sexta-feira, 2 de março de 2012

Auxílio-reclusão

Já ouvi muita gente  raivosa e obviamente desinformada criticar o auxílio-reclusão, tratando-o como se fosse uma forma de gerar renda para criminosos ou seus familiares, na perspectiva de locupletar-se do próprio delito. Acham um absurdo que o sujeito que delinquiu obtenha proveitos com a própria atitude ou, como dizemos em Direito, que se beneficie da própria torpeza.

Tais críticas, porém, são toscas. Antes de mais nada, o auxílio-reclusão é um benefício previdenciário, assim como o auxílio-doença e o auxílio-acidente. O objetivo não é dar vida boa a malandro, e sim garantir a subsistência de pessoas durante certo período de adversidade. Não se trata de caridade, mas de um direito que o cidadão adquire por fazer parte do sistema de previdência social, isto é, contribuindo para ele. Trata-se, portanto, do resultado de aportes financeiros que os próprios cidadãos fizeram com essa finalidade específica.

A Previdência Social, segundo ela mesma, consiste em "um seguro que garante a renda do contribuinte e de sua família, em casos de doença, acidente, gravidez, prisão, morte e velhice. Oferece vários benefícios que juntos garantem tranqüilidade quanto ao presente e em relação ao futuro assegurando um rendimento seguro. Para ter essa proteção, é necessário se inscrever e contribuir todos os meses."

Além disso, o beneficiário do auxílio-reclusão não é o criminoso, e sim os seus dependentes, que não cometeram crime algum e não podem ser relegados à indigência, para gáudio daqueles que acham que o crime se combate com o extermínio do criminoso e de toda a sua progênie.

A página do Ministério da Previdência Social esclarece que o benefício deve ser pago aos dependentes do segurado, durante o tempo em que este se encontrar cumprindo pena sob os regimes fechado e semiaberto. Ficam excluídas, por conseguinte, as situações de pena cumprida em meio aberto (no caso, regime aberto e livramento condicional). Além disso, o segurado, ora preso, não pode dispor de outra renda, tal como salário da empresa na qual trabalhava, gozo de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço.

Para que o benefício seja devido, é preciso que a reclusão tenha se iniciado num momento em que o indivíduo possuía a condição de segurado. Aqui se observa uma particularidade importante: uma fatia imensa da clientela do sistema penal não exercia nenhuma atividade remunerada; muitos nunca trabalharam com carteira assinada. Sem emprego (ou sem recolhimento como autônomo, o que é ainda menos provável), essas pessoas não chegam a se tornar ou deixam de ser segurados da previdência. Em suma, para muitos milhares de presos, o benefício em questão é simplesmente inalcançável.

Como requisito final, é preciso que o segurado tivesse, ao tempo de sua segregação, salário de contribuição inferior a um teto pré-estabelecido, que desde 1º.1.2012 é de R$ 915,05. Isto restringe os pagamentos aos dependentes de presos que já possuíam uma renda mais baixa, tão somente.

O benefício se estende ao adolescente responsabilizado por ato infracional, sob custódia do tipo internação, com idade entre 16 e 18 anos, já que a Constituição de 1988 não permite trabalho abaixo dos 16.

Concedido o auxílio-reclusão, os beneficiários deverão comprovar que o fato gerador subsiste, a cada três meses, sob pena de suspensão do pagamento. E o direito desaparecerá em caso de fuga ou de transformação da pena prisional em alguma medida a ser cumprida em meio aberto, bem como se o segurado for contemplado com outro benefício ou se o dependente perder essa condição (maioridade, cessação da invalidez ou morte). No caso de morte do segurado, o auxílio-reclusão pode ser convertido em pensão por morte.

Entendemos melhor, agora?

5 comentários:

Anônimo disse...

Habemus monitor!

Maria Cristina Maneschy disse...

Muito legal seu post. Tanta gente não tem idéia do que significa previdência social e associa a isso uma visão estreita sobre a vida em sociedade, na qual não cabem mecanismos de solidariedade social diante dos riscos da existência. Mesmo sem se darem conta, defendem uma visão puramente darwiniana, do salve-se quem puder, por si e, se cair no caminho (por exemplo, ter a renda familiar rompida por reclusão do provedor do lar), que se vire sozinho ou dependa da compaixão dos próximos - ou da periódica ajuda em época de elição. E olha que nossas proteções sociais são tão limitadas, dependem de tantas provas de necessidade, como você muito bem informa no caso do auxílio-reclusão. A incorporação da noção de direito social é um processo complexo, o que tem a ver, pelo menos em parte, com a exclusão cotidiana do usufruto desses direitos.

Luiza Montenegro Duarte disse...

Ai, Yúdice, obrigada pelas palavras! Vou compartilhar imediatamente! Também não aguento esse tipo de comentário!

Daniel Scortegagna disse...

a história do auxílio-reclusão volta e meia chega por e-mail..... sempre que chega em mim eu respondo explicando direitinho, pensando um dia em me livrar, pelo menos, deste spam, fazendo o que posso: esclarecendo... mas parece que não dá certo!!! a partir de hj vou mandar o link desta sua postagem!!
abraços

Yúdice Andrade disse...

Folgo em saber que o texto ajudou. No caso do Daniel, ajudou mais diretamente!
Abraços.