quarta-feira, 7 de abril de 2010

A polêmica do protesto por novo júri

Em decisão previsível, o juiz Maurício Fossen negou o protesto por novo júri da defesa de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá. Admitiu o recurso como apelação e abriu vistas às partes para suas razões. Também é previsível que a defesa recorra dessa decisão, para levar, às instâncias superiores, a discussão sobre o cabimento do novo júri em relação aos crimes ocorridos ao tempo em que tal recurso existia. Isabella Nardoni foi morta três meses antes de entrar em vigor a Lei n. 11.689, de 2008, que extinguiu o protesto.
Contudo, a pretensão é mais bem recebida na doutrina do que na jurisprudência. Em São Paulo, p. ex., Estado onde corre o processo, ela não faz sucesso. O Supremo Tribunal Federal não possui decisões posteriores à Lei n. 11.689, mas o Superior Tribunal de Justiça sim; e contrárias aos anseios dos réus. Eis dois exemplos:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO CONSUMADO E TENTADO. RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA. JULGAMENTO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N.º 11.689/2008. PROTESTO POR NOVO JÚRI. NOVO JULGAMENTO.
1. O Ministério Público Federal suscitou preliminar de prejudicialidade do recurso em face da superveniência da Lei n. 11.689/2008, que extinguiu o protesto por novo júri.
2. A recorribilidade se submete à legislação vigente na data em que a decisão foi publicada, consoante o art. 2.º do Código de Processo Penal. Incidência do princípio tempus regit actum.
3. O fato de a lei nova ter suprimido o recurso de protesto por novo júri não afasta o direito à recorribilidade subsistente pela lei anterior. Preliminar rejeitada.
4. O acórdão em análise foi publicado antes da vigência da Lei n. 11.689/2008 que, em seu art. 4º, revogou expressamente o Capítulo IV do Título II do Livro III, do Código de Processo Penal, extinguindo o protesto por novo júri. Dessa forma, subsiste o direito à interposição do mencionado recurso, em virtude do reconhecimento de crime continuado com pena superior a 20 anos. Precedentes desta Corte.
5. Com a revogação do § 1.º do art. 607 do Código de Processo Penal pela Lei n.º 263/48, é possível o protesto por novo júri quando a nova pena é fixada em sede de revisão criminal.

6. Recurso provido para determinar a submissão do Recorrente a um novo julgamento perante o Tribunal do Júri.
(Recurso Especial 1094482/RJ - rel. Ministra LAURITA VAZ - Órgão Julgador: 5ª Turma - j. 1º/9/2009 - DJe 3/11/2009)

HABEAS CORPUS. PACIENTE CONDENADO PELO JÚRI POR 1 HOMICÍDIO CONSUMADO E 2 HOMICÍDIOS TENTADOS EM CONCURSO MATERIAL. PENA TOTAL: 22 ANOS E 6 MESES DE RECLUSÃO. REGIME INICIAL FECHADO. APELAÇÃO QUE RECONHECEU A CONTINUIDADE DELITIVA ENTRE OS DELITOS. NOVA PENA: 21 ANOS E 9 MESES DE RECLUSÃO. PROTESTO POR NOVO JÚRI INDEFERIDO PELO TRIBUNAL A QUO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. PRECEDENTES DO STJ. REVOGAÇÃO DO ART. 607 DO CPP PELA LEI 11.689/08 QUE NÃO ATINGE A SITUAÇÃO DO PACIENTE. CRIME E JULGAMENTO PELO JÚRI E PELO TRIBUNAL ESTADUAL OCORRIDOS ANTERIORMENTE À ENTRADA EM VIGOR DA NOVA LEI. PARECER DO MPF PELA CONCESSÃO DA ORDEM. ORDEM CONCEDIDA, PARA ACOLHER O PEDIDO DE PROTESTO POR NOVO JÚRI.
1. Afastado o concurso material de crimes e reconhecida a continuidade delitiva entre os crimes de homicídio pelos quais restou condenado o paciente pelo Tribunal Estadual, deve ser acolhido o protesto por novo júri, porquanto a pena resultante da aplicação da fictio juris do art. 71 do Código Penal é considerada como um todo unitário. Precedentes do STJ.
2. A revogação do art. 607 do CPP pela Lei 11.689/08 não atinge a situação do paciente; isso porque, tanto os crimes, como os julgamentos pelo Júri e pelo Tribunal Estadual ocorreram antes da entrada em vigor da referida lei.
3. Parecer do MPF pela concessão da ordem.
4. Ordem concedida, para acolher o protesto por novo Júri, mantida a prisão do paciente.
(Habeas Corpus 94281/SC - rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO - Órgão Julgador: 5ª Turma - j. 26/3/2009 - DJe 4/5/2009)


Continuo acreditando que a decisão final será contrária ao protesto por novo júri.

