terça-feira, 31 de março de 2020

Você precisa conhecer o Efeito Dunning-Kruger, porque o vê toda hora e padece dele, também

O vídeo abaixo apareceu de repente em minha frente e, de imediato, decidi compartilhá-lo. Trata-se de uma explicação simples, mas bem precisa, de um fenômeno que, em alguma medida, diz respeito a todos nós.


Em meus diferentes meios de convivência, deparei-me com pessoas que se superestimam ao extremo (embora não possamos perder de vista que o Efeito Dunning-Kruger também é uma explicação para aqueles que se menosprezam). Meus ambientes profissionais são campos particularmente propícios para essa falta de autopercepção. O que não falta nos mundos jurídico e acadêmico, repletos de excelências e doutores, é gente que se acha a última bolacha do pacote, a última revolução científica, o último grito de carnaval da filosofia ou da arte.

Nos últimos tempos, infelizmente, a arrogância insana pulou para a rotina das relações humanas; virou quase a tônica do cotidiano. Qual a diferença entre um cara que acha que seu rosto será invisibilizado por suco de limão e um terraplanista? Nenhuma. Como tolerar que conhecimento científico seja tratado como nada diante do que o sujeito sente ou acha? Trata-se de um comportamento extremamente perigoso.

Doenças estão retornando porque gente inominável acha que vacinas são maléficas. E todo dia a democracia morre um pouco, por causa dos iluminados que acham que populismo, exploração da fé e disseminação da ignorância são caminhos desejáveis. Sabemos aonde isso nos levará. Ou deveríamos saber.

quinta-feira, 26 de março de 2020

Não é incrível que pessoas menosprezem a ciência?

Acabei de ler uma interessante matéria sobre Ignaz Semmelweis, médico húngaro que lutou pela implantação de um hábito simples ― lavar aos mãos ― como forma de evitar as elevadíssimas taxas de mortalidade nos hospitais europeus, na primeira metade do século XIX. Sua obstinação lhe custou até uma internação forçada em hospital psiquiátrico, diretamente relacionada a sua morte. Leia clicando aqui.

Eu já sabia que os profissionais de saúde se opuseram por muito tempo à teoria de que elementos invisíveis seriam os causadores de doenças e infecções, e que mortes se tornariam evitáveis com medidas tão singelas quanto manter a higiene. Hoje, causa-nos perplexidade pensar nisso, mas simplesmente pelo fato de que crescemos em um mundo em que a higiene era não apenas uma questão de saúde, mas também de inserção social. Nossos cérebros foram moldados em torno desse padrão. Para quem viveu aquela época, a ideia estava longe da obviedade.

Cerca de 180 anos mais tarde, o ato de lavar as mãos voltou ao olho do furacão ― e um furacão bem mais maldoso, porque agora falamos de uma pandemia, com efeitos globais. E lavar aos mãos por pelo menos 20 segundos, esfregando bem todas as partes delas, pode fazer uma gigantesca diferença na batalha contra outro inimigo invisível.

Ao tempo em que agradecemos a pioneiros como Semmelweis, lamentamos como o tempo passa e os loucos, imbecis ou canalhas continuam menosprezando a ciência, rejeitando todas as evidências e defendendo especulações ou sandices, tudo em nome de seus projetos pessoais ou classistas. Enquanto essas pessoas permanecerem em posições de destaque, a lucidez acabará sempre internada, maltratada e assassinada.

Felizmente, o tempo passa e a verdade se afirma.

quinta-feira, 19 de março de 2020

É preciso calá-los

Algumas verdades são evidentes a qualquer um que não esteja contaminado pelo mais perigoso agente patológico em circulação no país: o bolsonarovírus. Por exemplo: a economia, única coisa que parece importar ao brasileiro médio, não melhorou, mesmo após 1 ano, 2 meses e 19 dias de governo salvacionista. Não apenas não melhorou como tem matado do coração muitos investidores internos e afastado os externos, porque não sentem segurança alguma em investir por aqui. E isso mesmo com as "reformas" que, desde 2016, somente serviram para suprimir direitos de cidadania.

