Tenho três prazos para cumprir para a próxima segunda-feira, no mestrado. Entre eles e eu, mora um abismo no qual se esparrama a minha terrível dificuldade de concentração. E não adianta botar a culpa na internet e outras tecnologias de comunicação: é coisa minha, mesmo. Quando criança, numa era pré-internet, eu já era intensamente dispersivo.
Quando ando na rua, olho as pessoas, os letreiros, as fachadas, os cantos obscuros. Tudo pode me chamar a atenção; o problema é que ao mesmo tempo.
No meio de uma frase, conversando com qualquer pessoa sobre qualquer assunto que seja, inclusive os mais importantes, posso me interromper sem mais nem menos e disparar um comentário sobre algo que passou pelos meus olhos de repente. Na maioria dos casos, consigo retomar o que dizia antes, mas nem sempre. Minha esposa ainda se incomoda com essa minha característica, embora já devesse estar acostumada.
Durante uma aula, posso interromper qualquer explicação importante para declarar minha percepção da roupa, do penteado ou de alguma atitude de um aluno ou aluna. Para a alegria das mulheres, sou do tipo que percebe mudanças no cabelo ou detalhes colocados para impressionar. Estudar um pouco antes de entrar em sala é um recurso que me ajudar a manter o foco e não transformar o desvio num desastre acadêmico.
Enfim, meus dedos correm o teclado com alguma rapidez, mas sempre tem um passarinho pousando na sacada, uma árvore farfalhando ao longe, um som diferente. Aí o pensamento voa, o corpo reclama, não quer ficar sentado diante do computador por mais do que uns poucos minutos. Paro a fim de tomar água, olhar o relógio, consultar alguma coisa (que poderia ser postergada), vejo o que minha filha está fazendo, folheio uma revista — cedo, enfim, a qualquer influência marota, inclusive a internet, que está lá, à disposição na mesma máquina. Só não cedo à televisão. Programas de televisão não me desencaminham: só assisto a eles quando me decido a fazer isso, especificamente.
Entre idas e vindas, passei o dia hoje diante deste computador, lendo e escrevendo, consultando e redigindo, corrigindo e especulando. Ainda falta um bocado, mas meu cérebro se recusa a prosseguir. Sabe que são muitas horas oficialmente dedicadas à mesma atividade, portanto ele se rendeu. Quer algumas horas de repouso e alheamento, para amanhã recomeçar consultando o texto escrito por mim, de ponta a ponta, a fim de verificar a sua coerência e homogeneidade. Aí entra o segundo fator problemático: o texto precisa ser perfeito. E não pode ser amanhã, não: ele tem que nascer irrepreensível. Vê-lo capenga me provoca ansiedade.
Mentalmente cansado, vou capitular. Mas já sei que acordarei novamente às seis da manhã, sem qualquer despertador, acionado pelo brotar de uma frase pronta dentro da cachola. Tem sido assim.
Que vida estranha esta que tenho levado...
2 comentários:
kkkkkkkkkkkkkkkkkkk, adorei, me acha um ET, agora sei que não sou a única com dificuldade de manter o foco. Manda ver no mestrado, adoro suas postagens. abraços e bom 2013, cheio de sucessos.
Certamente não somos os únicos. Muito pelo contrário. O que mais me angustia é querer manter o foco e não conseguir. E como sou de uma geração em que não havia esse papo de déficit de atenção e hiperatividade, nem sequer posso me esconder atrás dessa desculpa!
Muito agradecido pelo apoio e pela gentil avaliação das minhas postagens. Um ótimo 2013 para nós.
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