4 comentários:

Frederico Guerreiro disse...

E como fica a irretroatividade da lei penal para prejudicar os réus? Diga-nos, mestre, por que acredita que a decisão final será contrária ao protesto por novo júri? Eles não poderiam, em novo júri, ter inclusive as penas aumentadas?

Yúdice Andrade disse...

No que diz respeito ao aspecto processual, penso que a postagem já responde a tua primeira pergunta.
Acredito que a decisão final será contrária à pretensão da defesa porque o Judiciário paulista tem sido enfático em negar o protesto por novo júri e, quanto aos tribunais superiores, porque a medida se inseriria no pacote por mais eficiência do processo penal. Além do mais, o STJ já emitiu opinião.
É verdade que o STF volta e meia contraria o STJ e amplia as liberdades, mas tenho um sentimento - e é apenas isso, um sentimento, de que tal não ocorrerá, em relação a este tema.
Por fim, a posição esmagadoramente predominante é que, realizado um novo júri, nenhuma decisão pode ser tomada em desfavor do réu, numa comparação com o julgamento anterior, se não houve recurso do Ministério Público.

Frederico Guerreiro disse...

Obrigado, mestre Yúdice!

Anônimo disse...

EDWARD:
Boa noite! Quem puder mim orientar por favor.
Quando o juiz do caso nardoni diz: – daquele recurso não implicava, de forma direta, na soltura do réu quando de sua interposição ou mesmo na extinção de sua punibilidade, posto que, caso viesse a ser deferido, tão somente submeteria o réu a novo julgamento pelo Tribunal de Júri.
Ele abre brecha quando diz de forma direta o recurso não implicaria na soltura do reu nem na extição de punibilidade.
Implica dizer que de forma indireta sim ( o recurso implicaria pois em novo juri os reus poderiam pleitear sua inocencia ainda que remota a posibilidade).
LEMBRA CASO DA IRMÃ DORATY:
O fazendeiro (Bida)foi absolvido em segundo julgamento.
É fato que o fazendeiro (Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida) foi condenado no seu 3º julgamento porém o protesto por novo júri mostra sua natureza jurídica penal, (diretamente) ampliando-o o prazo para ius puniendi poder de punir do estado, sendo que o crime aconteceu em 2005 estamos em 2010 não tendo uma resposta final do mesmo. (aumenta o prazo prescricional, o prazo para aplicação do ius puniendi). E causando uma possibilidade ainda que remota e indiretamente de novo júri. O réu pode ser absolvido, como o foi, só vindo a ser condenado em um 3º terceiro julgamento.
Neste sentido, valemos da lição de Espínola Filho:
Normas penais:
As normas penais são aquelas que afetam, ainda que indiretamente, o ius puniendi (direito de punir) estatal, criando-o (norma penal incriminadora), ampliando-o (aumenta o prazo prescricional, o prazo para aplicação do ius puniendi) ou extinguindo-o (causa extintiva da punibilidade, abolitio criminis etc.).
E O GRANDE X DA QÜESTÃO: SE O ART 607 DO CPP, É UNICAMENTE PROCESSUAL OU ADENTRA NO DIREITO MATERIAL DO REU POSTO, QUE AMPLIA DIRETAMENTE NO PRAZO PARA O ESTADO PUNIR POIS ATÉ ESSE MOMENTO DO PROCESSO O REU AINDA TEM A PRESUNÇÃO DE INOCENCIA. E INDIRTETAMENTE NA POSIBILIDADE AINDA QUE REMOTA DO REU SER ABSOLVIDO EM OUTRO JULGAMENTO.
Partindo da premissia que devemos seguir a lei ao pé da letra.
Tirando esse direito do réu faz letra morta o artigo 5º inciso LV : aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes e artigo 5º, inciso LVII: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.. Todos da nossa lei maior a Carta magna de 1988, A Constituição Federal.
Friso :
Deixando uma clareza quase que solar na resposta da questão. Que chega a doer a vista.
Gostaria de se alguem puder mim ajudar, pois sou apenas um alto didata e mim interresei sobre o assunto. Era esperado o juiz primeira instancia negar e até mesmo o TJSP.
Porém vejo muita coerencia do direito ao recurso ser garantido no STJ ou STF.
Desde já agradeçido.