segunda-feira, 24 de junho de 2013

Medidas de exceção?

Ouvi, nos últimos dias, pessoas falando sobre o risco de os militares começarem a se assanhar por causa da onda de manifestações espalhada pelo país. Considerei a perspectiva exagerada, mas agora me deparo com preocupação semelhante, exarada pela Profa. Janaína Paschoal, que leciona direito penal na Universidade de São Paulo e, em sua fala, procura reforçar a liderança da USP em relação a tudo que acontece no país. Mas o alarmismo de Paschoal não está sendo compartilhado pelos próprios colegas.

Não sou cientista político nem tenho conhecimento sobre a dinâmica das instituições brasileiras que me permita uma análise razoável da conjuntura. Por ingenuidade ou ignorância, não estou preocupado com os militares. Até prova em contrário, não creio que seja o caso de pensar num levante, num golpe, em ameaça armada contra a democracia.

O mundo mudou bastante da década de 1960 para cá. Não podemos esquecer que o golpe de 1964 (golpe, não existe outro nome para o que aconteceu) somente foi vitorioso porque uma conjugação de fatores, nacionais e internacionais, garantiu o sucesso da empreitada. Naquela época, o mundo se debatia com a Guerra Fria, de modo que o alinhamento com os Estados Unidos contra a tal ameaça comunista era um discurso que fazia sentido. Hoje, o comunismo acabou e os americanos substituíram os comunistas pelos terroristas nas prioridades de combate. Já tendo eliminado Saddam Hussein e Osama Bin Laden, desarticulando a Al Qaeda, neste momento estão mais preocupados em se reerguer do desastre econômico iniciado em 2008.

Além disso, os líderes mundiais que mais se opunham aos Estados Unidos também estão partindo. Chávez morreu; o Irã acabou de eleger um novo presidente, de perfil mais conciliatório, e a Coreia do Norte é governada por um moleque que brinca de tentar assustar o mundo com supostas ameaças nucleares. Salvo Cuba, que não tem força para nada, o país declaradamente comunista (na verdade, capitalista de Estado) restante é a China, que interage numa boa com o Ocidente, se lhe for vantajoso.

Além disso, na década de 1960 boa parte da América Latina foi palco de ditaduras militares. Esses países todos se transformaram em democracias, ainda que tímidas, como é o caso do próprio Brasil, em que o sistema democrático funciona muito bem na forma, porém não em substância.

Outro suporte imprescindível que os golpistas brasileiros tiveram foi da classe média, mas hoje seria diferente. O que essa faixa da população quer é segurança, pessoal e patrimonial, mas duvido que esteja disposta a tolerar restrições pessoais. Não consigo ver um Brasil de Congresso Nacional fechado, de Supremo Tribunal Federal aparelhado, de habeas corpus suspenso, de censura oficialmente restabelecida.

Não acho, também, que desta vez a Igreja estenderia sua mão amiga às Forças Armadas, nem ela teria toda essa força, já que hoje divide o rebanho com diversos segmentos evangélicos e vê o aumento do número de ateus e agnósticos. Além disso, melhoraram os níveis de educação e de articulação entre os indivíduos. Controle da internet? No país em que as redes sociais crescem mais rapidamente? Fala sério.

Em suma, reafirmo a minha baixa capacidade de fazer este tipo de análise, porém manterei o meu ceticismo quanto ao risco de Forças Armadas, sucateadas e sem legitimidade social, tentarem assumir o comando. A instabilidade vai passar. O povo brasileiro está vivendo um momento de catarse, está extravasando, vivendo o sonho de se manifestar nas ruas. Mas uma hora vai perceber que a mudança tão perseguida é mais fácil de obter do que parece: basta votar melhor no próximo ano. Mas isso, claro, depende de haver opções disponíveis para o eleitorado.

Outra percepção a que precisam chegar é que, sem envolvimento com partidos políticos, gerando seus próprios representantes, os manifestantes não chegarão a lugar algum. Mas a coisa começa alucinadamente. O bom senso vem depois. ele virá.

5 comentários:

Anônimo disse...

A ameaça de golpe ainda é distante, mas não pode ser desprezada.

Golpes não faziam sentido apenas no contexto da Guerra Fria, eles existiam antes dela, e continuam existindo depois.

Em 2002, houve tentativa de golpe de Estado na Venezuela. Em 2012, foi efetivado no Paraguai.

2012 foi ano passado. E o Paraguai está aqui do lado. Não estamos distante no tempo, nem no espaço. No contexto, estamos? Um pouco, mas nem tanto.

Existe sim uma classe média brasileira conservadora e moralista, doida pra tirar do poder a "presidenta do bolsa família".

Marajoara.

Anônimo disse...

Não passarão!!!

Yúdice Andrade disse...

Verdade, meu amigo Marajoara. Não quis dizer que o perigo não existe, mas apenas destacar que as Forças Armadas não possuem a infraestrutura e muito menos a ascendência social de antes. Além disso, não receberiam o mesmo apoio interno e externo. Veja-se que os mencionados golpes tentados na América Latina, em anos recentes, foram mal sucedidos. A conjuntura realmente mudou.
Quanto à classe média moralista e conservadora, ela sabe que pode acabar com governos mais à esquerda simplesmente votando, sem a necessidade de tolerar aventuras perigosas. Não é uma questão de princípios morais, mas de preocupação com o próprio bolso que faria essas pessoas recearem um novo período de exceção.

Não passarão, das 22h55!

Cléoson Barreto disse...

Olá!
O meu temor atual é de que o golpe parta justamente de quem já está no poder. Já ouvi comentários em rodas de conversas de planos para que o PT fique no poder pelo maior tempo possível. Na época em que o Lula era presidente, houve um boato muito forte sobre uma tentativa de emplacar a reeleição ilimitada, que já valeria para beneficiar o próprio Lula.
Um abraço.

Anônimo disse...

Regina Duarte está com medo.