terça-feira, 16 de outubro de 2007

Convenção Internacional de Palhaços

Não é piada e, por incrível que pareça, não foi no Brasil e sim no México gostoso: 450 palhaços de todo o continente americano se reuniram na Cidade do México, por ocasião da abertura da 12ª Convenção Internacional de Palhaços. Não é palhaçada: no evento, eles participarão de seminários, conferências e competições de vários tipos ao longo de quatro dias.
Depois dizem que ser palhaço não é coisa séria.

O lado bom e o lado mau da rotina

Para quem gosta — ou precisa — de organização, a rotina pode ser uma experiência muito salutar. Há muitos anos, criei o hábito de conduzir objetos pessoais sempre nas mesmas posições: relógio no pulso esquerdo, do mesmo lado em que levo a caneta (nunca saio sem uma); chaves à direita; carteira no bolso traseiro direito e, se de paletó, num bolso do lado direito, em geral externo. (Espero que estas informações não cheguem aos meliantes...). O problema é que, se por qualquer motivo, um desses itens sai do lugar, passo o tempo todo levando sustos. Mandei a trocar a bateria do relógio e tive uma manhã infernal. Cadê o meu relógio? Cadê o meu relógio?!
Essa padronização, contudo, permite que eu não esqueça as coisas. Frequentemente eu as esqueço, mas a própria ausência da sensação física me alerta que devo retornar e pegar o objeto faltante, antes de sair de casa. Ajuda.
Hoje, que levamos essa vidinha enquadrada, cheia de compromissos e tempo exíguo, a rotina pode nos salvar, ao mesmo tempo que pode causar transtornos, como o do rapaz que desceu comigo no elevador, hoje cedo. Sua vaga de estacionamento fica perto da minha, mas hoje ele deixara o carro na rua e perdeu tempo descendo até a garagem, sem necessidade.
Mais interessantes são os casos de pessoas que se mudam e, quase no automático, pensam retornar para casa. Somente se dão conta do erro quando chegam ao endereço antigo.
Tive um professor que quase passou mal, acreditando que haviam furtado o seu automóvel, quando na verdade ele o estacionara pela primeira vez em lugar diferente, na rua.
São acontecimentos prosaicos, sem maior importância, mas que podem chatear de verdade. Infelizmente, os condicionamentos excessivos que nos impomos são, também, a causa de mortes de crianças, esquecidas p. ex. em veículos, fato já comentado aqui no blog. Acidentes desse tipo, inclusive fatais, têm aumentado por aí afora.
Isso nos remete à necessidade de cuidar da saúde mental — não no sentido psiquiátrico, mas no da qualidade de vida. Retirar da rotina o que de melhor possa nos oferecer, sem nos aprisionarmos nela, ao ponto de nos tornarmos compulsivos. E evitá-la no casamento — ou nos relacionamentos amorosos em geral —, por motivos óbvios.
Boa semana para todos.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Parabéns, colegas

Pode ser que não haja festa nem mensagens de carinho. Pode ser que ninguém se lembre da data, além de nós mesmos. Pode ser que isso pareça muito estranho, considerando um longo tempo, às vezes anos, em companhia próxima com o nosso público. Pode ser que sejam poucas as condições de trabalho e que o salário seja frequentemente constrangedor. Pode ser que o volume de trabalho abata, com uma certa habitualidade. Pode ser que nossos esforços sejam recebidos com desdém e até, pasme, com violência. Pode ser, inclusive, que passemos por situações inusitadas, como quando nos perguntam se trabalhamos ou apenas damos aula.
Mas o mundo não seria o que é sem os professores. Isso é um fato. Assim como também é fato que todos sabemos o que nos aguarda quando abraçamos tal profissão e, a despeito disso, seguimos em frente. E adoramos.
Como em toda história de amor, há muito de loucura nessa relação. Mas nada como ser um louco construtivo.
Avante, professores do Brasil! Felicidades para todos!

Em tempo:
O amigo Val-André escreve acerca das origens históricas do Dia do Professor. Confira aqui.

domingo, 14 de outubro de 2007

A velha histeria provinciana

História confirmada por pessoas que presenciaram o ocorrido. Não sei nem quero saber quem são os envolvidos. Limito-me a narrar os fatos e a deixar minha impressão.

