Comigo foi bem parecido com a trajetória de muitos: quando criança, achava Roberto Carlos um saco, mas depois de adulto comecei a apreciar seu trabalho, desde que fazendo uma boa peneiragem, para separar joias como "Sua estupidez" de bobagens monumentais, como a sua sequência de homenagens às mulheres de 30, de 40, de óculos, gordas, etc. E, como acontece em relação a outros artistas, penso que suas canções ficam ótimas mesmo na voz de outros intérpretes. E dá-lhe Maria Bethânia e Adriana Calcanhotto!
Mais jovem, também não entendia por que Roberto Carlos ganhava um especial todos os anos, na emissora de TV que praticamente dominava o país (e hoje permanece francamente majoritária, embora com concorrência real). Achava aquilo um despropósito, mesmice, argumentos até hoje repisados por muitos. De minha parte, não vou entrar nessa de atacar o RC natalino da Globo, pois isso também é um clichê. É mais ou menos como menosprezar as novelas, em âmbito reduzido. Não gosto do show do Roberto e por isso não assisto, mas não faço disso nenhuma bandeira ideológica. Tenho outras mais relevantes com que me ocupar.
O que realmente se deve entender nessa história é que a Globo é uma empresa que joga para ganhar, não importa por quais meios. 40 anos atrás, com Roberto Carlos no topo da música brasileira, ao menos em termos de apelo popular, alguém lá dentro foi visionário e decidiu: vamos contratar o cara (sem trocadilhos)! Demorei a entender por que diabos uma emissora de TV queria um cantor no seu staff, para usar uma única vez no ano (exceto por eventuais aparições em programas, que foram rareando com o tempo), mas o motivo era claro: impedir que a concorrência usasse o prestígio do cantor para ganhar audiência, mesmo que em ocasiões específicas. A longevidade do sucesso de Roberto mostrou que o tal visionário deu uma dentro, em uma perspectiva mercadológica.
40 anos se passaram e Roberto Carlos continua lá, fazendo apenas a mesma coisa de sempre. Não se iluda: é nisso que reside o seu sucesso. E não apenas o dele: quando cantores e bandas estrangeiros vêm ao Brasil para megaeventos, eles não cantam as canções do último CD (que às vezes é um lançamento de anos atrás), e sim oferecem um espetáculo sintético de seus anos de carreira. O público quer o memorável, não o atual. Por isso, criticar o mais do mesmo de Roberto também é ingenuidade.
O que efetivamente não gosto nos especiais de Roberto Carlos — e por isso nunca assisto, porque se trata de uma questão de concepção do espetáculo — é o fato de que ele deixa a cargo dos produtores da Globo as inovações que serão apresentadas todo ano (sabe-se lá se tem escolha).
Por inovações entenda a participação especial de algum artista que esteja em voga no momento, para fazer a fusão de popularidades e alavancar a audiência. Não importa a qualidade, apenas o atiçamento do público. Os parceiros do passado, amigos fieis, foram deixados de lado e isso é causa de mágoas. Este ano, foi Anitta, cantando obviamente o seu único hit. Nada mais óbvio: alguém na Globo decidiu que essa moça merecia superexposição. Outras emissoras foram atrás e tivemos uma overdose de funkeira que não gosta de ser chamada de funkeira. E adivinhe o que toca, hoje em dia, nas festinhas infantis?
Devo dizer, entretanto, que intercalar o tema único da mocinha com "Se você pensa" foi uma boa sacada, embora o resultado não tenha sido nada demais (vi pelo YouTube), até porque Anitta há tempos anda fazendo a linha comedida, moça de família. Provavelmente assustada por estar ao lado de RC, estava miudinha no palco. Não houve sequer olhares provocantes ou insinuações veladas, mesmo da parte do cantor, que sempre foi bastante atiradinho. Não sei se é porque ele está namorando ou se porque se vacinou com a experiência de 2010, da qual só Paula Fernandes saiu beneficiada, ao catapultar a própria carreira (estou meio Fabíola Reipert, hoje; deve ser efeito do excesso de rabanadas...).
A busca frenética por audiência a todo custo explica, também, a presença de outras figuras do palco de RC, tais como Tatá Werneck, outro grande destaque do ano. Qual a sua função, mesmo? A de sempre: ela é popular, está na crista da onda, então traz audiência. E só. Marcelo Adnet não tem trazido audiência, mas a emissora ainda tenta justificar sua contratação ou recompensá-lo por arranhar sua carreira com os fracassos a que o submeteu.
E o especial é isso: as mesmas canções, com algumas variações, os convidados que agregam valor com suas presenças circunstanciais e, nos últimos anos, a elitização do público, pois hoje as gravações ocorrem com a plateia lotada de famosos. Tudo bem medido e calculado, tudo artificial. A emoção fica por sua conta e o número final de todos os anos. Mas continua funcionando.
2 comentários:
Professor, parabéns pela análise. Quase nunca concordo com você, mas gosto muito de lê-lo. acho louvável o sr se dispor a escrever para nós mesmo com tantas ocupações no dia-a-dia. O prazer de escrever por si só já se constitui num dom. Desejo um feliz ano novo para o senhor e aproveito para perguntar qual o nome dessa tipografia do blog. Bonitona rsrsrs! ABRAÇOS!
Bytenik, fiquei surpreso com a receptividade de alguém que quase nunca concorda comigo! Confesso que nem eu seria tão persistente no acompanhamento de um blog assim, por isso agradeço a audiência. Tentarei entender o que há de atrativo no blog, já que não são as ideias!
A fonte utilizada o blog se chama IM Fell DW Pica. Trata-se de uma fonte de internet disponibilizada pelo próprio Blogger. Como sou um jegue para esses assuntos, jamais faria uma formatação que não fosse fácil, já integrada à própria plataforma.
Abraço.
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