terça-feira, 30 de julho de 2013

Tio Johan

Amigos mais próximos sabem que a nossa semana de férias em Florianópolis não foi motivada apenas por lazer. Na verdade, a viagem também se motivou pela enfermidade de nosso tio Johan Heidrich, acometido por um linfoma tipo B. Em que pese a possibilidade de cura, em relação a que os médicos mostravam confiança, a quimioterapia fragilizou demais nosso tio, um homem de 75 anos, que obviamente já não estava tão forte quanto antes. Então nós fomos vê-lo, levar o nosso abraço para toda a família.

Durante os dias que passamos lá, tiramos um pouco de casa a nossa tia, que estava há meses dedicada integralmente aos cuidados com o marido. E mesmo lutando contra uma fraqueza extrema, pudemos vê-lo sorrir com as gracinhas feitas por nossa Júlia, que serviu de fonte de alegria. Realmente, uma criança alegra uma casa. Se era esse o nosso papel na história, graças a Deus pudemos cumpri-lo.

Foto tirada em Santarém, no dia 17 de novembro passado.
Nós nos despedimos dele no domingo à noite, pois nossa viagem seria de madrugada. Desejei a ele saúde. "Obrigado. Boa viagem" foram suas últimas palavras para mim. Saímos torcendo pela oportunidade de revê-lo adiante, recuperado. Mas hoje, apenas um dia após a nossa partida, data do aniversário de seu segundo filho, que por sinal tem o seu nome, ele faleceu.

Buscamos conforto na ideia de que lhe permitimos um pouco de felicidade em seus últimos dias, mas lamentamos muito não estarmos junto de nossa tia e primos neste momento. E por tão pouco tempo!

Ficam as lembranças de um homem que, quando convidei para apadrinhar o nosso casamento, convenci a atravessar o país lhe dizendo que ele era o homem que eu escolheria para pai, se pudesse fazê-lo. Não foi uma frase de efeito. Hoje, o meu tipo idealizado de pai partiu. Vamos nos encontrar, agora, só em outros contextos. Mas até lá, há toda uma vida pela frente.

Vai com Deus, tio Johan. Agradecemos por tudo. E não é pouca coisa.

Um pouco sobre o Johan futebolista: http://serrasconline.com.br/lages/19393-colorados-dao-adeus-a-johan.html

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Uma semana sob ares diversos

Passei uma semana com a família em terras catarinenses, como os leitores do blog já sabem. Gostaria de externar algumas impressões sobre o que vi por lá. Não me permitirei aquele discurso cansativo de que lá fora tudo é lindo e aqui, em Belém, é tudo uma porcaria. Amo minha cidade, o que já declarei ostensivamente em inúmeras ocasiões. Aqui tenho minhas raízes e ir embora não é um projeto que eu alimente.

Esclarecido isto, devo dizer que Florianópolis, Balneário Camboriú, Blumenau e Pomerode, cidades que vi um pouco melhor, e que tomo como termômetros do restante do Estado, continuam como eu me lembrava: limpas, organizadas, com obras públicas funcionando, melhoramentos visíveis em relação à minha última passagem, três anos atrás, e um povo gentil, cordial e prestativo.

Concentro-me na capital. A cidade cresceu e, por lá, a indústria da construção civil avança. Áreas antes desocupadas agora estão urbanizadas, caso do Campeche, p. ex. Quando passei pelo local, da última vez, havia anúncios de diversos residenciais. Agora, os mesmos estão instalados. Mas ao contrário do que acontece por aqui, não vemos uma profusão de espigões onde famílias se espremem em apartamentos minúsculos, cujo preço é definido em relação inversamente proporcional ao tamanho. O novo bairro é um charmoso conglomerado de casas, algumas enormes e belíssimas. A qualidade de vida vai sobrevivendo. E à exceção de alguns pontos saturados, como o Centro e Jurerê, os preços são muito mais realistas. Nada de 5 mil reais o metro quadrado.

Tive a oportunidade de dirigir por bairros distantes, como Cachoeira do Bom Jesus. Mesmo neles, tudo é limpo, caprichado, bem cuidado. As pessoas parecem se importar de verdade em manter o ambiente saudável.

Mas o que realmente chamou a minha atenção foi a questão da segurança pública. Confesso o meu amargor em fazer essa comparação. É duro perder em quesito tão delicado. O meu critério foi a observação do comportamento das pessoas. Mesmo altas horas da noite, e naquele frio que deixava as ruas desertas e soturnas, podiam-se ver cidadãos sozinhos, em duplas ou grupos pequenos, caminhando despreocupadamente. Caminhavam devagar, conversando, rindo. Não davam sinais de medo. Vi mulheres sozinhas. Adolescentes, inclusive. Vi gente exibindo ostensivamente o celular. Quem se comporta daquele modo realmente não está receoso de ser assaltado ou coisa pior.

Doi pensar que, aqui em Belém, essa tranquilidade a que todos temos direito simplesmente não existe mais. Eu jamais passaria meia hora batendo papo na porta de uma casa, numa ruazinha estreita, com um carro aberto e minha filha dentro, como fiz lá, às onze da noite. Eu queria, queria muito mesmo, viver como ali se vive. Se está longe do ideal, meu Deus, como está melhor do que aqui!

Vale um destaque: na publicidade institucional, o governo se orgulha de ser o Estado brasileiro que mais emprega egressos do sistema penal (veja: http://www.sc.gov.br/index.php/justica-e-defesa-da-cidadania e http://www.sc.gov.br/index.php/justica-e-defesa-da-cidadania/programa-de-ressocializacao-de-detentos). Há uma preocupação declarada com a ressocialização e isto virou uma política pública. É claro que podemos fazer relações.

Dou meus parabéns aos catarinenses por seus esforços por viver bem. Minha frustração quanto a nossa realidade conviverá com uma esperança teimosa de que, um dia, também estejamos em melhor situação.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Segundo dia em Floripa

É, meus amigos, a massa de ar polar não é brincadeira. Está frio, de verdade. Isso não me incomoda nem um pouco. Muito pelo contrário. Esse frio todo me atrai e eu, de bom grado, desde que devidamente agasalhado, fico numa boa ao ar livre. A Beira-Mar no inverno é encantadora. O problema é a chuva. Mas além disso, estamos com uma criança e precisamos poupá-la, dada a sua suscetibilidade a doenças respiratórias.

Gostamos tanto daqui que, a despeito de ainda não termos feito nenhum passeio, estamos curtindo a viagem, a pausa, os ares diferentes. Mas os programas agendados estão chegando!

Grande abraço para vocês.

sábado, 20 de julho de 2013

Semana de férias

Queridos apreciadores deste modesto blog, não exatamente as férias, mas as obrigações do mestrado têm roubado o meu tempo, reduzindo as atualizações. Logo mais, embarcarei com a família para uma semana de viagem de férias.

Visitaremos, uma vez mais, a cidade que considero a minha segunda casa: Florianópolis. Temos parentes lá e aproveitaremos, também, a oportunidade de escapar ao calor calcinante desta terra. Acabamos dando sorte: está prometido para amanhã, perdurando até quarta-feira, o frio mais intenso dos últimos 15 anos, por causa de uma massa de ar polar. Muitos ficam assustados quando o digo, mas para mim isso é uma alegria. Pelo menos, é diferente.

A semana dividirá a minha obrigação extrema de escrever artigos do mestrado e conduzir a família, em especial nossa pequena filha, para alguns momentos de lazer. Vocês podem não acreditar, mas eu farei minhas tarefas, sim. Se não por outra razão, porque não tenho escolha. Com a ajuda de Deus, hei de cumprir essa meta!

Por todas essas razões, a atualização do blog deve ficar ainda mais errática. Por isso, deixo esta mensagem para vocês. Sempre que der, apareço por aqui. Mas sabe como é: uma viagem de férias não é exatamente o momento adequado para ficar arrumando confusão com meus textos. Todo mundo precisa relaxar um pouco, certo?

Desejo a todos que o mês de julho lhes sorria, que haja oportunidade de descanso, diversão e alegrias. Qualquer hora dessas nos falamos. Abraços.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Canalhices e esperanças

Eu já vinha lendo algumas manifestações a respeito mas, não querendo dar atenção demais a ninharia tão desprezível, não gastarei minhas mal traçadas linhas falando de Joseph Blatter. Limito-me a subscrever a manifestação do jornalista Marco Antônio Araújo, em seu blog O Provocador. Pensando exatamente como eu, Araújo o classifica como persona non grata e sugere que, se restar alguma dignidade ao Poder Executivo, trate de colocá-lo em seu devido lugar.

O comportamento de Blatter era mais uma crônica de morte anunciada. Mesmo alguém com aversão ao futebol, como eu, sabe como a FIFA se comporta. É uma das empresas privadas mais poderosas, arrogantes e detestáveis do mundo. Move-se com o propósito exclusivo de gerar fortunas para seus dirigentes, sem se importar sequer com o esporte, posto que o futebol é apenas o meio para se chegar ao dinheiro. Esses personagens são verdadeiros clichês de estórias infantis: imoralidade absoluta, não há um só osso bom em seus corpos, nem o mais tênue laivo de decência em suas almas.

Alguém, do governo ou não, já deveria ter deixado bastante claro a essa canalha que o Brasil, que se goste ou não, é um país soberano. Blatter, assim como seus sequazes, não gozam de prerrogativas diplomáticas. São apenas estrangeiros no país, sujeitos a todas as normas internas, inclusive as de expulsão. Claro que não podemos sequer sonhar com algo assim. Somos uma república, uma democracia, uma soberania altamente peculiar: mais no nome do que na essência. E as cabeças coroadas dessa república amam vilões como Blatter e são alucinadas por convescotes globais. O episódio histórico do baile da Ilha Fiscal não poderia ter ocorrido em outro país. Além do mais, sempre há o problema da participação nos lucros.