Na última quarta-feira, cidadão, desses que se julga rico e poderoso como um protagonista de novela global, chega à Igreja de Santo Alexandre, onde sua filha se casaria na noite seguinte, e encontra o palco de uma das estações do Auto do Círio armado em frente — como todos os anos, diga-se de passagem. Surta. Sai ligando para Deus e o mundo, até alcançar os produtores do espetáculo. Exige que o palco seja desmontado porque ele está pagando 6 mil reais pelo aluguel da igreja! Considera muito fácil desmontar e remontar a estrutura. Atrás dele, aos berros, a noiva maldiz a sua sorte. Exigências palacianas e uma ameaça de conseguir a dispensa de quem autorizou a montagem do palco.

Pessoas da produção perdem seu tempo explicando ao nobre por que é difícil mexer na estrutura do palco, por onde tinha que passar todo o sistema de som. Não dava para simplesmente desmontar. Prometem até não ensaiar naquela estação na hora do casamento. Fosse eu, lembraria ao mancebo que o aluguel foi da igreja e não da rua, que continua sendo pública, mesmo na capital mundial do egocentrismo, Belém do Pará. Eu o teria mandado queixar-se ao bispo, até porque este anda muito ocupado e, tendo juízo, não deixaria suas obrigações por causa de gente que se acha.

A despeito da fúria da nobreza, o palco ficou. Mas foi todo pintado de branco na quinta-feira e, no dia seguinte, retornou ao preto, como deve ser.

Não sabemos se a moça que autorizou a montagem do palco na via pública já foi penalizada por fazer o seu trabalho sem adivinhar as necessidades dos vips locais. Só sabemos que o castigo veio a galope: quinta-feira à noite, a noiva se aproxima numa limusine antiga. Apesar de certamente ter custado caro, o automóvel prega — isso mesmo, sofre uma pane — na esquina da queimada ex-loja da Bechara Mattar. A noiva dá um novo pití e, para chegar à porta do templo, precisa ter sua carruagem empurrada. Adivinhe por quem? Pelo pessoal que estava ali para ensaiar o auto.

Parece brincadeira, mas é verdade. E eu não teria movido uma palha para tirar esse carro do lugar.

Não dá para entender

Do Repórter 70 de hoje:


Seca
Hoje, a Lei Seca vai ser cumprida pelo menos num dos quarteirões do entorno da Basílica, independente da ação dos fiscais da Secon e da Polícia. É o pedaço da avenida 14 de Março, entre as avenidas Nazaré e Gentil, onde está localizado um quartel do Exército. Representantes do poder público até que tentaram negociar pelo menos a venda de cerveja em lata no perímetro. A resposta foi um sonoro 'não' do comandante do quartel.


Último
A propósito, finalmente o apelo do arcebispo de Belém vai ter eco na festividade de sua própria Igreja. Este é o último dos círios em que a Paróquia de Nazaré permite a comercialização de bebidas alcoólicas no arraial. Em 2008, as barracas arrendadas no parque serão proibidas da prática ou terão outra destinação. Esse foi o acordo. Se vingar, em toda a Arquidiocese de Belém, só mesmo a Paróquia de São José de Queluz, em Canudos, ficará isolada na desobediência.
Que mundinho maluco este... Eis aqui alguns questionamentos a respeito das notas acima:

1. Que "Lei Seca" é essa? Desde quando é proibido comercializar bebidas alcoólicas no dia do Círio? Vale lembrar que a Constituição brasileira determina que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, em sentido estrito.

2. Ainda que tal lei exista, desde quando o comandante de um quartel do Exército tem (teria) competência para dar-lhe cumprimento? Para onde foi o princípio federativo? Restringir a liberdade das pessoas sem respaldo legal constitui abuso de autoridade — crime, por sinal. Quem esse sujeito pensa que é?

3. Ainda na premissa de que tal restrição pudesse ser imposta, porque apenas naquele perímetro? A lei não é igual para todos?

4. Quais foram os "representantes do poder público" que tentaram negociar a liberação da manguaça? E a modiquê fizeram isso? Que interesse possuem? Usaram suas funções públicas para negociar? Se o fizeram, não seria crime, também?

5. O mais estarrecedor: como pode a Igreja permitir a venda de bebidas alcoólicas dentro de sua própria área de influência direta, todos esses anos e até hoje? E se reconheceu que a ideia não era boa, decidindo acabar com ela, por que somente no ano que vem? A dignidade religiosa não prefere às urgências mundanas?

