Se um alienígena chegasse a Belém hoje e escutasse o discurso do empresariado acerca da decisão da Justiça do Trabalho, que proibiu o funcionamento dos supermercados nos domingos e feriados, talvez acreditasse na beleza de seus sentimentos. Mas isso se fosse oriundo de uma galáxia bem distante, porque quem conhece o grande empresário brasileiro típico sabe que, na prática, a teoria é diferente. O caso dos supermercados é bastante emblemático.
Os empresários logo ameaçaram com demissões, em proporções capazes de atemorizar quem precisa defender seu emprego e colocar, justamente esses beneficiados, em posição de ódio à decisão judicial. Mas as dispensas somente serão efetivadas se a decisão definitiva for desfavorável aos supermercadistas. Porque eles são sensíveis aos trabalhadores. Que bonitinho! Fossem mesmo sensíveis, não os obrigariam a jornadas escorchantes de trabalho, privando-os do repouso, que é uma necessidade física, e do direito de ter uma vida de relação, que é o desejo de todos, exceto os misantropos.
Em seu discurso falacioso para enganar trouxas, dizem ainda que estão tristes pelos consumidores, que serão os grandes prejudicados pela proibição. Os empresários decerto estão tão preocupados conosco como sempre estiveram: desde que estejamos lá para comprar, o mundo que se dane. Eles querem o nosso dinheiro, não a nossa felicidade. Sequer o nosso bem estar. Na verdade, os grandes prejudicados são os próprios empresários, que terão redução em seus lucros — isso sim uma grande infelicidade.
A questão é muito simples: não teríamos chegado a essa situação se os empresários tivessem contratado mais gente, em vez de contratar menos e exigir mais, para lucrar muito mais. Se os postos de trabalho fossem em maior número, seria muito mais fácil aos sindicatos de ambas as categorias chegar a um acordo benéfico e para eles e para nós, consumidores.
Mas não é assim que funciona, claro.
3 comentários:
Yúdice,
faço uma ressalva ao seu texto: se houve abuso dos empresários, obrigando os trabalhadores a jornadas excessivas, não vejo correção em restringir o trabalho aos feriados e domingos.
Se abuso houve, que o poder público (DRT e MPT) tome as providências, impedindo as sobrejornadas indignas.
Se o cenário fosse outro, em que o MPT e a DRT cumprissem de forma mais efetiva suas funções, creio que nenhum problema haveria em abrir aos domingos e feriados sem as negociações coletivas exigidas pela lei, pois ninguém trabalharia em excesso, garantindo a efetiva abertura de mais postos de trabalho.
Por isso, para resolver a febre, em vez de tratar a doença, matou-se o paciente.
Além do mais, exigir negociações coletivas como se fossem garantia de algo neste país é tapar o sol com a peneira. Ou temos realmente um sistema sindical forte e independente?
Abraços,
Vlad.
Tem gente confundindo as coisas.
O MPT (Ministério Público do Trabalho) não tem atribuições de fiscalizar as relações trabalhistas. Esta tarefa incumbe à DRT (Delegacia Regional do Trabalho, órgão do Ministério do Trabalho - Poder Executivo).
Por outro lado, o trabalho aos domingos NÃO DEPENDE de negociação coletiva. O que depende de negociação coletiva é o trabalho aos feriados.
Isto está bem claro na legislação.
Tomo de empréstimo o seguinte trecho de um recente artigo publicado na imprensa local:
As atividades do comércio em geral podem ser exercidas aos domingos? Sim. A competência para legislar privativamente sobre direito do trabalho é da União (art. 22, I, CR ). A competência do município é supletiva. Pode estabelecer o horário do exercício das atividades do comércio em geral, mas não pode condicionar o labor aos domingos à autorização sindical ou à previsão em convenção coletiva de trabalho.
Não é preciso muito esforço do intérprete para chegar a tal conclusão. O trabalho aos domingos foi autorizado a partir de 9 de novembro de 1997 (MP-1.539-34, reeditada até a de número 1982-77, hoje Lei 10.101/2000, art. 6º). Esta norma veio a ser alterada pela MP-388/07, hoje Lei 11.603/07. Passou, assim, a ter o seguinte teor: 'Fica autorizado o trabalho aos domingos nas atividades do comércio em geral, observada a legislação municipal nos termos do art. 30, inciso I, da Constituição.'
O fato de a norma federal haver mandado observar a lei municipal, não a autoriza, supletivamente, a legislar sobre o trabalho aos domingos, muito menos condicionar o seu exercício à (I) licença especial e (II) à estipulação em convenção coletiva de trabalho (Lei Municipal nº7.832/97, art. 2º, que malfere a CR, nada vale.). Primeiro, porque a matéria de competência legislativa privativa é indelegável. Segundo, porque se a União quisesse condicionar o trabalho aos domingos à existência de norma convencional, teria disposto expressamente a esse respeito, como fez, por exemplo, para o exercício das atividades do comércio em geral em dia de feriado: 'E permitido o trabalho em feriados nas atividades do comércio em geral, desde que autorizado em convenção coletiva de trabalho e observada a legislação municipal, nos termos do artigo 30, inciso, I da Constituição' (art. 6º -A, Lei 11.603/2007).
Artigo: "Trabalho aos domingos" (Deusdedith Brasil), "O Liberal" (3.4.08).
Finalmente, bem ou mal, o trabalho nos feriados, no caso, depende, sim, de negociação coletiva, cuja validade e eficácia é reconhecida na Constituição Federal (art. 7º, XXVI).
Vamos colocar a razão acima das paixões.
Agradeço ao Vlad e ao anônimo as contribuições para uma compreensão maior do caso. Como o Direito do Trabalho não é exatamente a minha praia, escrevi um texto centrado apenas no fato de que os empresários do setor se recusam a contratar mais pessoas, o que seria valiosa mostra de função social da propriedade (reduzir lucros para disseminar renda entre maior número de trabalhadores), sem me imiscuir sobre questões técnicas acerca do trabalho aos domingos ou em feriados.
Não quis ser simplista, apenas evitar erros de ordem técnica. Espero que contribuições como as suas ajudem a pôr a questão em bons termos.
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