Talentosa e experiente, Fafá de Belém soube impor sua presença e gerou uma bela imagem do desfile. |
Sendo paraense e sinceramente preocupado em ver dignidade no meu torrão natal e em meu povo, reconhecida por toda parte, não me empolguei com a novidade, pela única razão de que homenagens a cidades e a Estados, no carnaval, originam-se tão somente na força da grana que ergue e destroi coisas belas. O objetivo das escolas é obter um financiador público generoso, que encontrará uma rubrica orçamentária para justificar a aplicação do dinheiro do contribuinte em um espetáculo nada popular, ao contrário do que dizem os ingênuos e deslumbrados, em vez de empregá-lo em algo que pudesse melhorar as condições de vida por estas bandas.
Sei que minhas palavras serão tomadas até como clichê; como a inclinação permanente de muitos de falar mal; como despeito de quem se irrita em ter que aturar o carnaval totalizante a cada passo que dá. Que seja um clichê, é também verdade. Eu ficaria felicíssimo e honrado com a homenagem, se ela fosse espontânea e desinteressada; se ela expressasse apenas o reconhecimento de que o Pará está despontando no país. Em vez disso, a escola escolheu um enredo falando de um assunto que, para o Centro-Sul Maravilha, ainda é pitoresco, mas que ganhou visibilidade em 2012. Assim, reúne-se o curioso, mas que pode ser reconhecido pelo cidadão comum, e que vale patrocínio público.
Uma índia es-pe-ta-cu-lar. |
Também conheço antecipadamente a resposta para o que acabei de dizer: precisamos de um momento de alegria para dar um tempo no trabalho, na cabeça quente, nos problemas e blá-blá-blá. Precisamos de um instante de esquecimento. Até concordo com isso, juro. Só não acho que esse esquecimento devesse custar dinheiro público. Principalmente para custear o camarote 800 da Sapucaí, no qual um bando de picaretas e seus ilustríssimos convidados, todos de elite, foram sambar, comer e beber do bom e do melhor, com o nosso dinheiro. Mas, claro, foi um sacrifício em nome de levar longe o nome e a cultura do nosso Estado. Coitadinhos. Tão abnegados!
Eu ficaria feliz se, ao menos, todo esse investimento redundasse numa vitória da Imperatriz Leopoldinense, a fim de que ganhássemos mais uns dias de visibilidade, antes de voltarmos ao ostracismo. E se o ano começa depois do carnaval, que comece para valer no que tange ao governo estadual, que ainda não mostrou a que veio, já que continuamos no grupo mais baixo dentre os Estados, nos quesitos IDH, educação e segurança pública, além de não conseguirmos dar um passo em prol da solução de problemas, crônicos, como os fundiários.
Voltei ao meu clichê, eu sei. Mas você quer mesmo saber o que é clichê? Quer? Então aguarde a campanha eleitoral do próximo ano. Fafá de Belém, por sinal tucana de coração, e aquela índia gostosona despontando na propaganda do PSDB, exatamente como anos atrás aconteceu com o enredo sobre os caruanas, que ganhou até uma versão jingle patética. Aguardem e depois me digam se eu é que fui óbvio de doer.
5 comentários:
Sabe aquela história do pinto no lixo...?
Vou passar o resto do ano meditando sobre os benefícios que o carnaval e o desfile da Imperatriz nos trouxe (embora não tenha perdido meu sono). A única certeza que se tem é que chegamos à catarse popularesca quando se deixa de esquentar a barriga no fogão, esfriar no tanque e subir num carro alegórico para o mundo inteiro ver. Pode até ser que seja legal ser assim, mas tem que ter talento para tal, a exemplo da Fafá (a talentosa intérprete que um dia não queria mais ser de Belém, aí viu que não ia vender disco e voltou atrás, não sem antes alegar que foi Nossa Senhora que assim quis).
Os políticos se servem dessa falta de consciência do populacho sobre os meios de persuasão e apelam para o lado emocional. Afinal, sem identidade não há popularização, não se vende nada, ainda que seja alguma imagem persuasiva de que se é melhor que algo ou alguém.
Paraensismo é soberba. E não existe nada mais idiota que soberba de pobre, de pinto ciscando no lixo.
E como se defender de tudo isso? Ora, desligando a TV e aproveitando o ócio para ler um livro ou assistir a um filme. Prefiro algo mais autêntico que ficar venerando uma índia gostosona, que provavelmente nem é índia, e que está fora de meu alcance ou interesse sexual. Isso é coisa de adolescente de mão calejada.
O dia em que o Brasil não parar uma semana inteira para ver uma festa patrocinada por quem quer ver um povo inteiro alienado no próprio lixo, seremos realmente desenvolvidos.
Fred
De índia a moça não tem nada, Fred. Justamente por isso ela era destaque no carro alegórico.
Mais uma vez, pelo visto, temos uma visão semelhante do episódio.
Ah, Yúdice, e ainda tem um detalhe: tu não achas que tá estranha essa bandeira do Pará da Fafá? Não estaria de cabeça pra baixo?
Fred
E acrescento : alguém consegue imaginar que os milhares de reais - ou terão sido milhões ? - gastos nessa propaganda trarão turistas ao belo Pará?
Alguém imagina que com o enredo daquela outra escola - sobre Cuiabá - alguém irá até lá , ou até a Coreia?
É nesse "incentivo à cultura" que se vão os dinheiros públicos. No Distrito Federal, os deputados distritais canalizaram R$ 95,98 milhões em emendas parlamentares para festas, campeonatos e comemorações, para 2013.
E sabem quanto para saúde, educação e transportes? Nem a metade daquele valor. Foram R$ 40,65 milhões para as 3 áreas.
No Pará não deve ser diferente.
E por que tudo isso? Porque é nessa seara que reina a malandragem-mãe, com a contratação de artistas para as comemorações, para as inaugurações de hospitais(como os R$ 600 mil para a Ivete inaugurar um hospital), de pontes, de buracos, de placas de rua, etc, etc.
Quem consegue definir um cachê justo? Um show de membro da máfia do dendê vale R$ 100 mil ou R$ 200 mil? Quem decide, quem resolve?
É por isso que existe essa orgia de "shows gratuítos" para a população. Deveria ela saber que aqueles R$ 600 mil que foram pagos à axezeira bem poderiam bancar a contratação de 2 ou 3 médicos por 1 ou 2 anos.
Mas acho que, infelizmente, o povo quer é circo, ainda que com péssimos atores.
E o gozado é que os palhaços estão fora dele!!!
Kenneth Fleming
Uma correção: não foste o último a saber; eu o soube agora.
Anna
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