Mas enquanto o Brasil é conspurcado pela caterva da FIFA, avizinha-se a chegada do Papa Francisco. Com apenas quatro meses de pontificado, ele chegará na tarde da próxima segunda-feira, dia 22, para participar da Jornada Mundial da Juventude.

Quem me conhece sabe de minha grande reserva em relação à instituição Igreja Católica. Contudo, tento não abdicar do bom senso. Sem entrar no mérito das controvérsias relacionadas à pessoa e aos atos passados de Jorge Mario Bergoglio, preciso reconhecer que o Papa Francisco, desde o primeiro momento, apresentou-se publicamente com qualidades dignas de admiração e respeito.

Basta ver a diferença de semblante entre ele e seu antecessor para perceber que alguma coisa importante mudou na Santa Sé. Adotando uma postura humilde em cada ação, foi-se despojando dos galardões, da pompa e do ouro que cobre o Vaticano, obtido graças ao sofrimento de tantos povos espoliados. Logo recusou os célebres sapatos vermelhos da caríssima grife Prada. Costuma ser visto em trajes menos glamourosos, totalmente brancos, a cor que no Vaticano simboliza a necessária pureza de seu pastor para o exercício da função. E mantém maior proximidade física com os fieis.

É no discurso que Francisco impressiona, pois suas palavras definem os rumos da Igreja Católica em todo o mundo. Pregando o dever de dar atenção aos pobres, de ser solidário com todos, de buscar a conciliação em meio às diferenças, já admitiu que até o papa erra, demolindo o dogma da falibilidade papal. Em vez de jogar o problema para baixo do tapete, reconheceu o câncer da pedofilia na Igreja e declarou que as pessoas não estão mais dispostas a suportá-lo. Reconheceu que a devassidão e a corrupção estavam entranhadas em seu círculo mais próximo. Por tudo isso, fui gostando dele.

Mas o papa é uma übercelebridade (permitam-me o estranho neologismo, sem qualquer má intenção). Pela posição que ocupa, desperta as mais intensas e díspares paixões. Resulta daí que muitos opositores ou oportunistas estão se movimentando quanto a sua visita. E, claro, as redes sociais estão infestadas de manifestações. Em uma delas, tenta-se esclarecer que as despesas com a visita do pontífice não estão sendo suportadas com dinheiro público, mas com o produto da arrecadação dos fieis, seja através de doações, seja através de inscrições à Jornada Mundial da Juventude.

É óbvio, porém, que muitas despesas serão suportadas pela União. Aí entra o aspecto sectário das manifestações. A turma do sangue no olho protesta contra o gasto de recursos públicos com o líder de uma religião. Esquecem-se, por conveniência ou desbragada má fé, que a comunidade internacional reconheceu o Vaticano como um ente soberano. Se deveria fazê-lo, não sei. Mas fez. O papa é um chefe de Estado como qualquer outro. Logo, como se faria com qualquer presidente, primeiro-ministro ou rei, compete ao governo brasileiro recebê-lo com honras de Estado e assegurar-lhe proteção, assim como a sua comitiva.

Além disso, o imenso aparato de segurança, considerado inédito mesmo no Rio de Janeiro, não tem como beneficiário o papa: é um aparato de segurança pública. Devido à gigantesca massa popular que se reunirá para os eventos da JMJ, compete ao poder público garantir a segurança de todos, nos termos da Constituição da República. Sejamos sensatos: se ocorre um festival de música, um Rock in Rio, p. ex., o poder público modifica toda a mobilidade urbana, fechando ruas, mudando o sentido de outras, criando linhas de ônibus temporárias, etc. O policiamento é reforçado, com todos os recursos disponíveis. A rede hospitalar é posta de sobreaviso, como aliás acontece em qualquer réveillon ou carnaval. E todo mundo acha normal. Aliás, é normal. Então por que a visita do papa não poderia ter aparato à altura? Convenhamos, pensar assim é irresponsabilidade.

De minha parte, penso que é um privilégio ter tantas pessoas reunidas em torno de sentimentos de união, fraternidade e paz. Por isso gosto tanto do Círio de Nazaré. E por isso acho que a JMJ oferece muito a uma sociedade tão necessitada de reflexão. É uma apoteose do bem e, para isso, a denominação religiosa não deveria importar tanto. Mas não podemos ser toscos: o Brasil é o país com o maior número de católicos do mundo. É isso que faz desse evento algo tão grandioso. Um evento de espíritas, como eu, não iria tão longe. Nem um de budistas. Nem um de ateus. Não se trata de quem tem razão, de quem conhece a Verdade.

Se as pessoas pensarem mais com o cérebro do que com o fígado, compreenderão isso. Minha posição não-católica é clara e resoluta: mil vezes a JMJ que a copa. Mil vezes Francisco que Blatter ou qualquer outro de sua laia.

terça-feira, 16 de julho de 2013

Dracãojé

Júlia me entrega um desenho para pintar. Explica que é um cowboy, montado em um cavalo, que vai enfrentar um dragão. Aí eu pergunto onde estão as asas do dragão, porque dragões voam e para isso precisam de asas.

— Este dragão não tem asas, pai. Ele é parente do jacaré, por isso fica só andando de um lado para outro. É um dracãojé!

Boa sorte, cowboy!

Como sempre digo...

A razão de defendermos um direito penal e um processo penal humanitários, prudentes e sem inclinações simbólicas, rigorosamente fundado na Constituição de 1988, não é e jamais foi o desejo de proteger os violentos e os antissociais. Ela sempre se baseou em duas premissas: uma de caráter mais operacional, outra substancial.

A diretriz operacional tem a ver com a possibilidade de erro na persecução criminal. Ocorrido um delito, e quanto mais horroroso ele seja, só deveria interessar à sociedade a punição dos verdadeiros culpados, na exata medida em que tenham contribuído para o fato. Punir a torto e a direito implode qualquer lógica que se pretenda atribuir ao direito penal, seja retributivo, preventivo ou ressocializador. E coloca todos os membros dessa sociedade em grande risco, pois cada um pode ser objeto de arbítrio estatal em algum momento, se isso for conveniente para alguém.

A diretriz substancial é muito mais difícil de ser assimilada neste nosso mundo, em que as pessoas parecem se comprazer com a brutalidade e com a insanidade. Trata-se do fato de que uma sociedade que se pretende civilizada deve tratar seus criminosos de modo mais humano do que foi por eles tratada. Do contrário, nivela-se por baixo e não se transmite nenhum código de conduta positivo às pessoas. Se queremos um mundo minimamente tranquilo, antes de dizer aos indivíduos o que lhes acontecerá caso se desviem, devemos antes dizer o que realmente esperamos deles. E não há melhor forma de fazê-lo do que o exemplo.

Retorno a esta questão, não inédita no blog, por causa do terrível caso da adolescente de 14 anos, estuprada e assassinada em Colombo, região metropolitana de Curitiba, no final de junho. Quatro indivíduos foram presos. Eram suspeitos plausíveis, porque a vítima, salvo engano, desapareceu no parque de diversões em que eles trabalhavam. Então eles foram torturados e confessaram. Era a receita perfeita para que fossem demonizados e condenados, se não houvesse pelo meio do caminho uma perícia científica, o exame de DNA, comprovando que nenhum deles estuprou a garota. Logo, a confissão era falsa.

Os acusados, cuja liberação foi determinada ontem, agora passam à condição de vítimas. Além dos danos já provocados, cuja mensuração ainda não pode ser feita, os riscos subsistem e agora são de duas ordens: afora o risco de serem justiçados (odeio essa expressão!) por pessoas que continuem acreditando na culpa dos mesmos, correm o risco de ser silenciados pelos policiais que os seviciaram e terão todo o interesse em se isentar de responsabilidade, agora que a OAB entrou em cena, em favor dos rapazes.

Lembre-se, mais, do óbvio: enquanto uma polícia bárbara torturava os quatro inocentes, o verdadeiro culpado segue em liberdade e não identificado. Ninguém ganhou absolutamente nada, mas muitos perderam e o que perderam simplesmente não pode ser reposto, sequer minimizado.

Nada disso teria ocorrido se houvesse um mínimo de bom senso. E de humanidade. São os ingredientes que defendemos. Estes são os fatos.

