terça-feira, 18 de setembro de 2012

Reforma do Código Penal XXXV: aumentam as reações

Depois do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais — IBCCrim, nova frente se levanta contra o projeto de novo Código Penal. Desta feita, a insurgência ocorreu durante o "Seminário Crítico da Reforma Penal", evento da Escola de Magistratura do Rio de Janeiro (EMERJ) e da Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, tendo à frente o professor de Direito Penal da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Juarez Tavares.
A nova ofensiva foi exteriorizada em carta aberta do seguinte teor:

Reunidos no Seminário Crítico da Reforma Penal organizado pela Escola da Magistratura do Rio de Janeiro e Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça entre os dias 11 e 13 de setembro de 2012, juristas de todo o Brasil dedicaram-se à análise crítica do Projeto de Lei do Senado n. 236, que propõe um novo Código Penal para o país.
Os trabalhos apresentados e discutidos no Seminário demonstraram, sem exceção, inúmeras deficiências teóricas no Projeto, em boa medida resultado da equivocada e acrítica incorporação de critérios jurisprudenciais de imputação em detrimento à dogmática penal mais avançada, tanto em termos técnicos quanto democráticos.
A notável pobreza teórica do Projeto, constatada por unanimidade, precisa ser destacada porque implica maior dificuldade na tentativa de controle democrático da competência punitiva do Estado. Assim é que, por suas falhas, o Projeto afasta o Direito Penal simultaneamente da Ciência e da Cidadania, isto é, não só se opõe ao saber jurídico, mas também ao soberano poder popular.
A proposta revela, contudo, problemas ainda mais graves. Longe de inaugurar um marco no Direito Penal brasileiro, o Projeto é profundamente anacrônico, como revela uma análise sistêmica. É evidente seu compromisso ideológico com a ultrapassada política de defesa social, própria do Estado de Polícia e, portanto, absolutamente incompatível com o Estado Democrático de Direito.
A aposta na pena privativa de liberdade para repressão e prevenção da criminalidade que propõe é, provavelmente, o reflexo mais claro desta natureza punitivista do Projeto que, para piorar, abre mão de alternativas desencarceradoras em favor da prisão, cujo fracasso para fins de ressocialização foi exaustiva e reiteradamente demonstrado pela teoria — a mesma teoria que a Comissão responsável pela elaboração do texto decidiu, convenientemente, ignorar.
Diante de um sistema de justiça criminal sobrecarregado, seletivo e desumano — sobretudo no que se refere à execução penal, em toda sua miséria real — esta contraditória reafirmação da pena é radicalmente antidemocrática, porque agrava o já terrível drama carcerário.  Mas se a grave violação dos direitos fundamentais decorrente da eventual aprovação do Projeto de Código não for argumento suficiente para rejeitá-lo, importaria notar ainda o substancial aumento do custo social, político e econômico do sistema de justiça criminal — notadamente, do sistema penitenciário — que determinaria.
Em síntese, o Projeto de Lei do Senado n. 236 é incompatível com a promoção do ideal republicano de uma sociedade mais livre, justa e solidária. E seja pela quantidade de defeitos que apresenta ou por seu pernóstico compromisso ideológico com a repressão, o fato é que o Projeto não pode — nem deve — ser reparado mediante supressão, modificação ou acréscimos.
Somente a radical negação da proposta, como um todo, é admissível. Esta é a conclusão dos juristas que abaixo subscrevem.
Rio de janeiro, 13 de setembro de 2012

Há um aspecto que, às vezes me parece, está sendo ignorado pelos críticos: o novo Código Penal será deliberado pelo Congresso Nacional, instituição que está longe de se importar com as mais modernas teorias penais e muito mais próximo de acolher anseios punitivistas, inclusive irracionais, manifestados pelos eleitores.
Por conseguinte, se estamos interessados em uma lei realista e útil, é melhor dar um tempo na agressividade e nos insultos, preferindo a concórdia e a conversa fraterna. Porque se os juristas não se entenderem, não haverá como orientar o Congresso Nacional a deliberar tão difícil matéria, ainda mais considerando que os objetivos, lá, não costumam ser republicanos.

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