quarta-feira, 10 de abril de 2013

Insuportáveis dramas

"Rehtaeh nos deixou hoje porque quatro garotos acharam que estuprar uma garota de 15 anos não teria problema e distribuir uma foto que arruinou seu espírito e reputação seria divertido. Todo o bullying e perturbação ocasionou isso. Depois, a Justiça também falhou com ela. Essas são as pessoas que me tiraram minha linda garota."

Assim se expressou a mãe de uma adolescente canadense de 17 anos que se suicidou após um ano e meio de bullying decorrentes de um estupro e exposição de sua nudez.

Sempre temi pelas mulheres das minhas relações. Hoje, tenho especial temor em relação a minha filha. Porque o mundo avança e, hoje, as mulheres têm mais direitos reconhecidos e mais força para agir, no entanto isso não transformou de verdade a mentalidade da maioria dos homens. Ainda é extremamente natural para muitos usar o corpo da mulher para seu prazer pessoal, sem qualquer respeito, e ainda fazer disso instrumento de autoafirmação e de ridicularização alheia.

Não podemos ser lenientes com quem não demonstra respeito pelo semelhante. Mas isso vai além de ser contra o estupro. Ser contra o estupro é fácil. É preciso, ainda, ser contra as pequenas atitudes cotidianas que, toleradas e mal interpretadas pelo indivíduo médio, representam reafirmações do menosprezo pela mulher, hoje largamente favorecidas pelas ferramentas de comunicação, acessíveis a qualquer um.

Nada pior do que ser fácil fazer o mal. Eis aí um exemplo.

3 comentários:

Luiza Montenegro Duarte disse...

Ai, Yúdice, ontem fiquei tão triste e lembrei dessa tua postagem e de tantas outras do blog da Lola sobre o assunto. Amigos queridos meus estavam rindo de uma adolescente que cometeu a insanidade de tirar fotos nua e mandar pro namorado. O que aconteceu quando o relacionamento acabou, és capaz de imaginar.

Uma amiga ia sacar o celular para mostrar as fotos que estavam circulando no e-mail. Eu disse que não queria ver, que isso era crueldade e não tínhamos porque participar disso. Todos discordaram de mim, argumentaram que a menina foi idiota, que não era "ingênua" (na minha opinião, era justamente o contrário), que não sentiam pena porque ela mesma que provocou essa situação, etc.

Não nego que ela tenha contribuído, tenha feito um ato inconsequente, mas POR FAVOR, porque alguém tem que ser ridicularizado PRO RESTO DA VIDA porque mandou fotos íntimas pro namorado? Porque as pessoas não podem simplesmente esquecer e deixar pra lá? "Porque o mundo é cruel assim" (resposta que me deram)? É esse o mundo que queremos viver, em que nossos erros*, ainda que não interfiram na vida de ninguém, sejam expostos em praça pública?

O que me chateou mais é que eram amigos. Pessoas que realmente não fazem mal a ninguém conscientemente. E é longo o caminho quando nem pessoas de boa índole percebem que estão contribuindo para uma sociedade opressora, moralista e que machuca os outros o tempo todo.

Ao menos ontem, ninguém viu aquelas fotos. Ninguém concordou comigo expressamente, mas pararam de argumentar. Espero que tenham refletido. E que não ajudem a espalhar esse objeto de humilhação alheia por aí.

(*) Erro dependendo do ponto de vista. Considero um erro só porque as consequências são conhecidas, mas, sinceramente, porque exatamente seria um erro tirar fotos sem roupa e mandar pra quem já te vê sem roupa mesmo?

Yúdice Andrade disse...

Minha querida, o que tem me perturbado há tempos, sobretudo depois da consagração das redes sociais, é que filósofos como Hobbes aparentemente estavam certos quando tomavam como premissa a maldade como inerente ao ser humano. Minha psicóloga não falou em maldade, mas disse que a competitividade é da nossa natureza - e bem sabemos que competitividade pode fazer na cabeça das pessoas.
Penso, entretanto, que somos seres sociais e destinados à evolução. Por isso, não posso aceitar desculpas, escapismos sobre as coisas serem como são, como sempre foram, com a resposta que te deram. Temos o compromisso, conosco mesmos, e com a descendência que produzimo, de ao menos fazer um esforço por terminar melhor do que começamos. Se sou capaz de perceber que algo é ruim, então no mínimo eu devo me afastar dessa coisa - o que implica em não fazer, não aceitar, não ser condescendente com ela.
Ocorre que as pessoas se comprazem com o escândalo, com a agressão, com o sofrimento alheio. E quando o assunto tem a ver com sexo, então, funcionam também as taras que todos trazemos em alguma medida. Quero ver, porque de algum modo desejo tomar parte daquilo. Assistir pode ser uma forma inconsciente de cometer o "pecado" sem ser criticado por ele, já que o "erro" é do outro, não meu. Eu, pelo contrário, estou aqui criticando.
Temo as pessoas que se comprazem com a perversidade. E elas estão proliferando com uma velocidade assustadora!

Anônimo disse...

O que mais espanta é que ninguém recrimina a canalhice de quem divulgou as fotos. Um homem assim não queria nem como amigo. Por este e outros motivos sou cada vez mais Hobbes e menos J.J Rosseau.