Ao final, a presidenta Dilma Rousseff vetou um artigo do projeto e, com ele, jogou todo o esforço no lixo. Na prática, a repartição das receitas ficará do jeito que sempre esteve: Rio de Janeiro e Espírito Santo continuarão bamburrando, a União morderá o seu naco gigantesco e o restante, menos da metade (49%), será dividido de modo que o restante do país ficará apenas com um cheirinho dos benefícios.
(Para entender minimamente a questão, leia aqui.)
Inevitável tentar entender o ocorrido numa perspectiva mais ampla. Não podemos elitizar o Rio de Janeiro pura e simplesmente, porque se fosse somente por isso São Paulo é que teria o quinhão mais generoso. Nos subterrâneos do jogo político, o que me vem à mente é o fato de que o Rio é governado desde 1º de janeiro de 2007 por Sérgio Cabral, um dos mais famosos quadros atuais do PMDB, partido agora amigo de primeira infância do PT, que governa o país há três mandatos presidenciais. A ligação entre os dois partidos é umbilical, o que explica o vice-presidente atual ser Michel Temer e Sarney ser presidente do Senado, e portanto do Congresso Nacional, desde... desde... sei lá, desde sempre.
Na conjuntura presente, não haveria a menor chance de o Rio de Janeiro perder dinheiro. Não se trata apenas do fato de que não há nada que o PMDB preze mais do que uma boa boquinha. Trata-se de manter o equilíbrio entre os dois partidos mais poderosos do país: o PT, de direito, porque à frente do governo federal; e o PMDB, de fato, porque dá as cartas para tudo e todos dependem dele para alcançar a tal governabilidade - hoje a grande desculpa para as maiores safadezas de que já tivemos notícia.
Em suma, o dinheiro continua com o Rio de Janeiro, não por causa dos cariocas, mas do PMDB.
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A desculpa para a distribuição desigual dos royalties tem um fundamento baseado em ideias de justiça: o Estado que sofre os prejuízos da exploração mineral tem o direito de receber maiores benefícios. Afinal, é ele que está sujeito a danos ambientais e problemas sociais decorrentes da atividade econômica. Que seja. Também é verdade que esse Estado já lucra com impostos e empregos gerados. Mas tudo bem, eu realmente considero justo que um Estado produtor ganhe uma fatia maior.
O que eu não entendo, jamais entendi e tenho sérias dúvidas se um dia entenderei, é porque o Pará nunca lucrou particularmente com a exploração mineral. Ouro, bauxita, manganês, estanho, calcário e a maior jazida de ferro do mundo estão aqui. Nenhum outro Estado brasileiro chega perto em matéria de exploração mineral, afora o petróleo. E reza a lenda que existe petróleo em nosso litoral também, mas por alguma obscura razão a Petrobras decidiu suspender do dia para a noite a prospecção da costa de Salinas. Teorias conspiratórias à parte, fiquei com a sensação de que o governo sabe desse tesouro submerso, mas só vai explorá-lo no futuro, quando não houver mais como fazer a festa com os mano carioca.
O Pará tem ficado com os buracos da indústria mineradora. Danos ambientais gravíssimos e não reparados se somam aos dramas sociais: onde aparece um garimpo, ali surge um povoado miserável, dominado pela violência, prostituição, exploração infantil, trabalho escravo. As mazelas vão se acumulando e não há, nessa hora, royalties que cheguem para nos dar algum alento. O tratamento é diferenciado demais. Enquanto isso, a estrada de ferro e o porto vão para o Maranhão, mesmo sendo técnica e estrategicamente mais viável fazê-los no Pará. É que no Maranhão o lucro poderá ser mamado pelo clã de bigode. Aqui, não temos bigodes eficientes. Nem carecas barbados eficientes. Nem olheiras eficientes. Nem companheiras eficientes. Nem bancadas parlamentares que prestem.
Em suma, o Rio de Janeiro fica com o dinheiro. E o Pará, com os buracos.