Onde quer que haja uma situação econômica um pouco mais favorável, é para lá que se dirigem os que necessitam sobreviver e outros tantos que, embora não movidos pela necessidade, assim preferem. A dinâmica dos fluxos migratórios internos e internacionais surge muito espontaneamente em meio às contingências econômicas e políticas. Resulta daí que a grave crise econômica mundial e outros fatores têm redesenhado a geopolítica global nos últimos anos: o Brasil melhorou, menos do que deveria, mas a olhos vistos, ao mesmo tempo em que a conjuntura nos países ricos passou a ser de instabilidade, quando não de sufoco real. Que o digam Grécia e Espanha, dentre outros.
Resulta daí que o Brasil está cada vez mais atrativo para estrangeiros. Paralelamente a isso, está cada vez mais evidente que o nosso país, por nunca ter investido seriamente em educação, colhe agora os frutos de sua desídia (burrice seria melhor): faltam trabalhadores qualificados para vários setores. Esse diagnóstico já levou o Ministério da Educação, outras instituições públicas e até mesmo a iniciativa privada a criar estratégias de fomento à formação de engenheiros e demais profissionais de tecnologia, p. ex.
No entanto, formar um profissional demanda tempo e as carências do país não podem esperar. Ciente disso, a presidência da República deu a ordem: quer regulamentação para a política imigratória do Brasil. Para tanto, designou uma comissão de especialistas, que deve apresentar sua proposta no começo do próximo ano. A nova política precisa ter um ingrediente muito particular: facilitação do ingresso de estrangeiros qualificados. Ninguém quer saber de gente vindo disputar vagas de ajudante de pedreiro por aqui, até porque já temos brasileiros demais dependendo desse setor, mas nos andares superiores da educação formal a ajuda é mais do que bem vinda. O governo conhece as necessidades internas, sabe como enfrentá-las mas não conta com nacionais suficientes para isso.
Não se trata de uma decisão surpreendente: ela é racional e utilitarista. Mas se torna uma política oficial discriminatória em si mesma, o que pode ensejar reflexões éticas. A começar pelo fato de que o princípio da igualdade, um dos pilares em que se assenta o ordenamento constitucional brasileiro, é assegurado "aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País" (art. 5º, caput, da Constituição de 1988; grifei). Logo, declaradamente, não temos nenhum compromisso com os alienígenas.
Uma coisa me angustia: o brasileiro, cantado em verso e prosa como gentil, acolhedor e hospitaleiro ("aham, senta lá, Cláudia"), sabe ser bem cruel. Os preconceitos de origem são fortes aqui dentro. Quando os empregos bem remunerados começarem a ir para estrangeiros, nós nos tornaremos também uma nação xenófoba à moda europeia?
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