Já escrevi aqui no blog, em mais de uma ocasião, que compreendo perfeitamente o fato de o idioma ser, inevitavelmente, produto de fatores variados e dinâmicos. Por isso, a língua muda, sem que se possa fazer nada quanto a isso. E sem que esse fenômeno seja ruim. Acredito que você é um substitutivo bastante digno para o rebuscado vossa mercê. Existem, entretanto, modismos que me aborrecem.
O primeiro deles, claro, é o entrangeirismo. Quem acompanha o blog já sabe da minha implicância. Mas me refiro, aqui, a termos que acabam sendo assimilados pelo senso comum, sem qualquer justificativa plausível para isso. Natural que hoje todos falemos deletar (e aqui vemos o vocábulo inglês devidamente englobado pela Língua Portuguesa, que passa a interferir sobre a sua grafia e impõe as suas próprias regras de uso). Qual seria a razão, porém, para um indivíduo dizer que vai pedalar a sua bike?
O segundo modismo — e era nele que pensava quando comecei a escrever — são umas reduções toscas, que não cumprem nenhuma finalidade útil, senão forçar o surgimento de uma gíria. Hoje as pessoas comemoram o niver e, nele, servem refri. E para quê, isso? Economizar uma ou duas sílabas? Pronunciá-las custa tanto assim?
Penso que a razão — e esta é o motivo da marrentice que ora escrevo — é que as pessoas pensam cada vez menos em tudo e, por consequência, pensam cada vez menos no que falam. Com isso, as palavras e a construção das frases vão sendo progressivamente simplificadas. Aliás, corrompida seria um termo mais adequado. Assim, pode-se falar mais em menos tempo e espaço, não importando que haja comprometimento das ideias. Afinal, falar demais é indicativo de que não se tem o que dizer, certo? Fala-se menos, para liberar as pessoas para fazer outras coisas, mais ativas, mais físicas, mais condizentes com a noção atual de viver.
Viver, hoje, parece como disputar uma corrida. Uma corrida sem linha de chegada, onde não interessa quem está frente. Interessa, apenas, correr o máximo que se possa, sem parar. De preferência, sem sequer descansar. Afinal, há muita coisa acontecendo, que precisamos ver, fazer, etc. E para que tudo isso?
Quem puder, forneça-me a resposta para a pergunta acima. Eu não tenho nenhuma.
5 comentários:
Encontro-me na mesma situação que você: sem resposta!!!
Yúdice,
Quando estudava francês, soube que a língua tendia à redução das palavras. Não sei a motivação, mas o fato é descrito em todos os livros técnicos concernentes.
Muito depois, li um artigo que falava destas mesmas reduções em outras línguas, como o português. Há, pois, uma tendência universal à simplificação da linguagem, como no exemplo que deste da transformação do "vossa mercê", corruptelado nos interiores do Brasil em "vosmicê" e encontrado nos centros urbanos, principalmente do sul e sudeste, como "você". Creio que esta seja a fórmula seguida nas expressões "refri" e "niver", como de resto nas diminuições de conjugações de verbos (como "tô", "tá" e outros mais).
Pode parecer feio hoje, mas quem sabe em 50 anos não nos lembremos mais dos substantivos originais? Certamente foi assim quando começaram a chamar "fotografia" simplesmente de "foto". Hoje, achamos muito mais simpática a forma moderna da palavra.
Como diria o professor Pasquale Cipro Neto, "é isso". :-)
Aproveitando, agradeço a carinhosa postagem (ou simplesmente "post") de Natal e Ano Novo deixada no Flanar. Estava um pouco "off" (hehehehe) no mês de dezembro e somente agora retomo o ritmo normal.
Abração.
Também não tenho resposta a sua pergunta (felizmente, porque tê-la talvez significasse que eu já tinha aderido!), mas também me irritam, especialmente as seguinte: "Mara" (maravilhoso, maravilha); "Confra" (confraternização - essa eu conheci agora, no final do ano) e "quinzola" (festa de 15 anos - ah, essa é terrível!).
Como você disse, meu caro Yúdice, as pessoas estão pensando cada vez menos em tudo, e principalmente no que falam ou fazem.
Hoje se você disser que vai fazer um trabalho e demorará dois dias, mas o Zé vizinho demorará apenas uma manhã, as chances estão entre 20% em você contra 80% no Zé.
Ninguém mais quer esperar os dois dias de um bom trabalho, porque tempo é dinheiro (detesto esta expressão). Todos querem produtividade. Afinal, estamos na era da velocidade da informação, não é mesmo?
Para você ter uma ideia, não tão antigamente, levava-se cerca de dez anos para se testar um automóvel antes de vendê-lo, para garantir sua segurança. Hoje em dia os testes são feitos nas ruas pelos próprios usuários. E todos os problemas são facilmente resolvidos com um recall.
E é aí onde acaba surgindo toda estas porcarias que você encontra hoje em dia. Porcarias de mãos-de-obra, porcarias de trabalhos escolares, porcarias de matérias primas etc.
Que tristeza.
Alexandre
Verdade, Francisco. Reconheço que, fosse no passado, eu teria raiva de "foto" tanto quanto tenho de "refri". Mesmo sendo um vocábulo ao qual já me adaptei, se observares, não escrevo "foto" nas minhas postagens. Escrevo "fotografia" ou "imagem".
Nas postagens de cunho mais visual, como as da série Você conhece Belém?, isso fica mais perceptível.
"Mara" é consequência do poder da televisão, Luiza. Modismos, que logo serão esquecidos, salvo pelos mais telemaníacos ou saudosistas.
"Confra" é um termo que detesto. Posso acrescentar a minha lista, pois apenas não pensei nele na hora de escrever o texto.
O "quinzola", por fim, não seria propriamente uma redução. Apócope de quê? "Festa de debutante"? Creio que seja uma gíria. Mas concordo que é irritante.
Alexandre, essa é a preocupação que tenho. As pessoas estão emburrecendo voluntariamente e, pior, gostam disso. Ir contra a maré é ser ridículo e chato. Pode?
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