sábado, 25 de outubro de 2014

A longa e interminável marcha das mulheres pelo mundo (VI)

Mais uma notícia para mostrar o mundo como ele é. Vamos montando um (a princípio involuntário) banco de dados sobre maldades reais, profundamente arraigadas no pensamento de muitos, e que as pessoas insistem em não ver.

Eis a notícia: Mulher de 26 anos é enforcada no Irã por matar estuprador.

Não, eu não mudei de lado. Não comecei a defender o justiçamento (odeio essa expressão). Mas Reyhaneh Jabbari vivia no Irã, um dos tantos países que, notoriamente, conferem às mulheres uma condição de subcidadania. Ela negava ter assassinado o estuprador, um homem que, por sinal, não era nenhum bandidinho de rua, e sim um bem posto médico. Não sei se ela o matou ou não, mas que direito de defesa ela realmente teve? E não teve pelo simples fato de ser mulher.

A questão se aprofunda. Se Jabbari matou, pode não ter sido legítima defesa. Pode ter sido, de fato, um homicídio. Mas crimes são atitudes normalmente complexas, no que tange às suas motivações e modos de execução. Em um país como o Irã, que não lhe daria nenhuma assistência contra o estuprador; que provavelmente lhe imporia punições pelo fato de se relacionar sexualmente com um homem que não era seu marido, como se fosse uma escolha; que a responsabilizaria pelo estupro, afinal ela aceitara ir a um local reservado com um homem, o que ela poderia fazer? Viver passivamente com sua dor, quiçá tendo que olhar na cara desse homem, de vez em quando?

Fatores assim certamente levariam uma mulher a matar esse homem. Teríamos que olhar para isso com olhos de homicídio privilegiado, para usar, por analogia, o direito penal brasileiro. Ou até mesmo com olhos de coculpabilidade. Mas isso já seria difícil no Brasil. No Irã, impossível. Então, ainda que admitindo a existência da pena de morte, seria esse, realmente, um caso para aplicá-la?

Direito penal é isso: escrito pelos mais fortes, aplicado sobre os mais fracos. E tem gente que ainda acha que isso é apenas discurso. Pensa assim porque lhe é conveniente. Sente-se no time que está ganhando. Tolos: esse é um jogo em que ninguém ganha.

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