sábado, 12 de dezembro de 2015

Palavras ao vento, quando minhas

Desde criança, escrevi muitas estórias. Contos, projetos de romances. Já naquela época, leitor convicto, eu sonhava em ser escritor. Achava que podia produzir livros incríveis.

Ainda criança, houve um concurso de redação na escola. Podíamos inscrever mais de um trabalho, então tirei o segundo e o primeiro lugar. No dia da proclamação do resultado, recebemos a visita do grande Ruy Paranatinga Barata. Ele me entregou o prêmio, que muito acertadamente era um conjunto de livros, inclusive livros dele, um dos quais foi autografado. No autógrafo, ele me sugeria: "agora escreva um conto". Ingênuo, bobo mesmo, achei que um conto era pouco e comentei que pretendia escrever um romance. Sábio e paciente, ele apenas respondeu que eu devia começar por um conto.

Lá pelos 10, 11 anos, ganhei uma pequena máquina de escrever manual. Entenda: era o ano de 1985 ou 1986, então não há como pensar em microcomputador. Aquela maquininha sem nada de especial significou muito para mim. Talvez tenha sido o melhor presente de aniversário que ganhei de minha mãe. Ingênuo, bobo mesmo, eu achava que, a partir daquele momento, poderia escrever romances magníficos e me tornar um escritor rico. Mais ou menos como acontecera com Stephen King, que se tornou milionário graças a seus livros de terror, alguns dos quais eu adorava na época.

O destino de todos aqueles escritos foi o mesmo: as chamas. Bastava passar um pouquinho de tempo e eu me envergonhava daqueles exercícios canhestros. Não suportava a ideia de que alguém pudesse lê-los, então os queimava. Comigo é assim: nada de jogar no lixo; o negócio é queimar. Adoro fogo. Além disso, o fogo tem uma simbologia interessante e, no contexto, adequada. O fogo foi exorcizando aquele meu sonho de infância que, juntamente com todos os outros, ficou para trás.

O mais perto que cheguei de ser um escritor, afora algumas incursões pela redação acadêmica, foi este blog. Aqui me permiti falar, exercitar estilo, experimentar algumas vezes, testar a ironia, abrir combate direto. Um blog pode funcionar como um repositório de crônicas, então, com excesso de boa vontade, posso me considerar um cronista. O detalhe é que sou eu mesmo a fazer esse julgamento.

A propósito, neste blog, tive o atrevimento de publicar quatro textos de minha autoria: "Abandono" (28.7.2007), "Na sacada do sétimo andar" (30.6.2007), "Miniconto psiquiátrico" (23.11.2007, uma brincadeira de apenas 49 palavras) e "O desejo" (10.8.2012). Estão aí, dispersos na internet, onde sequer posso defender meus direitos autorais. Mesmo que alguém diga o contrário, esses textos são meus. Para o bem ou para o mal.

Esta semana, li matéria sobre pintura hiperrealista, uma forma de arte que me interessa bastante. Curiosamente, ela me inspirou uma ideia. Esta manhã, a ideia cresceu em minha mente a tal ponto que precisei me sentar à frente do computador. Ao que escrevi, chamei de "prólogo". Ingênuo, bobo mesmo, estou dizendo a minha própria vaidade que a coisa terá desdobramento, talvez vire algo grande. Tolice. Todas as minhas ideias fantásticas definham em alguns dias. A se repetir o que sempre aconteceu, nenhuma inspiração virá para completar o tal prólogo e, dentro em breve, a premissa extraordinária parecerá, tão somente, uma bobagem.

E assim deixamos de ter uma estória sobre arte, assassinato e remorsos, por um motivo trágico, que foi explorado pelo escritor e filósofo Jostein Gaarder, em seu romance O vendedor de histórias (2001): as ideias maravilhosas estão por aí, à procura de um escritor que as realize. Mas se falta o talento, elas morrem.

2 comentários:

Unknown disse...

Minha mãe sempre me disse que antes de morrer todos devem fazer três coisas: plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro. Então não desista! Rs

Me identifiquei com o texto (não cheguei a participar de concursos assim, tampouco a ganhar prêmios, mas tinha uma professora de redação no colégio que sempre guardava meus textos e me incentivava a continuar escrevendo). Aos 12 anos escrevia como uma pessoa mais velha (isso era o que me diziam), mas nunca levei adiante. Sempre que escrevia algo, me preocupava com o que iriam pensar e jogava fora. Poder expressar as ideias é fascinante, e decidi voltar a fazer isso depois de anos, criando o meu blog. Não pretendo escrever coisas grandes, apenas o suficiente para descarregar as ideias. Também deixei de ligar para o que pensam.

O sr tem MUITO talento, e se publicasse algo eu com certeza compraria! Sua escrita é admirável: clara e ao mesmo tempo refinada. As ideias de seus textos aqui do blog também são muito boas. Amadureça a ideia de escrever um livro!

Yúdice Andrade disse...

Quem sabe um dia, minha querida. Agradeço o incentivo, mas o meu talento é como a prova dos 100 metros rasos: o atleta dispara, brilha, maravilha, mas só aguenta alguns segundos e a prova acaba...