terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

A homenagem da Imperatriz e o alheamento dos paraenses

Talentosa e experiente, Fafá de Belém soube impor sua
presença e gerou uma bela imagem do desfile.
Não vi o desfile da Imperatriz Leopoldinense, o que não deve surpreender ninguém, considerando que não gosto de carnaval e desfiles de escolas de samba me entediam em pouquíssimos minutos. Para ser bem sincero, devo ter sido o último ser humano a saber que, este ano, a escola iria homenagear o Estado do Pará. Isso ocorreu apenas semana passada, devido ao fato de que uma amiga viajou para participar do desfile.

Sendo paraense e sinceramente preocupado em ver dignidade no meu torrão natal e em meu povo, reconhecida por toda parte, não me empolguei com a novidade, pela única razão de que homenagens a cidades e a Estados, no carnaval, originam-se tão somente na força da grana que ergue e destroi coisas belas. O objetivo das escolas é obter um financiador público generoso, que encontrará uma rubrica orçamentária para justificar a aplicação do dinheiro do contribuinte em um espetáculo nada popular, ao contrário do que dizem os ingênuos e deslumbrados, em vez de empregá-lo em algo que pudesse melhorar as condições de vida por estas bandas.

Sei que minhas palavras serão tomadas até como clichê; como a inclinação permanente de muitos de falar mal; como despeito de quem se irrita em ter que aturar o carnaval totalizante a cada passo que dá. Que seja um clichê, é também verdade. Eu ficaria felicíssimo e honrado com a homenagem, se ela fosse espontânea e desinteressada; se ela expressasse apenas o reconhecimento de que o Pará está despontando no país. Em vez disso, a escola escolheu um enredo falando de um assunto que, para o Centro-Sul Maravilha, ainda é pitoresco, mas que ganhou visibilidade em 2012. Assim, reúne-se o curioso, mas que pode ser reconhecido pelo cidadão comum, e que vale patrocínio público.

Uma índia es-pe-ta-cu-lar.
Para os políticos, é uma mão na roda. Um velho governo inoperante ganha a oportunidade de escamotear sua inércia fazendo algo que os paraenses adoram: o papo furado de que o nome do Pará foi levado longe para... Para o quê, mesmo? Sejamos francos: agora que o desfile acabou e o circo se foi, ficou ao menos algum pão? Estrangeiros maravilhados com o desfile vão nos procurar para investimentos? A tal promoção de nossa cultura vai tirar milhares e milhares de pessoas da pobreza?

Também conheço antecipadamente a resposta para o que acabei de dizer: precisamos de um momento de alegria para dar um tempo no trabalho, na cabeça quente, nos problemas e blá-blá-blá. Precisamos de um instante de esquecimento. Até concordo com isso, juro. Só não acho que esse esquecimento devesse custar dinheiro público. Principalmente para custear o camarote 800 da Sapucaí, no qual um bando de picaretas e seus ilustríssimos convidados, todos de elite, foram sambar, comer e beber do bom e do melhor, com o nosso dinheiro. Mas, claro, foi um sacrifício em nome de levar longe o nome e a cultura do nosso Estado. Coitadinhos. Tão abnegados!

Eu ficaria feliz se, ao menos, todo esse investimento redundasse numa vitória da Imperatriz Leopoldinense, a fim de que ganhássemos mais uns dias de visibilidade, antes de voltarmos ao ostracismo. E se o ano começa depois do carnaval, que comece para valer no que tange ao governo estadual, que ainda não mostrou a que veio, já que continuamos no grupo mais baixo dentre os Estados, nos quesitos IDH, educação e segurança pública, além de não conseguirmos dar um passo em prol da solução de problemas, crônicos, como os fundiários.