6. Se os comerciantes não podem vender nem sequer uma lata de cerveja, por que a paróquia pode?

Honestamente, há alguém muito doido, cínico e/ou abusado neste mundo. E não sou eu.

Antecipando o Dia do Professor

Por razões óbvias, reproduzo matéria do Diário do Pará de hoje, assinada por Fábio Nóvoa:


Mestre já não recebe tanto carinho
PROFESSORES

Profissão já não tem o mesmo reconhecimento de antes e docentes vivem dificuldades

Você, que é ou já foi estudante, ainda lembra que o dia 15 de outubro é o Dia do Professor? Se não, saiba que provavelmente não é o único — afinal, a profissão já não é reconhecida como antigamente, e sua importância passa despercebida pela maioria da população e, sobretudo, pelo Poder Público. Seja na rede privada, ou nas esferas municipal, estadual e federal de ensino público, as condições de trabalho não têm sido das mais fáceis para os docentes. O Dia do Professor é comemorado no 15 de outubro desde 1947 graças a um grupo de professores de uma escola na cidade de São Paulo. Os docentes instituíram a parada de um dia, no segundo semestre, para se reunirem para confraternizar e realizar o planejamento pedagógico para o restante do período letivo. Já em 1963, o governo baixou um Decreto de nº. 52.682 tornando a data oficial. Para a diretora-geral da Associação de Docentes da UFPA (Adufpa), Vera Jacob, a profissão vem sendo diminuida, principalmente nos últimos 12 anos. “Não temos nada o que prestigiar neste dia. Os professores trabalham sem reajuste e em condições precárias”, afirmou. Vera diz que muitos estão abandonando a universidade por falta de condições de ensino. “Muitos professores estão largando a docência e a maioria só ainda trabalha por compromisso com o ensino mesmo”. Jacob acha que o Governo Federal somente tem piorado a situação. “O governo baixou um decreto do Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), que caso a Universidade Federal do Pará faça adesão, deve aumentar a carga horária dos docentes, sem aumento no salário”. Além disso, segundo a diretora da Adufpa, o Governo Federal enviou ao Congresso Nacional, fevereiro último, o Projeto de Lei Complementar 01/2007, que integra o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e limita os gastos da União na folha de pagamento, determinando um congelamento salarial até 2016. “Já estamos com um indicativo de greve nacional. O prazo para a greve começar é 23 de outubro. Só esperamos uma definição das outras associações do país”, declarou.

Profissão digna que forma outros profissionais

Mas ainda há os que vêem o trabalho de maneira positiva. Herculano Torres, professor de uma instituição de ensino particular da cidade, trabalha há 40 anos lecionando. “Só o fato de ser professor já é motivo de comemoração, pois além de ser uma profissão digna, forma outros profissionais do futuro”, declarou. Para ele, o bom profissional é aquele que possui múltiplos saberes, além daqueles da sua área específica. “Entretanto, a falta de tempo é um impedimento para que o professor possa se atualizar e continuar estudando”. Alia-se a isso, o fato da alta incidência de doenças consideradas típicas dessa profissão, como pânico, depressão e outras como a Fobia Escolar. Herculano explica que existem diferenças entre lecionar para os cursos superiores e para os ensinos fundamental e médio. “Alguns saberes é que dão condições de atender aquela faixa etária. Entre eles, estão o diálogo e o bom relacionamento com os estudantes. O professor pode ter um conhecimento profundo de conteúdo, mas se não tiver um bom relacionamento, não adianta”, afirma. Segundo o secretário de Educação, Mário Cardoso, apesar de ainda não ser o esperado, a situação dos professores já teve melhoras. “Temos uma parceria com a Escola de Governo, garantindo a pós-graduação de 150 servidores, além do Projeto Bate-Papo do EJA (Educação de Jovens e Adultos), que envolve 150 professores e outros projetos de formação de professores em parceria com com a Funcap e Susipe”, enumera. Mário diz que atualmente, 40 professores estão fazendo especialização no Ministério da Educação. “Somando todos os docentes, já são 740 professores capacitados”. O secretário cita ainda a política de descentralização do Governo, que direciona projetos para todo o Pará. “Temos o Programa Pró-Gestão para a capacitação de gestores escolares das URE’s e técnicos e secretários de escolas. São 480 profissionais de 82 municípios até o fim do ano, em educação em cursos nos municípios de Santarém, Marabá, Conceição do Araguaia, Castanhal, Capanema e Belém”.

