segunda-feira, 14 de março de 2016

A maior explosão de chatice

A polarização político-partidária no Brasil vem me exaurindo faz tempo. A paciência já acabou, foi reposta e acabou de novo umas tantas vezes. De ontem para cá, a coisa extrapolou o nível do insuportável. Está impossível zanzar pelos ambientes da internet, daí que vim aqui ao blog, último lugar onde só existe o que eu posso suportar.

Mundo chaaaaaaaaaaaaaato... Até quando?

quinta-feira, 3 de março de 2016

A maldade que o mar não leva

A onda do mar leva
A onda do mar traz
Quem vem pra beira da praia, meu bem
Não volta nunca mais

Dorival Caymmi

Chamava-se Rian Brito de Oliveira Paula o rapaz de 25 anos que, para a imprensa brasileira, era o "neto do Chico Anysio". Para ser mais exato, filho do Nizo Neto. Acho importante dizer os nomes das pessoas, para nos forçar a lembrar que eram exatamente isso: pessoas.

Desaparecido desde o último dia 23 de fevereiro, quando não compareceu a uma aula de autoescola, seu corpo foi encontrado hoje pelas equipes de busca. Estava em uma praia de região afastada do norte do Estado do Rio de Janeiro.

Já se sabia que o rapaz, em ver de ir para a aula, entrou em um shopping center, onde sacou dinheiro em um caixa eletrônico. Depois pegou um táxi e não mais foi visto. Agora se sabe que ele foi nesse táxi para a rodoviária, onde tomou um ônibus para Quissamã. Chegou à cidade ao anoitecer e daí nada mais se sabe, exceto que morreu. A hipótese mais provável, agora, é de que tenha procurado um lugar paradisíaco para nadar e acabou se afogando. Um acidente.

No entanto, quando os familiares de Rian começaram a divulgar informações sobre o seu desaparecimento, pedindo que fossem repercutidas, porque isso poderia ajudar na localização, entrou em ação aquela espécie de internautas que, aparentemente, existe apenas para disseminar maldade no mundo. Os julgadores já sentenciaram que Rian saíra em busca de um traficante de drogas. Portanto, poderia estar morto por um crime ou por overdose, ou talvez poderia estar apenas viajando. É impressionante como essa raça a que me refiro sempre está a postos para reconhecer, de imediato, a depravação nos outros. Algo que possam  repudiar com veemência, a ponto de perder qualquer empatia, seja pelo desaparecido, certamente em dificuldades, ou pela família aflita.

A boataria levou Nizo Neto a declarar publicamente que seu filho não tinha envolvimento com drogas. Agora imaginem: em meio ao turbilhão emocional que os familiares enfrentavam, ainda precisaram encontrar forças para dar satisfações aos algozes. E a brutalidade seguiu: a mãe se queixou, pelo Facebook, de bobagens que estavam sendo espalhadas por aí.

É triste que a mais poderosa tecnologia de comunicação já criada, a internet, seja usada com tanta ênfase para causar ou incrementar sofrimento. É inacreditável no que as pessoas se tornaram. Isso me faz pensar que o mundo é, mesmo, um lugar muito perigoso, embora talvez não pelos motivos habitualmente citados pela mídia, pelos empresários morais, pelos moralistas das esquinas.

Só posso enviar um pensamento de solidariedade para a família enlutada e desejar que encontrem a paz. Desejar, também, que o número de pessoas vibrando positivamente seja maior e que, com isso, ainda valha a pena estar aqui neste planeta.

quarta-feira, 2 de março de 2016

Advogados de março ― 2016

Divulgado o resultado do XVIII Exame de Ordem Unificado, sai a relação de mais alguns novos advogados, oriundos de turmas que já haviam aprovado vários alunos antecipadamente. Com boas lembranças de nossos tempos de sala de aula, mando um abraço forte e meus melhores votos de sucesso para:

Adan Willian Sarubbi dos Santos
Adriana Kelly Leão Raia
Alessandra da Gama Malcher Godinho
André da Conceição dos Santos
Clícia Helena Freitas de Almeida
Erick Henrique de Carvalho
João Fillipi Araújo Martins
Larissa Ysabelle Ferreira Marroquim
Suzy Mara da Silva Portal
Tatiane Cardoso Gonçalves de França
Victor Hugo Ramos de Oliveira
Vitória Alvarenga Bassalo

Dos cavalos de batalha jurídicos

Dia desses, na sala dos professores, um dos colegas que leciona processo civil manifestou sua preocupação com a incerteza acerca da vigência do novo Código de Processo Civil. Imediatamente pensei que a preocupação tinha relação com um antigo boato sobre um projeto de lei para adiar a vigência do NCPC, para atender interesses sabe lá de quem. Mas o motivo que me foi apresentado pelo colega era tão prosaico que hesitei em admitir qual seria, na verdade, o imbróglio.

