No meu primeiro semestre do curso de Direito, houve um dia em que alguns alunos pegaram uma carona com o professor de Filosofia, o conhecidíssimo José Carlos Castro. Naquela época, eu considerava difícil entabular uma conversa com ele, pois sua mente funcionava num outro nível, emendando um assunto no outro e abordando aspectos inusitados. Ele ia de um tema a outro tão facilmente, e sem qualquer aviso, que muitas vezes eu demorava a compreender a continuidade do diálogo. Naquela manhã, sem mais nem menos, quando deixávamos o campus da UFPA, ele começou a falar sobre aspectos religiosos. Aos poucos, percebi que se referia aos nomes dos simplórios estabelecimentos comerciais ao longo da Av. Bernardo Sayão, na qual predominavam nomes religiosos.
Foi Castro quem me chamou a atenção, pela primeira vez, que eu me lembre, para a relação entre pobreza e religiosidade. E hoje, ao procurar um endereço usando esta mão na roda que é o Google Maps, deparei-me por acaso com o bairro da Terra Firme, ali onde foi erguida a favela "Riacho Doce". Ao tempo em que Edmilson Rodrigues foi prefeito, houve a macrodrenagem da Bacia do Tucunduba e parte daquela área foi urbanizada, ganhando arruamento, asfalto, meio-fio e pontes.
As ruas foram batizadas com nítidas referências bíblicas: Salvação, Fé em Deus, Apocalipse, Profetas, Redenção, Arrebatamento, Cristo Rei, Rosa de Saron. Não se engane: Ômega, no contexto, com certeza tem a ver com Deus ser o alfa e o ômega. O carrão da Chevrolet é que não poderia ser.
Pelo tom, eu diria que é uma região evangélica, porque os evangélicos são mais aferrados que os católicos nessa história de arrebatamento e apocalipse.
Eu me pergunto se o referencial religioso onipresente é uma manifestação de esperança ou se o povo acha que tem a obrigação de se lembrar, todo santo dia, de certas coisas, mesmo que não sejam belas. Mas não especularei a respeito. Ainda preciso me informar melhor sobre o efeito das condições econômicas sobre a religiosidade popular.
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