quarta-feira, 22 de novembro de 2006

Turismo é isso

A imprensa noticia hoje a chegada do transatlântico inglês Prinsedam a Icoaraci, onde atracou. Trouxe nada menos que 700 turistas para conhecer Belém. Pensemos: em países mais justos do que o nosso, o indivíduo trabalha anos a fio, com direitos sociais mínimos. Aqui temos uma vasta legislação trabalhista, descumprida a rodo e é muito fácil, na perseguição judicial a esses direitos, ganhar e nunca levar. Já nesses outros países vigora a liberdade contratual e o empregado não tem muitas garantias, mas os abusos são menores. E quando o cara se aposenta, tem renda suficiente para charlar mundo afora. É assim que entram em cena os transatlânticos cheios de turistas, desejosos de conhecer lugares que consideram exóticos.
Voltemos ao tema. Belém está pronta para receber esse fluxo de indivíduos endinheirados, curiosos e facilmente seduzíveis pelos encantos amazônicos, seus sabores e ritmos? Europeus dão gritinhos e pagam caro por essas pulseirinhas de semente de tento que até o meu afilhado de 10 anos sabe fazer.
Icoaraci está a 18 quilômetros do centro de Belém. O trajeto pode ser feito via Augusto Montenegro, muito longo e sem atrativos, ou via Arthur Bernardes, um pouco mais curto, porém, com um leito carroçável em mau estado de conservação. Que verão os turistas? Favelas, lombadas, profusão de bicicletas...
Chegando ao centro, terão segurança para caminhar em pontos turísticos óbvios, como o Ver-o-Peso ou nossas belíssimas praças? Naturalmente, sua aparência física e a quantidade de pessoas assanharão a bandidagem. E em vez de belos canteiros floridos, verão calçadas tomadas por camelôs, com as pedras portuguesas sumindo, lixo pelo chão e gramados pisoteados. E dá-lhe calor!
Será que o agente turístico, pensando na segurança dos visitantes, vai confiná-los na Estação das Docas, no Feliz Lusitânia, no Mangal das Garças e no São José Liberto, instituindo uma espécie de turismo de gabinete? Belém agora será vista através de vidros? Que contato terão com a nossa cultura, já que a única manifestação folclórica habitual é a apresentação das dezoito horas, sextas-feiras, na Estação? Onde poderiam ver cordões de pássaros ou bois?
Se eu prosseguir, ficarei mais triste. Enfim, quero dizer a quem possa dizer ao futuro secretário encarregado do assunto que turismo é isso: é a realidade das pessoas que chegam para ver e precisam ter condições de ver, precisam ser bem tratadas e sentir que valeu a pena ter vindo.
Se isso não existe, de pouco ou nada adiantam os palácios de vidro e ferro.

3 comentários:

Ivan Daniel disse...

Muito pertinente tuas colocações, Yúdice. É por isso que Manaus deixou Belém muito atrás na questão do turismo.

Anônimo disse...

Perfeito. Ótimas colocações.
Como certa vez eu disse para um amigo, Belém continua sendo "a terra do já teve". Não adianta fazer restaurações e novas construções, se não houver melhoria no aspecto geral. Se não houver investimentos também nas pessoas, na nossa cultura, nos nossos artistas.
Belém continuará sendo vista "através de vidros" se não houver cuidado com o entorno das obras, com a natureza, com o tratamento da
orla e dos buracos das ruas.
Vou para também para não me entristecer mais ainda.
Espero um dia ver Belém como uma cidade potencialmente turística.

Um abraço,

Luciane.

Obs: Reativei meu blog e reproduzi lá a sua postagem "Á espera de políticas culturais - Dança".

Anônimo disse...

Infelizmente, com a péssima educação do povo paraense, tornase mais difícil encontrar uma solução decente. Até côco é jogado pela janela de um carro em plena Alm. Barroso...
A melhor solução é a educação. Mas como os resultados não aparecem a tempo de uma reeleição nem no mandato seguinte, ninguém se interessa em investir seriamente nela...