sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Mudanças recentes na legislação criminal

Eu costumava monitorar o Portal de Legislação do governo federal, para acompanhar as frequentes, pontuais e assistemáticas alterações nas leis penais brasileiras. Trata-se de uma prática que devo retomar, inclusive porque mudanças no final do ano podem não aparecer nos edições de códigos e vade mecum a serem lançadas logo no início do ano.

No apagar das luzes de 2015, a Lei n. 13.228, de 28.12.2015, acrescentou uma linha ao Código Penal. Na verdade, inseriu um § 4º ao art. 171, que versa sobre o crime de estelionato:

"§ 4º Aplica-se a pena em dobro se o crime for cometido contra idoso." (NR)

A velha mania de achar que aumento de penas faz alguma diferença. Bem intencionado, porém inócuo.

Um pouco mais atrás, a Lei n. 13.167, de 6.10.2015, alterou o art. 84 da Lei de Execução Penal, estabelecendo regras para a separação de presos, provisórios ou condenados, dentro dos estabelecimentos prisionais. Uma pequena profissão de fé em favor da chamada "contaminação carcerária", como se o contato com alguma fruta podre fosse o maior problema do sistema. Mas, ao menos em princípio, essa separação pode ser positiva, considerando a segurança do detento.

A LEP já fora alterada um mês antes, pela Lei n. 13.163, de 9.9.2015, com vistas a implantar o ensino médio nos estabelecimentos penais e a determinar que o censo penitenciário investigue dados sobre a condição educacional da população carcerária. O que mais me chama a atenção em uma medida como essa é o fato de que o preso típico, no Brasil, tem baixíssimo nível de instrução formal, ou instrução nenhuma. Muitos são analfabetos funcionais. Por que será que alguém sentiu a necessidade de cuidar do ensino médio? Apenas deixar em funcionamento o serviço ou será que houve alguma mudança no perfil dos presos brasileiros? Algo a ser investigado.

Por fim, remontando à Lei n. 13.142, de 6.7.2015, em um ano em que o Código Penal já fora emendado em seu art. 121, para criação do tipo de feminicídio, como modalidade de homicídio qualificado, foi instituída nova qualificadora, agora quando o delito seja perpetrado contra integrantes das Forças Armadas, das forças policiais, Corpos de Bombeiros, do sistema penitenciário e da Força Nacional de Segurança Pública, ou ainda contra seus cônjuges, companheiros ou parentes consanguíneos até o terceiro grau.

Esta lei também atingiu o tipo de lesão corporal, instituindo uma majorante de um a dois terços, quando as vítimas sejam as acima indicadas. Se a lesão for gravíssima ou seguida de morte, o crime passa a ser hediondo.

Eis aí mais alguns retalhos para a legislação criminal brasileira. Uma revisão geral e organizada do Código Penal, do Código de Processo Penal e da Lei de Execução Penal segue sendo um sonho distante. Inclusive porque esse trabalho não é nada simples, sobretudo para ser feito com o Congresso Nacional mais podre da História, que temos atualmente.

Um comentário:

Anônimo disse...

Caro Yúdice

Quero tecer alguns comentários sobre a Lei nº 13.163/15, na qual tive participação a quando da sua elaboração, em função da minha atividade profissional. Já coloquei aqui, anteriormente, o meu ceticismo quanto a "ressocialização" dos presos. Confesso que continuo cético quanto aos resultados, ainda que tenha contribuído na elaboração do projeto em tela. O que tenho lido não me dá a convicção de que tais processos têm bons resultados. De qualquer maneira, respeito a tua opinião e dos demais que trilham o mesmo caminho, haja vista a experiência que vocês têm e os seus bons propósitos.

A lei em tela é fruto de um Projeto de Lei(PL 25/99) apresentado ainda nos idos de 1999 pelo então deputado Paulo Rocha(lá se vão 16 anos). Aqui o primeiro comentário. Vejam o tempo que demorou para um projeto se tornar lei.

O escopo inicial do projeto era acrescentar o ensino médio e , principalmente o profissional aos encarcerados. É inegável que um curso técnico do SESI/SENAI , por exemplo, dará a um ex-detento, maiores possibilidades a quando da sua liberdade.

O direito à educação é um direito de todos(CF art. 205), sendo que a Lei de Execução Penal(art. 11, IV) ainda prevê que a assistência social ao preso será, também, educacional. Ainda que discorde, cito aqui a lição de Heleno Fragoso, para quem o escopo da pena é a "ressocialização do condenado, ou seja, a finalidade de reincorpora-lo à sociedade".

Também o Plano Nacional de Educação - PNE , prevê, entre suas estratégias, que seja assegurada a oferta de educação de jovens e adultos, nas etapas de ensino fundamental e média, às pessoas privadas de liberdade em todos os estabelecimentos penais, .........

Em 2012, foram 23.665 os candidatos que estavam em estabelecimentos penais que se inscreveram no ENEM.

O PRONATEC prevê milhares de vagas para os presos e egressos do sistema penal. A própria previsão da remição da pena pelos estudos também vai na mesma direção.

Posto isso, reconheço que o ensino fundamental público hoje oferecido é de uma qualidade lastimável, e que pensar-se em ensino médio aos presidiários pode parecer utópico. Mas de qualquer modo, criaram-se os mecanismos legais para que se possa avançar - querendo - na educação da nossa população.

Não há como negar que um egresso do sistema prisional que apresente um certificado de conclusão de curso em tornearia ou mecânica de motores a diesel terá muito mais chances de conseguir um emprego do que aquele sem tal certificado.

Oxalá, como advoga você, consigamos ter um sistema prisional que reabilite os presos. Na minha modesta opinião, estamos a anos-luz desse dia chegar. Mas vamos avançando.

Abraços

Kenneth Fleming