Voltei ao meu clichê, eu sei. Mas você quer mesmo saber o que é clichê? Quer? Então aguarde a campanha eleitoral do próximo ano. Fafá de Belém, por sinal tucana de coração, e aquela índia gostosona despontando na propaganda do PSDB, exatamente como anos atrás aconteceu com o enredo sobre os caruanas, que ganhou até uma versão jingle patética. Aguardem e depois me digam se eu é que fui óbvio de doer.

5 comentários:

Anônimo disse...

Sabe aquela história do pinto no lixo...?
Vou passar o resto do ano meditando sobre os benefícios que o carnaval e o desfile da Imperatriz nos trouxe (embora não tenha perdido meu sono). A única certeza que se tem é que chegamos à catarse popularesca quando se deixa de esquentar a barriga no fogão, esfriar no tanque e subir num carro alegórico para o mundo inteiro ver. Pode até ser que seja legal ser assim, mas tem que ter talento para tal, a exemplo da Fafá (a talentosa intérprete que um dia não queria mais ser de Belém, aí viu que não ia vender disco e voltou atrás, não sem antes alegar que foi Nossa Senhora que assim quis).
Os políticos se servem dessa falta de consciência do populacho sobre os meios de persuasão e apelam para o lado emocional. Afinal, sem identidade não há popularização, não se vende nada, ainda que seja alguma imagem persuasiva de que se é melhor que algo ou alguém.
Paraensismo é soberba. E não existe nada mais idiota que soberba de pobre, de pinto ciscando no lixo.
E como se defender de tudo isso? Ora, desligando a TV e aproveitando o ócio para ler um livro ou assistir a um filme. Prefiro algo mais autêntico que ficar venerando uma índia gostosona, que provavelmente nem é índia, e que está fora de meu alcance ou interesse sexual. Isso é coisa de adolescente de mão calejada.
O dia em que o Brasil não parar uma semana inteira para ver uma festa patrocinada por quem quer ver um povo inteiro alienado no próprio lixo, seremos realmente desenvolvidos.

Fred

Yúdice Andrade disse...

De índia a moça não tem nada, Fred. Justamente por isso ela era destaque no carro alegórico.
Mais uma vez, pelo visto, temos uma visão semelhante do episódio.

Anônimo disse...

Ah, Yúdice, e ainda tem um detalhe: tu não achas que tá estranha essa bandeira do Pará da Fafá? Não estaria de cabeça pra baixo?

Fred

Anônimo disse...

E acrescento : alguém consegue imaginar que os milhares de reais - ou terão sido milhões ? - gastos nessa propaganda trarão turistas ao belo Pará?

Alguém imagina que com o enredo daquela outra escola - sobre Cuiabá - alguém irá até lá , ou até a Coreia?

É nesse "incentivo à cultura" que se vão os dinheiros públicos. No Distrito Federal, os deputados distritais canalizaram R$ 95,98 milhões em emendas parlamentares para festas, campeonatos e comemorações, para 2013.

E sabem quanto para saúde, educação e transportes? Nem a metade daquele valor. Foram R$ 40,65 milhões para as 3 áreas.

No Pará não deve ser diferente.

E por que tudo isso? Porque é nessa seara que reina a malandragem-mãe, com a contratação de artistas para as comemorações, para as inaugurações de hospitais(como os R$ 600 mil para a Ivete inaugurar um hospital), de pontes, de buracos, de placas de rua, etc, etc.

Quem consegue definir um cachê justo? Um show de membro da máfia do dendê vale R$ 100 mil ou R$ 200 mil? Quem decide, quem resolve?

É por isso que existe essa orgia de "shows gratuítos" para a população. Deveria ela saber que aqueles R$ 600 mil que foram pagos à axezeira bem poderiam bancar a contratação de 2 ou 3 médicos por 1 ou 2 anos.

Mas acho que, infelizmente, o povo quer é circo, ainda que com péssimos atores.

E o gozado é que os palhaços estão fora dele!!!

Kenneth Fleming

Anônimo disse...

Uma correção: não foste o último a saber; eu o soube agora.
Anna