terça-feira, 30 de março de 2010

Nos primórdios da obsessão midiática brasileira pelo crime

Pelo visto, vou virar freguês do Domisteco, Fernandel. Pelo segundo dia consecutivo, indico uma postagem de lá. Desta vez, trata-se de um caso criminal sempre citado em minhas aulas, o assassinato da atriz global Daniella Perez por seu colega de elenco, Guilherme de Pádua, e a esposa deste, Paula Thomaz. Ele pode ser considerado um precursor, no Brasil pós-redemocratização, da obsessão midiática por explorar o mundo-cão e criar vilões perpétuos no imaginário coletivo.
Antes de prosseguir, leia aqui.
Minhas considerações:

1. O termo "bobagem" utilizado por Pádua para se referir ao homicídio não deve, necessariamente, ser encarado como cinismo. Apesar de infeliz e reducionista, o vocábulo pode exprimir a dificuldade que ele mesmo tem de encarar o seu pecado. Seja por convicção própria, seja pelas consequências sociais do crime, ninguém quer ser reconhecido o resto da vida como assassino. A "bobagem" pode ser uma forma inconsciente de suportar os próprios dilemas íntimos.

2. Ambos os réus foram condenados a 19 anos de reclusão, mas Paula Thomaz conseguiu, através de recurso, a redução de sua pena, salvo engano para 17 anos. Ao tempo em que o crime foi cometido 29.12.1992 , já existia a Lei de Crimes Hediondos, porém esta, em sua redação original, não alcançava o tipo de homicídio. Somente através da Lei n. 8.930, de 6.9.1994, tornou-se hediondo o crime de homicídio, "quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado". Trata-se do único caso de lei de iniciativa popular em matéria penal que efetivamente entrou no ordenamento jurídico brasileiro.

3. O crime que mudou a Lei de Crimes Hediondos não foi alcançado pelas mudanças nela, devido ao princípio constitucional que veda a retroatividade da lei mais gravosa. Graças a isso, os condenados puderam progredir de regime e acabaram obtendo a duras penas, porque foi preciso enfrentar a opinião pública, tendo à frente a Rede Globo e sua contratada, Glória Perez o livramento condicional, após cumprirem mais de um terço da pena.

Honestamente, achei lúcida a explicação de Pádua sobre considerar-se um assassino. Cada um se agarra no que quer. E se defende como pode.

4 comentários:

Tanto disse...

Finalmente consegui comentar - amigo, o blog é seu! E obrigado por complementar a postagem de lá, com as informações sempre pertinentes.

Lafayette disse...

Yúdice, você daria um grande advogado criminalista!

Quando quiser e for permitido, este lado da sociedade é seu aqui no escritório, que só tem carteira trabalhista e cível.

Vou te contar... vai ter argumentos bons assim lá...

Ps.: Não concordei com o amigo, mas confesso que é interessante o argumento!

Yúdice Andrade disse...

As tuas postagens jornalísticas estão excelentes, Fernando. Nível condizente com os grandes jornais, só que mais bem escrito.

Lafa, por impedimento profissional decorrente do meu vínculo com o TJE, estou sem advogar há alguns anos. Mas sinto muita falta. E sei que um dia voltarei às lides advocatícias. Espero que, nesse dia, o convite esteja de pé!

Lafayette disse...

De pé, deitado, sentado, de cabeça pra baixo... rsrsrs