segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Direito Penal na prática

Esta postagem é direcionada a estudiosos do Direito Penal e só faz sentido se, antes, você ler esta matéria.
Sucintamente:

1. A tese sustentada pelo atirador é de legítima defesa putativa. Face a motivos concretos (vários assaltos anteriores no local), ele supôs que haveria mais um e precisou reagir, ou melhor, antecipar-se. O art. 25 do Código Penal admite repulsa a agressão iminente.

2. Contra a tese, temos a ausência de confirmação mínima acerca do possível roubo. O atirador agiu sem se acercar das mínimas cautelas sobre a situação que pretendia arrostar e era exigível que o fizesse. Afinal, mesmo que se tratasse mesmo de um ou mais de um assaltante, ainda seria necessário verificar a presença de um inocente, antes de atirar. Houve excesso e este é punível.

3. Entendo que o excesso é culposo. Não me parece, no contexto, que o atirador tivesse, ao menos indiretamente, a intenção de lesionar pessoas inocentes. O excesso é culposo porque o agente, nas circunstâncias em que se encontrava, com um pouco mais de diligência, poderia evitar o dano. Em consequência, deve o atirador responder pelo crime de lesão corporal culposa, mas não me surpreenderei se lhe imputarem tentativa de homicídio. Afinal, raciocínios de força são corriqueiros, ainda mais em se tratando de vítima criança.

Quem tiver uma segunda opinião, por favor compartilhe conosco.

2 comentários:

Alisson Monteiro disse...

Caro Yúdice,
Apesar de não ser estudioso do Direito Penal, a quem é direcionada naturalmente a postagem, gostaria de fazer pequeno comentário a respeito.
Parece-me que a legítima defesa putativa só poderia ser reconhecida se na dada situação não se exigisse outra conduta que não a praticada pelo atirador, o que, tenho a impressão, não é o caso. Por isso, concordo que há delito a punir, mas com alguma dificuldade de admitir apenas a culpa, mas sim, talvez, com a verificação de existência de dolo eventual.
A atuação de um agente com uma arma de fogo traz especialidade a qualquer evento, na medida de sua irretorquível potencialidade de lesividade. Ao apontar uma arma de fogo a alguém, o agente, dificilmente, não tem o entendimento do potencial danoso de um disparo (talvez em casos em qua a capacidade cognitiva ainda é incompleta, como em crianças e adolescentes), de modo que entendo que a mera imprudência não se aplica a esse caso. Então, acredito que o melhor caiminho seria o da denúncia pelo crime de lesão corporal dolosa (dolo eventual), pois ao atirar, o acusado assumiu o risco de produzir o resultado.
Como disse no início, o Direito Penal não é minha especialidade, mas era preciso me posicionar, a fim de expor realmente o que penso sobre este evento: como defensor entusiasmado do desarmamento, lamento que tenhamos perdido a oportunidade, no plebiscito, de começar a varrer esse mal da sociedade brasileira. Não obstante, muito me preocupa a ausência de política pública que influencie no não uso desses artefatos e na consequente repetição desse tipo de acontecimento.
Abraço Fraterno
Alisson Monteiro (Major da Polícia Militar, Mestre em Direito - UFPA, Doutorando em Ciências Sociais -UFPA. E mais importante: ex-aluno do Yúdice)

Yúdice Andrade disse...

Caríssimo Alisson, para mim, és naturalmente um "estudioso do Direito Penal", seja pela formação em Direito, seja pela atuação como agente de segurança pública, ainda que a tua área de interesse particular não seja essa.
Gostei da tua análise, ainda que discorde dela. É importante ver o argumento do dolo eventual ser sustentado de forma desapaixonada e comprometida com a dogmática jurídica e com as necessidades sociais. Quem me dera se todo mundo pudesse argumentar assim! E olha que me refiro aos iniciados em Direito, porque naturalmente o leigo não tem como pensar dessa forma.
PS - Com essa titulação acadêmica, ser ex-aluno meu é mesmo assim tão importante? Valeu por encher a minha bola.