terça-feira, 9 de março de 2010

Tantas histórias

Um dos relatos que escutei ontem, durante a palestra (veja as duas postagens abaixo), forneceu alguma dimensão sobre a intensidade dos danos causados pela violência contra a mulher. Contou-me a diretora da escola, Profa. Carina, um caso ocorrido na vizinhança de sua mãe.
Uma mulher passou anos sofrendo abusos físicos e sexuais por parte do marido. Temia-o tanto que jamais reagiu, por qualquer forma que fosse. Somente quando ele tentou abusar das filhas (então com 8 e 6 anos), foi que ela fugiu pela rua, desesperada, com as crianças. Foi acolhida na casa de uma vizinha. O companheiro a perseguia com uma faca, mas foi impedido de prosseguir porque os filhos da dona da casa, todos homens, puseram-se de pé à entrada. Como bem sabemos, machões que agridem mulheres costumam ser rapidamente dissuadidos diante de um obstáculo masculino.
Os vizinhos conversaram com a vítima e lhe prometeram apoio, desde que ela abandonasse o companheiro. Se voltasse para casa, ficaria por sua conta. Ela concordou. Houve uma coleta e a mulher viajou com as filhas. Nos anos seguintes, mudou-se três vezes, sempre que lhe diziam que o ex descobrira seu paradeiro. Vivia aterrorizada e só encontrou a paz dez anos mais tarde, quando lhe disseram que o sujeito morrera. O valentão encontrara outro mais valente do que ele, que lhe despachou com uma facada.
A mulher então voltou para Belém, com as filhas. Espera o dia que se casem para entrar num convento. Tem tanto medo de se relacionar com homens que só vê na vida monacal o caminho para o seu futuro. O problema é que as filhas, que salvou da violência, não desejam casar-se. Têm medo. A mãe tenta convencê-las de que nem todo homem é igual ao pai. E assim passa o tempo, nessa família trágica.
Quanto sofrimento uma única pessoa é capaz de causar?

4 comentários:

Ana Miranda disse...

Triste. Muito triste esse relato.
Infelizmente, há vários outros iguais a esse.

Yúdice Andrade disse...

Relatos assim existem à exaustão, em quantidade muito superior a das histórias razoavelmente bem sucedidas. Ontem mesmo escutei bem mais do que isso. Mas esta história me chamou a atenção por revelar que a vítima não se curou de seus traumas, mesmo uma década depois e com a morte do agressor. O único passo livre que ela deu foi retornar à cidade.
Como pode um ser humano viver desse jeito?

Tanto disse...

Que coisa triste. É a tese de que uma atitude pode influenciar a vida de várias pessoas, infelizmente de forma negativa, muitas das vezes.

Franssinete Florenzano disse...

Yúdice, essa é a tragédia diária de milhões de famílias "neste País". Apesar do sentimento de impotência diante de tanta opressão, é preciso usar nossa indignação a fim de divulgar ao máximo e exigir providências do poder público. Com sua licença, vou levar seu relato para o meu blog.
Grande abraço e parabéns pela abordagem de tema tão cidadão.