No entanto, o pior governo civil da História segue como sempre: inócuo em toda e qualquer área; comprometido com a supressão de direitos; medíocre e agressivo em todas as suas manifestações; incapaz de manter aliados mesmo no próprio partido; eficiente apenas em submeter o Brasil a humilhações internacionais cada vez mais dramáticas. E, claro, governando por tweets estúpidos, que mostram como estamos sob o comando de um valentão de escola, que quer resolver tudo na porrada, mas se cerca de jagunços para isso, porque ele mesmo não consegue fazer sequer uma flexão. As hoje onipresentes fake news e as grosserias colossais, que ajudaram a colocar essa escumalha no poder, são também uma estratégia de governo. Basta surgir uma situação embaraçosa ou um indicativo desfavorável e o Bolso Pai, ou um dos Bolsos Filhos, dispara uma lacração diferente, aplaudida pela claque, e que mobiliza não apenas a sociedade civil, mas também a classe política, a imprensa, as organizações ativistas, etc., para tentar impedir o desvario da ocasião.

Aliás, o Brasil surreal implantado em 2018 conta com essa característica inédita e singular: a de ser o único país no mundo em que o governo fala não apenas por seu titular e por um porta-voz, mas também pelos filhos do primeiro, proporcionando um show à parte na inacreditável competição para se saber quem é o mais intelectualmente indigente e emocionalmente desequilibrado. Dos três rebentos, o mais ativo nessa disputa é o tal de Eduardo, vulgo "03", por se prevalecer de um mandato de deputado federal para dar vazão aos seus arroubos.

A mais recente, e que motivou esta postagem, foi o tweet acusando a China de omitir informações relevantes, o que seria causa da perda de controle da situação, a ponto de termos, agora, uma pandemia. A resposta da embaixada chinesa foi mordaz e contundente, aludindo, inclusive, à postura lambe-botas que o clã presidencial tem em relação aos Estados Unidos do outro nojento, o tal de Trump.

Quando li sobre isso, já sabia o que aconteceria. E não deu outra: a turma da bancada ruralista, aboletada no Congresso Nacional, reagiu desautorizando a fala do abestado. Lógico. Embora os ruralistas atuem para implodir os direitos trabalhistas e ambientais, liberando a exploração ilimitada dos recursos naturais para maximização de seus lucros no mínimo de tempo possível, eles não são burros. Se bem que qualquer um que não tenha preocupações ambientais, no final das contas, é um completo idiota, porque todos vivemos no mesmo planeta. Digamos diferente, então: eles são coerentes com suas agendas e conseguem raciocinar com clareza (habilidade ausente naquela família lá). Se a China é o maior parceiro comercial do Brasil na atualidade, deve ser tratada com respeito. Se os chineses decidirem retaliar o país, aí a desgraça não terá precedentes, inclusive porque não será sentida apenas pelos pobres.

Vale lembrar que, ainda no começo do desgoverno, quando o presidente bostejava a todo momento contra a legislação ambiental, contra o IBAMA, contra a ciência que mostrava o nível de desmatamento, contra as reservas indígenas, contra a Amazônia, etc., a bancada ruralista já acendeu a luz vermelha. Porque, para os países do chamado Primeiro Mundo, a preservação ambiental é importante, ao menos no nível em que eles podem deixar de comprar produtos de indústrias predatórias. Ali os safardanas sentiram que o governo que eles ajudaram a eleger podia acabar com eles, por suas péssimas escolhas e por sua incapacidade de calar a boca. O episódio de hoje é apenas uma lembrança disso, se é que alguém esqueceu.

Enfim, segundo analistas, o isolamento do governo continua aumentando. E nem assim o clã muda de rota, até porque, provavelmente, não conseguem mesmo. São limitados demais até para isso. E de desvario em desvario, vão arrostando o país para uma situação cada vez pior. Por isso abri este texto inventando um "bolsonarovírus". Uma doença que ainda acomete uma quantidade inacreditável de brasileiros, como as manifestações do último dia 15 mostraram. Gente tão empedernida que não enxerga para onde estamos indo e que os danos ora causados demorarão muito para ser corrigidos, se possível, e a um custo inimaginável.

Enquanto os Bolsos e os doentes que os apoiam falarem, estaremos a caminho da falência múltipla de órgãos.

quinta-feira, 12 de março de 2020

Há mais alguém insone por aí

Publico um texto em plena madrugada e, vejam só, alguém o visualiza logo em seguida.

Curioso este mundo virtual. Eu e outra pessoa estamos no mesmo lugar, ao mesmo tempo, mas esse lugar existe apenas em uma codificação de zeros e uns. É um não estar. Sabe lá quem é essa pessoa e que motivos a mantêm desperta a uma hora dessas.

