quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Violência contra a mulher: o governo compra a briga

Com o surgimento da “Lei Maria da Penha”, aqueles que acreditam que uma lei — fator externo ao ser humano — pode mudar comportamentos e convicções acreditaram que a violência contra a mulher diminuiria. Ledo engano. Ela continua aumentando e o Estado do Pará é um dos campeões de maldade.
Mas é possível que a conjuntura mude, porque os machões estão prestes a ganhar um novo inimigo e, desta vez, um de peso. Veja a notícia abaixo:

Brasil: INSS quer ser ressarcido por quem agride a mulher
Quarta-feira, 08 de agosto de 2012 - 06h07

O INSS  processará os agressores de mulheres, para cobrar o ressarcimento de valores pagos pelo órgão, decorrentes de atos de violência doméstica. O Ministério da Previdência Social também exigirá nos tribunais uma reparação equivalente às despesas com pensões por invalidez ou morte. A medida deve ser aplicada no caso da própria Maria da Penha, que deu nome à lei de proteção às mulheres, há seis anos. No primeiro semestre de 2012, o Ligue 180, telefone para denúncias sobre violência contra a mulher, registrou quase quatrocentos mil atendimentos.
 

Tecnicamente, o INSS está coberto de razão. Se A causa lesões em B, em decorrência das quais o Estado, no caso o sistema de previdência social, foi obrigado a suportar ônus com benefícios diversos, é perfeitamente cabível o que em Direito chamamos de direito de regresso, que consiste, justamente, em fazer o causador do dano ressarcir as despesas suportadas pelo INSS. O que me surpreende, na verdade, é que só tenham pensado em fazer isso agora.

Parabéns pela iniciativa. Antes tarde do que nunca. Infelizmente, preciso lembrar que a maioria dos futuros réus não terão condições de ressarcir os cofres públicos, de modo que o contribuinte continuará pagando a fatura. Por isso, até seria interessante esse aspecto ser mais explorado pelo poder público, como forma de fazer a própria sociedade ter mais interesse em colocar os valentões em seu devido lugar. Se não pelo sentimento de humanidade, ao menos porque o bolso é a parte mais sensível do corpo.


Acréscimo em 7.10.2013:
O projeto de lei continua avançando na Câmara dos Deputados. Veja: 
http://www.conjur.com.br/2013-out-06/comissao-aprova-projeto-obriga-agressor-mulher-indenizar-inss

6 comentários:

Cléoson Barreto disse...

Olá!
Será que o mesmo não poderia ser aplicado aos fumantes? Afinal de contas eles causam a si mesmos um dano que o INSS, e no fim todos nós contribuintes, fumantes ou não, pagamos.
Um abraço.

Yúdice Andrade disse...

Poderia e deveria, Cléoson. O raciocínio é o mesmo. Mas aqui entra uma questão mais grave e difícil de resolver: enquanto uma vítima de violência é alguém que não pediu para sofrer danos, os fumantes escolheram se drogar, mesmo que não tenham escolhido se viciar. Entra em cena, portanto, o sempre complicado tema da autonomia da vontade.
O fato é que, por essa perspectiva, o fumante deveria arcar com as consequências de sua escolha, mas isso não pode implicar em negar-lhe o acesso à saúde - notadamente a pública - que, nos termos da Constituição de 1988 (e só no papel, bem sabemos), é universal.
Resulta daí que o contribuinte continuará pagando a fatura. Nos Estados Unidos, existem precedentes no sentido que mencionas. A indústria tabagista perdeu várias causas, mas ganhou outras e a coisa não está resolvida, mesmo por lá.
Um abraço.

Anônimo disse...

Querido Professor,

tinhas visto esta?

http://www.institutoavantebrasil.com.br/artigos-do-prof-lfg/os-bonitos-ganham-mais-aos-reus-feios-cadeia/

Um abração!

Fernando Bernardo

Yúdice Andrade disse...

Gostei da indicação, Fernando. Eu já li alguma coisa sobre pesquisas do gênero. Triste, não?
Mas é curioso como a notícia parece imediatamente plausível.

Cléoson Barreto disse...

Olá!
Esse é um assunto delicado. As pessoas que sofrem com doenças que não pediram tem que concorrer com pessoas que, muitas vezes, na maioria das vezes eu diria, sabem que estão fazendo mal a si. Acho até injusto essas pessoas concorrerem com as que sofrem com doenças "não provocadas".
De qualquer forma, também me parece injusto negar, ou dificultar de alguma forma, o atendimento aos fumantes. Essa é, pra mim, uma equação de difícil solução.
Talvez a própria indústria tabagista devesse arcar com o custo das doenças provocadas pelo cigarro.

Yúdice Andrade disse...

As primeiras ações que a indústria tabagista perdeu nos EUA foram movidas, justamente, pelo poder público, motivado pelos altos custos de tratamentos decorrentes de doenças do fumo. Depois vieram as ações individuais, mas acredito que hoje uma vitória seria mais difícil. Afinal, a indústria perdia sob o argumento de que, décadas atrás, acrescentava substâncias viciantes no cigarro, para garantir o consumo.
Hoje, diz que, tais substâncias não são mais utilizadas, o que aumenta a responsabilidade individual.