Saiba mais: http://www.conjur.com.br/2013-jul-15/jovens-torturados-assumir-assassinato-garota-sao-liberados

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Lombroso lives

Uma entrevista com o psiquiatra britânico Adrian Raine publicada na edição desta semana da revistaVeja mostra que o mundo os fatores neurológicos envolvidos no comportamento violento das pessoas. O especialista discorre sobre a possibilidade de as pessoas serem julgadas com base em suas imagens cerebrais, capazes de dizer se são predispostas ou não a terem comportamento violento.
Raine fala também sobre o amadurecimento do cérebro, que traz questões como a maioridade penal à baila. Segundo o psiquiatra, a idade de amadurecimento do cérebro é 20 anos. "Adolescentes de 15 e 16 anos são impulsivos, não controlam suas emoções, porque seu córtex pré-frontal não está completamente desenvolvido", explica.
Leia trechos da entrevista:
Existe uma predisposição genética para a violência? O que nós já sabemos é que cerca de 50% da variação nas taxas de violência pode ser atribuída a fatores genéticos. Toda uma geração de pesquisas, realizada com irmãos gêmeos e filhos adotivos, mostrou que os fatores hereditários são, sim, importantes. A próxima geração de pesquisas é a molecular, que já começa a identificar quais os genes envolvidos. Até agora o mais estudado é o gene da monoamina oxidase A (MAOA), que, quando produz uma baixa quantidade de sua enzima, atrapalha o funcionamento de neurotransmissores. Indivíduos com essa mutação são particularmente suscetíveis ao comportamento antissocial, principalmente quando sofrem abusos na infância. Mas é muito importante destacar que nunca vamos descobrir um gene que seja, sozinho, responsável pela violência. Descobriremos vários, que serão associados a muitos outros fatores sociais. O ambiente também é importante por alterar o modo como os genes funcionam. O DNA é fixo, mas o modo como ele se expressa — e como afeta o cérebro — pode ser alterado pelo ambiente.
O comportamento violento pode ser prevenido? 
Nós sabemos que, se pudermos melhorar o funcionamento do cérebro, podemos melhorar o comportamento. E existem estudos que colocaram isso em prática. Em um deles, enfermeiras visitaram mães durante sua gravidez e nos dois primeiros anos de vida da criança. Elas aconselhavam as mulheres a parar de beber e fumar, ensinavam qual a nutrição adequada, mostravam as necessidades psicológicas dos bebês. Ao comparar o resultado dessas crianças com o de um grupo de controle, que não recebeu as visitas, os pesquisadores descobriram que a delinquência juvenil caiu pela metade. Nós fizemos um estudo com crianças de três anos, no qual fornecemos uma melhor nutrição, mais exercícios físicos — que resultam no desenvolvimento de novas células nervosas — e exercícios cognitivos durante dois anos. Oito anos depois, essas crianças tinham melhores funções cerebrais, elas estavam mais alerta e atentas e seus cérebros pareciam ser pelo menos um ano mais maduros do que o grupo de controle. Não é só isso: seguimos essas crianças até os 23 anos e vimos uma redução de 34% no número de infrações penais. Há uma última técnica que pode ser útil, que é a meditação. Estudos mostram que ela melhora o funcionamento do lóbulo pré-frontal — uma área cerebral que sabemos estar disfuncional em indivíduos violentos. Essa técnica ainda não foi testada em prisioneiros. Isso porque os cientistas relutam em reconhecer que existem bases cerebrais para o comportamento violento. Espero que meu livro abra as portas para esse novo campo de pesquisas.
Do ponto de vista da neurociência, quando o cérebro está maduro e a pessoa pode ser julgada como um adulto? 
Essa questão é bastante debatida em todo o mundo. O que sabemos é que o cérebro humano não está completamente maduro até os 20 anos. Os adolescentes de 15 e 16 anos são impulsivos, não controlam suas emoções, porque seu córtex pré-frontal não está completamente desenvolvido. Em alguns casos, ele demora até os 30 anos para se desenvolver, e sabemos que disfunções nessa região são encontradas em criminosos. Acho que faz sentido levar em conta o desenvolvimento cerebral para analisar conceitos como a responsabilidade penal, mas não existe uma linha mágica. Há pessoas de 19 anos com cérebros funcionando como o de indivíduos de 16 anos, mas também existem pessoas de 15 com cérebro de 20. No futuro, poderemos usar outras medidas de maioridade neural, que usem imagens cerebrais para analisar se uma pessoa é responsável por seu comportamento. Mas é claro que hoje temos de ser práticos e decidir uma idade de corte. Nesse caso, fixá-la em 18 anos não me parece ruim.
O sistema judiciário pode usar imagens cerebrais para julgar alguém ou prever suas chances de cometer crimes?
É possível, mas nós ainda não podemos colocar isso em prática. Pesquisas iniciais, feitas neste ano, mostraram que imagens cerebrais ajudam a prever melhor quais criminosos podem voltar a cometer atos violentos nos próximos três ou quatro anos. Atualmente, a justiça usa fatores demográficos como idade, gênero, emprego e histórico para prever quais indivíduos são mais perigosos. Os juízes têm de fazer isso o tempo todo, quando decidem se condenarão alguém a trabalhos comunitários ou à cadeia. As técnicas de imagem cerebrais estão começando a nos dar mais informações que podem ajudar a saber se determinado indivíduo é um perigo para a sociedade.
O senhor não tem medo que isso leve a algum tipo de abuso, com indivíduos sendo presos por causa de seu perfil cerebral?
Na verdade, sim – como no caso do filme Minority Report. Nele, a polícia impede os crimes antes que aconteçam. Um grande medo que tenho é que no futuro usemos a genética, as imagens cerebrais e outros fatores neurobiológicos para prever a violência e aprisionar as pessoas antes mesmo de elas cometerem qualquer crime. Isso me preocupa.  Até porque minhas imagens cerebrais se parecem com a de um criminoso que matou 64 pessoas — eu tenho o cérebro de um serial killer. Além disso, tenho outros fatores biológicos para o crime, como baixa pressão sanguínea, e tive problemas de nutrição e no parto. Se esse cenário acontecer o futuro, eu seria um dos primeiros a ser preso. Acho que devemos tomar muito cuidado nessa área. Existe uma tensão entre proteger as liberdades civis — e não prender ninguém por probabilidade — e  a necessidade de proteger a sociedade. Essa é a tensão que teremos de enfrentar no futuro.
O senhor falou sobre a influência do cérebro, da genética e do ambiente no comportamento. Onde fica o livre-arbítrio?
Esse é outro desafio da minha área de pesquisas que costuma deixar muitas pessoas desconfortáveis. Pense em um bebê inocente, cuja mãe fumou e bebeu na gravidez, que teve uma nutrição ruim e problemas no parto, com genes que podem resultar em mau comportamento, com problemas de habitação e de educação durante seu desenvolvimento. Nós sabemos que essa criança tem muito mais chances de se tornar um adulto violento. Uma pergunta que surge a partir disso: será que essa pessoa tem livre-arbítrio? Ela é responsável por seus atos? Em meu livro, eu digo que o livre-arbítrio é reduzido em algumas pessoas, logo no começo de suas vidas, por influências que estão além de seu controle. O livre-arbítrio tem vários tons: a pessoa pode ter total livre-arbítrio, pouco, ou quase nenhum. Acho que devemos levar isso em conta no sistema judicial, na hora de punir as pessoas. Existe um caso real de um indivíduo que teve um tumor em seu córtex pré-frontal que o transformou num pedófilo. Os médicos retiraram o tumor, e seu comportamento voltou ao normal. Será que ele era tão responsável por seus atos quanto alguém que fez a mesma coisa e não tinha o tumor? Essa é a dificuldade e a tensão desse campo de estudos, e elas não serão superadas de modo fácil. Em um nível, é importante reconhecer os fatores de risco que conspiram para diminuir o livre-arbítrio. Mas também temos de levar em conta a igualdade e a justiça, buscando uma lei igual para todos. Não tenho respostas no momento. Esse é um debate aberto.
Como a neurocriminologia pode ajudar a explicar os casos extremos de violência? A neurocriminologia é uma nova disciplina que estou começando a desenvolver nos Estados Unidos, que envolve a aplicação de técnicas da neurociência para entender as causas do crime. Nós tentamos juntar tudo que aprendemos nos últimos anos — na genética, técnicas de imagem cerebral, neuroquímica, psicofisiologia e neurocognição — para explicar porque algumas pessoas crescem para se tornar criminosos violentos. Queremos entender o cérebro por trás não só dos criminosos comuns, mas também o de psicopatas, criminosos de colarinho branco e homens que batem em suas esposas. Nós estudamos todo o leque de comportamento antissocial e observamos que, não importa a forma, existe uma base biológica para todos eles.
Todas essas formas diferentes de violência têm a mesma base cerebral?Há diferenças. Por exemplo, minha equipe estudou psicopatas — os criminosos que não têm empatia nem remorso. Já sabíamos que eles têm um baixo funcionamento da amígdala, o centro emocional do cérebro. Nossa pesquisa mostrou ainda mais: que nesses indivíduos a estrutura física dessa área é 18% menor do que no resto da sociedade. Com o centro emocional reduzido e sem funcionar direito, os psicopatas passam a não sentir medo.  É por isso que eles quebram as regras da sociedade – pois não têm medo da punição. Quando estudamos homens que batem em suas esposas, no entanto, descobrimos que suas amígdalas são muito ativas, mas o córtex pré-frontal não funciona direito. O córtex pré-frontal é a área que regula as emoções. Nossa conclusão é que a alta atividade da amígdala resulta em reações exageradas a estímulos leves, como receber críticas da esposa — o que os deixa mais agressivos. Esses homens que respondem exageradamente aos estímulos não possuem os recursos cognitivos para controlar essa emoção. São formas diferentes de comportamentos antissociais, com tipos diferentes de predisposições biológicas.
Como se explica que problemas em áreas cerebrais específicas possam levar a comportamentos violentos?
Quando temos de tomar uma decisão moral e pensamos em quebrar a lei (e todos nós já pensamos em fazer algo errado), ficamos ansiosos, com um pouco de medo. Esse é o freio de emergência que nos impede de quebrar as regras da sociedade. Mas esse freio não funciona direito nos psicopatas. Eles sabem o que é certo e errado, mas não têm o sentimento correspondente. E é esse sentimento, e não o conhecimento, que nos faz frear nosso impulso. Isso traz uma questão que me fascina. Como os psicopatas têm o motor emocional quebrado — e eles não têm culpa de possuírem essa disfunção —, será correto culpá-los e castigá-los por seu comportamento? Essa é uma questão que teremos que discutir no futuro.
Revista Consultor Jurídico, 14 de julho de 2013
Fonte: http://www.conjur.com.br/2013-jul-14/fatores-hereditarios-influenciam-comportamento-criminoso-psiquiatra
No site da revista "Veja": http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia/dentro-da-mente-dos-criminosos

Então o psiquiatra Adrian Raine se considera criador de uma nova área do conhecimento, a Neurocriminologia. Interessante, muito interessante. Pessoalmente, sou fascinado pelo mundo das neurociências e da psicologia. Fico na expectativa de ler o livro lançado pelo rapaz. E sei que o tema costuma provocar entusiasmo em mentes jovens e antenadas com o admirável mundo novo. Mas há muito em que pensar.

