sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Irresignação acadêmica

A tendência da esmagadora maioria da população brasileira, no que tange à prática de crimes escandalosos, é bradar pela máxima punição dos culpados. Em pleno ano 2012, vivemos imersos em um espírito de vindita tão horrível quanto na Antiguidade. Basta que se vejam os discursos do populacho e sua convicção de que delinquentes devem ser linchados, torturados, fatiados e, naturalmente, humilhados antes disso tudo. E qualquer conceito de civilização escoa pelo ralo numa hora dessas.

Eu e meus colegas de disciplina procuramos combater essa mentalidade em nossa atividade docente, mas estou ciente de que, perante a sociedade, remamos contra a maré. Felizmente, no âmbito acadêmico, que é mais restrito e instruído, conseguimos inspirar algumas almas.

A despeito disso, chamou minha atenção, ontem, a grande quantidade de estudantes protestando contra a condenação de Lindemberg Fernandes a 98 anos e 10 meses de reclusão. Falou-se que houve desproporcionalidade, concessão às pressões da mídia, violação à legalidade e um monte de outros defeitos. Lembrei-me da situação da "Lei da Ficha Limpa", também decidida ontem pelo Supremo Tribunal Federal, que dividiu os iniciados em Direito em dois grupos: o daqueles que queriam a aplicação plena da lei como instrumento de exclusão dos canalhas de mandatos políticos, ao menos por alguns anos (inclua-me aqui), e os dos Defensores da Legalidade, do Estado Democrático de Direito, que bradavam contra a flexibilização de princípios constitucionais em nome de um utilitarismo cego. Neste meio estão pessoas admiráveis, que respeito bastante, mas ainda assim me mantive no lado oposto.

Estou certo de que, considerando os parâmetros da legislação brasileira, a pena de Lindemberg provavelmente foi excessiva. Merecida, talvez, mas destoante das regras aplicáveis. Só não acho que a juíza Milena Dias, que se portou tão bem durante o julgamento, mereça essa execração toda. Excessos e erros ocorrem, sendo passíveis de recurso.

Qualquer hora dessas farei um exercício pessoal de dosimetria e tentarei estabelecer o valor que eu teria imposto ao réu, fosse o juiz-presidente do júri. Só por curiosidade. E como o assunto ainda vai palpitar por algum tempo nos meios jurídicos, posso analisar algumas das decisões tomadas pela magistrada, especialmente porque tenho três turmas que estudarão o assunto neste semestre. Nada como um caso verídico e rumoroso para servir de material de estudo.

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