos comentários. Desta vez, contudo, ela foi tão feliz que decidi dar o devido destaque. Comentando a postagem imediatamente anterior a esta, ela escreveu:
A verdade é que, a despeito de todas as conquistas, ser mulher ainda é muito difícil. É claro que o mundo do "politicamente correto" impede que se façam diferenças explícitas, mas não faltam dados que comprovem a discrminação no trabalho, na diferença salarial e, principalmente, nos relacionamentos afetivos/sexuais.
Quando uma mulher engravida acidentalmente (não me perguntem como, em pleno século XXI!), por exemplo, qual a primeira coisa que escutamos? "Golpe da Barriga"! A (ir)responsabilidade pelo fato recai somente sobre a mulher. Ninguém se pergunta porque o homem "ingênuo" não se protegeu e fez a sua parte.
A liberalidade sexual só gera uma fama nada edificante para as mulheres. Não que eu ache que a promiscuidade deva ser louvável, mas acho estranho que ter vários parceiros somente seja ruim para a imagem da mulher.
No caso em tela, devo dizer que é muito normal que a culpa recaia sobre a vítima. Em algumas andanças pelas páginas policiais percebemos que várias "mães" culpam as filhas crianças pela "sedução" de seu parceiro (que pode ser o padrasto ou o "pai").
É triste, mas ainda há um loooongo caminho pela frente...
Fiquei com a impressão de que Luiza acreditou na versão narrada pelo advogado. O mais provável é que ela seja esperneio de defensor e que a moça tenha sido, de fato, vítima de uma grande violência, para a qual sua vontade em nada concorreu.
Seja como for, a análise supra é pertinente. Com efeito, em pleno ano de 2008, toda a sociedade continua sendo muito dura com as mulheres, em relação ao seu comportamento afetivo e, sobretudo, sexual. Os preconceitos de sempre subsistem. E as próprias mulheres os sustentam e renovam.
Continuo vendo famílias prendendo as cabras e soltando os bodes. Os homens continuam sendo "educados" para não ter responsabilidades emocionais por seus atos, ao passo que as mulheres continuam sendo "educadas" para prestar contas de seus atos a todo mundo.
Há não muito tempo, em uma aula, criei uma hipótese envolvendo comportamento sexual (desafortunadamente, não me recordo qual era a situação). De propósito, comecei com "Imagine que um de vocês..." Fiz com que eles se sentissem protagonistas da situação, embora sem definir ninguém em especial. Quando pus o contexto em relação aos rapazes, todos me escutaram inalteráveis, ocupados somente com as implicações do caso para o Direito Penal. Mas quando repeti a mesma situação envolvendo uma mulher, houve reações imediatas: os garotos cochicharam entre si, rindo e fazendo piadas; as garotas ficaram inquietas e algo constrangidas.
Para mim, foi nítido: o único ponto ali era que as meninas não poderiam ser relacionadas a uma vida sexual ativa. Guardei a informação para mim, eis que isso não traria benefícios à aula daquele dia. Mas é curioso ver como se comporta uma geração que se diz atualizada, globalizada, descolada.
Obviamente, eu também não tenho o menor interesse por promiscuidade. O que me interessa é a igualdade nos modos de viver entre os que são iguais. Ou homens e mulheres, como cidadãos, não são iguais?
Muitíssimo obrigado, Luiza. Abraços.
2 comentários:
Tenho mais dúvidas que certezas sobre esse assunto. Por isso o que escrevo aqui está longe de expressar uma posição formada. Apenas divido minhas incertezas. Se dermos crédito à biologia evolutiva, poderíamos perguntar: Mas como a liberalidade sexual poderia ser considerada igualmente tolerável para dois tipos da mesma espécie, um com o cérebro programado para espalhar sua progênie por tantas fêmeas quanto for capaz de amealhar e outro com o cérebro programado para selecionar o mais criteriosamente possível entre os machos com que se relaciona em busca daquele capaz de gerar descendentes mais saudáveis? Temos, claro, a opção de não dar crédito à biologia evolutiva, de dizer que essas são crenças pseudocientíficas que servem apenas para reforçar padrões conservadores de pensamento e para naturalizar os preconceitos de uma sociedade machista que se sente incomodada pelas mudanças de comportamento sexual de homens e mulheres desde a segunda metade do Séc. XX. Só que essa me parece um opção muito preguiçosa. Parece-me uma forma de raciocínio do tipo "Se a teoria X reforça a crença Y e a crença Y é considerada um preconceito, logo a teoria X é falsa", ignorando o quanto a teoria X pode ser bem fundada em pesquisas e investigações sérias. Assumamos por um momento, apenas por hipótese, que a biologia evolutiva estivesse certa nesse particular. Ainda poderíamos dizer, é claro, que não somos apenas seres de natureza, somos também seres de cultura, e podemos, com os recursos que a cultura nos provê, nos