sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Violação sexual mediante fraude ou estupro

Quando leciono sobre o crime de violação sexual mediante fraude (outrora posse sexual mediante fraude), destaco que, hoje em dia, é complicado identificar hipóteses concretas dessa figura, na modalidade "ter conjunção carnal". Afinal, o tempo das mulheres que só transavam com seus maridos de luz apagada e em silêncio já acabou há muito. Existe também o exemplo dos irmãos gêmeos que, embora plausível, sempre tem um ar meio rocambolesco. No final, é muito mais concebível a execução do delito através de outras formas de atos libidinosos e, como costumo destacar, o universo dos atendimentos médicos é bastante propício a ele.
Por isso, chamou-me a atenção a matéria "Médico gaúcho engana paciente para ter relação sexual". Fui conhecer o exemplo concreto, para citar em minhas aulas, mas ele simplesmente não me convenceu.
Segundo consta, o médico (entendi que durante uma consulta ortopédica) teria imobilizado a paciente e passado nela um gel que a teria deixado incapaz de se mover. Fiquei impressionado de saber que existem anestésicos em gel tão potentes a esse ponto. Em seguida, teria realizado a penetração, que culminou com uma ejaculação, considerada prova material do crime.
A justiça gaúcha condenou o réu por posse sexual mediante fraude e o tribunal manteve essa capitulação, ainda que aumentando a pena. Mas, honestamente, eu discordo com veemência dessa interpretação. Houve fraude, sem dúvida, utilizada como meio executido para criar as condições de execução do delito. No entanto, tendo a vítima sido imobilizada por dois modos diferentes (ainda estou recalcitrante quanto a essa história do gel), e considerando sobretudo que a paciente desconfiou dos procedimentos antes de ser penetrada, mas não pode impedir o fato porque não conseguia mexer-se, a meu ver está caracterizada a violência imprópria, isto é, a redução da ofendida a uma condição de incapacidade de resistência (a lei diz expressamente que não importa a causa).
Entendo, por conseguinte, que a situação configurava, de acordo com a legislação anterior, estupro com violência presumida e, hoje, estupro de vulnerável.
Obviamente, analiso apenas as poucas informações constantes da reportagem, até porque o feito corre em segredo de justiça. Talvez os magistrados tenham considerado alguma informação adicional que desconheço mas, se o caso foi mesmo assim como descrito, vou sustentar que houve estupro. Minha tese é esta: houve fraude até a preparação do crime, porém violência imprópria em sua execução.

3 comentários:

Anônimo disse...

Fostes pro sul buscar um exemplo concreto? Aqui no SUS da capital paroara um médico sexagenário expulsou do consultório a mãe de uma jovem com problemas psiquiáticos. Mandou a moça tirar roupa e passou-lhe a cupiúba. O inquérito dormita lá na polícia federal e não se a classificação do crime é violação sexual mediante fraude. Mas tem testemunhas e outras vítimas do "véio tarado".

Ana Miranda disse...

Que história mais estranha...

Custa-me a crer que alguém estude tanto para se profissionalizar e cometa uma sandice dessa.

Esse cara é louco e merece mesmo ir preso.

Agora, que gel é esse, capaz de imobilizar uma pessoa???

Por que será que ela não gritou? Estaria ela acreditando que tudo fazia parte do procedimento da consulta???

Até que ponto, nós confiamos em nossos médicos???

Yúdice Andrade disse...

Das 22h54, na verdade eu não procurei o exemplo: apenas me deparei com ele e escrevi o texto. Agradeço a sua informação quanto ao caso aqui de Belém. Não que devamos apreciar um horror desses acontecendo por aqui, mas para que possamos nos precaver.

A história é mesmo muito esquisita, Ana. Mas quanto à questão da confiança nos médicos, eles mesmos sabem que o tempo em que essa profissão era romanceada já passou. Os mais conscientes admitem a culpa da própria categoria e entendem que o problema existe desde a formação universitária.