Na madrugada de sexta-feira, minha mãe passou mal. Agora nós sabemos que ela estava com níveis baixíssimos de glicose e sinais de infecção, o que provocou um desequilíbrio metabólico. A consequência disso foi que ela se levantou da cama surtada, completamente desorientada. Não falava coisa com coisa, repetia frases sem sentido, e alternava esses momentos de agitação com outros nos quais nos encarava de um jeito estranhíssimo, parecia lenta e distante, e demorava a responder aos nossos comandos.
Atônitos, imaginamos que poderia ser um AVC ou um processo de doença demencial. Foi um desespero. No hospital, o médico considerou todo o histórico que eu e meu irmão lhe fornecemos na anamnese e rejeitou a primeira hipótese (mas pediu uma tomografia para confirmar, por cautela), admitindo entretanto a segunda. Contudo, para ele os sinais apontavam para uma descompensação metabólica, prognóstico pelo qual passamos a torcer, porque era o único que nos permitiria ter nossa mãe de volta. Graças a Deus, era isso mesmo e, após receber glicose injetável, em poucos minutos ela foi voltando a si.
Ficamos algumas horas no hospital aguardando os resultados dos exames laboratoriais e, com base neles, o médico arriscou um palpite, que precisa ser checado em consultas posteriores, já com os profissionais que cuidam dos diversos problemas médicos de nossa mãe. Há alguns dias, ela começou a tomar um medicamento novo para diabetes, chamado Trayenta. O médico examinou a bula e disse que pode ser que este medicamento tenha levado a uma perda de açúcar que, no quadro de minha mãe, portadora de insuficiência renal, geraria uma combinação infeliz. Por cautela, mandou suspender o Trayenta até a nova consulta com a endocrinologista que o receitou.
Longe de mim levantar falsos, até porque advoguei para o Sindicato dos Médicos e vi como eles são acusados de mundos e fundos, injustamente. Mas só eu e meu irmão sabemos o terror que passamos naquela madrugada, por isso me permito compartilhar minha irresignação.
Trayenta é uma droga nova no mercado, por isso muitos médicos nem o conhecem (como o que nos atendeu, p. ex.) e não há maiores informações sobre os seus efeitos, além daquelas que o fabricante quer que sejam conhecidas. Além disso, custa caro. Já escrevi outras vezes aqui no blog sobre meu horror à indústria farmacêutica, uma das mais calhordas e criminosas do mundo. Então me ocorreu: será que a endocrinologista (que não sei quem é) recebeu a visitinha daqueles tipos odiosos (os representantes), que vivem puxando o saco, dando presentes e comodidades aos médicos, oferecendo inscrições em congressos, pagando almoços, etc. — propina, eu chamaria —, para que os seus produtos sejam prescritos aos pacientes, mesmo que caros e não sejam exatamente os mais recomendáveis à necessidade do paciente?
Como pacientes, eu e pessoas de minha família já recebemos recomendação de tomar medicamentos inócuos, já fomos orientados para farmácias de manipulação e laboratórios específicos, ou seja, instruções altamente direcionadas, que acolhemos de boa fé pela pressuposição ingênua de que o médico só nos pediria o que fosse melhor para nós. Ledo engano. Certa vez, meu irmão entrou na farmácia recomendada e deparou com o médico lá: o estabelecimento pertencia a sua família.
Insisto que isto é apenas uma suposição, mas é algo a ser considerado. Por isso digo a todos: quando receberem prescrições e demais orientações médicas, perguntem o porquê de tudo. Principalmente se lhes impuserem alguma novidade. A informação completa e correta é direito inalienável do paciente.
No mais, quero deixar registrados os nossos agradecimentos ao médico Olávio Silva Neto, que nos atendeu com grande solicitude e interesse, acertou o diagnóstico e tirou nossa mãe da crise.
3 comentários:
Yúdice, estou por perto. Sabes que podes sempre contar comigo.
Estimo melhoras para sua mamãe.
Ab
Fred
Mais uma vez, Fred, meus melhores agradecimentos. Felizmente, eu estava perto e acessível, por isso consegui socorrê-la com rapidez e dispunha do meu irmão junto!
Ela já está bem.
Yúdice, no contexto atual da medicina, uma das poucas vantagens de ser médico é saber escolher qual o colega de profissão vai cuidar dos membros da sua família.
Um abraço.
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