quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Libertad interior de la cabeza

No site do Senado uruguaio, a notícia é modesta e meramente descritiva:

La Cámara de Senadores votó 16 en 29 el proyecto de ley por el que se establece el control y la regulación por parte del Estado de la importación, exportación, plantación, cultivo, cosecha, producción, adquisición, almacenamiento, comercialización, distribución y consumo de la marihuana y sus derivados. Informó en Sala el Senador Roberto Conde.

Seguem-se os nomes dos parlamentares que fizeram uso da palavra e a informação de que o projeto seguirá para o presidente da República, o admirável José Mujica, para promulgação. No site da presidência, nenhuma notícia, por enquanto.

O comedimento dos uruguaios não corresponde ao extremo interesse que a matéria desperta mundo afora. Afinal, trata-se do primeiro país a liberar o consumo de maconha em qualquer caso, estabelecendo apenas uma restrição no que tange à quantidade de droga a ser disponibilizado a cada pessoas.

O marco legal das drogas é um assunto palpitante para a Criminologia, há décadas, porque está fortemente relacionado a questões como princípio da lesividade (quem se droga prejudica apenas a si mesmo, não a terceiros, de modo que não poderia ser criminalizado); criminalização de estilos de vida e, em especial, de pessoas já vulneráveis; política criminal "higienizadora"; combate ao crime organizado e à corrupção policial; guerra ao tráfico, à frente, claro, os Estados Unidos; custos sociais da liberação; questões tributárias; políticas públicas de saúde, dentre outros. Ou seja, neste momento há muita gente de olho na República Oriental do Uruguai.

Dada a moderação dos hermanos cisplatinos, colho na imprensa comum maiores informações sobre as consequências da mudança legislativa sob comento:

Dez aspectos sobre as inovações legislativas uruguaias (http://oglobo.globo.com/mundo/a-legalizacao-da-maconha-no-uruguai-em-10-pontos-11025561):

Papel do Estado
O projeto estabelece que o Estado assumirá o controle a regulação, a importação, a exportação, a plantação, o cultivo, a colheita, a produção e a aquisição de todas as partes da comercialização e da distribuição da cannabis e de todos seus derivados.

Órgão supervisor
A lei cria o Instituto de Regulação e Controle de Cannabis, o IRCCA, que dará licenças e poderá aplicar multas e suspender o registro dos infratores. O órgão também pode destruir mercadorias. Participam desse controle os ministérios da Agricultura e da Saúde Pública e a Junta Nacional de Drogas.

Quem pode plantar
A planta pode ser cultivada para pesquisa científica e criação de produtos farmacêuticos. O cultivo para consumo próprio será limitado a seis plantas ou 480 gramas anuais. Cooperativas de maconha também podem plantar, para isso, devem ter no mínimo 15 e no máximo 45 membros, além de uma autorização do poder Executivo.

Pena
Os que plantarem, armazenarem ou comercializarem ilegalmente podem cumprir pena de 20 meses a 10 anos de prisão.

Farmácias
IRCCA dará licença para que farmácias possam vender a droga. O consumo mensal máximo por pessoa é de 40 gramas.

Uso medicinal
O uso medicinal de maconha também será liberado.

Onde não pode fumar
A lei de tabagismo se aplica, com isso, fica proibido fumar maconha em lugares fechados. Não se pode consumir a droga quando houver mais de 1% de THC no organismo.

Publicidade
Fica proibido fazer campanha da maconha e passa a ser obrigatório o ensino da matéria "prevenção do uso problemático de drogas” em escolas e universidades.

Tratamento
Em cidades com mais de 10 mil habitantes serão inaugurados centros de informação e diagnóstico para reabilitação de usuários problemáticos.

Regulamentação
O governo tem 120 dias, quatro meses, para regulamentar a lei. Entre os pontos que precisam ser resolvidos estão a aquisição das sementes e como será a venda nas farmácias.

Acostumados a menosprezar a América Latina da qual faz parte (a preferência seria fazer fronteira com os Estados Unidos, especialmente com a Flórida), o máximo de respeito que os brasileiros costumam demonstrar pelo Uruguai diz respeito a aspectos turísticos e, mesmo assim, apenas recentemente. Contudo, o país vizinho merece respeito por sua preocupação com os direitos humanos e por seus investimentos sociais.

Segundo a Wikipedia, citando fontes, o Uruguai foi o primeiro país sul-americano a legalizar uniões civis homoafetivas e a adoção por homossexuais. Em 2009, tornou-se o primeiro país do mundo a oferecer um laptop e internet sem fio, gratuitamente, para cada criança do ensino primário. Devagar, vão fazendo o que podem. Por aqui, mesmo os direitos dos homossexuais saem lentamente e com dificuldades, já que dão trela para uma tal de bancada evangélica. E os investimentos sociais são insuficientes, equivocados e prejudicados pelos desvios.

O Uruguai se torna, em relação à maconha — uma das drogas mais consumidas do mundo, inclusive pela convicção de muitos de que ela não faz tanto mal assim, do que obviamente eu discordo —, um laboratório. O próprio presidente Mujica considera essa nova lei como um teste. Sem dúvida alguma, um teste que será acompanhado com grande atenção.

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