Desde o seu surgimento, a Criminologia é verdadeiramente obcecada pelo tema do comportamento criminoso, sendo essa a principal orientação entre os autores estadunidenses, como bem destaca Philippe Robert em Sociologia do crime. Poucos assuntos foram investigados com tanto afinco e tanta convicção acerca de sua cientificidade. Mas assim como conquista adeptos, arrebanha também opositores furiosos, alguns dos quais munidos de argumentos igualmente respeitáveis.

À medida que a Criminologia se desenvolveu, a ênfase no comportamento individual arrefeceu um pouco (sem jamais desaparecer), sendo substituída pela influência de fatores exógenos — ambientais, econômicos, políticos, geográficos, etc. Atualmente, parece prevalecer a ideia de que o crime é disparado por uma conjugação de fatores internos e externos, mas subsiste a rejeição a teorias que aspiram à certeza e precisão. É difícil explicar com base nelas, p. ex., o delito de ímpeto, aquele praticado num rompante emocional, com o sujeito por vezes agindo em total desconformidade ao seu temperamento, tal como a pessoa dócil que, sem  mais nem menos, comete uma violência desmesurada.

Não seria demais, penso, apostar em explicações paralelas, tais como crimes determinados por motivos predominantemente individuais; crimes determinados por motivos predominantemente exógenos; crime precipitados pela influência de multidões (outro aspecto que desperta especial interesse), etc. Mas tudo privilegiando o caráter mais indicativo do que determinista.

À medida que a ciência avança, surgem novos conhecimentos e novos exames médicos, que se tenta aplicar ao mundo do crime. Publiquei aqui no blog, em novembro de 2010, a postagem "Investigação da verdade", que dá um exemplo disso. A Neurocriminologia seria uma versão muito mais sofisticada dessa tendência porque, oferecendo parâmetros supostamente confiáveis de propensão criminosa, ela se torna um conhecimento prospectivo, capaz de subsidiar o poder público a medidas preventivas. E é aí que o terror de Estado eclode. Temos razões fartas e concretas para temer conjunturas como essa. Felizmente, o próprio Raine deixou claro esse risco, ao dizer que ele mesmo possui um cérebro com várias características "criminosas". Mas ele é um cientista; sabe ser cauteloso. E políticos querendo dar as famosas respostas à sociedade?

Outra crítica veemente que não pode ser esquecida é a que repudia a psiquiatrização da justiça penal. Tem-se muito medo de que recursos (pseudo)científicos desumanizem a aplicação do direito, assim como que juízes e demais agentes se tornem vassalos de laudos de todo tipo, tornando a função jurisdicional mera receptora de decisões e análises pretensamente técnicas.

Não bastasse tudo isso, não podemos ignorar que análises neurocriminológicas (admitamos o termo, para facilitar) podem ser eficientes para explicar ações violentas, mesquinhas, impulsivas ou reiteradas. Ou outros grupos de ações bastante características. Mas os tipos penais vão muito além disso. Existem condutas tipificadas como crimes que simplesmente não podem ser associadas a essas posturas, porque resultam de juízos de valor do poder legisferante, impostos como fatores de moralização, tais como certos delitos sexuais. Existem condutas que só são crimes por opções políticas do poder vigente (questionar o regime, p. ex.). Estaria a Neurocriminologia apta a enfrentar essas nuanças?

Se alguém achou que estamos chegando ao tempo de resolver o problema do crime, fracassou miseravelmente. Quanto mais ciência tivermos, mais as armas se erguerão numa guerra que é fortemente política e ideológica. E por isso mesmo, talvez, sem fim.

Nasce uma roqueira

Escutávamos a trilha sonora do filme Somos tão jovens no carro. Quando chegamos ao nosso destino, terminou a terceira faixa do CD, "Benzina", uma composição instrumental em estilo punk rock. Júlia me olhou e disse, sorrindo:

— Eu gostei dessa música que estava tocando.

— Ótimo, filha, porque isso é rock! — respondi. Detalhe: também ensinei Júlia a sacudir-a-cabeça-maluco. Mas ela não fez isso na hora. Nem achei que estivesse prestando atenção.

Polyana reclamou da intensidade do som. Tive que lembrá-la que aquilo era rock, então não dá para regular essas coisas. Ainda preciso dizer isso a Júlia, sobre rock: aprecie sem moderação.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Crime organizado

Não só o Congresso Nacional tem trabalhado como nunca em sua existência, o que por si só já impressiona, como tem varado a madrugada na ativa, apreciando projetos que nem sequer interessam financeiramente aos parlamentares ao governo. Sinal dos tempos.

Na madrugada de ontem, o Senado concluiu a votação do PLS 150/2006, que tenta resolver uma longa discussão acerca da imprecisão do conceito de crime organizado. O projeto segue agora para sanção presidencial.

O texto aprovado define organização criminosa como a associação de 4 ou mais pessoas, "estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional". Trata-se de um critério essencialmente político-criminal, nada livre de críticas, que procura positivar aspectos amplamente discutidos pelos estudiosos da matéria, frente à realidade da chamada nova criminalidade.

Os primeiros senões sobre o texto já foram levantados. Agora é aguardar para saber se o projeto será integralmente sancionado. Se for, entrará em vigor 45 dias após a sua publicação. Nesse meio tempo, os debates já estarão acirrados.

Para animar a sexta-feira


Um Sábado Qualquer, de Carlos Ruas.

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Um novo código penal para o Vaticano

O Papa Francisco foi muito bem recebido, quando do anúncio de seu nome, e tem sido alvo de inúmeros elogios desde que assumiu a chefia da Igreja Católica. Os motivos são variados, mas chama a atenção, sobretudo, a sua simplicidade, exteriorizada não por meras declarações, mas por atitudes concretas, além de uma afirmação impensável até então: a de que o papa também pode errar! Uma ousadia, considerando que a infalibilidade papal é (ou era, sei lá) dogma da Igreja.

Francisco está mesmo com os pés fincados no mundo real e atual. Sua mais recente audácia foi aprovar reformas no código penal da Santa Sé, com vistas a adequá-lo à legislação penal internacional, que é laica!

Em consequência, a pena de morte deixa de ser aplicável e me surpreende que com tamanho atraso. Afinal, passada a era hedionda da Santa Inquisição, a ampla influência da Igreja sobre o mundo ocidental contribuiu efetivamente para a humanização do direito penal. Outras mudanças colocam o dedo na ferida: dinheiro e sexo. Agora, lavagem de dinheiro e abusos sexuais, nos quais se incluem a pedofilia, serão punidos com maior rigor. No geral, a nova legislação está claramente preocupada com a maior defesa dos direitos humanos.

Papa Francisco, assim, vai ganhando a minha admiração e o meu respeito.

Lei do Ato Médico

Uma batalha legislativa de mais de 11 anos chegou ao fim, embora isso não indique, obviamente, que a verdadeira batalha já esteja concluída. Foi publicada hoje e entrará em vigor daqui a 60 dias a Lei n. 12.842, de 10 de julho de 2013, que dispõe sobre o exercício da Medicina. A briga de foice entre médicos e outras categorias profissionais ligadas à saúde girava em torno da definição de atividades privativas da Medicina, ou seja, da caracterização do que seria um ato médico.

Diversas categorias lutavam por assegurar certas prerrogativas, por se entenderem capacitadas a fazê-lo e, também, como forma de atender melhor à demanda. Não faltava, é claro, o componente acusatório: médicos são arrogantes e querem reservar para si um poder decisório que pode menosprezar outros profissionais e dificultar o atendimento à população. Mas eles não estariam minimamente preocupados com isso.

Deixo claro que esta matéria é complexa e extrapola o meu conhecimento pessoal, por isso prefiro não tecer nenhum juízo de valor. Apenas me parece que a presidente Dilma Rousseff procurou uma solução conciliatória, vetando as previsões de atividades privativas que poderiam provocar maior descontentamento.  O Conselho Federal de Enfermagem, p. ex., está satisfeito porque os vetos incidem justamente sobre hipóteses que a categoria desejava ver excluída do texto legal. No Portal COFEN, há diversas notícias sobre o assunto. Desde a aprovação do projeto de lei havia um certo clamor pelo veto.

Também me parece que os profissionais não-médicos não devem considerar-se afagados pela presidência da República. Nas razões dos vetos, o Executivo deixou claro que os motivos determinantes de sua recusa estão sempre ligados à operacionalidade dos serviços públicos de saúde. Restringir a atuação das diversas categorias que atuam na área de saúde dificultará ainda mais o atendimento ao público e o governo, sensatamente, não quer piorar o que já é ruim (muito menos levar a culpa por isso).