Seja como for, o corpo precisa repousar. Eu lhes desejo bom descanso e uma feliz quinta-feira.

A segunda garota

Júlia surgiu em minha vida ao raiar do dia 6 de dezembro de 2007, uma quinta-feira, quando uma animadíssima Polyana, não suportando mais esperar, me acordou para contar que o teste de farmácia dera positivo. "Você vai ser papai", foram suas palavras, com olhos luminosos e úmidos. A partir dali, tudo se tornou Júlia. Tudo passou a ser ela e por ela.

Vivíamos o tempo dos blogs. Antes de se limitarem às redes sociais, muitas pessoas se expunham em seus próprios blogs, nos quais palpitavam sobre qualquer coisa ou sobre temas em particular. O Yúdice falastrão e opinioso daquela época se expunha aqui e registrou a novidade na postagem "A maior de todas as aventuras começa", que continha apenas um anúncio abrupto e empolgado. Uma semana depois, na quarta postagem que fiz sob o marcador "paternidade", eu já me questionava: "Será que meu filho um dia se aborrecerá de ter sido exposto à curiosidade pública desse jeito?" Recordo-me que, à época, alguém me disse para relaxar, pois as crianças que estavam nascendo já chegavam a um mundo conectado, então para elas essa exposição seria natural.

O tempo foi passando e, seguindo a concepção de blog como um diário, eu registrava de vez em quando o avanço da gestação. Aqui e ali, um ser humano patético despejava sobre mim e meu bebê os seus tumultos íntimos. Naquela época, eu respondia. Felizmente, não me abatia, porque estava muito cercado de amor por todos os lados, o que também foi devidamente anotado.

A insônia da madrugada me trouxe às postagens antigas e constatei que Margot não teve nada disso. Teve, é claro, um anúncio, propositalmente intitulado "A maior de todas as aventuras se repete", para criar um laço com a gestação anterior. Mas esse anúncio foi feito apenas em 23.10.2019, quase três meses após o início da gestação. Àquela altura, já sabíamos que estávamos à espera de mais uma garotinha, exatamente como queríamos, e seu nome estava escolhido. Esta é a segunda postagem que lhe dedico, neste momento em que estamos no limiar da 35ª semana gestacional. Meu questionamento atual pode ser: será que minha filha um dia se aborrecerá de ter sido menos comentada do que a irmã? Espero que não. O que mudou?

Basicamente, tudo mudou. Se não podemos banhar-nos duas vezes nas águas do mesmo rio, que dirá voltar a mergulhar com uma diferença superior a 11 anos! A era dos blogs acabou, substituída pelas facilidades das redes sociais e sua busca alucinada por ostentar sucesso e felicidade. Eu também caí nessa esparrela. Afinal, era jovem e tolo. Atualmente, não sou mais tão jovem... As redes sociais começaram a minar este blog, mas nada que se compare às mudanças que se operaram em mim. O Yúdice de 2019 ainda conservava a saúde física, mas a espiritual... Deixemos isto para lá. Não é o tema.

Margot foi tão planejada e desejada quanto Júlia. A diferença é que precisamos lutar por ela. E você deve saber como é: lutas vencidas são dádivas, mas sempre deixam marcas. Houve inúmeros percalços no caminho, então esta garotinha vai encontrar um pai mais velho, mais calejado, mais comedido, mais silencioso, mais realista. Cheio de saudade e tristeza, também, mas quero crer que as perdas serão compensadas por outros atributos, especialmente algum know how para, quem sabe, ser um pai melhor. E até uma pessoa melhor, nesse aprendizado de calar, sorrir, entender que as pessoas são como são e deixar o mundo seguir seu curso. Alguém, enfim, que economiza energia para as batalhas que realmente vale a pena travar.

A espera está sendo longa e ainda não acabou. Uma trajetória muito diferente e cheia de curiosidade. Mas que está, enfim, se encaminhando para o seu... recomeço! É uma vida que vem à luz, então não cabe falar de fim. Vamos ao mais novo ato deste grande teatro do qual somos todos atores, uns mais mambembes do que outros. E a mim basta ser espectador das duas meninas que coloquei no palco, junto com Polyana. Para mim, divas supremas da mais bela ópera.