REAJUSTE — Cardoso também citou o reajuste salarial de 9,8% dado pelo governadora, 6,5% a mais do que as perdas ocorridas no ano passado. “E tem mais: já está nas mãos da governadora para sanção, o projeto de lei que prevê concurso público para 15.600 vagas para a secretaria”, afirmou. “E a governadora Ana Júlia ainda deve assinar um decreto para criar o Plano de Cargos, Carreira e Remuneração dos profissionais do magistério e devemos apresentar na Assembléia Legislativa no primeiro semestre de 2008”, prevê.

Ainda o etnocentrismo?

Desde ontem, tenho acompanhado a repercussão do Círio de Nazaré pela grande imprensa fora do Pará. A Folha Online não dá nenhum destaque à maior procissão religiosa do mundo, embora em sua página inicial (baixando a tela) se encontra um título específico para as festividades de Nossa Senhora Aparecida. Mas isto é em São Paulo, certo? Para nós, apenas notícias na sua lista normal.
Já a Globo.com deu uma atenção muito maior. Desde ontem havia um link específico no G1 e, hoje, há um na página inicial, que abre um vídeo.
Pelo visto, a imprensa do Brasil — aquele país que fica de Brasília para baixo, aceitando a convivência com partes do Nordeste, por causa das praias e do carnaval — continuando tratando o Círio como um evento muito, mas muito menor do que é.
Tem nada, não.
Feliz Círio até para eles.

Atualizado em 14.10.2007, às 23h40:
Hoje, a Folha abriu uma seção especial para o Círio, em sua página inicial, logo acima da Parada Gay carioca. Já é um avanço, não?

sábado, 13 de outubro de 2007

Feliz Círio!


Como diz o velho e querido samba-enredo,

Rogai por nós, ó virgem santa,
pois precisamos de paz!

Feliz Círio para todos!

Interessante teologia

"Jesus ensina que o único pecado imperdoável é a blasfêmia contra o Espírito Santo. Para os demais, há perdão, se houver arrependimento".

Com essas palavras, Edir Macêdo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus, ensina que até a corrupção é perdoável. Então tá.
Macêdo deve ter a intenção de angariar simpatias ao se mostrar publicamente dócil em relação ao abortamento, ao homossexualismo e à pesquisa científica com células embrionárias. Sem dúvida, mais simpático com os pecadores do que a Igreja Católica, que condena com veemência cada um desses itens. E agora ele deu um alento para os políticos brasileiros.
Você já sabe: pode barbarizar. Na hora da morte, é só se arrepender. Simples, assim.

A mensagem ficou

Autran e seu algoz: ficou uma mensagem


Não foi apenas uma trajetória teatral maravilhosa que ficou como legado de Paulo Autran (7.9.1922 — 12.10.2007). Antes de morrer, vitimado pelo câncer de pulmão e pelo enfisema pulmonar que adquiriu graças ao tabagismo, ele — talvez se considerando perdedor de uma guerra contra o vício —, pediu à esposa, Karin Rodrigues, que alertasse as pessoas, especialmente os jovens, para não fumar.
Segundo a viúva, Autran acreditava que, se não fosse fumante, poderia ter mais 10 anos de vida.
Espero que sigam as tuas lições, Paulo. Sobretudo essa última.

Mondo cane

É o mundo, animal. E bem aqui, em Belém do Pará. Segundo o Repórter 70 de hoje:

São tantos os ladrões em Belém que quatro se enfrentaram a bala, na Alcindo Cacela entre Gentil e Magalhães Barata, na disputa por uma vítima que estava sendo assaltada.

A nota, infelizmente, não revela se a vítima conseguiu fugir ou se, o que é mais provável, foi roubada e ainda ficou à mercê do bando perdedor, para verificação de eventuais despojos. Parece coisa de desenho animado. Mas não é animado. É trágico. E bem sob nossos narizes.