A questão é que o art. 1.045 da Lei n. 13.105, de 2015, ao estabelecer a cláusula de vigência, dispõe: "Este Código entra em vigor após decorrido 1 (um) ano da data de sua publicação oficial."

A publicação no Diário Oficial da União ocorreu em 17.3.2015 e os queridos processualistas não sabem quando será, exatamente, o início da vigência, porque a vacatio legis usualmente é definida em dias. Há um segundo motivo, ainda pior: 2016 é um ano bissexto! "E daí?", pensei.

Expliquei rapidamente como entendo que a coisa deva ser interpretada, mas o colega insistiu na necessidade de uma deliberação formal para resolver o impasse. Nesse momento, mesmo sem querer chatear o colega, disse a ele que processualistas têm essa mania de fazer cavalos de batalha, de transformar questões aparentemente banais em verdadeiras esfinges, a demandar muitos simpósios para esclarecimento. Ou então um ato normativo do Conselho Nacional de Justiça, que se espera seja proferido até quinta-feira, dia 3, a partir de uma provocação da Ordem dos Advogados do Brasil.

Até compreendo a cautela da OAB, já que uma mudança legislativa dessa magnitude realmente traz grande impacto sobre a vida de todos. Todavia, o fato de uma questão ter consequências graves não a transforma em matéria de alta indagação. E eu realmente não acredito que haja alta indagação neste contexto. Penso que a solução pode ser encontrada em uma norma singelíssima inscrita no Código Penal.

Antes de prosseguir, sei que preciso esclarecer algo que também não é de alta indagação, mas será objeto de imediata rejeição: uma norma constante do Código Penal poderia surtir efeitos sobre o processo civil? Absurdo? Absurdo nenhum. O Código Penal é uma lei federal vigente e suas normas se aplicam a toda e qualquer situação que não seja disciplinada por norma específica. A antiga Lei de Introdução ao Código Civil, hoje Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (a Lei n. 12.376, de 2010, mudou exclusivamente o nome, sem afetar o conteúdo), sempre foi aplicada a toda a legislação brasileira, mesmo que as matérias não tivessem relação com o direito civil. 

Veja-se o Código de Defesa do Consumidor: seu art. 81, ao disciplinar a defesa do consumidor em juízo, conceitua interesses ou direitos difusos e interesses ou direitos coletivos, acrescentando ainda "para efeitos deste código". Mas isso significa que existe um conceito de direito difuso ou coletivo para as relações de consumo e outro conceito para as demais situações, p. ex. relacionadas ao meio ambiente? Claro que não. O conceito é um só. Tanto que a Lei n. 7.347, de 1985, que regulamenta a ação civil pública, foi alterada pelo próprio CDC e ganhou a seguinte norma: "Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da lei que instituiu o Código de Defesa do Consumidor" (art. 21).

Não é demais lembrar que o fato de a norma a que aludirei se encontrar no Código Penal é meramente circunstancial. Precisamos perder a mania de achar que as divisões mais ou menos imprecisas das disciplinas jurídicas são determinantes para a natureza e aplicabilidade das normas.

Dito isto, vamos ao mérito. O art. 10 do Código Penal assim dispõe:
Contagem de prazo

Art. 10. O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum.
O dispositivo em exame contém duas normas. A primeira, admito, aplica-se exclusivamente ao direito penal. Trata-se da regra segundo a qual prazos materiais (aqueles que afetam a existência ou os limites da pretensão punitiva) são contados incluindo o dia do começo, distinguindo-se dos prazos processuais, que excluem o dia do começo (mesmo no processo penal). O objetivo, em ambos os casos, é beneficiar o indivíduo alcançado pelos efeitos do prazo. Efeito prático: se um crime sujeito à prescrição de 3 anos for praticado em 20 de janeiro de 2016, sua prescrição se dará em 19 de janeiro de 2019, e não no dia 20, como aconteceria se excluíssemos o dia do começo.

