quarta-feira, 18 de outubro de 2006

A imprensa faz jornalismo ou elege governos?

Visitando o 5ª Emenda, conceituadíssimo blog de Juvêncio de Arruda, encontrei um comentário postado por um leitor anônimo (aliás, por que anônimos?), transcrevendo artigo atribuído ao jornalista Paulo Henrique Amorim. Por achá-lo no mínimo interessante, tomei a liberdade de surrupiá-lo para publicação aqui. Ei-lo:

Um golpe de Estado levou a eleição para o segundo turno. É o que demonstra de forma irrefutável a reportagem de capa da revista Carta Capital que está nas bancas (“A trama que levou ao segundo turno”), de Raimundo Rodrigues Pereira. E merecia um sub-título: “A radiografia da imprensa brasileira”. Fica ali demonstrado:
1) As equipes de campanha de Alckmin e de Serra (da empresa GW) chegaram ao prédio da Polícia Federal, em São Paulo, antes dos presos Valdebran Padilha e Gedimar Passos;
2) O delegado Edmilson Bruno tirou fotos do dinheiro de forma ilegal e a distribuiu a jornalistas da Folha de S. Paulo, Estado de S. Paulo, do jornal O Globo e da rádio Jovem Pan;
3) O delegado Bruno contou com a cumplicidade dos jornalistas para fazer de conta que as fotos tinham sido roubadas dele;
4) O delegado Bruno procurou um repórter do Jornal Nacional para entregar as fotos: “Tem de sair à noite na tevê., Tem de sair no Jornal Nacional”;
5) Toda a conversa do delegado com os jornalistas foi gravada;
6) No dia 29, dois dias antes da eleição, dia em que caiu o avião da Gol e morreram 154 pessoas, o Jornal Nacional omitiu a informação e se dedicou à cobertura da foto do dinheiro;
7) Ali Kamel, “uma espécie de guardião da doutrina da fé” da Globo, segundo a reportagem, recebeu a fita de audio e disse: “Não nos interessa ter essa fita. Para todos os efeitos não a temos”, diz Kamel, segundo a reportagem;
8) A Globo omitiu a informação sobre a origem da questão: 70% das 891 ambulâncias comercializadas pelos Vedoin foram compradas por José Serra e seu homem de confiança, e sucessor no Ministério da Saúde, Barjas Negri.
9) A Globo jamais exibiu a foto ou o vídeo em que aparece José Serra, em Cuiabá, numa cerimônia de entrega das ambulâncias com a fina flor dos sanguessugas;
10) A imprensa omitiu a informação de que o procurador da República Mario Lucio Avelar é o mesmo do “caso Lunus”, que detonou a candidatura Roseana Sarney em 2002, para beneficiar José Serra. (A Justiça, depois, absolveu Roseana de qualquer crime eleitoral. Mas a campanha já tinha morrido.)
11) Que o procurador é o mesmo que mandou prender um diretor do Ibama que depois foi solto e ele, o procurador, admitiu que não deveria ter mandado prender;
12) Que o procurador Avelar mandou prender os suspeitos do caso do dossiê em plena vigência da lei eleitoral, que só deixa prender em flagrante de delito.
13) Que o Procurador Avelar declarou: “Veja bem, estamos falando de um partido político (o PT) que tem o comando do país. Não tem mais nada. Só o País. Pode sair de onde o dinheiro ?”
14) A reportagem de Raimundo Rodrigues Pereira conclui: “Os petistas já foram presos, agora trata-se de achar os crimes que possam ter cometido.”
Na mesma edição da revista Carta Capital, ao analisar uma pesquisa da Vox Populi, que Lula tem 55%, contra 45% de Alckmin, Mauricio Dias diz: “... dois fatos tiraram Lula do curso da vitória (no primeiro turno). O escândalo provocado por petistas envolvidos na compra do dossiê da familia Vedoin ... e secundariamente o debate promovido pela TV Globo ao qual o presidente não compareceu.”
Quer dizer: o golpe funcionou.

Assim que li, e tendo decidido republicar, visitei a coluna Conversa afiada, do PH Amorim, para confirmar a autoria. Não consegui localizar o texto, mas acabei achando outro, que me deixa, como estudioso do Direito, muito preocupado. Chama-se "Se der 'empate', o TSE elege Alckmin", cuja leitura recomendo.
Fiquei preocupado porque o teor do artigo indica que o TSE teria todo o interesse de eleger o candidato tucano, em flagrante oposição aos deveres de imparcialidade e idoneidade do Judiciário. Como é óbvio, não podemos acreditar cegamente no que se publica por aí, mas é importante conhecer e fazer juízos críticos.
Acima de tudo, porém, minha questão é outra. Ontem citei Cláudio Humberto, para quem destruir o PT parece ser uma missão de vida. Hoje, Paulo Henrique Amorim, que parece ter carteira assinada pelo PT, ou ao menos por Lula.
Eis meu questionamento: qual é o papel da imprensa brasileira em nossos dias? Jornalismo puro, sério, engajado que seja, mas isento de influências inconfessáveis de qualquer ordem, isso não parece mais existir — se é que existiu em algum lugar, em algum momento. A impressão que tenho é que o jornalismo deixou de ter existência própria para ser, única e exclusivamente, atividade meio para fins outros, especialmente os de natureza econômica e política. A imprensa elegeu e depôs Collor. Sua missão, agora, limita-se a decidir os rumos da Nação?
Naturalmente, minha intenção não é melindrar jornalistas. Prefiro irritar o Diabo — Satanás em pessoa e malvadeza — a irritar quem tenha veículos de comunicação a seu dispor. Mas gostaria muito que alguém me explicasse alguma coisa sobre a ética da imprensa.
Não há nada demais em estar de um lado e defendê-lo. Só acho que isso deveria ser declarado ostensivamente.

2 comentários:

Unknown disse...

Professor, essa é, em síntese, a tese de Mino Carta.O problema de um mídia não é ter candidato, e sim não dize-lo abertamente.
E obrigado pela sempre gentil referencia ao Quinta, imerecida, é claro.
Um abraço.

Yúdice Andrade disse...

Eu é que agradeço por me fornecer uma referência teórica que, agora, posso estudar para tentar entender melhor o assunto.
Quanto às referências ao Quinta, o número de visitas diárias que ele recebe me parece prova mais do que suficiente de que "conceituadíssimo" não foi exagero meu. Um abraço.