Coletivos

Do Dicionário Eletrônico Hoauiss:

CACHO
substantivo masculino
1 conjunto de flores ou frutos que brotam muito próximos entre si
2 Rubrica: morfologia botânica.
m.q. racemo ('tipo de inflorescência')
3 Derivação: por analogia.
qualquer conjunto ou agrupamento de pessoas ou coisas, esp. quando dispostas proximamente entre si, ou suspensas, ou se assemelhando a um cacho ('conjunto')


ENXAME
substantivo masculino
1 conjunto de abelhas associadas que, acompanhando sua rainha, deixam a colmeia para fixar-se em outro local
2 conjunto de abelhas de uma colmeia
3 Derivação: por extensão de sentido.
grande número de animais
Ex.: e. de vespas, de gafanhotos
4 Derivação: por metáfora.
grande quantidade de pessoas ou coisas; abundância, multidão, quantidade, profusão

Do Repórter Diário de hoje (negritei):

Abelhas assustam
A romaria fluvial deste ano promete ser a maior da história. A governadora Ana Júlia, tendo ao lado a ministra Marta Suplicy, vai acompanhar em uma embarcação de tamanho médio. Paratur e Setran, mobilizando embarcações maiores, vão levar jornalistas e convidados. A Setran, aliás, mandou fazer uma limpeza geral na área da Enasa, ao lado do Hospital Sarah, onde a governadora e comitiva embarcam. O medo era de um enorme cacho de abelhas que ficava próximo demais da área do trapiche.

Sei que a linguagem é uma força viva e que não podemos cerceá-la, mas cacho de abelhas não me caiu bem. Será que o autor da notícia passeia com uma vara de cães e oferece à mãe um arquipélago de flores?

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Garota, eu vou pra Califórnia

Os californianos dão mostras de uma civilidade muito superior a nossa. Depois falam que o governador Arnold Schwarzenegger não merece respeito. Quer saber o motivo? Clique aqui.

Improbidade

Cidade cheia por causa do Círio — todo mundo acha lindo. Inclusive eu. Todavia, esse fato também gera uma situação que considero melindrosa. Por toda parte se veem autoridades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, e outras mais que titularizam cargos ou funções públicas, ou exercem mandatos eletivos. Ontem pude constatar um pouco disso pessoalmente, num restaurante da cidade.
Para os ilustres visitantes, que pertencem às elites do país, só o bom e o melhor. Os anfitriões têm que impressionar, certo? Daí o desfile de carros oficiais, motoristas fazendo hora extra noturna, incursões nos restaurantes mais sofisticados, palanques erigidos em áreas privilegiadas, brindes a distribuir fartamente, diárias caras em hoteis. Tudo custeado com dinheiro público!
Essa turma ganha os vencimentos ou subsídios mais altos da República — os visitantes e seus cicerones. Todos podiam custear as próprias despesas, mas isso não acontece na República das Bananas. Para isso existem os otários, como você e eu, sempre dispostos a suportar, através dos nossos impostos, o luxo, a vaidade e a ostentação dos privilegiados, que consideram normal usufruir do alheio e dirão que estas minhas palavras são insurgência de invejoso ou coisa de pobre. Digam o que disserem, elas são a irresignação de quem está cansado de ver os canalhas se dando bem impunemente.

Atenção: para aquelas autoridades que respeitam a coisa pública e não usam o nosso dinheiro em seus excessos, estas minhas palavras obviamente não se aplicam. Sei que muitas teorias mirabolantes podem ser usadas para justificar esses gastos, mas eles são o que são. Quem se doer, passou recibo.

Amar sem ver

Ajoelhei-me no chão: estava louca para fazer uma coisa dessas, nunca tive que fazer isto nem quando era criança — meus pais nunca acreditaram em orações. Não fazia idéia do que dizer. Maurice estava morto. Extinto. Não havia uma coisa chamada alma. Mesmo a meia felicidade que eu dei a ele foi sugada como sangue. Eçe nunca mais teria a chance de ser feliz. Com ninguém, eu pensei: alguém poderia tê-lo amado e tê-lo feito mais feliz do que fui capaz, mas agora ele não teria esta chance. Ajoelhei-me, pus a cabeça na cama e desejei que pudesse ter fé. Querido Deus, eu disse — por que querido, por que querido? — faça-me ter fé. Não consigo acreditar. Faça-me acreditar. Sou uma cadela e uma impostora e me odeio. Não consigo dar um jeito em mim mesma. Faça-me acreditar. Fechei os olhos bem apertados, enfiei as unhas nas palmas das mãos até não sentir mais nada além da dor, e disse: vou ter fé. Faça com que ele esteja vivo e vou ter fé. Dê-lhe uma chance. Deixe-o ser feliz. Faça isso e eu acreditarei. Mas não foi o suficiente. Acreditar não dói. Então eu disse: eu o amo e farei qualquer coisa se Você fizer com que ele esteja vivo. Eu disse bem devagar: vou desistir dele para sempre, deixe apenas que esteja vivo e tenha uma chance, e apertei até sentir a pele rasgar e disse: as pessoas podem amar sem se ver, não é? Elas amam Você a vida inteira sem vê-Lo. E então ele apareceu na porta, e estava vivo, e eu pensei, agora começa a agonia de ficar sem ele, e desejei que estivesse morto outra vez sob a porta.