elevar acima de nossa programação biológica e decretar uma igualdade de direitos entre homens e mulheres, indiferentes às diferenças neurocomportamentais entre eles, apenas por uma questão de justiça. Mas não me parece tão simples porque as crenças que compõem o mainstream do politicamente correto de que homens e mulheres são igualmente livres para conduzir suas vidas sexuais do modo que bem entenderem se baseiam, explícita ou implicitamente, em suposições sobre a natureza humana segundo as quais essa natureza é maleável pela cultura e segundo as quais o padrão machista da sociedade ocidental é um padrão aprendido, e não natural, de modo que, assim como foi aprendido, poderia ser desaprendido, bastando para isso uma boa dose de boa vontade e muita reeducação positiva. A partir do momento em que essas suposições são postas em questão, as crenças igualitaristas que se baseiam nelas não precisam exatamente ser abandonadas, mas precisam no mínimo ser reconstruídas à luz de novos argumentos e com base em novas estratégias. Vejam bem, não sou um sujeito conservador com relação a comportamento sexual de mulheres. Não acho que existem mulheres para casar e mulheres para outros fins, nem acho que a promiscuidade seja uma honra nos machos e uma desonra nas fêmeas. Acho todas essas crenças bastante imbecis, na verdade. Mas, por liberal que seja, fico surpreso e preocupado com a resistência que as crenças supostamente machistas e supostamente superáveis apresentam e me pergunto, honestamente, se a biologia evolutiva não pode fornecer parte da resposta de por que as coisas ainda não mudaram tanto quanto se pensava, na década de 60, que elas mudariam. Acho os livros de Steven Pinker, "Como a mente funciona" e "Tábula rasa", especialmente intrigantes a esse respeito. Como disse, não tenho muitas certezas sobre esse assunto, estou apenas dividindo minhas incertezas.
Prof. Yúdice,
Primeiramente, gostaria de agradecer a deferência e dizer que fico muitíssimo honrada em merecer destaque em um blog tão interessante quanto este. Vejo-o como um espaço onde permeiam boas idéias, bom senso e respeito, características que valorizo muito.
Dando continuidade ao tema, devo esclarecer que não acreditei na versão do advogado. Talvez não tenha me expressado tão bem, mas quis dizer justamente que a história apresentada por ele, apesar de completamente absurda, ainda é levantada por muita gente, em razão da imagem de que a mulher sempre tem alguma parcela de culpa nas questões relativas ao sexo, mesmo quando ainda crianças, o que sem dúvida é uma aberração. Quando estagiava no Núcleo de Prática Jurídica da UFPA, ouvi de uma senhora, cuja neta de 6 anos havia sido vítima de atentado violento ao pudor por um vizinho, que a esposa deste colocou a culpa na criança, que seria "faceira" e ficava "se oferecendo" ao marido dela. Tive ânsia de vômito.
Mesmo se (e isso é apenas uma hipótese) a garota do caso relatado no post anterior tivesse "flertado" com o estuprador e dado a entender que que teria relações sexuais com ele, ainda lhe seria resguardado o direito de não querer ou mudar de idéia a qualquer momento, então mesmo a suposta sedução alegada pelo advogado não justifica de forma alguma a relação sexual contra a sua vontade.
Concordo com o André que homens e mulheres tem vontades diferentes em relação ao sexo. Acredito na teoria da biologia evolutiva, pois é perceptível na prática que a grande maioria das mulheres quer um relacionamento estável e se sente mais à vontade quando a relação sexual envolve amor, o que não acontece sempre com os homens (especialmente entre os 15 e 19 anos!), que sem dúvida valorizam o sentimento, mas também não se incomodam com o sexo casual.
Não acho, porém, que devamos nos resignar com essa "pré-programação". Já domamos nossos instintos em outras áreas e creio que possamos fazer o mesmo agora. Homens e mulheres podem continuar tendo suas diferenças e buscando o que os faz feliz, mas se alguém fugir deste padrão, não há razão para ser discriminado por isso.
De qualquer forma, acho que os padrões atuais não são parâmetro. A juventude perdeu o freio, tanto homens quanto mulheres. A diferença que aqueles saem com a boa fama e elas, com uma péssima. O ideal era que ambos saíssem com a péssima e respeitassem mais o seu corpo e o sentimento dos outros (e não que eu seja moralista, mas apenas tenho a convicção de que assim as pessoas são mais felizes; se alguém não concordar e for feliz de outra forma, eu respeito!).
Acredito que o importante seja a igualdade de tratamento, e não a de vontades. De qualquer forma, também não entendo porque as coisas ainda não mudaram. Já não era sem tempo.
Abraços,
Luiza M. Duarte
P.S.: Será que Júlia já nasceu? :)
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