terça-feira, 15 de outubro de 2013

Saúde mental

Quando comecei a fazer terapia — lá se vão mais de 13 anos , após resistir por um bom tempo, cheguei à conclusão de que todas as pessoas deveriam ter a oportunidade de viver essa experiência. Digo "oportunidade" para destacar que a medida deveria ser totalmente voluntária, uma escolha esclarecida do cidadão que, a partir daí, poderia ter acesso a bons serviços de psicologia, psiquiatria e psicanálise, conforme necessidades e preferências.

Infelizmente, se neste país mal se consegue atenção à saúde para manter o corpo vivo e íntegro, imagine manter a sanidade mental! Os serviços públicos são sobrecarregados e se destinam, basicamente, a atender situações extremas, como as de pessoas direta ou indiretamente atingidas por violência ou por doenças ocupacionais que provocaram afastamento do trabalho.

Só Deus sabe como a demanda é infinitamente superior à oferta. E, com isso, muita gente necessitada deixa de se tratar, mergulhando em intenso sofrimento sem esperança, por anos a fio, às vezes até o final de suas vidas. Vidas que talvez acabem abreviadas ou que, em todo caso, foram suportadas em vez de vividas, sem a qualidade que todos merecemos, mas nem todos alcançamos.

O desembargador do Espírito Santo Pedro Valls Feu Rosa escreveu matéria na qual externa sua fé de que a psicologia pode mudar o mundo, citando uma série de exemplos de comportamentos absurdos ou abusivos, que poderiam ser mitigados se os seus protagonistas tivessem tratado a cabeça. Entendi que a premissa defendida é apenas uma aposta na ideia geral de que, se o indivíduo se conhece, pode agir melhor no mundo. Algo semelhante a se você se alimentar melhor, terá mais saúde e viverá mais. Uma conclusão bastante plausível, sem arroubos de certeza.

Nesse particular, concordo com o articulista e comungo da sua grande preocupação: a quantidade imensa de loucos de todo gênero e de sociopatas que estão aboletados em funções públicas, perpetrando toda sorte de malefícios às pessoas que não podem defender-se de sua opressão. Algo tão comum na realidade deste país — onde o crime de desacato está na ponta da língua desses sombrios personagens, mas nunca o de abuso de autoridade —, que me dou ao direito de não citar nenhum exemplo. Imagino que os leitores terão na memória, em uma fração de segundo, mais de um caso.

Em se tratando de serviço público, e particularmente em relação a funções que exprimam grande poder de ação, o acompanhamento psicológico não deveria ser voluntário. Esses servidores públicos deveriam entrevistar-se anualmente, no mínimo, com terapeutas, para um bate papo e, quem sabe, encaminhamento a terapia mais prolongada. Para certas carreiras, esse acompanhamento deveria ser condição de progressão. Em outras, de permanência na função.

Sei que a proposta é audaciosa e, claro, precisaríamos de muito debate para encontrar um modelo que atendesse às necessidades do país, sem engessar o serviço público e sem transformar os profissionais de saúde mental em déspotas com poderes titânicos sobre tudo e todos. Acima de tudo, sem enveredar por um novo modelo de sociedade de controle, sem incorrer no erro absurdo da psicologização de toda a vida. Mas que do jeito que a coisa está, não é bom. Ouso dizer que, definitivamente, não é bom.

2 comentários:

Anônimo disse...

Yudice, comungo do seu pensamento e há tempo advogo que os policiais em geral deveriam ter férias de 60 dias e avaliação psiquiátrica anual, além da disponibilidade de terapia. É um grupo muito vulnerável devido a exposição diária a estresse, dai a necessidade de atuação preventiva, para o bem dele e dos cidadãos. melhor que aposentar por invalidez

Yúdice Andrade disse...

Das 10h11, grato por sua manifestação.
Eu não tinha pensado em férias de 60 dias, mas é uma proposta sensata. Afinal, pela natureza estressante e perigosa do trabalho, as exigências de reparação do corpo e da menta são maiores. E como você bem percebeu, não se trata de interesse pessoal do policial, mas de toda a sociedade, que precisa interagir com o indivíduo atormentado.
Mas já sabemos que a proposta não passará, porque é entendida como privilégio e os privilégios favorecem quem tem poder de lobby, não quem precisa. Além disso, já faltam policiais; com férias ampliadas, a carência seria muito mais sentida.
É triste, mas não vejo como implementar algo assim. É o gigantesco abismo existente entre a nossa realidade e o que seria ideal. Pena.