Graham Greene
 Um dos mais fortes trechos do romance Fim de caso, do inglês Graham Greene (no meu exemplar, 3ª edição da Record, 2000, pp. 117/118), publicado originamente em 1951. Fala sobre um homem, Maurice Bendrix, convidado a descobrir quem seria o amante da esposa (Sarah) de um amigo (Henry Miles). Aceita o encargo pois ele mesmo fora amante dela e, tendo sido súbita e inexplicavelmente abandonado, quer saber quem seria o homem que teria custado a sua felicidade. Mas suas investigações o levam a uma descoberta surpreendente, que revela um sacrifício por amor. E como ficar longe da mulher que se ama e que retribui o sentimento, especialmente após se saber o tamanho de sua devoção?
Greene se converteu ao catolicismo em 1926 e, desde então, passou a abordar em suas obras os dilemas morais e espirituais típicos de seu tempo. Fim de caso faz uma inegável apologia do catolicismo, apesar de o protagonista não ceder até o fim. Foi considerado o maior escritor católico da Grã-Bretanha (rivalizando, portanto, com C. S. Lewis), mas sempre rejeitou tal rótulo.
Em 1999, o cinesta Neil Jordan levou Fim de caso às telas, tendo Ralph Fiennes, Stephen Rea e a maravilhosa Julianne Moore nos papeis principais. Classificado como drama, eu o considero carinhosamente o meu filme de amor favorito — um raro exemplo de filme melhor do que o livro que o originou. Embora essa minha opinião seja altamente controversa.


Recomendo ler e ver.

Para ser solidário e prevenir as pessoas

O que você faria se uma pessoa aparentemente honesta começasse a dilapidar o seu patrimônio e o colocasse, da noite para o dia, à mercê de dezenas de consumidores furiosos? O que faria se, de repente, se visse em meio a 19 ações judiciais enquanto o malfeitor nada sofre? O que faria se o delegado de polícia, inexplicavelmente, não concluísse o inquérito, sem dar explicações?
Esta drama é verdadeiro e recai sobre o amigo Fred Guerreiro, meu ex-aluno e nosso companheiro de blogosfera. Conheço a história há tempos, mas somente agora ele decidiu torná-la pública.
Sugiro que leiam a postagem que ele escreveu em seu próprio blog, observem a situação e aprendam o nome. É muito importante sermos alertados contra o fato de que, por trás de um belo sorriso, pode estar um estelionatário perigoso, capaz de arruinar vidas.

É hoje o Auto do Círio

O meu jabá continua aí ao lado, mas não custa lembrar. Hoje é a sexta-feira que antecede o Círio, portanto esta noite, a partir das 19 horas, acontece nas ruas da Cidade Velha, começando na Praça do Carmo, a procissão dos artistas em homenagem a Nossa Senhora de Nazaré — o Auto do Círio.
Música, dança, teatro e poesia em meio à fé. Prestigie.

Pedido de ajuda

Há bastante tempo — tempo demais, na minha opinião —, meu computador foi invadido por uma desgraça chamada CiD:, que nem sei o que é. Suponho tratar-se de um programa, cuja finalidade é me obrigar a ver pop-ups de publicidade. Tenho instalado o Norton Utilities, com anti pop-up e ele funciona, mas não para esse maldito CiD. Assim, quando navego na internet, se abrir uma página nova, lá vem a propaganda de roupas, jogos, cassinos online e pornografia, o que me custa alguns constrangimentos previsíveis.
Já fizemos uma pesquisa pela internet e encontramos sítios em inglês com explicações detalhadas (leia-se: longas, enfadonhas e ineficazes) sobre como excluir essa miséria. Tudo em vão.
Por isso, se algum leitor souber do que estou falando e puder me sugerir como me livrar desse inferno em vida — que não seja formatar o disco, pitombas!! — agradeço penhoradamente. Paz em Cristo.