O Conselho Federal de Medicina ainda não se pronunciou sobre a nova lei. Está muito ocupado, no momento, com o anúncio de trabalho obrigatório no SUS, polêmica novidade trazida pelo governo nos últimos dias. O que não significa que não vá protestar adiante. Afinal, até os médicos, nestes tempos barulhentos, encontraram o caminho da rua.

Esta reportagem aqui fornece uma boa síntese sobre o assunto.

Acréscimo em 12.7.2013:
No site do CFM, já pode ser lida a promessa de trabalhar para a derrubada dos vetos apostos à lei. Quem achou que a confusão ia acabar?

Sai pra lá!

Existem alguns setores que apostam muito alto na ignorância do povo. A grande imprensa local, p. ex. O Diário do Pará vem tratando como "barrigada" (publicação de informação falsa por erro ou descuido), desde ontem, a capa de sua edição na qual estampou fotografias de bebês recém-nascidos acomodados em caixas de papelão, dizendo que era a situação atual da Santa Casa de Misericórdia do Pará.

Sem demora, leitores cuja memória não é tão falha se recordaram das imagens e descobriram que as mesmas constituem registros de ..., feitas em um hospital de Honduras. As redes sociais ferveram. Independentemente do descalabro que é a saúde pública no Pará, não podemos admitir uma mentira tão descarada. À noite, em seu site, aquele jornal já publicara uma nota informando que estava checando a veracidade das imagens e que não via problema algum em admitir seu "erro", caso comprovado. Àquela altura, porém, as fotografias reais, associadas aos jornais estrangeiros da época, já estampavam as redes sociais e eram intensamente exploradas pelo grupo concorrente.

Esta manhã, o Diário do Pará publicou um editorial em plena capa. Começa pedindo desculpas pela publicação das fotos e persiste na tese do erro, que afirma estar sendo apurado. Alguém nos tapeou, sabe? E esses "erros lamentáveis" acontecem nos "melhores jornais do mundo". É verdade, isso pode acontecer em qualquer lugar. Mas também é verdade que o pretenso erro deflagrou uma campanha de fustigação do governo do Estado, iniciada imediatamente após o PMDB deixar a barca que vinha apoiando até aqui, como sempre em troca de cargos estratégicos e rentáveis, financeira e politicamente.

Será que o grupo RBA, de propriedade do Senador Jader Barbalho, maior quadro do PMDB paraense, realmente acredita que vamos engolir essa? Estou certo de que não, mas convém manter o personagem, persistir no jogo de cena, como sempre fazem por aqui os caciques da imprensa e da política. E digo mais: não é apenas o público mais informado e informatizado que percebe isso. O cidadão menos escolarizado também reúne condições mais do que suficientes para identificar a manipulação envolvida nessa história. Hoje em dia, tapear não é mais tão simples quanto antes.

Em países sérios, por muito menos do que isso, jornalistas já abdicaram de suas carreiras ou delas foram defenestrados. Por aqui, claro, será apenas uma questão de deixar a poeira baixar. Até porque o Diário do Pará conta com uma causa de peso para sustentar as suas baterias. Veja como, passadas apenas seis linhas, o editorial volta ao ataque e, aí sim, explorando fatos verídicos. Uma estratégia retórica para fazer o leitor se esquecer da "barrigada" e se concentrar apenas na situação de Santa Casa. Obviamente, as pessoas darão muito mais atenção a estes fatos e aí o próprio cérebro se encarregará de formar o convencimento. É mais ou menos como o promotor de justiça que exibe uma prova não autorizada ao tribunal do júri. A defesa protesta e o juiz manda aos jurados que desconsiderem aquela prova, por ser ilícita. Mas os jurados já viram a tal prova e não se esquecerão dela. Ao final, decidirão com base nela, mesmo sem o declarar.

Fique claro, contudo, que a conjuntura desesperadora da saúde paraense é real e não pode ser mitigada, muito menos pelas desculpas sempre evasivas e inócuas de Simão Jatene. Em uma coisa, por sinal, o editorial da família Barbalho está absolutamente correto, verbis: "O povo do Pará espera que o governador assuma suas responsabilidades. Passados quase três anos de administração, o governo sequer começou."

Essa é uma grande verdade, opinião da qual este humilde crítico compartilha. Basta que se consulte o histórico do blog, em postagens combinando os marcadores "Pará" e "governo", para ver a mesmíssima assertiva: Jatene ainda não fez nada neste seu mandato. Nada. Não que tenha feito muita coisa no anterior, de modo que não se trata exatamente de uma novidade. Mas o imobilismo do governador-cantor rivaliza com a inércia da gestão precedente e chega mesmo a destoar do estilo tucano, que adora uma obra grandiosa e caríssima, para turista ver, mesmo que isso não altere em nada a vida do povo.

Ao final, a constatação rotineira e exaustiva: neste imbróglio, não há nenhum santo. E enquanto os envolvidos se engalfinham em torno de seus interesses particulares mais mesquinhos, a realidade social continua torturante. Pior para os peões do tabuleiro, que são as peças mais numerosas e, segundo muitos enxadristas, as mais importantes. Só não sabem disso. Ainda, se Deus quiser.

O primeiro dia depois

São quase duas horas da madrugada, horário em que me recolho na maioria dos casos. Este é o primeiro dia após o meu 38º aniversário. O que mudou? Obviamente, nada, como sempre. Não mudamos pelo fato de fazermos aniversário. Mudamos por outras razões, que até podem ser algum evento do dia do aniversário, mas em geral são processos, bem graduais.

Nunca fui de comemorações de aniversário. Não sou de festas. Mas realmente acredito que tive um excelente dia. Após o trabalho, onde nos confraternizamos, à exceção de um breve compromisso moral relacionado a um falecimento, passei todas as demais horas do dia em casa (e em seu prolongamento natural, a casa de minha mãe), juntamente com a família. Esposa, filha e os integrantes de minha família originária. Somente nós, um pequeno grupo. Nada fizemos de especial, exceto estarmos juntos. Creio que isso já seja especial o bastante. Eu, pelo menos, gostei muito. Pensando nas pessoas que passam o próprio natalício sozinhas ou junto a quem não se importa com elas, chega a ser um privilégio.

Por esses aspectos, foi um dia muito agradável. E agora vamos à vida. que é o que temos pela frente. Começando por algumas horas de sono. Boa noite.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Chegar aos 38

Tudo bem que é só um programinha de computador, facilitado pelo fato de o Google possuir zilhões de informações pessoais a meu respeito, mas confesso a minha surpresa ao me deparar com este doodle, há alguns minutos.


Confesso que desconhecia esse mimo que a gigante da informática está oferecendo a seus usuários agora. E devo dizer que achei simpático. Causa um bom efeito.

E é isso: estou chegando aos 38 anos de idade. Quem diria, passou tão rápido... E foi totalmente diferente de tudo o que eu imaginava. Mas em geral somos nós que fazemos os nossos caminhos, então hoje é apenas uma oportunidade para agradecer a Deus por me permitir as aventuras que compõem a minha trajetória e, em especial, pela família e pelos amigos extraordinários que me concedeu. Não me tornei o escritor aclamado por público e crítica internacionais (e rico, claro) que sonhei na infância, mas tenho as minhas conquistas. E são minhas. Quaisquer que sejam, são minhas.

Resta, agora, seguir adiante. Pois há todo o resto da vida pela frente. E eu quero estar presente, para acompanhar minha filha e contribuir para que ela seja uma mulher de bem, para si mesma e para a sua sociedade. Esse é o meu maior projeto agora. E, curiosamente, desta vez eu acho que posso fazê-lo.

Honestamente...

É festa em uma certa empresa de comunicação da cidade. Em mais um capítulo da briga de foice travada com a concorrente, a empresa em questão pode gozar da possibilidade de ostentar a notícia da condenação de Jader Barbalho, a devolver mais de 2,2 milhões de reais aos cofres públicos, dinheiro desviado da Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM). A notícia está nos principais portais de notícias do país.

Simpatize você com ele ou não (não é difícil encontrar um fã do político e já tive alunos de sua família), não se pode negar que o nome de Jader Barbalho é conhecido nacionalmente como exemplo de mau agente público. Experimente perguntar a qualquer um nos outros Estados e você verá. Faça aquele jogo em que a pessoa responde com uma palavra a cada comando que você dá. Se você disser, "Caetano Veloso", a resposta provavelmente seria "Bahia". Então pergunte "Jader Barbalho".

Tudo bem que a notícia possa produzir um certo encantamento ético em boa parte da população paraense. Mas cá entre nós: você acha mesmo que esse dinheiro será devolvido? Comparemos com uma notícia que me chamou a atenção na manhã de ontem: o governo repatriou 4,7 milhões de reais desviados pelo ex-juiz do trabalho Nicolau dos Santos Neto. E ainda se ufana de ser o maior montante recuperado de uma só vez.

Podemos comemorar isso, porque antes merreca do que nada. Mas o governo recuperou, até o momento, segundo o Advogado-Geral da União, 115 milhões de reais relativos a fraudes no escândalo das obras do TRT de São Paulo. Nessa conta entram desvios de Nicolau Neto e do ex-senador Luiz Estêvão que, condenado pela justiça, vem realizando pagamentos mensais da ordem de 4 milhões de reais (ele deve restituir 80 milhões). Mas o prejuízo total para os cofres públicos é estimado em 169,5 milhões de reais. Além disso, a recuperação do dinheiro só começou vários anos após o escândalo se tornar público. O ataque ao erário ocorreu entre os anos de 1994 e 1998.

