segunda-feira, 14 de maio de 2012

Presídio particular

Medida comum na América do Norte e, por estas bandas, defendida ardorosamente há décadas pelo jurista paraense Edmundo Oliveira, a privatização do sistema penal está prestes a se tornar uma realidade, guardadas as devidas proporções. Na verdade, não se trata de uma privatização, mas de uma parceria público-privada, esta curiosa figura que desperta muita desconfiança e que agora chegou ao universo prisional.
A primeira prisão neste modelo está sendo construída em Ribeirão das Neves, região metropolitana de Belo Horizonte, e quando pronta, disponibilizará mais de 3 mil vagas. A previsão de inauguração é para agosto.
Se ajudar a conferir trabalho para os presos e, assim, fazer funcionar a complexa rede de sanções e recompensas próprias da execução penal, pode ser mesmo uma boa ideia. O cuidado a tomar é não fazer como os americanos, que primeiro privatizaram as prisões, depois começaram a prender cidadãos pelos mais variados e absurdos motivos, tais como ligar demais para a polícia ou tentar usar uma ambulância como táxi.
Afinal, se é privado, tem que gerar lucro. E não me parece uma boa ideia criminalizar para fazer dinheiro. Definitivamente, não é.

P.S. Uma curiosidade: a população da cidade não ficou muito feliz com a notícia da construção do complexo penitenciário.

3 comentários:

Anônimo disse...

E pelo andar da carruagem...talvez até aqui no Pará. Essa onda das chamadas parcerias público-privada me incomoda no geral, tendo em vista nosso histórico de corrupção nesta relação nada republicana entre empresas e Governos.
Ao mesmo tempo que me incomoda a aplicação no sistema penitenciário, em que observo uma possibilidade de melhorias, como a possibilidade mais concreta de se garantir (em tese) capacitação profissional e trabalho prisional, como você temo e muito que possamos criar uma indústria de prisões, justamente pelos motivos que elencastes, ainda mais com o imenso exercito de reserva de mão de obra que temos no Brasil.
Veja: Num contexto em que o trabalhador é tido como descartável, quando o custo da sua força de trabalho não é mais passível de manter ou aumentar a taxa de lucro (face a uma determinada proporção de capital constante utilizada e do grau de concorrência a que a empresa está sujeita no mercado). Com a crescente produtividade do trabalho, nomeadamente em esferas tecnologicamente avançadas, dá-se a expulsão de operários (manuais e intelectuais; qualificados e desqualificados) do mercado de trabalho. Em simultâneo, ocorre uma precarização dos vínculos laborais (trabalho temporário, contratos a prazo) com o correlativo aumento do subemprego. Aqui as fronteiras entre o emprego e o desemprego são, por vezes, muito ténues. Forma-se um «exército de reserva de mão-de-obra docilizada pela precarização e pela ameaça permanente do desemprego» (BOURDIEU, Pierre (1998) – Contrafogos. Oeiras: Celta. ISBN 972-774-007-3, p.133).
Portanto, poderíamos supor que não seria mais interessante para certas empresas "suspeitas", terem certificado de responsabilidade social, ter incentivos fiscais, pagar menos que 01 salário mínimo para cada trabalhador e sequer se preocupar com a legislação trabalhista e com uma oferta abundante de pessoas a serem "inseridas" no sistema prisional?
Também me incomoda é que essa onda liberalizante no Brasil não anda no mesmo compasso com a ética na politica e está imersa numa democracia que precisa ser mais fortalecida.
Sinto ainda que a luta por um serviço público de qualidade, que nos dá a ideia de universalização e acesso a todos está perdendo espaço para estas soluções privatizantes em que apenas alguns possuam condições financeiras de serem incluídos no "sistema" e sinceramente temo que num futuro eu ou meus descendentes tenhamos que pagar até pelo ar que respiramos.
Apenas para refletir...
Anna Lins

Yúdice Andrade disse...

Anna, as tais parcerias sempre foram alvo de inúmeras críticas no meio jurídico, a começar por sua gênese, num contexto de viabilização de planos do governo FHC, porém margeando as privatizações, que foram tão combatidas em sua época.
E, como dizes, para piorar elas chegaram ao sistema penitenciário, setor onde seriedade e eficiência não constituem exatamente uma tônica. Justamente por isso precisamos de pessoas como tu, com conhecimento de causa, para nos ajudar a entender um pouco melhor essa dinâmica.

Anônimo disse...

Estamos articulando uma sessão especial na ALEPA para trazer contribuições de um pesquisador da UFPa sobre o trabalho no contexto prisional. Quando tivermos a data marcada, te mando.
De repente, poderias sugerir que teus alunos participassem.
Afinal, existe muito preconceito nesta área, mas tb muita desinformação.
abraços
Anna Lins