Portas para o futuro

Há mais ou menos duas décadas, quando o Brasil não montava carros, mas apenas carroças, possuir um automóvel com quatro portas era sinônimo de sofisticação. O sujeito precisava de bala na agulha para ostentar um brinquedo como o Maverick — ou o Corcel II ou o Diplomata.
Com o tempo, porém, felizmente, as montadoras brasileiras decidiram levar a característica para veículos mais em conta, inclusive para os populares, categoria engendrada no começo dos anos 1990, graças à qual muita gente conseguiu sair dos pontos de ônibus. A comodidade seduziu o público brasileiro. Nada mais de bancos dianteiros com encosto rebaixado, para o passageiro de trás se espremer e passar. Nada mais de os passageiros da frente terem que saltar para liberar os caronas. Mais espaço e rapidez de movimentação. Paixão fulminante e definitiva, hoje, a maioria esmagadora dos automóveis produzidos no país têm quatro portas (ou cinco, contando com a do porta-malas, em alguns modelos).
Mais recentemente, uma onda de esportividade andou influenciando as fábricas, que decidiram apostar novamente em modelos apenas com portas dianteiras. Ao menos no Brasil, o movimento foi tímido, mas permitiu o surgimento de produtos como o Citröen C4, esse modelo inovador, especialmente na traseira. Tive a oportunidade de fazer, logo depois do lançamento, um breve test drive nele, justamente o que me motivou a escrever esta postagem.
Enquanto a vendedora se esmerava em mostrar as vantagens do produto, especialmente o que ela chamou de "preço tímido" (quase 70 mil reais), jurando que eu pretendia fazer a compra, sentei-me no banco do motorista e, após namorar o belíssimo painel, pousei os olhos na porta. Imensa. Abri e fechei, para observar o enorme ângulo que faz quando se move e concluí: quem tem um carro desses, não pode estacionar nos shoppings de Belém. Se o fizer, só descerá dele se tiver um teto solar, pois aquelas vaguinhas vagabundas, estreitíssimas, crueis com os gordos e fatais para os maus motoristas, são simplesmente impraticáveis.
As fábricas de automóveis devem adequar os seus produtos ao mercado específico. Carros de duas portas, as quais por motivos óbvios precisam ser grandes, estão se tornando um problema nos grandes centros urbanos, onde a luta por espaço está assumindo contornos épicos. E não apenas nos estacionamentos, mas inclusive nas ruas. Hoje, com o incremento do número de veículos em circulação, cada vez mais eles avançam por entre as faixas de rolagem. Cada centímetro é valioso. Por isso, os motoristas tiram o fino dos automóveis estacionados. Na hora de abrir uma porta voltada para o tráfego, qualquer descuido pode custar caro. Ainda mais por causa dos ciclistas e sua absoluta incapacidade de respeitar as regras de trânsito.
O drama é mundial, claro, o que explica as fábricas investirem em projetos audaciosos, para driblar a falta de espaço. Mesmo que o resultado seja um mondrongo como o Pivo 2, da Nissan, que você abaixo:



A ousadia do Pivo 2 é girar sobre o próprio eixo e se espremer para facilitar o estacionamento. Quer um desses?

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Compulsão: arte e crime

Em dezembro de 2000, Dariusz Janiszewski, dono de uma pequena agência publicitária de Wroclaw, Polônia, foi torturado e assassinado e teve seu corpo mutilado. Os restos foram encontrados no rio Oder, que banha a cidade. Apesar das investigações, não se descobriu o homicida. Anos mais tarde, Krystian Bala, escritor radicado naquela mesma região, lançou o livro Amok ("Arrebatamento", em português). No romance, publicado três anos após a morte, ocorre um homicídio, narrado com riqueza de detalhes — detalhes que faziam a narrativa tão semelhante ao crime pendente que uma denúncia anônima recomendou, às autoridades, que lessem o livro.

Bala foi investigado e se tornou o suspeito oficial. No final das contas, seu romance não se tratava de ficção: ele não se conteve e transportou, para a obra, o crime que de fato perpetrara, por motivos passionais: a vítima teria um relacionamento com a esposa do escritor.

Parece roteiro de livro ou de cinema, certo? Mas é verdade. No último dia 5 de setembro, Bala foi condenado a 25 anos de prisão.