Outros casos são desalentadores. Paulo Maluf, por exemplo, foi condenado pelo Judiciário da Ilha de Jersey a devolver 60 milhões de reais ao Município de São Paulo, mas nenhum centavo foi devolvido, até porque, no Brasil, todas as condenações contra o deputado, cuja imagem como político é icônica como a de Barbalho, são gradativamente revertidas, o que lhe permite debochadas declarações públicas (tem esta outra aqui). Além de seguir como titular de mandato político federal.

Portanto, a tendência segue sendo: 1) Não vemos o dinheiro de volta, de modo que o crime na verdade compensa. 2) Caso o dinheiro seja recuperado, é apenas uma fração do prejuízo causado. 3) Muitos anos e ingentes esforços são necessários para tanto.

Desculpem, mas eu não consigo comemorar. Até porque penso em Duciomar Costa e sua enorme coleção de ações de improbidade e penais, envolvendo malversação de dinheiro público. Condenações existem, mas eficácia que é bom, nada. Nem cassação de direitos políticos, para evitar que essas figuras sombrias voltem a se esconder nos meandros de mandatos populares para se furtar à responsabilização por seus atos.

terça-feira, 9 de julho de 2013

Advogados de julho

Divulgado hoje o resultado preliminar da prova prático-profissional do X Exame de Ordem, quero mandar um abraço caloroso aos novos colegas que conheci em meio acadêmico. São eles:

Adalberto Guimarães Corrêa de Melo Neto
Adriana Dantas Nery
Aline Loureiro Cavalcante
Amanda Fontelles Alves
Ana Carolina Silva Falcão
Ana Manuela Silva João
Bluma Barbalho Moreira
Breno Vinicios Dias Wanderley
Bruna Vidigal Tavares Nunes
Elden Borges Souza
Fernanda do Vale Fernandez
Fernanda Moura Silva
Fernanda Vaz Pereira Rodrigues
Gabriel Perez Rodrigues
Gabriela Tostes Lobato Silva
Gisele Cristina da Silva
Jaqueline Bahia Vinas
Jaqueline Mirna Martins Pinheiro Cardoso
João Victor Nogueira Grobério
Jordana Tobias Athias
Laís Bibas Quintanilha Bibas
Marcelo Augusto Paradela Hermes
Mariel Dacier Lobato Martin de Mello
Natasha de Oliva Farias
Nelson Eliaquim Carneiro Pimentel
Nicolau Monteiro de Azevedo Filho
Pâmela Falcão Conceição
Patrícia Andréa Batista Pereira
Rafael Duque Estrada de Oliveira Peron
Rafaela Teixeira Neves
Ricardo Augusto Chady Meira
Rodrigo Maciel Lamego
Tâmisa Fonseca Cardoso Rodrigues
Thierry Badarane Nicolau Gonçalves
Tiago Fernando Ramos de Oliveira Martins
Virgílio de Carvalho Nelo Neto

Dou-lhes meus parabéns e desejo muita sorte na nova carreira. A advocacia e demais carreiras jurídicas precisam de mentes arejadas. Grande abraço para todos.

Conceição Fiúza de Melo

Hoje é dia de incluir mais um nome na lista dos necrológios do blog, atitude que sempre me deixa com a alma um tanto pesada, por mais que minhas concepções religiosas pessoais me conduzam à convicção em uma outra e verdadeira vida.

Presto minha homenagem, hoje, à Profa. Conceição Rangel Fiúza de Melo, que esteve no CESUPA desde sempre, literalmente, de modo que estava lá quando eu cheguei. Na época, setembro de 1999, ela era a diretora da Área de Ciências Exatas e Tecnologia, portanto foi ela quem me abriu as portas da docência, pois comecei minha carreira lecionando a disciplina Noções de Direito, Legislação e Ética para o curso de Tecnologia em Processamento de Dados. A despeito da generosa indicação feita por minha amiga pessoal, Bárbara Dias, a quem substituí, eu não teria conseguido a vaga não fosse pela confiança que me foi concedida pela Profa. Conceição.

Posteriormente, já em outra função, foi sempre uma incentivadora da nossa qualificação acadêmica. Digo "nossa" porque sua preocupação, claramente pessoal, dizia respeito a mim e a Polyana, minha esposa. Aliás, nós lhe somos particularmente gratos porque, quando da licença-maternidade de Polyana, Profa. Conceição foi de uma generosidade extrema, facilitando o retorno ao trabalho de uma jovem mãe que estava com a cabeça em outro lugar e que, não podendo voltar à sala de aula porque era final de semestre letivo, recebeu incumbências administrativas com um horário de trabalho bastante favorável.

Não é nenhum exagero dizer, portanto, que ela cuidou de nós e até mesmo de nossa filha. Então a nossa gratidão não é mera força de expressão. Nós lhe somos, de fato, profundamente reconhecidos e ficaremos muito saudosos de seu carinho e zelo. Mas a vida segue e só podemos desejar que ela, em sua nova existência, esteja bem como merece e, de lá, continue a ser a mãezona que foi para nós.

O depoimento de Polyana, via Facebook, foi este:

É com meu coração cheio de saudades que vejo a querida profa. Conceição Rangel Fiúza de Melo, minha mentora e amiga no CESUPA, partir desta vida. Profa. Conceição foi responsável por quase toda a minha vida profissional. Foi ela que me facilitou o contato com os professores do meu mestrado em Floripa, que me deu acolhida calorosa no Cesupa como gestora da ACET, que me ajudou a crescer dentro da instituição, que me permitiu ter um pouco mais de tempo com a minha Juju ao fim da licença maternidade, que lutou até o último minuto pelo crescimento da ACET. Todos os cursos da área estão hoje com um vazio no coração. Porque ela era o coração da ACET do CESUPA. Deixo aqui uma homenagem singela, mas muito sincera. E nem de longe a homenagem que ela merecia. Uma mulher para se admirar e amar. Profa. Conceição, esteja em paz. Sentiremos saudades.

Direito à convivência familiar

A Câmara dos Deputados aprovou, no último dia 2, projeto de lei (PL 2785/2001, de autoria do Ministério da Justiça, Secretaria de Direitos Humanos e Secretaria de Políticas para as Mulheres) que favorece a convivência de crianças e adolescentes com seus pais, caso estes se encontrem presos. O projeto tramitou em caráter conclusivo (apenas pelas comissões técnicas, sem a necessidade de aprovação em plenário), merecendo a acolhida das comissões de Constituição e Justiça, Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado e de Seguridade Social e Família. Segue, agora, para o Senado.

O projeto faz acréscimos ao Estatuto da Criança e do Adolescente. O art. 19, p. ex., que dispõe sobre o direito do menor de "ser criado e educado no seio da sua família" e, caso em família substituta, assegura "a convivência familiar e comunitária", ganha um novo parágrafo, que garante essa convivência "com a mãe ou o pai privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável ou, nas hipóteses de  acolhimento institucional, pela entidade responsável, independentemente de autorização judicial".

O art. 23 determina que "a falta ou carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar" e já prevê a inclusão da família em "programas oficiais de auxílio". Ganha um novo parágrafo determinando que "a condenação criminal do pai ou da mãe não implicará a destituição do poder familiar, exceto na hipótese de condenação por crime doloso, sujeito à pena de reclusão, contra o próprio filho ou filha".

São feitas mudanças, também, no procedimento legal de perda ou suspensão do poder familiar. A justificativa da proposição menciona:
(...) 2. A presente iniciativa surgiu a partir da realidade enfrentada por mães privadas de sua liberdade em relação ao exercício de seu poder familiar. Como possíveis causas da quebra dos laços familiares da pessoa presa, podemos apontar a dificuldade do acesso à Justiça e a ausência de legislação que promova e garanta, efetivamente, condições para manutenção dos vínculos afetivos entre pais e filhos.
3. Destaca-se que muitos pais e mães são destituídos do poder familiar quando presos, em razão de desconhecerem o processo de destituição desse poder, o que implica não somente violação ao direito de defesa constitucionalmente estabelecido, como também, a condenação a uma sobrepena.
4. Nesse contexto, o projeto ora proposto tem como objetivo ampliar as condições para assegurar o acesso à Justiça aos pais e mães em privação de liberdade, garantindo a eles a citação pessoal, o direito de solicitar a assistência jurídica gratuita e de comparecer à audiência que discutirá a destituição do poder familiar.
5. A proposta contribui para a reinserção social dos pais em privação de liberdade, na medida em que mantém os seus vínculos familiares, ao assegurar a seus filhos, desde que crianças e adolescentes, o direito a visitas periódicas.
6. O conjunto de direitos trazidos pela propositura é relevante para o sistema carcerário brasileiro, pois fortalece as relações familiares através das visitas e aprimora o direito de defesa do poder familiar, permitindo a continuidade do vínculo entre pais e filhos, mesmo quando os primeiros encontram-se privados de sua liberdade.
Quando há possibilidade de (res)socialização do preso, o desejo de retornar à família é um dos incentivos mais poderosos que existem, sobretudo em se tratando de mulheres (lamentável reconhecer que os homens renunciam com muita facilidade a suas famílias, a menos que delas dependam). Além disso, a proposta é centrada nos superiores interesses dos filhos, que devem ser preservados, quanto possível, das consequências danosas de um crime não praticado por eles.

Boa iniciativa. Espero que seja logo aprovada pelo Senado.

