Novamente graças à colaboração do amigo Jesiel Lopes, segue o texto abaixo, atribuído a Luís Fernando Veríssimo, mas sabemos que vivem atribuindo falsamente a autoria dessas coisas a nomes famosos. Provenha de onde provier, contudo, é um retrato fidedigno do Brasil, para meditarmos nesta semana de retorno da propaganda eleitoral.
Pegaram o cara em flagrante roubando galinhas de um galinheiro e o levaram para a delegacia.
Delegado — Que vida mansa, heim, vagabundo? Roubando galinha para ter o que comer sem precisar trabalhar. Vai para a cadeia!
Ladrão — Não era para mim, não. Era para vender.
Delegado — Pior, venda de artigo roubado. Concorrência desleal com o comércio estabelecido. Sem-vergonha!
Ladrão — Mas eu vendia mais caro.
Delegado — Mais caro?
Ladrão — Espalhei o boato que as galinhas do galinheiro eram bichadas e as minhas galinhas, não. E que as do galinheiro botavam ovos brancos enquanto as minhas botavam ovos marrons.
Delegado — Mas eram as mesmas galinhas, safado!
Ladrão — Os ovos das minhas eu pintava.
Delegado — Que grande pilantra! (Mas já havia um certo respeito no tom do delegado) Ainda bem que tu vais preso. Se o dono do galinheiro te pega...
Ladrão — Já me pegou. Fiz um acerto com ele. Me comprometi a não espalhar mais boato sobre as galinhas dele e ele se comprometeu a aumentar os preços dos produtos dele para ficarem iguais aos meus. Convidamos outros donos de galinheiros a entrar no nosso esquema. Formamos um oligopólio. Ou, no caso, um ovigopólio.
Delegado — E o que você faz com o lucro do seu negócio?
Ladrão — Especulo com dólar. Invisto alguma coisa no tráfico de drogas. Comprei alguns deputados. Dois ou três ministros. Consegui exclusividade no suprimento de galinhas e ovos para programas de alimentação do governo e superfaturo os preços.
O delegado mandou pedir um cafezinho para o preso e perguntou se a cadeira estava confortável, se ele não queria uma almofada. Depois perguntou:
Delegado — Doutor, não me leve a mal, mas com tudo isso, o senhor não está milionário?
Ladrão — Trilionário. Sem contar o que eu sonego de Imposto de Renda e o que tenho depositado ilegalmente no exterior.
Delegado — E, com tudo isso, o senhor continua roubando galinhas?
Ladrão — Às vezes. Sabe como é.
Delegado — Não sei não, excelência. Me explique.
Ladrão — É que, em todas essas minhas atividades, eu sinto falta de uma coisa. O risco, entende? Daquela sensação de perigo, de estar fazendo uma coisa proibida, da iminência do castigo. Só roubando galinhas eu me sinto realmente um ladrão e isso é excitante. Como agora fui preso, finalmente vou para a cadeia. É uma experiência nova.
Delegado — O que é isso, excelência? O senhor não vai ser preso, não!
Ladrão — Mas fui pego em flagrante pulando a cerca do galinheiro!
Delegado — Sim. Mas é réu primário e com esses antecedentes...
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