terça-feira, 6 de setembro de 2011

Privilégios

A cena se passou numa agência bancária de Belém, esta manhã, e foi presenciada pela filha de uma amiga minha.
Cidadão idoso entrou e se dirigiu à fila de atendimento prioritário, onde havia umas poucas pessoas. Passou por todas e chegou ao balcão, para ser atendido imediatamente. A funcionária disse que, naquela fila, todos tinham prioridade e ele precisaria aguardar sua vez. Ele se virou para a senhora que encabeçava a fila e reclamava, indagando:
— Quantos anos a senhora tem?
— 69.
— Eu tenho 75!
Instalou-se a confusão porque o homem invocava os direitos que a lei lhe concede. E ele conhece a lei! A funcionária ainda argumentou que a lei, no caso, o Estatuto do Idoso, confere prioridade a todos os maiores de 60 anos, mas entre estes não há qualquer preferência. Não teve jeito. O bonitão manteve o bate boca. A senhora prejudicada começou a se sentir mal. A filha de minha amiga se aproximou para ajudá-la, abanando-a, e também reclamou do comportamento do homem.
— E você cale a boca, sua moleca! — redarguiu ele, para quem o mal estar da senhora era "frescura".
A jovem disse que não lhe responderia à altura porque ela tinha educação. No final das contas, a própria prejudicada disse à funcionária que atendesse logo o mal educado. A bancária perguntou a todos da fila se deveria fazê-lo, com o que todos concordaram, irritados, para se livrarem logo da sórdida figura. A funcionária ainda ressaltou ao sujeito que só o atenderia porque autorizada por todos.

***

Algumas normas são criadas para, instituindo privilégios, compensar vulnerabilidades materiais do indivíduo, como as decorrentes da idade avançada. Infelizmente, alguns tipos que recebem tais benesses não são merecedoras delas. Invocam-nas para dar vazão a suas depravações de caráter. E o pior é que nem podemos confrontá-los, porque corremos o risco de ser mal interpretados e a coisa virar em nosso desfavor.
Não gostei do desfecho desse caso porque, seja pelo motivo que for, o canalha venceu. E os maus nunca deveriam vencer. Ao chegar em casa, esse fulano há de se vangloriar de como pôs todos na mão porque, afinal, ele tinha mesmo razão. Deplorável.

8 comentários:

Cléoson Barreto disse...

Olá!
Isso me lembrou um dito, que é mais ou menos assim: "Para que o mal prevaleça, basta que os bons nada façam."
Acho que a própria funcionária deveria ter chamado a segurança para colocar o "esperto" no seu devido lugar, e não jogar a responsabilidade da situação para os demais que estavam na fila.
Um abraço.

Anônimo disse...

Ao contrário do que alega a postagem, existe, sim, prioridade entre os idosos. Uma pessoa com 60 anos não deve ter o mesmo tratamento de outra com 90 anos.
Por acaso, você conhece alguém de 90 anos? Tem noção de suas dificuldades:
Pois é...
É claro que o mais idoso deve ter preferência.
Não se trata de canalha, mas de cidadão que merece respeito. Deplorável, muito deplorável, a opinião equivocada da postagem. Todos são iguais na medida de suas desigualdades. Tratar de forma igual é tratar desigualmente as situações desiguais. Isso é curial em direito, no mundo civilizado.
Finalmente, não se trata de "privilégio", mas de preferência ou prioridade legal, natural e humana.
Logo...

Anônimo disse...

O que parece natural é o anônimo da postagem anterior ser parente do referido senhor ou ter um parente idoso como ele. Ou pior ainda, é adepto de privilégios.
Nem que estivesse com a razão -e não estava, posto que a lei não faz distinção entre idosos- é injustificável a condta dele de desrespeitar as pessoas.
Tenho certeza de que esse senhor que chamou a moça de "moleca", ficaria ofendidíssimo se fosse classificado como "velhote" ou qualquer outra expressão perjorativa. Nada justifica o desrespeito e a insolência desse senhor.

Yúdice Andrade disse...

