A partir de hoje, com a publicação e vigência da Lei n. 12.590, de 9.1.2012, "ficam reconhecidos como manifestação cultural a música gospel e os eventos a ela relacionados, exceto aqueles promovidos por igrejas". Claro que a bancada evangélica no Congresso Nacional não tem nada a ver com isso.
Detalhe: a lei sob comento incluiu a novidade no texto da Lei n. 8.313, de 23.12.1991, que não é outra senão a famosa "Lei Rouanet", que disciplina o Programa Nacional de Apoio à Cultura, criando mecanismos para que os realizadores acessem recursos financeiros para as suas produções. Assim, ao menos em tese, ficará mais fácil conseguir patrocínio para eventos religiosos, desde que não sejam realizados oficialmente por uma igreja. Caso a igreja se associe a uma produtora, p. ex., não haverá obstáculos.
Conseguir patrocínio neste país já é difícil. Agora que o dinheiro pode migrar mais facilmente para certos setores organizados e com mandatos políticos, pode ficar ainda mais complicado.
Escrevo esta postagem porque conheço, por razões familiares, as dificuldades extremas e aviltantes para se promover cultura neste país e particularmente neste Estado. O poder público e a iniciativa privada não têm interesse na cultura; só em moedas de troca. Já falamos sobre isto antes aqui no blog. Mas o gospel está crescendo, mesmo. Tanto que a Rede Globo, sempre umbilicalmente ligada à Igreja Católica, exibiu um evento do gênero em dezembro e colocou uma das mais famosas cantoras do estilo em plena "Festa da Virada". Ou seja, a coisa dá audiência e dinheiro, por isso a Velha Senhora passou a promover o que antes parecia desprezar. Por sinal, o mesmo que está fazendo com essa porcaria de UFC.
Ah, sim, eu não gosto de música gospel. Não gosto nem do cacófato que se forma quando pronunciamos tal expressão. A música sacra, aquela produzida há três séculos ou mais, é um dos meus estilos favoritos. Mas gospel não me desce. E por mais alguém tenha dificuldade em separar o artístico do religioso, como eu separo, posso lhes dizer que não é por causa da temática. Afinal, também eu sou cristão e acho importante louvar a Deus, inclusive por meio de um estilo musical específico, como fazia Bach, um de meus compositores prediletos. Não gosto de gospel pela qualidade, mesmo. Acho as letras pobres e os arranjos melodramáticos, sem falar que o povo canta como se estivesse levando uns choques elétricos de vez em quando.
Se a questão é professar uma religião através da música, vou das missas de Mozart, mesmo. Nelas, ninguém grita no meu ouvido.
7 comentários:
Yúúúúúúúúúdice, você falou exatamente o que eu penso!!!
Caramba!!!
Eu sou ateia, mas admiradora incondicional das músicas sacras!!!
Música gospel, desculpe-me os fãs do estilo, eu coloco na mesma categoria de axé e afins. Eca...
Música gospel virou atalho pra artista fora da mídia se promover.O que importa é continuar aparecendo.A qualidade do produto não interessa.
Ana e das 15h55, para ratificar a impressão que esbocei, existe essa coisa de fazer gospel em ritmo de axé, funk, metal, etc. Uma estratégia para arrebatar fieis que me incomoda profundamente.
Aí me vem o tal de Belo e grava com o Pe. Fábio de Mello, literalmente para se autopromover. Não é o estilo dele. Qual o sentido de pegar uma canção religiosa famosíssima e regravar. Com certeza não é louvar a Deus.
Só discordo da afirmação de que a Globo como umbilicalmente ligada à Igreja Católica. Afinal, a programação da Globo não tem nada de católica. O que pode haver é um certo boicote da Globo à igreja evangélica por causa do Edir Macedo.
Se bem que agora a Globo tenta investir nesse nicho numa suposta aliança com o pastor Silas Malafaia, arqui-inimigo do Edir.
A vinculação entre a Globo e a Igreja Católica não tem nada a ver com o conteúdo da programação, Victor - embora a "Santa Missa em seu Lar" tenha sido exibida por anos a fio e até hoje seja exibida a Missa do Galo, direto do Vaticano. Mas não se trata de conteúdo, e sim de política.
A Globo sempre esteve associada ao que havia de mais reacionário na sociedade brasileira, desde que fossem grupos no poder. Daí sua vinculação umbilical, como escrevi, aos governos militares, que tanto defendeu, e à Igreja, que por sua vez também possuía um chamego imenso com o poder secular. Lembre que o jogo no Brasil foi proibido por causa da carolice da esposa do presidente Gaspar Dutra. Lembre episódios como a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em 1964. Havia setores progressistas na Igreja, que se opunham a esse movimento, mas bem sabemos o que acontece quando um católico tenta ser progressista.
Enfim, meu amigo, foi nesse sentido que me manifestei.
Lembrei de ti ontem. É que fomos a um concerto da Orquestra Jovem Vale Música e vi uma aplicação realmente interessante da Lei Rouanet.
O evento era pela comemoração dos dois anos da Orquestra. Esse é o tempo funcionamento, porque o projeto é desenvolvido há sete anos.
A empresa poderia simplesmente patrocinar alguns eventos culturais, mas investiu em um trabalho duradouro e que proporciona inclusão social a centenas de crianças que, em outro cenário, estariam em situação de risco.
Há sete anos, se iniciou o trabalho com o coral, com crianças bem pequenas, introduzindo nelas a musicalidade. Depois, elas escolheram instrumentos de seu interesse para aprender, até ter idade e habilidade suficientes para integrar a Orquestra (composta por jovens entre 14 e 18 anos).
Hoje, o grupo todo conta com mais de 100 crianças e adolescentes, desde os 5 anos de idade, que passam pelas diversas etapas até o grupo principal.
Os treinamentos incluem peças brasileiras e paraenses, além de outras internacionalmente conhecidas, muito utilizadas pelas maiores orquestras do mundo, para que esses meninos tenham chance de pleitear empregos em orquestras profissionais.
O grupo viaja pelo Brasil e alguns solistas já foram inclusive premiados fora do Estado. Nas apresentações aqui, suas famílias ganham ingressos para ir ao teatro e são introduzidas na música clássica.
Assim, o projeto: a) regasta crianças de situações de risco; b) promove uma elevação do nível cultural das suas famílias; c) cria as bases para uma orquestra local adulta, que é o objetivo declarado da empresa; d) oferece uma profissão aos jovens, que é o principal. Neste ano, 10 membros foram aprovados no vestibular de música da UFPA.
Essa foi a terceira apresentação que assisti e, apesar de completamente leiga, é possível perceber a evolução, como a inclusão de solistas próprios, que antes eram músicos convidados.
Por fim, devo dizer que mesmo não tendo predileção pela música clássica, ou vontade de escutá-la em casa ou no carro, por exemplo, tenho que dizer que, no teatro, não há nada mais bonito.
Segue um vídeo, pra conheceres um pouco mais: http://www.fundacaovale.org/pt-br/multimidia/Paginas/orquestra-jovem-vale-musica-se-apresenta-no-theatro-da-paz.aspx?Pagina=0
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