Por muito que aprecie seriados de investigação criminal ou de temas policiais em geral, sempre chega uma hora em que sinto falta de temas diferentes e de estar alheio a agentes do FBI. Mas é raro surgir uma série realmente inovadora, aspecto que reforça mais uma vez os méritos de
Lost. Devido a isso, fiquei satisfeito de saber, há alguns meses, que estava no forno um seriado de terror, prometendo ombrear com os grandes títulos do gênero. Afinal de contas, adoro filmes de terror. Um seriado do gênero seria uma boa pedida para as madrugadas, antes de o sono chegar.
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Um psiquiatra adúltero e de caráter duvidoso; uma
esposa em sofrimento pela traição e por um
abortamento; uma adolescente no meio do
turbilhão: a família Harmon chega à mais mal
assombrada residência de Los Angeles. |
Pouco antes da estreia no Brasil de
American Horror Story, cujas chamadas na TV eram bastante convidativas, li uma resenha escrita pela conhecida crítica de cinema Ana Maria Bahiana, não muito favorável. Críticos normalmente são uns chatos e, quando não gostam de algo, inventam os motivos mais estapafúrdios para se justificar. O problema é que
a resenha me pareceu sensata e me pôs em alerta (não leia se não quiser enfrentar
spoilers!).
Chegado o momento, eu e minha esposa assistimos ao piloto e a crítica de Bahiana fez sentido: o excesso de informações e personagens, a frenética sucessão de bizarrices cansa e pode levar os menos tolerantes à desistência. Mas se você insiste, pode se entreter com uma trama que, como reconhece a própria crítica, vai encontrando o seu tom.
Na esteira da crise econômica que vem encurtando orçamentos e, consequentemente, as temporadas dos programas da TV estadunidense,
AHS teve apenas 12 episódios, o que me parece adequado para o tipo de proposta que desenvolveu. À exceção do nono, que considerei uma bobagem só (para que aquela besteira de Dália Negra?), os roteiristas conseguiram criar uma trama plausível. O fato de termos que lidar com vários personagens segue sendo um problema, tanto que alguns deles simplesmente somem (como se fossem fantasmas! ahahahahahahah), para aparecer num momento isolado, ainda que importante, como é o caso do médico Charles Montgomery.
Abaixo, spoilers. Se ler, não reclame.
Mas o seriado tem os seus momentos felizes. Consegue até surpreender, provocando um susto diferente, por meio da inesperada revelação de que Violet não foi salva do suicídio, como fôramos induzidos a pensar, e sim que morrera mesmo.
A construção da personagem como uma adolescente problemática e que só interagia com o pai, com a vizinha Constance (médiuns, portanto) e com os mortos construiu um enredo inteligente, que nos deixa com cara de bestas, ao percebermos o ardil.
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Violet e o adolescente psicopata Tate, autor de
um massacre escolar. Abaixo, a moça em sua
versão cadáver. |
O mais interessante é que, à medida em que as mortes vão-se sucedendo, num ritmo veloz, começam a se delinear os campos opostos no mundo dos mortos. De um lado, os fantasmas "gentis", como definiu a empregada Moira, pessoas que foram vítimas da crueldade alheia, como ela mesma e os Harmon. De outro, os verdadeiramente maus ou perturbados, como o maníaco Tate, a obsessiva Hayden, a mulher queimada que queria compartilhar com os vivos a sensação de queimar, os gêmeos sem caráter, Nora Montgomery e sua obsessão por ter um bebê (e, quando consegue, descobre que não tem "paciência para ser mãe", o casal
gay (que sai da trama após um inesperado rompimento no além), dentre outros.
Exércitos a postos, os bons querem impedir que os vilões façam novas vítimas. Basta de mortes e tragédias na malsinada casa. Assim, tornam-se uma espécie de força-tarefa, que expulsa os novos moradores antes que sejam alcançados pelos trevosos. Chega até a ser divertido. O mais interessante é que, condenados à danação eterna naquele antro de sofrimento, a família Harmon e Moira ganham uma inusitada chance de alcançar a felicidade que não alcançaram em vida, com direito até a uma árvore de natal e a um bebezinho nos braços.
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Constance e a criança que pode ser o
Anticristo, logo após seu primeiro homicídio |
No final das contas, o maior legado de
AHS é o sucesso da veterana Jessica Lange. No ostracismo há anos, após uma bem sucedida carreira no cinema, a bela e talentosa atriz ganhou de presente a personagem Constance Langdon, mulher decadente em diversos sentidos e que está na raiz de boa parte dos infortúnios da casa mal assombrada, sendo direta ou indiretamente responsável por vários de seus habitantes defuntos.
Com uma interpretação vigorosa, Lange caiu na simpatia geral quando o seriado ainda era uma novidade e venceu, como melhor atriz coadjuvante em série dramática, o Globo de Ouro e o Screen Actors Guild. Já confirmada para a segunda temporada, quem sabe quanto sucesso mais fará?
Exibido em mais de 30 países,
AHS terminou sua primeira temporada com elevada audiência e uma indicação ao Globo de Ouro de melhor série dramática, que não venceu. A segunda temporada está em fase de produção.