Agora, depois de dormir por algumas horas e de acordar com uma filha carinhosa falando comigo, meu coração se serenou. Mas ontem, por volta de meia noite (note o horário), quando eu tentava chegar em minha casa depois de um dia inteiro de trabalho, a situação era bem outra. No meio do caminho havia o Hangar e, dentro dele, um show. Àquela altura, sequer sabia de quem. Precisei procurar no Google para saber que era da tal de Paula Fernandes, mas na hora já imaginei que era uma das modinhas do momento, o sertanojo. Imaginei por causa do perfil de público e dos carros caríssimos que via. A breguice sertanoja, agora, é chique, diz que.
Vou morrer repetindo: por mais horrível que possa ser isso, sinto saudade dos tempos em que as classes sociais distinguiam cultura. Agora caiu tudo no mesmo balaio e todos gostam das mesmas drogas. E só das drogas. Deve ser culpa da globalização.
O fato é que havia carros estacionados por todos os lugares. Na Av. Brigadeiro Protásio, onde é proibido estacionar, eles estavam junto ao canteiro central (de uma esquina à outra) ou até em cima dele; estavam sobre a calçada do lado direito, sendo que os flanelinhas cuidaram para que os babacas estacionassem em ângulo de 90º, para caber mais carros (e estreitar mais a rua). Só não havia carros em cima das árvores e estritamente porque não conseguiam subir. A sertanojinha que usou o Roberto Carlos para se promover ganha dinheiro, cara! Devia viver menos deprimida...
Os babacas que vinham do centro queriam entrar no estacionamento do Hangar e, para isso, formou-se uma fila enorme. Resultado? Formaram uma ao lado. E outra ao lado desta e daí por diante, até que o caos estava instalado. Após o acesso ao estacionamento, sequer havia tráfego: o caminho estava livre, mas para chegar a esse ponto foi infernal, porque um babaca, você sabe como é, se considera melhor dos que os demais seres humanos e é capaz de trancar uma cidade inteira, em nome da própria conveniência. Ali eu esgotei o meu estoque de palavrões e agradeci a Deus mais uma vez por não ter uma arma.
Mas o que é ruim pode ficar pior, sempre. Não é que, chegando ao acesso, descobri que havia um agente de trânsito lá? Ou ao menos parecia um, pelo uniforme. E ele a tudo assistia, deixando que os hijosdelaputana desta cidadezinha egoísta fizessem tudo o que bem entendiam. Baixei o vidro de minha janela para perguntar a ele que espécie de fiscalização de trânsito era aquela, mas nessa hora o cara se afastou. Acelerei e tomei o rumo de minha casa.
Uma noite antes, quando eu chegava para apanhar minha esposa, vi uma viatura da Guarda Municipal passar lentamente pela frente do CESUPA, como giroscópio ligado. Alguém dentro dela mandou dois motoristas que estavam parados junto ao meio fio embora. De fato, é proibido estacionar ali. Não questionarei isso, embora às 23 horas não houvesse mais tráfego que justificasse o excesso de zelo. O que me emputece além das forças é que um cretino desses quer ser preciosista até o osso quando não precisa, mas o poder público deixa a patifaria ultrapassar qualquer limite quando o abuso é infinitamente maior. Que efeito psicológico isso causa sobre um cidadão de bem? Esses safados estão dizendo, em suma, que você não é proibido de fazer o mal aos outros: só cuide para que ele seja o maior possível, que você esteja acompanhado por muita gente e que essa gente seja da classe média para cima.
Um dia vai aparecer um atirador massivo por aqui. Tomara que seja numa hora dessas.
Acréscimo em 20.11.2011: A propósito, bem feito.
3 comentários:
Espetacular comentário!!! Como oficial de justiça ando de carro pra cima e pra baixo, tenho no transito de belém o inimigo número um da minha saúde... concordo com tudo dito, sobre música, trânsito e educação do povo... abraço!!!
Ah, Yúdice! Adorei o 'sertanojo', muito bem apropriado para um fenômeno de muita luz e pirotecnia para o público, porém com pouca música; ou quase nenhuma!
Teu estado de espírito diante dessa situação também reflete um sentimento pessoal meu de repúdio à falta de educação de um bocado de gente dessa terra.
Abraço
Quem dirige todos os dias por esta cidade, como nós, Daniel, precisa redobrar os cuidados com a pressão arterial.
Modismo meramente comercial, Fred. Melodias gosmentas e letras vazias, tudo com muitos efeitos especiais, para prender fácil a atenção de uma larga faixa da população, que desliga o cérebro para se divertir ou para quase tudo.
Interessante que essa "fórmula de sucesso" foi explorada em uma edição da revista "Turma da Mônica Jovem". Os amigos querem montar uma banda teen e Cebola, claro, cria um plano para levá-los ao estrelato, usando esses recursos e tecnologia, para mascarar a falta de talento do grupo. A arte imita a vida.
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