- a primeira, ideológica, na qual se destaca o seu discurso ético, cidadão, questionando um país onde os mais pobres, que sustentam o Estado com seus impostos, ficam relegados a serviços públicos de péssima qualidade, enquanto os afortunados gozam de regalias sem fim. Nada de inédito nos argumentos. Mas também nada de equivocado. Sou forçado a concordar.
- a outra, dogmática, pede que Márcio Thomaz Bastos seja também investigado, porque provavelmente cometeu crime. Duas seriam as opções: lavagem de dinheiro ou receptação.
A premissa do procurador é indiscutível: Carlos Cachoeira não tem como justificar rendimentos lícitos suficientes para suportar os honorários do defensor, que a grande imprensa diz serem da ordem de 15 milhões de reais. Não há confirmação acerca desse valor, mas também não há desmentido. E considerando a lógica do mercado, somos levados a crer que a coisa gira por aí, mesmo.
Obviamente, Cachoeira dispõe do dinheiro. Só não pode confirmar sua origem, o que concreta e objetivamente sugere a ilicitude dos recursos. Diante desta premissa, urge perguntar: receber honorários, nesta hipótese, constituiria crime?
O imbróglio criado por Manoel Pastana está longe de ser mero devaneio. A meu ver, o melhor argumento em favor de Márcio Thomaz Bastos é sustentar a atipicidade de eventual conduta criminosa, porquanto o advogado não está auxiliando a prática de crime, mas tão somente exercendo o seu munus de defender o acusado, que é a razão de ser da função advocatícia. Poderíamos alegar, assim, exercício regular de direito, que exclui a ilicitude, invocando até mesmo a Constituição como suporte. Em suma, se todo acusado deve ser defendido e se é vedado o trabalho gratuito (normas constitucionais), deve o defensor ser remunerado por seu trabalho, não lhe sendo exigível questionar a origem dos recursos. Fosse por isso, nenhum traficante poderia ter advogado particular.
Se aplicássemos a teoria da imputação objetiva, poderíamos acrescentar que o advogado que se limita a cumprir o seu papel de defender o acusado, mesmo ciente de seu patrimônio ilícito, não incorre em crime por ausência de tipicidade.
Em princípio, não concordo com a imputação de lavagem de dinheiro, porque não haveria interesse do criminoso em legalizar seu dinheiro ficando sem ele, até porque o pagamento dos honorários poderia ser feita de forma clandestina, sem registros. Mas a ideia de receptação não é tão extraordinária assim. Merece, ao menos, alguma consideração.
No final das contas, tudo isto é mais um exemplo de muito barulho por nada. Sabemos como as coisas terminam na República das Bananas. Se alguém for punido nessa história, pode ser Carlinhos Cachoeira. Mas não com uma pena criminal: talvez com um homicídio que o impeça de pronunciar nomes. Aguardemos os próximos capítulos.
4 comentários:
Verdade, a questão dos honorários recebidos por dinheiro de origem ilícita é tema hoje de dissertações e teses na área penal.
Vale lembrar que esse mesmo advogado recebeu uma bela bolada para atuar em defesa de um deputado acusado de pedofilia em Belém, que, ao que dizem, também não teria como comprovar a capacidade financeira de arcar com os honorários cobrados. Só que isso nenhum blog noticiou na época.
Uma dúvida: Que Cachoeira obtém sua renda de modo ilícito e que comanda um esquema de lavagem de dinheiro advindo do crime não são parte do próprio objeto da investigação? Sendo assim, até que uma sentença condenatória transite em julgado, estas acusações não têm caráter apenas hipotético, passível de serem provadas falsas no curso do processo? E, se é assim, como poderia o advogado que atua para provar que certas acusações são falsas ser acusado de um ilícito que só existiria pressupondo, antes da sentença final, que elas já são desde agora verdadeiras?
Ah, André... Eu folgo em te admirar.
"Vale lembrar que esse mesmo advogado recebeu uma bela bolada para atuar em defesa de um deputado acusado de pedofilia em Belém"
E que bela absolvição teve o Deputado, neste Estado, não ??
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