Fontes: 

Jovens empreendedores tricampeões

Pela terceira vez o Cesupa sagrou-se vencedor do campeonato de projetos universitários Enactus Brasil 2013, evento que ocorreu em São Paulo nos dias 03 e 04 de julho.
Realizado pela organização norte-americana Enactus, o campeonato reúne anualmente instituições de ensino superior de todo o Brasil para que apresentem os projetos desenvolvidos por seus alunos, os quais são avaliados por executivos das mais importantes corporações, como: KMG, Walmart, Bic, Unilever e Cargill.
O time de representantes do Cesupa deste ano foi composto por oito alunos de diferentes formações e também foi acompanhado por outros quarenta alunos e pela produtora rural Eliana de Souza, uma das ribeirinhas apoiadas pelos projetos do time.
Após os dois dias de campeonato, ao sair vencedor de sua liga e conquistar uma vaga para a final, o Cesupa disputou o título principal com o INSPER (São Paulo – SP), FACAMP (Campinas – SP), CEUT (Teresina – PI) e CEFET-RJ (Rio de Janeiro – RJ), contra os quais obteve o título de Campeão Nacional, honraria que também já conquistara nos anos de 2009 e 2011. Com isso, o Cesupa representará o Brasil na Enactus World Cup, que ocorrerá nos dias 30 de setembro, 01 e 02 de outubro deste ano, em Cancún (México).
Além do título de campeão, o time do Cesupa também conquistou a 1ª Colocação na Parceria Walmart para Projetos de Empoderamento Econômico de Mulheres, recebendo o aporte de Us$3.200,00 para que seja aplicado junto à comunidade.
A equipe vencedora é composta pelos alunos Jefferson Watanabe, Ana Luiza Rocha, Luana Bacury, Everaldo Oliveira, Ednilson Souza, Rebecca Bentes, Thatiana Barros e Juliana Marques, com orientação do professor Rafael Boulhosa.
A Enactus é uma organização sem fins lucrativos presente em 38 países, com a participação de mais de 62.000 estudantes, em mais de 1.500 campi universitários ao redor do mundo. No Brasil, são 29 times Enactus, formados por mais de 800 estudantes.
Fonte: Assessoria de Comunicação

Meus parabéns à vitoriosa equipe do CESUPA, campeã nacional da competição, mais uma vez. Vão rodando o mundo com essas vitórias e aprendendo a fazer a diferença em nossa sociedade.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Morar também é necessidade de quem estuda

Está no Portal G1, acessível a todo o país, a situação escandalosa e humilhante da Casa do Estudante Universitário do Pará. O assunto está sendo repercutido pela blogosfera e pelas redes sociais.

Aparência de favela...

...insalubridade e riscos...

...em meio ao esforço para estudar e, com isso, tentar melhorar de vida.
Fotos Ingrid Bico/G1

O pior é que, aparentemente, todos estão preocupados em ajudar os estudantes, mas faltam recursos e meios legais para fazê-lo. Até a COSANPA aceita negociar, mas não há quem pague a dívida absurda de 1,6 milhão de reais. E enquanto não se resolvem os aspectos financeiro e operacional, os estudantes permanecem na indigência.

Honestamente, doeu em mim essa situação. Bem que os ativistas políticos destes nossos tempos podiam se mobilizar para ajudar nossos irmãos estudantes, não é?

O que está faltando?

'Domínio do fato' poderá punir mão de obra escrava

Ministério Público do Trabalho defende que teoria do mensalão seja usada contra empresas

08 de julho de 2013 | 2h 07

Fernando Gallo - O Estado de S.Paulo
Assim que for consolidado o julgamento do mensalão, no Supremo Tribunal Federal, o Ministério Público do Trabalho vai utilizar a teoria do domínio do fato para buscar a responsabilização judicial de empresas que utilizam mão de obra escrava.
Na mira estão empresas que comandam as respectivas cadeias produtivas, mas terceirizam a produção justamente para tentar se dissociar da responsabilidade da contratação de funcionários que trabalham em condições análogas à da escravidão.
Entre os setores investigados pelos procuradores, e nos quais eles dizem ser comum a prática, estão o da construção civil, o de frigoríficos, o sucroalcooleiro, de fazendas e vestuário. A título de exemplo, só nos últimos dois anos viraram alvo de operações do Ministério Público a construtora MRV, maior parceira do governo federal no programa Minha Casa, Minha Vida, a grife multinacional Zara e o grupo GEP, detentor das marcas de roupas Luigi Bertolli, Cori e Emme.
Todas essas empresas estão no topo de cadeias produtivas nas quais auditores e procuradores do trabalho encontraram o uso de mão de obra escrava durante as operações - jornadas exaustivas de até 16 horas, pagamento por produtividade e moradia precária no mesmo local do trabalho. Todas terceirizavam a produção, subcontratando outras empresas que forneciam a mão de obra e o produto, e todas alegam que não tinham conhecimento das condições a que os fornecedores submetiam funcionários. As empresas sustentam que não podem ser responsabilizadas porque os funcionários não eram seus.
A súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, de 2011, proíbe a terceirização da atividade-fim das empresas. Significa dizer que uma fábrica de sorvete pode terceirizar atividades-meio do trabalho, como o serviço de limpeza, mas não pode terceirizar a produção do sorvete. Contudo, há questionamentos sobre ela no STF, que ainda não pacificou entendimento sobre o assunto.
Coordenador nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo do Ministério Público do Trabalho, o procurador Jonas Ratier Moreno refuta a tese das empresas do topo da cadeia em que foi flagrado o trabalho escravo. Ele é um dos entusiastas do uso da teoria do domínio do fato na acusação dessas empresas. "Será mais um material para a gente alegar. Esse julgamento (do mensalão) vem consolidar muitas posições, e principalmente essa. De que a empresa quando assume essa atividade, contrata alguém para produzir esse produto e coloca para vender, ela tem que saber que tem responsabilidade objetiva por esse produto", afirma.
Moreno diz também que as empresas "não podem dar uma de avestruz e não monitorar a cadeia produtiva", e utiliza o exemplo das confecções de roupa. "Pergunta: já que são confecção, onde está a fábrica? Vocês monitoram o produto? Não estão sendo negados direitos? Muitas vezes terceirizam para ter um produto barato. Em que condições se costura uma peça a R$ 0,20? Não pode alegar ignorância."
Amparo. A tese do coordenador encontra eco entre os pares. Chefe da instituição, o procurador-geral do Trabalho, Luís Antônio Camargo, lembra que o Ministério Público do Trabalho já vem, desde meados da década de 1990, buscando a responsabilidade objetiva das empresas do topo das cadeias produtivas, e endossa o uso do domínio do fato como mais um instrumento jurídico para o Ministério Público do Trabalho. "Essa linha de argumentação vem à baila com muita força na medida em que é adotada pelo Supremo Tribunal Federal. Você passa a ter uma jurisprudência muito significativa."
Os procuradores do Trabalho pretendem incentivar colegas de outras áreas a também usarem o instrumento.
Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,dominio-do-fato-podera-punir-mao-de-obra-escrava-,1051270,0.htm

A teoria do domínio do fato foi desenvolvida por Hans Welzel em 1939, mas hoje tem em Claus Roxin o seu grande expoente. Mesmo considerando que os avanços teóricos demoram décadas para aportar aqui no Brasil, não pode ser considerada uma novidade de modo algum. Tenho em mãos uma edição do manual de direito penal do bom e velho Damásio de Jesus, edição de 2003, dez anos atrás, que já tratava do tema. E não era a primeira edição a fazê-lo.

Vale lembrar que leis, quando bem elaboradas, são inspiradas em orientações teóricas, mas a lei, em si mesma, não existe para fixar teorias. É o intérprete que, no instante de enfrentar o caso concreto, fará a aplicação da norma de acordo com alguma teoria. Ou ao menos assim deveria ser. Por isso, causa-me surpresa a notícia de que o Ministério Público do Trabalho vai aguardar o desfecho do caso do "mensalão" para, somente então, perseguir a responsabilização de empresas exploradoras de trabalho escravo.

Responsabilização penal ou não penal, pouco importa. A teoria existe e pode ser suscitada como base de argumentação, porque os fatos estão aí, à disposição do intérprete. Ora, convenhamos: se mesmo que não houvesse lei, doutrina, jurisprudência, etc. e tal, o juiz não pode eximir-se de decidir, qual a lógica de se esperar o trânsito em julgado de um processo específico para que o MPT cumpra a sua missão institucional? Só para poder alegar um precedente?

A meu ver, a coisa está mal explicada.

sábado, 6 de julho de 2013

Consequências legislativas dos protestos

Para quem, como eu, estava curioso sobre as matérias que o Congresso Nacional aprovou no último mês, a maioria deles como consequência das manifestações populares por todo o país, eis aqui um levantamento feito pelo Congresso em Foco:


Vale lembrar que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado aprovou, também, em sessão do último dia 27, a PEC do trabalho escravo. Este item não constou da lista acima porque se trata de aprovação por comissão técnica, de modo que a tramitação continua.

Lembrem-se, ainda, deliberações em nível estadual e municipal, a maior parte delas determinando a redução de tarifas de transportes públicos. Por tudo isso, permanecerei repetindo, mormente aos reacionários: este país só avançará quando o seu povo decidir assumir um pouco, quanto possível, as rédeas de seu destino. Isso envolve participação direta nas deliberações dos titulares de mandatos eletivos.