Ao escutar a história, Cléoson, ciente de que a corda sempre arrebenta no costado do funcionário, mesmo que ele esteja correto, pensei nisso também. Acho que o correto seria mesmo chamar um gerente para que ele conversasse com o indigitado e tentasse orientá-lo. Se não desse jeito, colocá-lo no seu lugar seria uma boa opção.

Das 20h05, não sei o motivo de sua raivinha, mas vamos lá:
1. Não existe, na lei, no Estatuto do Idoso ou em qualquer outro diploma, preferência gradativa consoante a idade, só a preferência geral aos idosos, legalmente definidos como todos os maiores de 60 anos. Foi isso que a postagem disse e não está errada.
2. Concordo que deve ser assegurado tratamento diferenciado a quem tem maiores necessidades. Mas como a lei não dispõe nesse sentido, deve imperar o bom senso. Uma pessoa de 75 anos pode estar mais saudável do que outra, de 69. Quem mereceria a preferência, nesse caso?
3. Em seu patético questionamento sobre eu conhecer pessoas de 90 anos, você deixou implícito que está em jogo não a idade em si, mas a debilidade física do idoso. Do contrário, não teria recorrido a uma idade tão avançada.
4. A idosa que mais amei nesta vida morreu aos 92. Forte, vigorosa e cheia de marra, aposto que ela não faria a menor questão de passar à frente dos demais idosos. Até porque era educada.
5. Além disso, a postagem deixa claro, para quem sabe ler, que a canalhice não está em reivindicar uma prioridade adicional, digamos assim. Mas na conduta do infeliz, que se achou melhor do que todos, passou à frente de todos e exigiu atendimento. Se ele acredita em prioridade conforme a idade, por que não perguntou aos idosos na fila quem era o mais velho? Simples: porque ele queria um privilégio imoral, não justiça.
6. Finalmente, ele foi arrogante e agressivo com outra idosa e com uma jovem que ajudava a senhora. Mas isso você não considerou canalhice, não é?
Quando quiser pagar de guardião dos melhores valores humanos, analise melhor as informações disponíveis e reveja seus conceitos.

Yúdice Andrade disse...

Com um adendo nada insignificante, das 1h19: ao chamar a jovem de "moleca", ele incorreu numa conduta que é "apenas" imoral, que não o sujeita a nenhuma consequência além do plano ético. De quebra, contaria com a tolerância de todos porque, afinal de contas, é idoso. Mas se a jovem o chamasse de "velhote", incorreria num crime de injúria preconceituosa, com penas de 1 a 3 anos de reclusão e multa, aumentada de um terço se o fato fosse praticado na presença de várias pessoas, como devia ser o caso.
Além disso, em nome daquela mesma tolerância, é possível que as pessoas em redor deixassem de apoiá-la, sob aquele conhecido argumento de que ela estava certa mas, agindo como agiu, acabou por perder a razão.
Como pretendi dizer na postagem, certas leis são criadas para compensar desigualdades e injustiças. Contudo, nas mãos dos ímpios, acabam se tornando fonte de desigualdade e injustiça.

AlterEgo Incógnito disse...

Cavalheirismo não "envelhece". sem entrar no mérito da questão que já foi brilhantemente exposta,idoso ou não, sou daqueles que acredita que: primeiro as damas; puxar a cadeira para uma mulher sentar é elegante; dar o lugar pra uma mulher sentar-se caso não haja outro disponível no ônibus ou em qualquer outro lugar é de muito bom gosto, enfim... Prefiro uma cortesia à uma grosseria!

Yúdice Andrade disse...

Você é um cavalheiro, AlterEgo. Infelizmente, o mundo anda carente de gente civilizada. Cavalheiros, então, são um artigo ainda mais sofisticado!

Anônimo disse...

Deplorável mesmo deve estar, agora, o anônimo das 20:05, detentor da "cintilante" aula de hipossuficiências! Fosse ele, eu passaria a requerer preferência, já que a mesma também é assegurada aos que possuem debilidades físicas. Quis dar uma de professor de Deus, mas o lombo dele está em miséria... Bem feito.