A segunda norma, contudo, é genérica. Embora prevista no Código Penal, institui um critério de aplicação que, segundo entendo, pode incidir sobre qualquer situação, porque não existe nenhuma razão legal, sequer lógica, para excluir a sua incidência. Funciona como o CDC definindo o que é direito difuso ou coletivo, para toda e qualquer finalidade.

O que significa contar de acordo com o calendário comum? Significa contabilizar o número de dias de acordo com cada unidade de tempo. Um ano tem 365 dias em regra, mas os bissextos têm 366. Isto não faz a menor diferença se o prazo é estabelecido em anos (por isso o meu "e daí?"). Então:

a) um prazo fixado em dias é contado... em dias! Pode usar seus dedinhos, se quiser:

  • Um prazo de 45 dias iniciado em 1º de janeiro terminaria em 14 de fevereiro (porque janeiro tem 31 dias, restando 14 para o mês de fevereiro);
  • Um prazo de 45 dias iniciado em 1º de abril terminaria em 15 de maio (porque abril tem 30 dias, restando 15 para o mês de maio);
  • Um prazo de 45 dias iniciado em 1º de fevereiro terminaria em 17 de março (porque fevereiro tem 28 dias, restando 17 para o mês de março);
  • Um prazo de 45 dias iniciado em 1º de fevereiro de um ano bissexto terminaria em 16 de março.

b) um prazo fixado em meses é contado de certo dia até o mesmo dia do mês correspondente:

  • Um prazo de 3 meses, iniciado em 10 de fevereiro, terminaria em 10 de maio, não interessando quais meses têm 31, 30, 29 ou 28 dias, simplesmente porque o prazo não está sendo contado em dias!

c) um prazo fixado em anos é contado de certo dia e mês até o mesmo dia e mês do ano correspondente:

  • Um prazo de 3 anos, iniciado em 27 de junho de 2015, terminaria em 27 de junho de 2018, não interessando se pelo meio existe um ano bissexto.
Compreenda que não é correto afirmar que o mês tem 30 dias (isto só é verdade para abril, junho, setembro e novembro) ou que o ano tem 365 dias (inaplicável aos anos bissextos). Não se faz nenhum arredondamento, porque não é assim que funciona o calendário comum.

Diante de tudo quanto explanado acima, o novo Código de Processo Civil entrará em vigor, de acordo com a legislação brasileira, em 17 de março vindouro.

Se a segurança jurídica pede que um ato formal esclareça isso, tudo bem. Totalmente compreensível. Só espero que ninguém vá buscar uma renca de teorias pós-new-up-over-pré-dark-light para conduzir a um debate interminável no plenário do CNJ porque, honestamente, não precisa.

Era isto. Aceito, agora, que os colegas repliquem esta análise. Vamos ver no que dá.


Fonte: http://www.conjur.com.br/2016-mar-01/cnj-definir-quando-cpc-entrara-vigor

terça-feira, 1 de março de 2016

A técnica do doido e meio em tempos de páscoa

Daí o sujeito exercita o velho hábito de falar mal do Brasil, apresentando como motivo o fato de que o mesmo ovo de páscoa vendido aqui por 50 reais custa, nos Estados Unidos, 1,99 dólar. Emenda um discurso sobre preços, política econômica e tributária, que naturalmente descamba para a corrupção, e, ao final, lança-me um olhar provocativo e pergunta se vou mesmo comprar esses ovos caríssimos ou se vou fazer ovos em casa, usando duas barrinhas de chocolate, o que me levaria a uma ótima economia.

Daí eu respondo que, em primeiro lugar, embora adore doces, não dou a mínima para chocolate. Segundo, que presentear crianças com doces não é algo saudável e que poderíamos substituir o ovo de chocolate por algo mais útil, como um livro. Terceiro, que a páscoa deveria ser uma oportunidade para refletir sobre a simbologia da ressurreição do Cristo como necessidade de renovação em nossas próprias vidas, mas que essa conotação espiritual se perdeu, subjugada pelo consumismo desenfreado que faz capitalistas enriquecerem às custas de nossa compulsão por comprar o que não precisamos, apenas para participar da maré que a todos arrasta, sem que sequer percebam o quanto são comandados por terceiros.

Daí o sujeito me encara com uma expressão aborrecida, dando-se conta de que não importa o quanto ele se esforce por ser um pé no saco: sempre tem alguém mais habilidoso para insuflar a bolsa escrotal alheia. Ainda que, eventualmente, dizendo algumas verdades.