A turma diz que isso é modismo, que já cansou, que já deu, mas é importante lembrar que os verdadeiros vilões estão só esperando a desmobilização. Eles sonham que tudo volte a ser como antes. Contam com isso. Então se parar agora, pode-se perder uma oportunidade e tanto. Deixem que o povo fale. Ainda estamos no estágio seminal de aprender a viver a democracia. Quando aprendermos, começaremos a fazer mais e melhor do que gritar nas ruas. Mas por enquanto, é o que dá para fazer. A verdadeira prova de fogo será no próximo ano, nas eleições.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

Barba, bigode e cavanhaque

Mais de três anos atrás, publiquei a postagem "Ode ao bigode", tratando sobre uma característica masculina em franco descrédito. Naquela oportunidade, disse que um dia falaria sobre barba e cavanhaque, mas acabei não o fazendo. Nem precisarei mais. Acabei de topar com um artigo bem bacana no Obvious, no qual a autora traça uma interessante síntese sobre a evolução do uso dos pelos na cara dos homens.

Indiretamente, o assunto voltou à baila com postagem de fevereiro deste ano, criticando a proposta ridícula de estimular o body shaving. Fiquei indignado com essa babaquice de sugerir que homem deve ser depilado, por isso me senti vingado quando, na noite da entrega do Oscar, vários dos atores mais cobiçados de Hollywood compareceram à premiação adornados com vistosas barbas.

Nada de modismos influenciados por quem só quer ganhar dinheiro vendendo lâminas ou, pior ainda, estimular idiotices para nos obrigar a aceitar padrões de beleza radicais e irreais. O importante é nos sentirmos bem, naturais e à vontade.

Volta e meia estou de barba. Eu gosto.

Situação de Belém

O dia de ontem impressionou muitos belenenses. Afinal, estamos acostumados a ver os supermercados funcionando diuturnamente, mas eis que de repente eles começaram a fechar as portas. Obviamente, não por iniciativa dos capitalistas. Cansados em todos os sentidos, os trabalhadores resolveram agir. Começou pelo Grupo Líder, passou para o Yamada e, hoje, só os funcionários daquela primeira empresa já retornaram ao trabalho, porque fecharam um acordo. Todos os demais supermercados fecharam, os últimos na manhã desta quinta-feira.

Ontem, o cenário era de filme pré-apocalíptico. Um número enorme de consumidores acorreu aos supermercados abertos, abarrotando seus carrinhos de mercadorias. A irmã de uma amiga avistou até briga pelo último pacote de um certo produto. Gente estocando e brigando por comida... Será o prenúncio do apocalipse zumbi?

A mesma testemunha, que ficou uma hora sofrendo na fila para conseguir pagar suas compras, relatou ter ido depois a dois postos de combustíveis, em vão. Sim, Belém está mais uma vez amargando desabastecimento de gasolina. Hoje, a imprensa anuncia que 10% dos postos estão desguarnecidos.

De permeio, tem chovido forte diariamente, numa época em que as chuvas normalmente já pararam. As chuvas têm alagado a cidade (mas o prefeito já declarou que não é mágico, justamente por causa desse motivo: ele não pode impedir a chuva de chover!), provocando ainda maior caos no trânsito. Tem faltado água e energia (mas isso não é exatamente novidade). Se somarmos aos frequentes protestos nas ruas, e descontextualizarmos tudo, teremos um cenário deveras preocupante.

E se pensarmos em outras mazelas que a cidade possui, tais como serviços de saúde muito deficitários, podemos ficar realmente apavorados...

Um pouco de transparência sobre direitos autorais

Uma das mais furiosas e indecentes caixas-pretas do Brasil está prestes a ser aberta. O Senado concluiu a votação, ontem, e aprovou o projeto de lei que define novas regras para a cobrança, arrecadação e distribuição de direitos autorais sobre obras musicais (PLS 129/2012). Resultante de uma CPI, que investigou o misterioso Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD)  que eu jurava ser um órgão público e somente agora descobri tratar-se de uma sociedade civil de natureza privada , o projeto, caso se torne lei, trará ao menos duas grandes vantagens para os artistas: maior transparência (haverá fiscalização externa) e aumento dos lucros, porque a taxa administrativa cobrada pelo ECAD será reduzida de 25% para 15%.

Vários artistas foram acompanhar a votação do projeto. Aí foi o encontro entre duas categorias que vivem de aparência: artistas e políticos. Houve fotografias, nos quais o povo da música aparece feliz, exceto Caetano Veloso. Olha a cara do baiano, postado entre a presidente Dilma Rousseff e esse boneco de cera e palha que lembra vagamente Marta Suplicy:


Nem parece que ele, prolífico compositor, vai ganhar mais dinheiro. Talvez ele se sentisse mais à vontade ao lado do finado Antônio Carlos Magalhães ou, ao menos, de um presidente tucano.

Enquanto isso, o ECAD não está nada feliz. Em seu site, ele se apresenta como o responsável pelo fato de o Brasil ser, como alega, "um dos mais avançados países em relação à distribuição de direitos autorais de execução pública musical". Você encontra lá um comunicado à sociedade, explicando as razões pelas quais o PLS 129 prejudica os artistas. Então tá.

Saiba mais: http://www12.senado.gov.br/noticias/materias/2013/07/03/mudanca-na-arrecadacao-de-direitos-autorais-de-musicos-vai-a-camara

Um pouco da convicção parlamentar brasileira

No meu outro blog, um pouco de patrimonialismo na Câmara dos Deputados, com direito a mentiras descaradas.

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Informação é controle

Uma notícia auspiciosa.
O Conselho Nacional de Justiça reunirá, em um banco de dados, toda a legislação penal brasileira. Tratado como um aperfeiçoamento do cadastro que existe no Processo Judicial Eletrônico, o sistema será aberto aos órgãos e instituições da justiça criminal.
O banco de dados, que ainda está em desenvolvimento, vai reunir ações penais e os inquéritos policiais e permitirá que o Ministério Público, os tribunais e as polícias agilizem a identificação dos crimes — o que pode tornar mais rápido o indiciamento, condenação e execução, por exemplo.
A expectativa é que o uso do banco de dados pelos integrantes do sistema de justiça criminal ajude na produção de estatísticas mais confiáveis, uma vez que todas as informações estarão agrupadas em um mesmo formato. Também será possível calcular automaticamente os casos de prescrição e os órgãos terão acesso a informações de indiciamento, da ação penal e até mesmo da denúncia. Cada tribunal ou órgão terá sua própria base que poderá ser compartilhada.
Em um segundo momento, com a adesão de todos os tribunais, será possível criar uma lista nacional de culpados, abrindo a possibilidade, inclusive, de emissão de certidões em âmbito nacional.
Um grupo de trabalho está responsável pela criação e estruturação dessa base de dados. O conselheiro do CNJ Gilberto Martins coordenará os trabalhos do grupo que terá representantes do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, da Presidência da República, do Conselho Nacional do Ministério Público, do Ministério da Justiça, da Polícia Federal, da Defensoria Pública da União, do Conselho Federal da OAB e da Polícia Civil.
Fonte: http://www.conjur.com.br/2013-jul-02/cnj-criara-banco-dados-informacoes-sistema-penal

Resta, agora, sair do papel.

Protesto por melhores condições de trabalho

Enquanto os reacionários continuam dizendo que manifestações são coisa de vagabundo, o mundo segue seu curso e coisas mudam de verdade.

Fiquei impressionado com a atitude dos trabalhadores do Grupo Líder, que cruzaram os braços, interromperam o funcionamento de, ao menos, três de suas lojas mais importantes, com direito à obstrução da via pública em frente (avenidas Visconde de Souza Franco e Augusto Montenegro, além da BR-316). Após as ondas grevistas das décadas de 1970/1980, o trabalhador brasileiro aprendeu a ser submisso, dado o seu pavor de perder o emprego, numa conjuntura tão propícia a isso.

Muitas vezes escutei pessoas dizendo que devíamos valorizar o nosso emprego, porque se você não quer, tem muita gente que quer. E é isso, mesmo: crise econômica, desemprego, necessidades batendo na porta e na cara, o trabalhador se submete a tudo, por mais humilhante que seja. Somente em conjunturas menos opressivas é que se pode conceber uma relação entre capital e trabalho menos aviltante.

Desconheço a real situação dos empregados do Grupo Líder. O que sei, porque vejo, é que os empregados de todas as redes de supermercados da cidade são extremamente sacrificados: trabalham muitas horas por dia, muitos dias por semana e recebem salários baixos. Lidam com o público, escutam desaforo, são obrigados a suportar tudo porque o cliente tem sempre razão e, ainda por cima, sofrem intensas cobranças, seja de produtividade, seja com suspeições sobre o modo como lidam com o patrimônio das empresas, notadamente mercadorias. Não é uma vida nada simples. E a despeito de tantos sacrifícios, a recompensa é pouca.

O fato é que o Ministério Público do Trabalho ajuizou ação civil pública por dano moral coletivo contra o Grupo Líder. Pede 3 milhões de reais como reparação. O réu alega que as acusações são infundadas e se diz até surpreso com o processo. Mas no dia de hoje negociou concessões, prometendo atender 10 das 12 reivindicações constantes da pauta dos trabalhadores. Não foi suficiente: a proposta foi recusada, porque a classe obreira tem duas prioridades sobre as quais nada se prometeu: cumprimento de carga horária de 6 horas diárias e pagamento de tíquete-alimentação. Ou seja, menos trabalho e um pouco mais de dinheiro. As mesmas prioridades de sempre.

Amanhã, os funcionários do Grupo Yamada devem aderir a movimento. Especula-se que as duas outras grandes redes supermercadistas irão atrás, mas por enquanto parece ser apenas boato. Seja como for, o trabalhador voltou a gritar, na rua, para lembrar ao capitalista por qual motivo ele está onde se encontra. E em apoio a esses brasileiros sofridos, vale um trecho do extraordinário poema de Vinícius de Moraes, "O operário em construção":

(...) Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.

E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.

Fontes: