quinta-feira, 28 de maio de 2015

Os frutos do nosso dinheirim

Na edição n. 346 da revista SuperInteressante, publicada este mês, o jornalista Rodolfo Viana assinou um box chamado "Você paga este político para". Veja só este pouquinho de Brasil, ai, ai:

"Alberto Fraga, deputado federal pelo DEM-DF, para que ele defenda que, quando um policial mata alguém, o ato seja sempre considerado legítima defesa."

"Décio Lima, deputado federal pelo PT-SC, para que ele proíba funcionários do Ministério Público e juízes de postarem coisas na internet."

"João Rodrigues, deputado federal pelo PSD-SC, para que seja liberado o porte de armas a caminhoneiros e taxistas."

Com isso, meus alunos podem ter uma pequena demonstração de por que eu critico tanto, mas tanto e sempre, os parlamentares brasileiros.

Sobre o tolo projeto do petista, trata-se apenas de uma violação à liberdade de expressão, como se juízes e membros do MP não possuíssem o direito de interagir com terceiros, de um modo absolutamente disseminado hoje em dia. Além de uma agressão à individualidade, parte do pressuposto de que todos são irresponsáveis e postarão informações capazes de trazer prejuízo às funções desempenhadas.

Mas os outros dois projetos são de matar. Com trocadilho.

O projeto do demo não é o primeiro a pressupor que é possível forçar os fatos a caberem na lei, quando na verdade somente se pode adequar a lei aos fatos. Anos atrás, outro debiloide propôs que todos os fatos de trânsito fossem considerados como instruídos por dolo eventual. Ou seja, a forceps, ele queria acabar com a culpa e redefinir o elemento subjetivo do crime por lei, não mais pela intenção do agente.

Agora, o demo quer que a legítima defesa deixe de depender dos requisitos constantes do art. 25 do Código Penal e passe a ser uma condição natural do agente, desde que policial. Nem os famigerados autos de resistência, que supostamente exigem prova da regularidade da ação policial, foram tão longe no objetivo de liberar as execuções sumárias por policiais.

Por fim, o sequelado que pretende liberar o porte de arma para caminhoneiros e taxistas. Já imagino o argumento: para que essas categorias, tão expostas à violência, possam se defender. O projeto já é imbecil por acreditar, como muitos acreditam, que o cidadão comum ter uma arma ajudaria no combate à violência, ao invés de fomentá-la. E ignora totalmente a realidade. Imagine os caminhoneiros do Brasil, que seja lá pelo motivo que for, trabalham muitas horas por dia, alimentam-se mal e se entopem de rebite para não dormir, andando por aí armados. Ou os taxistas, na sandice do trânsito urbano, que gera tantos conflitos.

Minha esposa me perguntou se um deputado propõe um negócio desses para ganhar visibilidade e votos. Minha suposição é que ele tenha ligações pessoais ou tenha recebido doação de campanha da indústria armamentista. Esse compadrio espúrio é a origem de muitos projetos de lei abusivos. Que o digam Eduardo Cunha e os planos de saúde.

Você tem medo do mundo como está? Eu tenho medo do mundo projetado.

2 comentários:

Rodolfo Viana disse...

Que bacana ver meu humilde box repercutido aqui! :)

Excelentes considerações, Yúdice. Eu também fico bastante consternado quando pesquiso os projetos de leis que são apresentados por nossos parlamentares. Alguns são bem interessantes -- a desoneração de pessoas com determinadas doenças crônicas, por exemplo, é um tema recorrente no plenário. Por outro lado, também são bastante comuns projetos que visam armar a sociedade, dar poderes absolutos às polícias etc. Estes, sim, me preocupam muito.

Mas não podemos perder a esperança. E não podemos parar de lutar. Afinal, "o que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética; o que me preocupa é o silêncio dos bons".

Abraços.

Yúdice Andrade disse...

Caro Rodolfo, fiquei surpreso em ver que o jornalista citado chegou até aqui. Até fiquei curioso de saber como me encontrou. Buscou pelo Google, mesmo?

Seu box é desses trabalhos que produzem textos rápidos e certeiros, que permitem grandes reflexões. Ele me chamou a atenção imediatamente, por isso me concentrei nele, embora houve outras questões relevantes na revista. Afinal, os projetos tocam a minha área profissional.

Pelo que entendi, você costuma trabalhar com a área legislativa, então fique à vontade para trocar ideias sobre quaisquer projetos voltados às ciências criminais, direitos humanos ou segurança pública. Tenho interesse imediato sobre isso, mas não necessariamente tenho conhecimento do que existe tramitando no Congresso Nacional, a menos que seja divulgado.

Creio que ainda não perdi a esperança e ela se renova a cada turma na qual entro como professor, tentando favorecer algum senso crítico e desvelar um pouco dos objetivos obscuros que há por trás dessas supostas grandes iniciativas. Qualquer coisa, meu e-mail é yudice.andrade@gmail.com.

Grande abraço.